Solução para assassinato de Marielle Franco é cobrada em audiência
No dia em que se completam cinco anos do crime, participantes da reunião pediram também o fim da violência política contra mulheres.
14/03/2023 - 19:50“Cinco anos é muito tempo para ficar sem respostas.” O desabafo da deputada Bella Gonçalves (Psol) deu o tom à reunião da Comissão de Direitos Humanos na qual foi cobrado o esclarecimento da execução da vereadora carioca Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, há exatos cinco anos. A violência política que marcou o caso e que prossegue nos dias atuais também foi repudiada pelas participantes. A reunião foi realizada nesta terça-feira (14/3/23), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
A luta de Marielle foi destacada em vários momentos e por diversas mulheres: contra o encarceramento em massa de jovens negros e periféricos; contra a militarização da sociedade; e em defesa das mulheres em sua diversidade. Muitas também destacaram seu exemplo, seu legado e o quanto a semente que ela plantou germina na sociedade. “Somos frutos da jornada de Marielle”, enfatizou a vice-presidenta da ALMG, deputada Leninha (PT).
Por outro lado, na visão das participantes, entre as quais a deputada Ana Paula Siqueira (Rede), a impunidade do crime sustenta vários outros casos de violência contra as mulheres.
A presidenta da comissão, deputada Andréia de Jesus (PT), ainda relatou as ameaças que sofre há mais de um ano, que já se desdobraram em mais de 40 inquéritos.
A presidenta da Associação de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade, Maria Teresa dos Santos, também relatou as ameaças que sofre diariamente, inclusive, com comparações com Marielle Franco. “Tivemos delegados trocados, pessoas destituídas, tudo para não se chegar aos mandantes do assassinato. Temos que matar um leão por dia”, afirmou.
Violência política no mundo
As participantes da reunião também trouxeram dados que dão a dimensão dessa violência. Andréa Cangussú, da Secretaria de Mulheres do Partido dos Trabalhadores, citou pesquisa da organização internacional União Parlamentar, segundo a qual 82% das mulheres nos parlamentos do mundo já sofreram violência psicológica e 44% delas relataram violência física, boa parte dentro desses parlamentos.
No Brasil, 53% das prefeitas já sofreram assédio e violência política, segundo o Instituto Alziras.
Maria Goreth Luz, rainha do Reinado de Nossa Senhora do Rosário da Comunidade dos Arturos, citou a violência diária contra as mulheres e a invisibilidade a que estão sujeitas. E a violência geral foi enfatizada por Silvânia Moraes Rosa, da direção das Brigadas Populares e Intersindical: “No ano em que mataram Marielle e Anderson, 57.956 pessoas foram assassinadas no Brasil.”
Já a professora de história e militante do movimento “Mulheres Negras Sim” e do comitê “Marielle Vive”, Tainá Rosa, cobrou mais participação política das mulheres, que apesar de serem majoritárias na sociedade representam apenas 2% na composição das casas legislativas.
Crime
Marielle Franco e Anderson Gomes foram mortos a tiros, quando o carro em que seguiam foi emboscado no Rio de Janeiro. As investigações da Polícia Civil fluminense e de uma força tarefa do Ministério Público (MP) levaram à prisão do policial militar reformado Ronnie Lessa e do ex-policial militar Elcio de Queiroz. O mandante do crime, porém, nunca foi revelado. Agora, a Polícia Federal abriu inquérito para investigar o caso.
Emocionada, a vereadora por Belo Horizonte Cida Falabella (Psol), lembrou seus encontros com Marielle, sua colega de partido. “É uma honra estar aqui, mas o que eu queria mesmo é que ela estivesse. Tive a sorte de ser eleita junto com ela na Primavera Feminista do Psol. Nos nossos encontros, ela sempre tinha uma luz muito grande e a certeza absoluta do seu papel na política”, lembra.
Em um dos vídeos exibidos na audiência, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, irmã de Marielle, agradeceu a mobilização em Minas e afirmou que seguirá lutando para elucidar o crime.
Participantes repudiam fala de deputado
O deputado Caporezzo (PL), também membro da Comissão de Direitos Humanos, defendeu a investigação do assassinato e a punição dos autores, mas, na sequência, afirmou que, antes de perguntar quem matou Marielle, era preciso esclarecer quem era Marielle. “Ela se dizia da Maré (favela carioca), mas foi eleita na Zona Sul”, afirmou o parlamentar, antes de passar a relacionar os locais em que a vereadora foi votada.
A reação do público foi imediata e levou à suspensão da reunião. A presidenta da comissão, Andréia de Jesus, decidiu conceder a fala a Caporezzo ao final da reunião, o que levou o deputado a deixar o local. A deputada Macaé Evaristo (PT) enfatizou que Marielle era da Maré e, como qualquer candidata, pode ser votada em qualquer lugar.
Já Leninha anunciou a reinstalação da bancada feminina e da Comissão de Ética da ALMG para, segundo ela, construir mecanismos para combater a violência política contra as mulheres.
Vereadora por BH, Iza Lourença (Psol) reforçou a necessidade de medidas para coibir a violência política nas casas legislativas e em outros espaços de poder. Segundo ela, já está em articulação na Câmara Municipal a organização de uma rede de enfrentamento à violência politica dentro da mesma estratégia já utilizada com relação à violência doméstica.
Sete deputadas solicitaram a reunião em homenagem a Marielle Franco. Além das citadas, também assinaram o requerimento Beatriz Cerqueira (PT) e Lohanna (PV).