Mudanças na educação para crianças com deficiência em Bom Sucesso geram críticas
Desde agosto de 2022, prefeitura passou a concentrar atendimento em escolas da sede, o que tem gerado reclamação por parte de famílias.
08/08/2023 - 14:45Mudanças na oferta de professor de apoio a crianças com deficiência na rede municipal de ensino de Bom Sucesso (Centro-Oeste de Minas) foram criticadas, nesta terça-feira (8/8/23), em audiência pública da Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Até o primeiro semestre do ano passado, havia oferta desses profissionais em todas as escolas onde havia matriculadas crianças com deficiência, conforme explicou o assessor jurídico da prefeitura municipal, Kildare Chaves Gusmão.
Depois disso, a prefeitura passou a concentrar o atendimento a esses alunos em duas escolas na sede do município. A medida trouxe ainda mais impactos para quem mora na zona rural ou em distritos da cidade, como o de Macaia.
As dificuldades impostas por essa situação fez com que a pedagoga Janaína Xavier Porto, mãe de um aluno de 7 anos com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), tomasse uma decisão difícil. Ela não matriculou seu filho na escola neste semestre.
Moradora do distrito de Macaia, ela leva seu filho todas as manhãs para os tratamentos especializados em Lavras (Sul de Minas), que fica mais perto. Tratamento custeado pela família, como contou.
No retorno dessas atividades, às 12h30, ele frequentava a escola de Macaia, onde contava com um profissional de apoio até julho do ano passado.
No segundo semestre de 2022, ele permaneceu na mesma escola, mesmo sem professor de apoio, contando com o auxílio de outros profissionais da instituição. Neste ano, a matrícula naquela escola não foi renovada.
Janaína Xavier relatou que, desde que a escola onde o filho estudava parou de ofertar o professor de apoio, ela convive com depressão, ansiedade e síndrome do pânico.
Mãe conta que filha com TEA regrediu após mudança
Michele de Oliveira, mãe de uma garota de 6 anos que tem o TEA, relatou que a filha contava com professor de apoio na rede municipal e teve um desenvolvimento importante.
Após a mudança implementada, como contou, viu sua filha regredir a cada dia. “Além do autismo e de um problema genético, ela agora tem um laudo de retardo mental”, disse.
Ela ainda acrescentou que os monitores de apoio têm se mostrado inadequados para o atendimento a essas crianças. Michele de Oliveira relatou que sua filha precisa ir ao banheiro de três em três horas e que isso não vem sendo cumprido, por exemplo.
Os prejuízos apontados pelas mães foram endossados por cinco vereadores de Bom Sucesso que participaram da reunião. São eles: Fred Junior (PT), Rafael Oliveira (Patriota), Fabiano Santos (Avante), Reginaldo Reis (Avante) e Marcos Fabiano Carvalho (PSB).
Eles foram unânimes em criticar as mudanças implementadas pela prefeitura e enfatizaram a necessidade de assegurar os recursos para o devido atendimento às crianças com deficiência.
Representantes da prefeitura explicam alterações
Segundo o assessor jurídico da prefeitura municipal, Kildare Chaves Gusmão, as mudanças tiveram como objetivo melhorar o atendimento às crianças e também adequar os custos à realidade financeira da cidade que, em 2022, começou a pagar o piso nacional aos professores.
Conforme explicou, as duas escolas municipais localizadas na sede da cidade que atualmente fazem o atendimento às crianças com deficiência contam com sala de recursos e equipe multidisciplinar, conforme exigido por regulamentação.
Ele explicou que o salário do monitor é inferior ao do professor de apoio. Um projeto de lei para assegurar a presença desses monitores nas escolas tramita na câmara municipal.
A secretária municipal de Educação de Bom Sucesso, Marília Carvalho dos Reis Tiote, corroborou a fala de Kildare Chaves. Ela disse que, com a mudança implementada, a contratação de monitores de apoio no lugar de professores e a consequente redução de custos, já está havendo uma ampliação do atendimento a crianças com deficiência para outras três instituições da cidade.
Direito deve ser assegurado
A presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB/MG, Michelly Pereira, destacou que não se pode falar em ausência de recursos para garantir um direito fundamental.
Ela se disse chocada com o fato de a prefeitura retirar os alunos de suas escolas regulares e colocá-las em espaços específicos. “Hoje a inclusão deve ser uma realidade”, ponderou.
O coordenador da Defensoria Especializada da Pessoa Idosa e da Pessoa com Deficiência, Estevão Machado de Assis Carvalho, enfatizou que, pela lei, uma criança com deficiência deve ser matriculada na escola da preferência de sua família, exceto quando não há mais vaga.
“O município tem que se virar para receber adequadamente o aluno sob pena de reclusão para quem se negar a fazer isso”, explicou.
Já a diretora educacional da Superintendência Regional de Ensino (SRE) de São João del-Rei, Leila Moura, apontou irregularidades a partir da mudança implementada. Uma delas é ir contra o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que garante o acesso de crianças à educação perto da sua residência.
“Pode ser o transporte escolar da melhor qualidade, mas ir e voltar cerca de 17 quilômetros para algumas crianças pequenas e com deficiência gera impacto. Algumas deixam de estudar em Bom Sucesso e vão para Ijaci (Sul de Minas) que é mais perto”, contou.
Deputados manifestam apoio às famílias
O deputado Duarte Bechir (PSD), que solicitou a reunião, classificou como irrecuperável o que está ocorrendo com as crianças. Ele disse que vai propor uma visita ao município, além de encontros no Tribunal de Justiça e no Ministério Público.
Já o deputado Dr. Maurício (Novo), que preside a comissão, falou que não se pode ficar omisso nessas causas. “As mães têm seus motivos e a prefeitura pode ter outros. Mas, precisamos entrar num denominador comum e acolher a criança que precisa de ser incluída na sociedade”, falou.