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Combater a violência contra a mulher demanda dar voz às vítimas

Escuta, acolhimento e providências são passos para tirar proteção legal do papel, conforme convidados de audiência realizada por ocasião do Agosto Lilás.

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"Se eu tive medo e fiquei calada dois anos, mesmo atuando numa instituição que, em tese, deveria assegurar a segurança de todos, imaginem aquelas mulheres em condições mais vulneráveis". Num misto de desabafo e encorajamento, a delegada Karen Hellen Esteves de Avelar relatou, nesta segunda-feira (1º/9/25), os caminhos percorridos para conseguir justiça. Vítima de assédio na Polícia Civil, ela participou de audiência na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) por ocasião do Agosto Lilás, mês de conscientização e combate à violência contra a mulher e aniversário da Lei Maria da Penha.

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"Meu objetivo está sendo ressignificar a dor, mas esse combate à violência é um compromisso que deve ser coletivo", defendeu a delegada na audiência, realizada pela Comissão de Administração Pública, a requerimento do deputado Charles Santos (Republicanos).

Segundo Karen Avelar, o machismo estrutural e a cultura de silenciamento e intimidação ainda permeiam as instituições. "A luta é constante. A mulher sempre é colocada à prova. Quando denuncia, tem que provar que não foi ela que deu causa à situação", disse.

Apesar das dificuldades que relatou em sua trajetória desde que venceu o silêncio, a delegada frisou já ter conseguido vitórias.

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O caso da delegada é acompanhado ainda por instâncias, como a Comissão de Direitos Humanos do Senado, para que também a denúncia de abuso de autoridade no trabalho prossiga com o devido encaminhamento. "Tive o azar de cair nas mãos de um promotor amigo íntimo do acusado, e estou numa luta para que a investigação seja transferida para uma autoridade neutra e isenta", declarou.

Instituto Rafaela Drumond quer vozes sendo consideradas

Mensagens de encorajamento e acolhimento a mulheres que sofrem violências foram trazidas ainda por Aldair Divino Drumond, presidente do Instituto Rafaela Drumond.  Ele exibiu um vídeo de momentos da vida da filha, a escrivã Rafaela Drumond, vítima de assédio moral e sexual na Polícia Civil, que tirou a própria vida em junho de 2023

Hoje ela dá nome ao instituto criado pelo pai para acolhimento e amparo jurídico e psicológico a vítimas como Rafaela, que chegou a comunicar episódios sofridos ao delegado de sua unidade e a pedir ajuda, além de ter desabafado com amiga e colega, também por meio de mensagens.

"Mas a pressão sofrida por ela foi só sendo intensificada, junto com pessoas, colegas e amizades omissas", lamentou Aldair Divino Drumond, que à frente do instituto atua para que vozes de vítimas sejam ouvidas e consideradas.

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Algumas das mensagens foram apresentadas em áudios na audiência, como a de Úrsula, que se identificou como policial aposentada por invalidez, relatando seu adoecimento mental causado por assédio moral e sexual no trabalho e pela inércia do Estado.  "O instituto me ofereceu suporte jurídico e minha causa ganhou voz e visibilidade", registrou ela na gravação.

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Wemerson de Oliveira, presidente do Sindpol, Sindicato dos Policiais Civis de Minas Gerais, endossou a necessidade de escuta e suporte em casos denunciados, afirmando que foram nove os casos de suicídios ocorridos na corporação, embora somente o de Rafaela tenha vindo à tona.

"E o dela só veio a público pelos relatos deixados, porque a Corregedoria tem um núcleo que não funciona. Em vez das partes serem procuradas para orientação ou punição, a vítima é que começa a ser isolada pelos demais colegas", denunciou ele.

Em breve, segundo Wemerson de Oliveira, o Sindpol vai inaugurar um núcleo de atendimento à mulher e seus familiares, sendo importante a formalização dos casos de violência. 

Peso à palavra da vítima

Convidados como o presidente do Sindipol e a presidenta da Comissão de Enfrentamento à Violência contra a Mulher da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Isabel Rodrigues, defenderam maior fiscalização do cumprimento da Lei Rafaela Drumond no serviço público. A lei, de iniciativa da ALMG, proíbe o assédio moral por funcionário público, prevendo pena de demissão.

Isabel Rodrigues ressaltou especialmente a importância de dar peso à palavra da vítima, segundo ela a base para mudar a realidade de impunidade e agressões contra as mulheres nos mais diversos espaços, seja no serviço público, no transporte, nos centros obstétricos ou nas relações de trabalho.

Vídeo

O papel da educação para combater a cultura da violência foi destacado pela presidenta da Associação dos Delegados da Polícia Civil de Minas Gerais e ex-deputada Elaine Matozinhos. "Ouvindo esses relatos me dá uma tristeza muito grande, pois são 40 anos de luta efetiva em defesa da mulher", frisou ela, que esteve à frente da implantação da primeira Delegacia da Mulher de Belo Horizonte, inaugurada em 1985.

Por outro lado, a delegada apontou avanços em relação a um tempo em que não havia onde tipificar a violência sexual no Código Penal Brasileiro, nem existia a Lei Maria da Penha.

O deputado Charles Santos destacou, entre outros, dados estaduais do Anuário de Segurança Pública 2025, que analisa indicadores de 2024, mostrando uma queda de 6,4% nos homicídios dolosos contra mulheres. Porém, se considerados isoladamente os feminicídios, houve um aumento de 0,7% nos casos consumados e de 19% nas tentativas de feminicídio, conforme destacou o deputado. 

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O deputado anunciou uma série de requerimentos a partir da audiência, entre eles pedido de informações a ser formalizado ao Poder Executivo, solicitando dados sobre a aplicação e efetividade da Lei Rafaela Drumond.

Comissão de Administração Pública - debate sobre o Agosto Lilás
"Houve a penalização do meu abusador. Foi aquém do que deveria ter sido, mas já serve de alento para aquelas que acham que denunciar não vai dar em nada."
Karen Hellen Esteves de Avelar
delegada
"Os relatos que recebo de apoio e de agradecimento mostram que a Rafaela deixou um legado, que ela passou a ser uma luz no fim do túnel para muitas mulheres".
Aldair Divino Drumond
presidente do Instituto Rafaela Drumond e pai da escrivã
"Precisamos de um trabalho ativo e conjunto, porque a violência contra a mulher é uma situação que não tem lado, raça ou partido político."
Charles Santos
Dep. Charles Santos
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Servidoras da Polícia Civil denunciaram assédio moral e sexual e cobraram penas mais severas TV Assembleia
Áudio
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