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Transporte metropolitano da RMBH ganha projeto de tarifa zero

Proposta é anunciada em audiência com especialistas sobre mobilidade e gestores de municípios que já vivem a experiência.

- Atualizado em 02/10/2025 - 14:56
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A mobilização por tarifa zero no transporte público ganhou novo fôlego em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta quinta-feira (2/10/25).

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Logo no início da reunião, a presidenta do colegiado, deputada Bella Gonçalves (Psol), anunciou a proposta de criação do Programa Metropolitano de Incentivo ao Uso do Transporte Público Coletivo.

O Projeto de Lei (PL) 4.538/25 foi protocolado na manhã desta quinta (2), na Assembleia, com o objetivo de implementar, de forma progressiva e gradual, tarifa zero no transporte intermunicipal da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

Para Bella Gonçalves, a proposta é uma medida de justiça social, ambiental e econômica. “Falaram que era uma utopia, uma impossibilidade, uma maluquice, mas é um direito”, afirmou a parlamentar.

Hoje, oito municípios da RMBH já possuem tarifa zero no sistema de ônibus interno municipal: Brumadinho, São José da Lapa, Sarzedo, Mário Campos, Ibirité, São Joaquim de Bicas, Caeté e Itatiaiuçu. A ideia é estender a gratuidade para todos os usuários do sistema metropolitano.

Em Belo Horizonte, tramita na Câmara Municipal um projeto para a tarifa zero na Capital. A votação em 1º turno está prevista para esta sexta-feira (3/10). “A principal debilidade no nosso projeto é porque só consigo atender a demanda da cidade, não da RMBH. E muitos trabalhadores de Belo Horizonte vivem na região metropolitana”, pontuou a vereadora Iza Lourença (Psol-BH), autora do projeto municipal, ao elogiar a iniciativa de Bella Gonçalves.

Iza criticou o sistema atual belorizontino, no qual, segundo a vereadora, o passageiro paga duas vezes: com os seus impostos, que se tornam subsídio para as empresas de ônibus, e com a própria passagem. Ela informou que o subsídio pago pela Prefeitura de Belo Horizonte às empresas chegará a R$ 1 bilhão este ano, para manter o que ela considera "um transporte ruim e o terceiro mais caro entre as capitais”.

Marina de Oliveira Costa, coordenadora do coletivo Mobiliza Região Metropolitana de Belo Horizonte e Contagem, listou reclamações da população acerca da má qualidade do transporte coletivo, citando episódios de ônibus pegando fogo e com rodas se soltando, falta de acessibilidade, situações de assédio e veículos insuficientes rodando nos períodos noturnos e fins de semana.

A deputada Bella Gonçalves defendeu a tarifa zero como ponto de partida para um novo modelo de mobilidade urbana. Disse que zerar a tarifa é melhor para as cidades do que a prática de dar isenção fiscal de IPVA para veículos de locadoras, como fez o Governo do Estado.

“Acabar com isenções assim é uma forma de encontrar recursos para financiar a tarifa zero”, frisou, destacando que, por isso, o projeto por ela anunciado propõe justamente a revogação de dispositivos da Lei 14.937, de 2003, a qual dispõe sobre o IPVA.

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Brasil e Minas são referência

“Belo Horizonte e Minas Gerais estão inspirando o Brasil”, disse o coordenador na Fundação Rosa Luxemburgo e pesquisador sobre mobilidade na Universidade de São Paulo (USP), Daniel Santini.

Ele apresentou dados que demonstraram queda no uso do transporte público nas Capitais, onde não há tarifa zero: uma perda de 30% dos passageiros. Em BH, a queda foi de 453 milhões de usuários em 2013 para 275 milhões em 2023.

Fora das Capitais, são 137 cidades brasileiras com algum sistema de tarifa zero, seja para determinado público ou meio de transporte (ônibus ou metrô, por exemplo). Isso faz do Brasil o País com mais casos de tarifa zero no mundo.

Em Minas Gerais, 33 cidades possuem tarifa zero universal, sendo as maiores Ibirité (RMBH), Ituiutaba (Triângulo), São João del Rei (Central), Mariana (Central), Pirapora (Norte), Campo Belo (Centro-Oeste), Lagoa da Prata (Centro-Oeste), Leopoldina (Zona da Mata), Monte Carmelo (Alto Paranaíba) e São Lourenço (Sul).

