Participantes de audiência elogiam limitação da saída temporária de presos
Autoridades e entidades lamentaram na Comissão de Segurança Pública assassinato de sargento da PM, por detento beneficiado pela saidinha de fim de ano.
26/02/2024 - 19:02 - Atualizado em 27/02/2024 - 09:38A limitação do benefício de saídas temporárias - a chamada “saidinha de fim de ano” - contida no Projeto de Lei 2.253/22, aprovado no Senado, foi elogiada por todos os participantes da reunião da Comissão de Segurança Pública, nesta segunda-feira (26/2/24). Deputados estaduais e federais e membros das Polícias Militar e Civil, do Ministério Público e de entidades que representam policiais participaram da audiência na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Vários deles lamentaram o assassinato de Roger Dias da Cunha, sargento da PMMG, atingido por tiros, ao tentar abordar Welbert de Souza Fagundes, detento condenado que não se reapresentou na prisão após a “saidinha”. E relacionaram o crime a essa falha na Lei de Execução Penal (LEP), que protegeria excessivamente o criminoso em detrimento da proteção à sociedade.
Tramitação
Aprovado na última semana, o PL 2253/22 terá que voltar à Câmara dos Deputados (onde foi aprovado em primeiro lugar), antes de ir à sanção presidencial, pois sofreu alterações no Senado. A proposta é que, uma vez sancionada, a lei seja chamada de "Lei PM Sargento Dias", em homenagem ao mineiro. O texto aprovado mantém o benefício da saída temporária apenas para os detentos do regime semiaberto quando estiverem frequentando cursos supletivos profissionalizantes, ensino médio ou ensino superior.
O presidente da comissão, deputado Sargento Rodrigues (PL), que solicitou a reunião junto com o colega Bruno Engler (PL), avaliou que a juíza de Ribeirão das Neves foi negligente ao liberar o criminoso para a saída. “O Ministério Público recorreu várias vezes, afirmando que esse indivíduo não merecia a redução de pena e o benefício da saidinha”, insistiu.
Lembrou que em três ocasiões em 2023, Welbert foi flagrado com arma de fogo e que, portanto, não poderia ser beneficiado. Essa decisão custou a vida de um policial de 29 anos, que deixou esposa e um bebê de 5 meses. “Ficam as polícias enxugando gelo, prendendo 5, 10 vezes a mesma pessoa e juízes, como essa de Neves, beneficiando criminosos em vez de proteger a sociedade”, lamentou o Sargento.
“Ninguém aguenta mais essas saidinhas. Já não bastam todos os benefícios de redução de pena?”, questionou o deputado Bruno Engler (PL). Ele comemorou a aprovação do fim das saidinhas no Senado e conclamou os colegas a pressionarem para que a Câmara aprove o projeto da mesma forma. Mas colocou em dúvida se o presidente Lula sancionará, já que, segundo o parlamentar, o presidente tem histórico de “passar a mão na cabeça de vagabundo”.
O deputado Caporezzo (PL) disse que apresentou pedido com mais de 500 assinaturas para que a juíza que concedeu a saidinha para Welbert Fagundes tenha suspensa a medalha que ganhou da Polícia Militar. “Essa pessoa tem que ser responsabilizada, ainda que simbolicamente”, afirmou. Ele ainda considerou que os defensores do benefício vivem “em um mundo de fantasia”, dentro de condomínios fechados. “No Brasil, o cidadão de bem está preso e o bandido, solto”, criticou.
Na mesma linha, a deputada Chiara Biondini (PP) lembrou que o assassinato de Roger Dias representou um fato muito triste para a sociedade brasileira. Ela afirmou contar com os deputados federais para acabar com as saidinhas.
“No Brasil, prende-se pouco, ao contrário do que se diz”, afirma promotor
O promotor de justiça do MPMG Marcos de Souza Miranda, apresentou dados para corroborar sua tese de que o sistema de justiça brasileiro encarcera pouco, ao contrário do que apregoa o discurso dominante, de que o índice de encarceramento no Brasil é alto. Ele informou que cerca de 50% dos processos da justiça mineira são de crimes de menor poder ofensivo.
