Pronunciamentos

DEPUTADA BELLA GONÇALVES (PSOL)

Discurso

Manifesta preocupação com as comunidades terapêuticas, destacando denúncias de possíveis violações de direitos humanos nesses espaços. Cita reportagem exibida na televisão e inspeções realizadas por órgãos como o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho e o Conselho Regional de Psicologia, que apontam situações recorrentes de abuso e irregularidades em diversas unidades. Critica a falta de fiscalização por parte do Estado, que contribui para que essas práticas se perpetuem. Defende a aprovação do Projeto de Lei nº 2.049/2024, que institui o serviço Disque Denúncia Comunidades Terapêuticas, Clínicas de Reabilitação e Congêneres e dá outras providências, o qual propõe regras claras de fiscalização, um canal de denúncias e um fluxo de acompanhamento contínuo.
Reunião 13ª reunião EXTRAORDINÁRIA
Legislatura 20ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 31/05/2025
Página 11, Coluna 1
Indexação
Proposições citadas PL 1366 de 2023
PL 2049 de 2024

13ª REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 29/5/2025

Palavras da deputada Bella Gonçalves

A deputada Bella Gonçalves – Presidente Tadeu, bom dia! E bom dia aos colegas deputados e às colegas deputadas desta Casa. Toda vez que vier um projeto sobre comunidades terapêuticas, eu me sinto na obrigação de vir aqui discutir ou, pelo menos, encaminhar a questão, uma vez que nós estamos lidando com um espaço de violação de direitos, tortura, trabalho análogo à escravidão, hoje livre de fiscalização, porque o Estado não faz o seu papel de fiscalizar.

Recentemente, o Fantástico soltou uma matéria sobre uma comunidade terapêutica em São Paulo – depois eu convido vocês para verem essa matéria. Nela são narradas histórias de assassinato, tortura e violência sexual cometidas não com uma ou duas, mas com mais de dez mulheres de uma comunidade terapêutica no Estado de São Paulo. Queria eu que esse fosse um caso isolado, que a gente tivesse uma comunidade desviante entre várias outras comunidades virtuosas, que fossem espaços de fato de reestabelecimento de vínculos, como aqui o deputado que me antecedeu colocou. Infelizmente, não é o que mostram os relatórios das inspeções feitas pelo Ministério Público Federal, pelo Ministério Público do Trabalho e pelo Conselho Regional de Psicologia. Vistoriadas mais de cem comunidades terapêuticas no Estado, foram constatadas situações terríveis de espaços onde pessoas eram levadas, sim, de forma compulsória e permaneciam lá muitas vezes sendo obrigadas a fazer um trabalho análogo à escravidão. Em uma dessas comunidades terapêuticas, que ficava em Belo Horizonte – não vou detalhar quem são os donos de lá –, eu me lembro que, quando realizei uma inspeção em conjunto com a vigilância sanitária e conseguimos fechar esse espaço, comecei a receber ameaças de morte, ameaças diretas, deputada Leninha. E essas ameaças não eram dos declarados proprietários da comunidade terapêutica; eram ameaças do crime organizado. E aí fui descobrir o que estava por trás dessa comunidade terapêutica.

Na verdade, o crime organizado forçava e extorquia as famílias a manter os seus parentes nessas comunidades. Era assim: “Se ele ficar do lado de fora, ele vai ser assassinado, mas a senhora, que recebe um salário mínimo, pode pagar R$2.000,00 …” – sabe-se lá de onde – “… para manter o seu filho internado em uma comunidade terapêutica.” Na capital a gente pegou um relato como esse, questão que está sendo investigada até hoje. O que se dirá das comunidades terapêuticas que estão em vários outros locais e regiões de Minas Gerais mais longínquas da região metropolitana, como Esmeraldas, Betim e o Bairro Nacional, em Contagem, onde se concentra um grande número de comunidades terapêuticas?

Na Comissão de Direitos Humanos, nós temos recebido inúmeras denúncias sobre a existência dessas comunidades. E eu tenho certeza de que, se os deputados aqui atestam que essas comunidades são espaços de promoção de direitos, eles vão me ajudar a garantir que sejam espaços fiscalizados. Eu gostaria, então, que algum dos deputados me dissesse de quem hoje é a responsabilidade de fiscalização das comunidades terapêuticas: da Secretaria de Estado de Saúde, da Sejusp ou da Sedese? Porque o que eu tenho visto é que nenhum dos órgãos do Estado faz hoje a fiscalização das comunidades terapêuticas.

Eu tenho um projeto de lei, que está hoje na Comissão de Constituição e Justiça, e espero que ele possa avançar. É um projeto que vem criar regras de fiscalização das comunidades terapêuticas. Já que elas existem, precisam ser fiscalizadas, e as famílias precisam ter onde denunciar. Então a gente criou uma proposta de um disque denúncia para que o Estado possa ter um fluxo organizado para regular as comunidades terapêuticas e estabelecer um fluxo de acompanhamento para que esses espaços não continuem perpetuando violações de direitos. Eu acho que um projeto como esse deveria ser de interesse dos deputados desta Casa, que atestam e defendem as comunidades terapêuticas inclusive. Porque, se a gente tem comunidades que hoje estão queimando o filme de todas, como essa que eu vistoriei na região da Pampulha, em Belo Horizonte, a gente deveria conseguir fiscalizá-las e garantir que outros espaços – quem sabe existam – possam promover direitos.

Não é o caso que tem sido verificado pelas diferentes inspeções dos órgãos federais e estaduais que eu citei, mas deveria ser o caso aqui do Estado. Não são hoje espaços de promoção da saúde, não são reconhecidas pelo Sistema Único de Saúde, não estão sendo acompanhadas por um fluxo de fiscalização do Estado. Isso faz com que, dentro desses espaços, onde paredes altas vigoram, horrores aconteçam do lado de dentro sem que a sociedade conheça. É muito fácil para a sociedade prender aqueles que são considerados loucos e dependentes, quando deveria, na verdade, oferecer um tratamento de saúde. Essa é a história do nosso país. Essas pessoas já foram mortas, foram presas em manicômios e hoje são levadas de forma compulsória para comunidades terapêuticas. Onde não há fiscalização e acompanhamento do Estado o horror se estabelece.

Eu clamo a esta Casa, presidente, que a gente possa avançar com medidas de fiscalização, porque, se a gente está, através desta Casa, aprovando orçamento público para comunidades terapêuticas, se a gente está aqui criando o Dia da Comunidade Terapêutica, se a gente está dizendo que essas comunidades são de utilidade pública, o mínimo que a gente deve fazer, enquanto Casa Legislativa, é construir um fluxo organizado de fiscalização desses espaços. Obrigada.

O presidente – Obrigado, deputada Bella.