Experiências municipais

Representantes de prefeituras de municípios mineiros onde já existe política de tarifa zero implementada compartilharam dados e impactos da experiência.

“É o programa da prefeitura com maior alcance entre a população”, afirmou Cristiane Costa Gonçalves, engenheira de transportes do Departamento Municipal de Trânsito de Mariana. Ela conta que, após a tarifa zero, a média de passageiros do sistema público municipal saltou de 150 mil por mês entre 2020 e 2021 para cerca de 450 mil passageiros mensais de acordo com os últimos dados.

Cristiane explicou também que o programa de tarifa zero é financiado com recursos próprios do Município de Mariana, representando em torno de 2,6% do orçamento municipal. 

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Em Ibirité, que já conta com tarifa zero desde o início de 2023, a ideia é implementar um fundo de financiamento do sistema, conforme Rodrigo Valú, diretor de transportes da Ibiritrans. O fundo seria alimentado com recursos advindos de taxas e publicidade, objetivando melhorias na frota de ônibus, que aumentou de 18 para 24 veículos para atender o aumento de passageiros.

Luciano Rodrigo Martins dos Santos, da Secretaria de Segurança Pública, Mobilidade e Trânsito de Ouro Branco, afirmou que o Executivo local tem buscado parcerias de investimento com a Gerdau, empresa com forte atuação no município, para manter a gratuidade das passagens. Segundo ele, apesar dos trabalhadores da empresa utilizarem transporte fretado, o sistema público é utilizado por seus familiares que vivem na cidade.

Em Juiz de Fora, a tarifa zero ocorre aos domingos e feriados, com passe livre para estudantes durante todos os dias. A medida aumentou o uso do transporte público em 40%, segundo Marcelo Frederico Pianta da Oliveira, subsecretário da Secretaria de Mobilidade Urbana do município.

Um projeto tramita na Câmara de Juiz de Fora para a tarifa zero universal todos os dias, prevendo seu financiamento a partir de uma taxa mensal a ser paga pelos maiores empregadores da cidade, baseado no número de empregados.

Letícia Domingues, integrante do Movimento Tarifa Zero BH, defendeu o modelo de taxação dos empregadores caso a tarifa zero seja implementada na Capital. "É uma disputa acirrada", observou, mencionando informações falsas que estariam sendo divulgadas contra a gratuidade da tarifa. Entre elas, uma possível fuga de capital das empresas empregadoras, o que no seu entendimento não ocorreria com a contrapartida da isenção do vale-transporte.

Custo é desafio apontado por gestores

Charliston Marques Moreira, diretor de Planejamento Metropolitano da Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, disse que a tarifa zero é discutida há muito tempo e tem o seu apoio. "Mas desde que feita de forma sustentável, principalmente sob o aspecto financeiro", ponderou.

Segundo ele, ainda seria preciso aprofundar na análise de vários pontos, como padrão de deslocamento da RMBH e dinâmica de circulação das pessoas, além de ser considerada a necessidade de haver simetria entre a fonte de financiamento do sistema e o número de viagens realizadas.

Citação

Diego Pessoa Santos, superintendente de Modernização do Transporte Coletivo da Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra) disse acreditar no sucesso das propostas expostas.

“Toda iniciativa que vem agregar à mobilidade merece nossa atenção. Mas obviamente temos muitos desafios, principalmente quando se fala em escala e como custear”, disse ele, citando que o cenário fiscal do Estado traz limitações orçamentárias.

O representante da Seinfra citou ainda estudo feito pelo BNDES que teria acusado um déficit de R$ 600 bilhões necessários para alavancar a estratégia de mobilidade urbana no País. Nesse sentido, defendeu a necessidade de inserir o governo federal na discussão, melhorando a governança entre todos os entes.

Comissão de Direitos Humanos - debate sobre a tarifa zero no transporte coletivo
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Comissão de Direitos Humanos - debate sobre a tarifa zero no transporte coletivo
"Precisamos de maior controle dos custos do transporte em toda a Região Metropolitana. Há muitas fontes relevantes de dados e pesquisas, mas precisamos aprofundar as análises."
Charliston Marques Moreira
Diretor de Planejamento Metropolitano da Agência de Desenvolvimento da RMBH

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