Moradores de ocupações de Mariana vivem rotina de insegurança e desassistência
Comissão de Defesa da Habitação realizou, na segunda (24), visita aos locais e audiência pública em busca de solução.
Ameaça de despejo, insegurança, falta de acesso aos serviços de energia e saneamento, vias precárias e sem calçamento fazem parte da rotina de cerca de 3 mil famílias de Mariana (Região Central), que totalizam aproximadamente 11 mil pessoas.
Vivendo em ocupações da parte alta da cidade, moradores demandaram o avanço da regularização urbana no município, nesta segunda-feira (24/11/25), durante visita técnica e audiência pública da Comissão Extraordinária de Defesa da Habitação e da Reforma Urbana da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) em Mariana.
As ocupações se localizam em Bairros como Cabanas, Santa Rita, Santa Clara, Cristo, Serrinha e Vila Renascer, áreas de propriedade de um único particular, a Companhia Mina da Passagem.
De acordo com moradores e participantes das atividades, as áreas já pertenceram ao poder público, mas foram transferidas à família proprietária da Mina da Passagem, na década de 60, com a promessa de industrialização dos locais, o que não ocorreu. Ainda conforme participantes, atualmente, os valores pedidos pela empresa para desapropriação seriam altíssimos.
A primeira atividade da comissão foi uma visita às ocupações. Uma das mais antigas, no Bairro Santa Rita, existe há cerca de 20 anos. Parte dela fica abaixo de uma encosta. Ela é um das três com processo de reintegração de posse em andamento. Dessa forma, moradores sofrem ameaça de despejo. Outras ações referentes a demais áreas também estariam em curso.
Depois da visita, a comissão realizou uma audiência pública na quadra da Escola Municipal Monsenhor José Cota. Moradores das ocupações encheram o espaço para discutir o déficit habitacional e as ocupações da cidade.
Para o líder comunitário da Ocupação Renascer, José Marques, nunca houve política pública habitacional em Mariana. “Ocupar foi a única opção que nos foi dada”, afirmou. Como relatou, há uma ação relativa à ocupação para ser julgada em dezembro. Ele clamou a união dos moradores.
Sebastião Coelho, liderança comunitária da ocupação Santa Clara, pediu uma resposta efetiva à demanda por moradia. Paulo Lopes, liderança do bairro Serrinha, disse que os moradores das ocupações querem conquistar seus direitos com base no diálogo.
Segundo o advogado especialista em Direito Urbanístico e Ambiental, Thiago Guerra Naves, a causa do problema se chama especulação imobiliária.
Parlamentares e autoridades defendem ocupações
Segundo o presidente da comissão, deputado Leleco Pimentel (PT), Mariana vive uma emergência habitacional. “Não queremos ameaça de despejo a nenhuma família”, afirmou.
Conforme disse, ele vai apresentar requerimentos com pedido de providências para o governo estadual e a prefeitura de Mariana utilizarem recursos da repactuação do acordo pelo rompimento da barragem na cidade com objetivo de atender à regularização fundiária e urbanização das áreas.
Outro requerimento, como disse, é para a criação de uma comissão de trabalho com todos os envolvidos para encontrar soluções.
O deputado federal Padre João (PT-MG) enfatizou que a moradia é um direito fundamental. “Nesse sentido, os governos precisam assegurá-la”, afirmou, acrescentou que o poder público precisa ainda oferecer infraestrutura e serviços básicos à população das ocupações.
Durante as atividades da comissão, eles salientaram a importância de haver um censo nas ocupações para apurar o número real de famílias e suas características.
Representando os vereadores de Mariana, Preto (PV) manifestou apoio aos moradores das ocupações e pediu a regularização das mesmas durante a audiência.
Os defensores públicos Luiz Carlos Santana e Sara Carvalho enfatizaram o direito à moradia. Como salientou Luiz Carlos, moradores sem condições de arcar com um advogado podem procurar a Defensoria.
“Que todos os moradores sejam ouvidos antes de decisões do Judiciário”, solicitou Luiz Carlos.
Também destacou a relevância de escutar os moradores das ocupações a promotora de Justiça Clarisse Perez.
Representante da Mina da Passagem entrega plano de ação
De acordo com o preposto e um dos proprietários da Companhia Mina da Passagem, Roberto Rodrigues, a empresa tem o interesse de resolver a situação, assim como os moradores dos locais. Nesse sentido, ele entregou um plano de ação ao deputado Leleco Pimentel e autoridades presentes, baseado em soluções já desenvolvidas em outras cidades.
Conforme falou, a cidade dobrou sua população tendo hoje 60 mil habitantes e uma enorme população flutuante a qual pressiona o valor dos aluguéis.
Segundo Roberto Rodrigues, em 2008, a empresa entrou com processo de reintegração de posse por causa de cerca de 40 ocupações. “De lá para cá a questão não se resolveu e as ocupações se multiplicaram”, contou, acrescentando que os governos municipais se alteraram ao longo do tempo sem resolver o impasse.
Para desembargador, moradores precisam manter mobilização
Conforme o desembargador do Tribunal de Justiça (TJ), Osvaldo Oliveira Araújo, moradores das ocupações precisam manter a mobilização.
Ele afirmou que os moradores precisam designar representantes, procurar advogados, buscar saídas para o problema e ficar atentos aos passos concretos, sob pena de realmente haver reintegração de posse.
Representando na audiência comissão do TJ a qual trata de questões fundiárias urbanas e rurais, o desembargador relatou que já foram feitas visitas a ocupações da cidade e reuniões. Essas iniciativas, no entanto, não influenciam a decisão do magistrado responsável pelas ações, como esclareceu.
Município criou Secretaria de Habitação neste ano
O secretário Municipal de Habitação de Mariana, Antônio Marcos de Freitas, contou que a pasta foi criada neste ano para buscar soluções para o deficit habitacional da cidade. “Em Mariana temos deficit habitacional quantitativo e também qualitativo”, afirmou. Ele participou da visita e também da audiência pública.
Antônio Marcos também abordou o alto custo de vida na cidade, pressionado pela atividade minerária e pela população flutuante.
Ele ainda pediu cópia do plano de ação apresentado pelo preposto. “O município não vai se furtar à sua responsabilidade”, disse, acrescentando que o problema só será resolvido com diálogo e boa vontade de todos os envolvidos.
Segundo o deputado federal Padre João, é preciso que a Mina da Passagem peça um valor viável pelos terrenos para haver uma solução.