Emprego e infraestrutura mobilizam população na revisão do PPAG no Rio Doce
Baixa execução das emendas populares em 2025 não desanimou representantes regionais, que apresentaram propostas para melhorar infraestrutura e outras.
Divinolândia de Minas é um município com cerca de 6,5 mil habitantes, no Vale do Rio Doce, a 290 quilômetros de Belo Horizonte. Apesar da pequena população, lá foram identificados 104 novos casos de câncer em 2024, e 36 outros em 2025. De acordo com o secretário municipal de agricultura, Agnaldo Figueiredo, a causa mais provável são as manilhas usadas no abastecimento de água, que contêm amianto.
Para tentar mudar esta realidade, o secretário participou, nesta sexta-feira (24/10/25), do encontro regional do Rio Doce, no Município de Coronel Fabriciano (Vale do Aço), que compõe a discussão participativa da revisão 2026 do Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG) 2024-2027.
Os encontros de interiorização são uma das formas adotadas pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para promover a discussão participativa do PPAG. Também são realizadas audiências públicas, encontros online de monitoramento, grupos de trabalho e consulta pública, com o objetivo de convidar a sociedade a discutir e participar das decisões sobre o planejamento do Estado nas diversas áreas.
No caso de Divinolândia, o secretário de Agricultura trouxe uma proposta pronta para ampliação da rede de abastecimento (no valor de R$ 300 mil), construção de uma adutora, com a substituição das manilhas atuais, e um reservatório (no valor de R$ 2,5 milhões). Além disso, também apresentou propostas para pavimentação de estradas, compra de equipamentos agrícolas para a prefeitura apoiar os agricultores familiares, entre outras.
Contaminação da água prejudicou pesca e cultivo na região
Representantes de 23 municípios participaram do encontro em Fabriciano. Foram 128 inscritos para participar dos grupos de formulação de propostas e outros que participaram apenas da abertura e debates iniciais, incluindo prefeitos, vereadores, representantes da sociedade civil ou pessoas como Ivani Oliveira, de 60 anos, e Longina Emiliano de Oliveira, de 81 anos, moradoras do Município de Papagaio, próximo a Governador Valadares.
As moradoras de Papagaio se preocupam com a criação de oportunidades de emprego e geração de renda, uma vez que a contaminação da Bacia do Rio Doce com rejeitos de minério prejudicou atividades de pesca e cultivo que existiam na região. A tragédia ambiental foi consequência do rompimento da Barragem do Fundão, da mineradora Samarco, em Mariana (Região Central), em 2015.
Ivani Oliveira disse que hoje recebe uma remuneração mensal de R$ 2.080,00 da Fundação Renova, financiada pelas mineradoras responsáveis pela tragédia, mas se preocupa com o possível fim da indenização no ano que vem. Mesmo agora, diz que o pagamento não compensa o que ganhava antes com a pesca. “Antes a gente chegava a ganhar mil reais por semana com a venda de peixes que a gente pescava”, comparou ela. Como ainda não é possível pescar no local, ela teme pelo futuro.
“Tem muita gente dependendo do Cras e do auxílio família”, lamentou Longina, de 81 anos de idade. Uma alternativa, segundo o vereador Juninho do Nereu, de Papagaio, seria incentivar a agricultura familiar. Outras demandas do município, segundo ele, são a instalação de ar condicionado em escolas e creches, que vêm sofrendo com as ondas de calor; a implantação de câmeras para inibir a criminalidade e a construção de casas populares.
Baixa execução das emendas populares gera críticas
O PPAG planeja a atuação do Estado para um período de quatro anos, com metas orçamentárias e do que será realizado, bem como as regiões do Estado a serem beneficiadas. Ele é revisto anualmente para haver compatibilidade com a Lei Orçamentária Anual (LOA), a partir do envio de projeto de lei pelo Executivo para análise dos parlamentares.
Um problema neste ano tem sido a baixa execução das propostas participativas apresentadas nos anos anteriores. O fato foi destacado pelo presidente da Comissão de Participação Popular, deputado Ricardo Campos (PT), que coordenou a abertura dos debates nesta quinta-feira.
“O ponto central é inserir o povo no orçamento. É fazer com que o governo do Estado possa enxergar que não é apenas 0 ,0012% do orçamento que é a vontade popular”, afirmou Ricardo Campos. Ele acrescentou, no entanto, que as dificuldades não impediram as revisões anteriores do PPAG de alcançar grandes conquistas para o Vale do Aço ou outras regiões, tais como a estruturação de delegacias de mulheres e de batalhões do Corpo de Bombeiros Militar, o apoio a eventos culturais como o Festivale, no Vale do Jequitinhonha, e também a entidades como as associações dos pais e amigos dos excepcionais (Apaes).
O deputado Celinho Sintrocel (PCdoB), que também participou da reunião em Fabriciano, destacou demandas regionais como a recuperação ou pavimentação de estradas como a MG-425, o contorno da MG-760 e ligação entre o Parque Estadual do Rio Doce e o Município de Marliéria. “E como é que está o transporte público no Vale do Aço? Sucateado. Acabou. Frota velha. Um desrespeito com a população. Será que nós podemos defender algum recurso para que possa melhorar? Baratear a tarifa?”, sugeriu o parlamentar.
Tanto Ricardo Campos, como Celinho Sintrocel e o ex-deputado Chico Simões, atual vereador em Fabriciano, alertaram para o risco de desabastecimento de água em algumas cidades menores, diante da iminente privatização da Copasa. O ex-deputado estadual e federal Ivo José chamou atenção para a necessidade de se valorizar o planejamento metropolitano. Sobre isso, Celinho Sintrocel lembrou que o Vale do Aço é uma das três regiões metropolitanas que já têm um Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado, algo que nem a Região Metropolitana de Belo Horizonte tem.
Segundo o prefeito de Córrego Novo (Rio Doce), Elon Ferrari, os municípios impactados pelo rompimento da barragem do Fundão não vêm sendo adequadamente ouvidos na repartição dos recursos indenizatórios.
Já o assessor de Relações Institucionais da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão, Caio Campos, apresentou dados orçamentários para orientar o debate. Ele mostrou que o PPAG reserva R$ 2,866 bilhões para a região de Ipatinga em 2026, e outros R$ 3 bilhões para a região de Governador Valadares. Ambas as regiões administrativas englobam a totalidade dos municípios do Rio Doce. A maior parte deste recurso está comprometida com obrigações previdenciárias, restando pouco para o Executivo ou a população decidirem onde investir.
Mesmo diante das dificuldades de implementação, o encontro resultou em 154 propostas apresentadas sobre os mais diversos temas, como geração de emprego, saneamento, preservação ambiental, recursos hídricos, infraestrutura, assistência social e outros. Também foi apresentada uma moção contra a privatização da Copasa.
Na área ambiental, houve sugestões relativas a cercamento de nascentes, novas barraginhas, monitoramento de focos de incêndio e desassoreamento, entre outros. Na área social, uma das propostas foi a implantação de “repúblicas jovens”, um projeto para receber jovens de 18 a 21 anos que deixam o sistema público que abriga crianças e adolescentes sem família. O objetivo é evitar que esses jovens acabem nas ruas e na marginalidade, proporcionando um apoio para seu ingresso no mercado de trabalho, entre outras coisas.