Miranda registrou que, para esses crimes, sem grave ameaça, cuja pena é inferior a 4 anos, o mecanismo de justiça penal negocial permite que os implicados não cumpram a pena em regime fechado. Somados a esses delitos, há cerca de 30% de crimes de médio potencial ofensivo, totalizando 80% dos casos, em que as pessoas não são presas.
“A saída temporária só se aplica, então, aos 20% dos crimes restantes, com penas superiores a 8 anos”, concluiu. O promotor incluiu no rol desses crimes homicídio, tráfico, estupro de incapaz e organização criminosa. “No nosso regime jurídico, temos sempre a pena menor, que é aplicada via de regra; prisão é exceção; no Brasil, prende-se pouco, ao contrário do que se diz”, avaliou.
Ele criticou ainda a “posição garantista, quando não abolicionista”, dos membros do Supremo Tribunal Federal: “Não raras vezes, conseguimos uma condenação e quando chega ao STJ ou ao STF, vemos muitas penas serem abolidas”, lamentou. “O sargento Roger Dias é apenas um entre muitas vítimas desse sistema perverso", criticou. O procurador do MPMG André Ubaldino Pereira, defende que é necessário acabar com os mandatos vitalícios para os ministros dessa Corte, para aperfeiçoar sua atuação.
Já o promotor Marcos Miranda registrou que, em 2023 em Minas, 3760 receberam o benefício das saídas e, destes, 392 se envolveram em 514 ocorrências policiais, ou seja, mais de 10% do total. Para aperfeiçoar o benefício (se este ainda prevalecer), ele propõe que seja exigido o exame criminológico para todos que o requererem.
Por fim, sugeriu o monitoramento eletrônico por todos os beneficiados com a saidinha. “Em Minas, 6040 pessoas são monitoradas com tornozeleiras, sendo que há 12.933 disponíveis. Precisamos utilizar com mais intensidade o monitoramento eletrônico”, concluiu.
Progressão de regime
O secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, Rogério Greco, defendeu mudanças na Lei de Execuções Penais, considerando-a obsoleta.
Na avaliação dele, não só a saída temporária, mas também a progressão de regime devem acabar. No caso dessa última, ele avalia que os Estados não têm casa de albergados para os que avançam do regime fechado para o semiaberto. Em seu lugar, deve-se criar o que chamou de livramento condicional monitorado, feito com o uso das tornozeleiras.
Entidades policiais apresentam reivindicações
Representantes de entidades estaduais dos policiais militares, civis e penais apresentaram reivindicações, que poderiam contribuir para a melhoria do sistema prisional. Wemerson Oliveira, presidente do Sindicato dos Servidores da PCMG, reclamou dos salários baixos pagos para sua categoria, gerando uma defasagem de mais de 40%.
José Lino Santos, presidente do Sindicato dos Auxiliares, Assistentes e Analistas do Sistema Prisional e Socioeducativo, reclamou que o Congresso não reconheceu a aposentadoria especial da sua categoria. Também denunciou que os policiais penais estão sendo caçados pelo crime organizado, pois falta proteção do Estado.
“Uma grande ‘façanha’ do governo do Estado é sucatear o serviço público, incluindo o sistema de segurança pública. Aí, alega que não funciona e chama a iniciativa privada para fazer”, condenou.
Alexsander Ferreira, vice-presidente da Associação Nacional dos Polícias Penais do Brasil (Ageppen), fez várias reivindicações, além da melhoria da política remuneratória. “Devemos criar um grupamento de recaptura, e que o Judiciário trabalhe junto com o sistema penal; precisamos da integração das forças de segurança”, propôs.
Por fim, o deputado federal Pedro Aihara, bombeiro militar mineiro, considerou que atualmente existe uma desvalorização da atividade policial, o que acaba provocando a hesitação na atuação do agente de segurança. Ele criticou também decisão do Superior Tribunal de Justiça que praticamente impediria a busca pessoal realizada pelos policiais. Segundo o STJ, essa ação não pode ser realizada com base em fontes anônimas ou apenas no tirocínio do policial.
Além disso, segundo Aihara, se o policial encontrar objetos ilícitos em uma ação considerada ilegal, o criminoso, ao ser abordado pelo Judiciário, será solto.