Oposição anuncia que vai reforçar campanha contra terceirização de hospital
Hospital Maria Amélia Lins foi fechado no final de 2024; há poucos dias, o governo divulgou a intenção de terceirizá-lo.
19/03/2025 - 20:12Parlamentares da oposição contrários à terceirização do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL) anunciaram, durante a audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos, nesta quarta-feira (19/13/25), a intenção de reforçar a campanha de resistência a essa medida do governo de Romeu Zema.
A resistência deve incluir a organização de outras duas audiências públicas em outras comissões parlamentares da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nos próximos dias.
Antes da reunião desta quarta-feira, a própria Comissão de Direitos Humanos realizou uma visita ao Hospital Pronto Socorro (HPS) João XXIII, na segunda-feira (17/3/25), para verificar o impacto da transferência para aquela unidade dos atendimentos que eram realizados anteriormente no Amélia Lins.
Um dos casos mais dramáticos verificados na visita foi o de dona Eva, com 79 anos de idade, que chorou ao relatar, num corredor lotado, que há uma semana esperava por um procedimento cirúrgico no ombro.
Durante a audiência pública desta quarta, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) afirmou que, além da visita e da audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, também serão realizadas reuniões na Comissão de Administração Pública e na Comissão do Trabalho, a fim de manter a pressão contra a política de terceirização promovida pelo Governo do Estado.
Outra medida anunciada por Beatriz Cerqueira foi um pedido de impugnação do edital de terceirização que foi apresentado pelos deputados de oposição ao Tribunal de Contas do Estado. “Esse edital está viciado e apresenta irregularidades”, afirmou a deputada.
Antes de ser fechado no final do ano passado, o HMAL atuava como retaguarda do HPS, recebendo pacientes já estabilizados depois de cirurgias no João XXIII e que precisavam de continuidade no tratamento ou até novas cirurgias ortopédicas.
Apesar de ter sido divulgado à época do fechamento que a reabertura do Amélia Lins se daria tão logo fosse comprado um novo equipamento imprescindível às cirurgias, que havia sido danificado, no início do mês de março o governo anunciou a terceirização do HMAL, com o lançamento de edital.
Os selecionados deverão ser anunciados já em abril. No projeto do governo estadual, o HMAL não será mais parte do Complexo de Urgência e Emergência. Ele será um hospital exclusivamente cirúrgico e para demandas eletivas.
Confronto de narrativas sobre terceirização dominou audiência
O que se viu durante a audiência desta quarta foi um confronto de narrativas a favor e contra a terceirização da saúde estadual. De um lado, dirigentes estaduais e o deputado governista Zé Laviola (Novo); do outro, servidores, sindicalistas, Ministério Público e deputados da oposição, incluindo Beatriz Cerqueira, a deputada Bella Gonçalves (Psol), o deputado Lucas Lasmar (Rede) - esses dois últimos autores do requerimento para reunião; o deputado Betão (PT) e a deputada Andréia de Jesus (PT).
Bella Gonçalves frisou que o Amélia Lins vinha funcionando como retaguarda do João XXIII há décadas e destacou o cenário na visita de segunda-feira. “Todo mundo que participou daquela visita técnica viu com os próprios olhos o que vocês, trabalhadores e usuários, têm narrado para gente: um cenário criminoso de desassistência à saúde”, criticou.
A deputada anunciou que será aprovada a convocação da presidenta da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), Renata Ferreira Dias, e do secretário de Estado de Saúde, Fábio Bacheret, caso os dois não compareçam à próxima audiência já marcada sobre o tema.
Lucas Lasmar afirmou que não se trata de uma pauta partidária. “É normal algum hospital tratar paciente no corredor? Pregar papel na parede e dizer que ali é um leito?”, questionou. Ele afirmou que foram transferidas 200 cirurgias mensais para o João XXIII e que não há nem anestesistas para suprir esta ampliação.
Ele também se disse preocupado com a idoneidade de empresa interessada na terceirização. “Uma empresa que administra uma UPA na região metropolitana e que está cheia de escândalos financeiros quer participar do edital”, afirmou. Lasmar ainda argumentou que hospitais de alta complexidade como o João XXIII precisam de um hospital de retaguarda, para não desperdiçar leitos de alta complexidade.
Andréia de Jesus e Betão também classificaram as intenções do governo como privatistas e prejudiciais para a saúde pública.
Em contraponto, o deputado Zé Laviola disse que há uma vontade da Secretaria de Estado de Saúde de promover a especialização dos hospitais para que eles tenham equilíbrio financeiro. “A população não vai ficar sem o serviço, mas será atendida em outra localidade. A finalidade é oferecer mais serviço e procedimentos”, garantiu o deputado.
Os números foram os argumentos do diretor-geral do Complexo Hospitalar de Urgência da Fhemig, Fabrício Oliveira, para defender o projeto de terceirização do Amélia Lins. “A intenção é ampliar o serviço de saúde para o cidadão”, disse.
Esse aumento, segundo ele, já vem acontecendo. Segundo o diretor, mesmo com o fechamento do Amélia Lins, o João XXIII conseguiu realizar um número de cirurgias, nos primeiros dois meses e meio de 2025, 26% maior do que o realizado pelos dois hospitais no mesmo período de 2024. Ele também afirmou que houve uma redução de 31,5% da mortalidade.
A vice-presidente da Fhemig, Patrícia Albergaria, criticou o discurso de que o Amélia Lins está sendo fechado. “Não é o fechamento de um hospital que é referência, mas é uma melhoria para atender a fila das cirurgias eletivas”, argumentou. Ela disse que o financiamento continuará a ser feito por meio do Sistema Único de Saúde, mas com uma complementação do Programa Opera Mais, do Governo do Estado.
Ela reconheceu a escassez de anestesistas como um problema mundial, mas disse que o governo conseguiu mais cinco para o João XXIII.
Os argumentos do governo, no entanto, não convenceram a promotora Josely Pontes, da 2ª Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde. “Não tem cabimento alegar que para fazer essa mudança de modelagem é preciso fechar um hospital”, censurou a promotora, complementando que há 6,6 mil pessoas esperando cirurgias ortopédicas no Estado. Ela criticou a narrativa do governo de que o setor público é ineficiente.
Neusa Freitas, do Sind-Saúde, apresentou vídeo de paciente do Amélia Lins, acidentado em 2022, com fratura exposta e com o pé infeccionado. Marcaram a cirurgia dele no João XXIII e, devido à superlotação nesse hospital, o procedimento foi adiado por várias vezes. Por fim, fizeram a cirurgia e o devolveram ao Amélia Lins. Atualmente, estão apenas ele e mais outro paciente no hospital, que conta com 60 leitos. O João XXIII , para onde o governo tem encaminhado as cirurgias, está sempre superlotado.
Cristiano Túlio, pediatra do Hospital João Paulo II e diretor do Sindicato dos Médicos, lembrou que o governo fechou o Hospital Galba Veloso e o Galba Veloso Ortopédico. Afirmou que, desde que essas duas unidades foram fechadas, cirurgias deixaram de ser feitas, muitas em caráter de urgência, levando pessoas, em alguns casos, a perderem membrosa mão.

