Comissão recebe denúncias de maus-tratos e violação de direitos em presídios
Durante visitas a duas unidades em Uberlândia, nesta sexta (26), presidenta da Comissão de Direitos Humanos confirma condições precárias e anuncia providências.
26/05/2023 - 20:28Várias denúncias de maus-tratos contra presos de duas unidades prisionais de Uberlândia (Triângulo) chegaram à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta sexta-feira (26/5/23). A Comissão de Direitos Humanos visitou a Colônia Penal Professor Jacy de Assis, pela manhã, e a Penitenciária Professor João Pimenta da Veiga, à tarde, para verificar as condições carcerárias e apurar as denúncias trazidas por familiares dos detentos.
Em entrevista à TV Assembleia, Daniela Ferreira, da Associação de Familiares de Privados de Liberdade de Uberlândia, reclamou das várias violações de direitos humanos cometidas na Colônia Penal. Repercutindo queixas dos presos, ela citou a falta de atendimento médico e de medicamentos; a baixa qualidade da água oferecida, geralmente suja e com mau cheiro, e muitas vezes, insuficiente; bem como a escuridão dentro das celas.
Ela denunciou ainda um problema que é recorrente no sistema prisional do Estado: a qualidade inferior da alimentação, que vem com cheiro forte e, muitas vezes, com água (que seria para inteirar o peso do prato), além de ser insuficiente. “Então, os privados de liberdade ficam subnutridos, doentes, justamente por causa da má alimentação”, lamentou.
Transferências de presos seriam imotivadas
Daniela Ferreira questionou algumas transferências que a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública tem realizado. De acordo com ela, a Central de Vagas, muitas vezes, não apresenta aos familiares os motivos dessas mudanças, alegando razões de segurança. “Durante a pandemia, denunciamos muito as transferências, porque o governo proibiu a entrada de visitantes mas transferia presos de um lado para o outro”, detectou.
Além disso, ela reclamou que alguns presos da comarca são transferidos para unidades distantes, o que gera um transtorno ainda maior para os familiares, que têm dificuldades para fazerem deslocamentos maiores e mais caros. “Acontece também de fazerem primeiro a transferência e só depois publicarem no Diário Oficial. Com isso, muitas mães me ligam desesperadas porque não sabem pra onde o filho foi transferido”, relatou.
Sobre as famílias, Daniela Ferreira disse que elas também são maltratadas, quando visitam seus familiares. Um dos problemas ocorre com a entrada no bodyscanner, porque, de acordo com ela, não haveria uma pessoa treinada para avaliar a imagem da pessoa que entra na unidade.
De superlotação a celas escuras, problemas se acumulam
A deputada Andréia de Jesus (Psol), que solicitou a atividade, acrescentou alguns aspectos negativos que observou na visita à Colônia Penal. Conforme seu relato, faltam também colchões na unidade, além de muitos estarem molhados. O problema das celas escuras, apontou, prejudica os detentos que estão fazendo remissão de pena por meio da leitura.
Ela ainda repercutiu a queixa de falta de assistência judiciária: “Há pessoas com penas já cumpridas, com progressão de regime; outras 30 com saúde mental comprometida que deveriam estar em manicômios judiciais”, citou ela, criticando o fato de o sistema prisional mineiro não contar com psiquiatras. “Tem uma única psicóloga, que atende a mais de mil presos”, informou.
A parlamentar lembrou a audiência na ALMG em que foi denunciada tortura praticada por policiais penais, inclusive com indicação de nomes pelos familiares. “Algumas medidas paliativas foram tomadas, como o afastamento de uma policial, mas vemos uma estrutura que precisa de atenção”, analisou.
Outro ponto grave é a superlotação da Colônia Penal, com 900 vagas, que hoje está com 1700 presos. Faltam também kits de higiene, que as famílias normalmente enviam por sedex (o que é muito caro) e que as unidades demoram a entregar aos destinatários. Sobre a qualidade inferior da comida, segundo Andréia de Jesus, muitas denúncias partem dos próprios policiais penais.
