Orçamento não acompanhou o crescimento das universidades estaduais
Escassez de recursos impacta diretamente o quadro de pessoal, sua remuneração e a oferta de serviços à população.
17/11/2023 - 15:50Autonomia administrativa e financeira, orçamento e a revisão dos planos de carreira foram as principais demandas apresentadas por gestores e representantes dos professores e alunos das universidades estaduais mineiras, no primeiro painel do debate público sobre a situação dessas instituições. A discussão é promovida pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) ao longo desta sexta-feira (17/11/23).
Os reitores da Universidade do Estado (Uemg), Lavínia Rodrigues, e da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), Wagner Santiago, questionaram a efetiva autonomia das universidades, prevista na Constituição. Como relataram, atividades corriqueiras de gestão estão atreladas à aprovação de órgãos de governança do Executivo, como o Comitê de Orçamento e Finanças (Cofin).
A recusa do governo em financiar a participação de professores em congressos internacionais e a impossibilidade de manutenção de benefícios a quem busca especializações no exterior foram algumas das amarras citadas pelos reitores, que se queixaram também da burocracia que acaba por engessar e inviabilizar decisões comuns ao dia a dia de instituições desse porte.
Na Uemg, destacou a reitora, o orçamento de 2023, de R$ 402 milhões, já é menor do que o de 2022 e a perspectiva é de que haja nova redução para 2024.
O impacto se dá em todas as frentes: no número de professores e técnicos, abaixo da média das universidades estaduais brasileiras, na remuneração, com a necessidade de se recorrer a gratificações para se alcançar o valor de um salário mínimo em determinadas carreiras, e na prestação de serviços. A incorporação das gratificações, por sinal, é uma antiga reivindicação, devido à defasagem salarial.
Na briga por orçamento, frisou Wagner Santiago, da Unimontes, além de tentar sensibilizar o governo sobre as necessidades das universidades, algumas alternativas são emendas parlamentares e repasses de órgãos de fomento, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapemig).
A Uemg conta hoje com cerca de 21 mil alunos, 1,7 mil professores e 600 técnicos. Na Unimontes, são mais de 10 mil alunos em 12 campi.
Afastamentos podem causar perda de metade da remuneração
Representantes do corpo docente relataram as dificuldades enfrentadas em ambas as instituições. Ildenilson Barbosa, presidente da Associação dos Docentes da Unimontes, disse que os professores precisam pagar do próprio bolso despesas com transporte e estadia para se deslocarem entre as unidades espalhadas no Norte, Noroeste e Nordeste do Estado.
Ele também reclamou da remuneração, já insuficiente, dividida em gratificações e auxílios, além do salário, o que torna os professores reféns dos “penduricalhos”, que ainda por cima não contam para cálculos de aposentadoria.
O professor também se mostrou preocupado com a possibilidade de adesão do Estado ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que poderia resultar em 55% de perda salarial durante a sua vigência de nove anos.
Danilo Barcelos, diretor da mesma associação, também abordou o corte da verba para transporte, o que teria causado a transformação do campus de Almenara (Norte de Minas) em unidade voltada ao ensino a distância, devido à falta de professores interessados em se deslocar para lá. “Se faltar ao serviço, sai mais barato do que ir trabalhar”, salientou.
Ele ainda destacou a importância da Unimontes para as regiões mais vulneráveis do Estado, com a oferta de serviços e a geração de emprego e renda. Na Uemg, 75% dos alunos são egressos de escolas públicas, o que dá uma dimensão da sua relevância social.
Camila Pinto, vice-presidente da Associação dos Docentes da Uemg, lamentou a condição precária dos professores contratados, cerca de dois terços dos profissionais no campus de Passos (Sul de Minas), onde atua.
Indignada, criticou também o baque na remuneração de servidores afastados, seja por doença ou em licença-maternidade, por exemplo, que perdem suas gratificações. “Mães não podem perder 50% do seu salário, pessoas estão sendo punidas pelo governo. É uma vergonha”, afirmou.
Assim como os colegas, ela lembrou os desafios dos professores para manterem as contas em dia com a remuneração que recebem. “A bolsa de produtividade não é utilizada para fazer pesquisa, é para supermercado”, frisou.
Deputados defendem alternativa ao RRF que garanta continuidade de serviços essenciais
Mais cedo, na mesa de abertura do evento, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) lembrou que, ao longo deste ano, a Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia, a qual preside, já debateu e denunciou as dificuldades enfrentadas pelas universidades públicas estaduais. Um dos motivos que a levou a requerer o debate público, no entanto, foi o Regime de Recuperação Fiscal, que ela entende que pode agravar a situação.
Pontuando que as universidades estaduais não podem ser aida mais prejudicadas com o teto de gastos e o congelamento de salários previstos no plano de recuperação encaminhado à ALMG, a deputada advertiu que limitar investimentos na educação superior significa limitar as condições de permanência do estudante na universidade e desvalorizar ainda mais a carreira de docentes e servidores.
A deputada Lohanna (PV) também considerou que o momento é delicado e que as universidades precisam ter garantida sua autonomia e seu financiamento.
No mesmo sentido, o deputado Betão (PT) citou dados que mostrariam que o Estado sairia do RRF após nove anos devendo ainda mais à União e defendeu alternativas que garantam à população serviços essenciais, como educação.