Notícias

Comunidade escolar de Oliveira quer anular municipalização

Projeto para adesão ao Mãos Dadas teria sido aprovado a toque de caixa na câmara, sem estudo de impacto financeiro.

03/07/2025 - 18:35
Imagem

Possíveis irregularidades na adesão do município de Oliveira (Centro-Oeste) ao projeto Mãos Dadas, do governo do Estado, podem levar à anulação da iniciativa. Essa é a expectativa da comunidade escolar e de vereadores da cidade, que participaram de audiência sobre o tema nesta terça-feira (3/7/25), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

A reunião foi realizada no âmbito da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia, a requerimento do deputado Lucas Lasmar (Rede). O parlamentar anunciou ingresso em juízo contra o ato de aprovação do projeto na câmara, por falta de requisitos legais como a avaliação da capacidade do município para assumir os alunos. Segundo ele, nem mesmo um pedido de vista foi acatado durante a aprovação.

Botão

O Mãos Dadas prevê a transferência do Estado aos municípios dos anos iniciais do ensino fundamental, mediante repasse de um valor único às prefeituras. A falta de critérios claros do projeto e indícios de irregularidades nas adesões, denunciadas pela deputada Beatriz Cerqueira (PT), levaram o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) a suspender novas adesões.

A suspensão ocorreu no último dia 1º/7, mesma data da aprovação do projeto em Oliveira. A proposição foi sancionada pelo prefeito no dia seguinte, mas não foi firmado nenhum convênio com o Estado, conforme informou a superintendente regional de Ensino de Divinópolis, Luiza Amélia Coimbra. Segundo ela, o projeto abarca apenas a Escola Estadual Francisco Fernandes.

O deputado Lucas Lasmar, ex-aluno da instituição, reproduziu fala da gestão municipal de que o objetivo é reformar o prédio e instalar ali um curso profissionalizante. “Isso pode ser feito de outras formas, sem municipalizar”, ponderou. A comunidade, porém, teme o fechamento da escola – possibilidade negada por Luiza Amélia – ou de outras unidades, com transferência de alunos e prejuízo para a qualidade do ensino.

Mães de alunos relataram incerteza e falta de diálogo. “Nossa opinião vale. Por que não podemos opinar?”, questionou Patrícia Fátima Pereira de Paula, uma das mães presentes. Segundo ela, o ensino na escola estadual é melhor, há professores de apoio e de leitura, e os estudantes e pais se sentem acolhidos.

“A decisão tem que ser técnica. A partir de 2027, a prefeitura passa a arcar com tudo, água, luz merenda, transporte, salários, manutenção. O município pode assumir isso?”, questionou Lucas Lasmar. Segundo ele, o repasse previsto para a prefeitura é de R$ 3,8 milhões

Vereadores relatam pressa na tramitação

Imagem

Vereadores de Oliveira detalharam o processo de tramitação do projeto de lei de adesão ao Mãos Dadas. Sem audiência pública, sem respeito ao pedido de vista e com informações incompletas. “O projeto já chegou com pedido de urgência. O prefeito não deu ouvido a ninguém. E a informação é de que não havia impacto financeiro”, contou Leandro César Lemos.

Geraldo Nicácio Júnior, que foi alfabetizado na Escola Estadual Francisco Fernandes, também votou contra e se revoltou com a ausência de representantes da prefeitura na audiência. “Quase não deu para escutar qual projeto estava sendo votado”, reforçou.

Já Ederson de Souza Silveira questionou a capacidade do município de assumir a escola estadual. Segundo ele, há uma creche concluída na cidade, e a prefeitura não consegue colocá-la em funcionamento. “Temos relatos de falta de papel higiênico e de açúcar nas escolas municipais. A prefeitura não conseguiu fornecer uniformes. Como vai gerir mais uma escola?”, indagou.

Antônio Carlos Barcelos, por sua vez, pediu desculpas por ter votado a favor do projeto, levado, segundo ele, pela boa fé. “Nos disseram que era obrigatória a adesão. E como defensor do patrimônio, fiquei encantado com a possibilidade de reforma do prédio. Não tivemos tempo de estudar o projeto, e isso nos levou ao erro”, afirmou.

Dieese aponta falhas no projeto e antecipa despesas

Diego Severino Rossi, economista e coordenador técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (Sind-UTE), criticou o texto do projeto de lei e afirmou que a prefeitura terá que colocar mais recursos próprios para manter a escola.

Ele reiterou que a comprovação de capacidade técnica e financeira do município em assumir a responsabilidade é exigência legal para a municipalização. Mas o parecer técnico do projeto não cita números e refere-se a “abertura de crédito especial”. “É do tipo: tenho dinheiro, não vou te mostrar, mas acredite em mim”, ironizou

Considerando dados de 2024, o economista afirmou que a prefeitura investiu com recursos próprias quase 40% do total da educação fundamental. E ela ainda deixaria de receber os complementos aos repasses feitos com recursos próprios do Estado. “Depender apenas do Fundeb é um equívoco”, sentenciou.

Diego estimou em R$ 2,60 milhões o investimento necessário para a prefeitura assumir a escola estadual. Já a municipalização traria um incremento de receitas da ordem de R$ 1,08 milhão, restando, então, R$ 1,5 milhão como aporte do município, de forma a manter a qualidade atual da educação.

Deputada alerta sobre atos irregulares

A deputada Beatriz Cerqueira, presidenta da comissão, alertou prefeituras e câmaras sobre as implicações da aprovação de adesões ao Mãos Dadas de forma irregular. “Estamos falando de dinheiro público. Há regras. E a resposta da Secretaria de Estado da Educação sobre irregularidades é para que o TCE questione os municípios”, afirmou.

Segundo a parlamentar, as irregularidades no Mãos Dadas ocorrem desde o início do projeto, em 2021. Ela citou casos de municípios que, após o uso do repasse único do governo, já não conseguem atender sequer o transporte escolar. Outros fecharam as escolas nos distritos.

Beatriz Cerqueira também lamentou que a comunidade não tenha participado da decisão. A diretora do Sind-UTE, Marilda de Abreu Araújo, reforçou que esteve com a secretária municipal de educação de Oliveira e pediu para ser ouvida, o que não ocorreu. O projeto, segundo ela, traz problemas para os professores, que ficam sem avaliação de desempenho e perdem promoções.

Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia - debate sobre encerramento de escola em Oliveira
Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia - debate sobre encerramento de escola em Oliveira

Receba as notícias da ALMG

Cadastre-se no Boletim de Notícias para receber, por e-mail, as informações sobre os temas de seu interesse.

Assine