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Comunidades sofrem com indefinição na divisa entre Minas e Bahia

Moradores dos lugarejos de Paxés e Santa Maria, historicamente situados no Vale do Jequitinhonha, reclamam de prejuízos com mudança para o estado vizinho.

11/05/2023 - 15:00
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“Não houve alteração na divisa de Santo Antônio do Jacinto, ela está onde sempre esteve”. A fala é da pesquisadora em ciência e tecnologia da Fundação João Pinheiro (FJP), Aliane Maria Motta Baeta. A especialista explicou que a mudança das comunidades de Paxés e Santa Maria, do município de Santo Antônio do Jacinto (Jequitinhonha) para Guaratinga (Bahia), não tem base nos registros cartográficos da FJP. 

A afirmação foi feita durante audiência pública da Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta quinta-feira (11/5/23). Na reunião, moradores relataram que só foram comunicados da mudança em março deste ano, quando os agricultores rurais buscaram recursos do Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf)

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“Não fomos informados da alteração e, quando descobrimos, não achamos que fosse trazer prejuízo maior. Porém, da forma como está agora, os agricultores não têm acesso ao Pronaf, porque a documentação deles está com o município antigo e precisaria ser atualizada. Mas temos papéis da década de 1970, que comprovam que as duas comunidades pertencem a Santo Antônio do Jacinto. Essas pessoas estão lá há mais de 100 anos”, relata a vice-prefeita de Santo Antônio do Jacinto e presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Luzia Alves dos Santos.

Aliane Baeta apresentou mapas e explicou que Minas Gerais sempre teve um órgão que registrou a demarcação de seus 853 municípios e que esses registros têm 130 anos. 

“A história e a memória da divisão administrativa de Minas estão bem preservadas. O mesmo não podemos dizer de outros estados, como a Bahia, onde o órgão que fazia esses registros foi fechado. Então, para definir as demarcações municipais, eles recorreram ao IBGE, cuja atribuição não é essa. As divisas foram alteradas lá porque os limites dos municípios estavam abertos. Mas em Minas não houve qualquer alteração”, afirmou. 

A especialista sugeriu, ainda, que o governo federal, em conjunto com os dois estados, resolva a questão, com a realização de um plebiscito entre os moradores e um estudo minucioso para determinar exatamente onde estão as comunidades. 

“Essa divisa remonta a 1938. Naquela época, o entendimento era o seguinte: à leste do Córrego do Timóteo, era Minas. À oeste, é o estado da Bahia”, explicou.

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Autor do requerimento para a realização da reunião, o deputado Leleco Pimentel (PT) explicou que a legislação vigente não traz uma orientação da forma como determinar os limites entre estados e municípios. Por isso, a questão foi discutida em reunião na Câmara dos Deputados, em Brasília, no dia 12 de abril deste ano.

“Vamos solicitar também aqui na Casa, como aconteceu lá na Câmara, a criação de uma comissão e um grupo de trabalho com representantes da Bahia e de Santo Antônio do Jacinto, para formular metodologias para resolução da questão”, disse Leleco Pimentel. 

Representando a Procuradoria-Geral do Estado da Bahia, Guerta Almeida afirmou que é interesse do órgão resolver essa questão e propôs que a Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais (SEI) da Bahia vá até as comunidades para identificar quais são os problemas e resolver. “Nossa intenção é atuar o mais rápido possível. Na questão técnica e também conversando com as pessoas das comunidades”, disse. 

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Parque Nacional não será impactado

Outra questão relacionada às duas comunidades é se elas pertenceriam ou não ao Parque Nacional do Alto Cariri, criado em 2010, e como a construção do plano de manejo as impactaria. 

Coordenador regional do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Frederico Drumond Martins afirmou que o parque foi criado para proteger a Mata Atlântica da região e o Muriqui-do-Sul, maior primata das Américas ameaçado de extinção, cuja espécie se concentra na área.

“Para nós tanto faz a área estar em Minas ou na Bahia. Desejo que consigam o reconhecimento de estar em Minas se é isso que vocês querem. A má notícia é que as comunidades não vão sair de dentro do parque, definido por critério ambiental e socioambiental. E o plano de manejo é peça-chave para uma política de convivência entre as comunidades e o parque. Vocês podem e devem, inclusive, participar da elaboração desse plano de manejo. A conservação precisa ser feita com a inclusão social de vocês. Mas isso não interfere em nada nos limites entre estados”, ressaltou Frederico.

Tanto a vice-prefeita Luzia dos Santos como o presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Minas Gerais (Fetaemg), Vilson Luiz da Silva, afirmaram ser a favor da preservação promovida pelo ICMBio.  

“Não somos contra o ICMBio nem inimigos do meio ambiente. Quem mais se preocupa com a preservação é o pequeno agricultor, porque sabemos que, se desrespeitamos a lei, o estado vem atrás de nós com força. Mas peço cautela com esse plano de manejo. Precisamos nos preocupar com a biodiversidade, mas também com a cultura e as pessoas. Essas 97 famílias não podem ficar desalojadas. Mas não somos contra o parque”, enfatizou o presidente da Fetaemg.

Presidente da Câmara Municipal de Santo Antônio do Jacinto, Itamar Alves Viana ressaltou que o município perde sem as duas comunidades que mais produzem farinha, feijão e milho na região e que os moradores não pensam em sair da área. 

“Ambulância e transporte escolar vão ser muito impactados, porque, ao invés dessas pessoas serem atendidas pelos entes públicos que estão mais perto delas, esse transporte vai ter de sair de Guaratinga, a uma distância de 20 quilômetros de onde as comunidades estão. Não houve preocupação alguma com essas famílias. O sentimento geral é de perda”, completou. 

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Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização - debate sobre a incorporação de município mineiro pela Bahia
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Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização - debate sobre a incorporação de município mineiro pela Bahia

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