Problemas estruturais no predio
Quanto à Penitenciária Pimenta da Veiga, visitada à tarde, a deputada informou que a unidade é menor (capacidade de 396 e ocupação de 440 presos atualmente), mas também apresenta problemas de estrutura. “São prédios antigos, sem manutenção há mais de 20 anos. E agora no período de frio, isso compromete a saúde dessas pessoas”, condenou.
Outra dificuldade é a falta de vagas na escola da unidade para os detentos estudarem. Como na outra prisão, na Pimenta da Veiga, a alimentação também é precária e insuficiente, com relatos de pessoas passando fome. Para agravar o quadro, a Sejusp baixou portaria reduzindo para 800 gramas a quantidade de biscoitos que cada família pode entregar a cada 15 dias ao privado de liberdade, o que é a metade da quantia permitida anteriormente.
Além disso, o governo contratou uma empresa privada para fazer o cadastro das famílias. Esta obriga os familiares a virem à cidade se cadastrarem para se habilitarem a enviar seus kit aos presos. “Há gente de outros estados, do Norte de Minas, que gastam até 12 horas de viagem para virem fazer o cadastro”, criticou Andréia de Jesus.
Objetivo é melhorar sistema prisional, que nasceu caótico
Na chegada ao presídio Jacy de Assis, a deputada foi recebida pelo secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, Rogério Greco, o qual não participou da visita, mas concedeu entrevista à TV Assembleia. Questionado sobre as denúncias de superlotação, na colônia penal, e de maus-tratos nas duas unidades visitadas, ele apresentou o posicionamento da Sejusp.
Conforme frisou, essas questões são uma herança de décadas. “Nosso objetivo é tentar resolver o problema da superlotação, com a criação de novas unidades e ampliação das unidades existentes. Então, o que a gente faz é tentar melhorar o sistema prisional, que já nasceu caótico”, afirmou.
Por outro lado, Rogério Greco reconheceu ser praticamente impossível acabar com a superlotação, porque há milhares de mandados de prisão expedidos e não cumpridos. “Nunca vai ter um sistema prisional suficiente para prender todo mundo. Então, tentamos separar aqueles que necessariamente têm que ser privados de liberdade dos que podem cumprir a pena fora das prisões”, observou.
Sejusp diz não admitir irregularidades
Sobre as denúncias de maus-tratos, Rogério Greco disse que qualquer ilegalidade é punida com o maior rigor pela secretaria. “A Sejusp não admite irregularidades; se aconteceu, a gente vai colher provas a respeito e a pessoa será punida, evidentemente. Tem havido um processo enorme de demissões, inclusive". Ele acrescentou que a Corregedoria percorre todo o sistema prisional e age com firmeza e eficiência.
Em relação às transferências imotivadas, o secretário respondeu que a finalidade da secretaria é sempre trazer o preso para perto de sua família. E completou que, hoje, no Brasil, há várias facções criminosas que dominaram o sistema prisional. “Se há algum movimento para retirar o preso de perto da família é porque alguma coisa estranha está acontecendo, porque não é essa a regra”, apostou.
Ao final, a deputada Andréia de Jesus anunciou os desdobramentos das visitas realizadas. Segundo ela, os consultores da ALMG vão elaborar o relatório dessas atividades e indicar as ações que os outros órgãos precisam empreender. Serão requeridas providências ao Ministério Público e à Defensoria Pública, especialmente para aperfeiçoar os mecanismos da remissão de pena e do direito dos detentos ao trabalho. A parlamentar informou que as informações das visitas serão também encaminhadas ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Por fim, ela avaliou que falta vontade política ao Governo de Minas para garantir melhor estrutura para o sistema prisional, tanto para quem cumpre a pena quanto para quem trabalha nas unidades. Na visita à Colônia Penal, inclusive, vários policiais penais reclamaram da sobrecarga de trabalho devido ao efetivo insuficiente e que seriam necessários mais 40 profissionais para completar o quadro.