Cobrança de protocolo do SUS para neuromielite óptica é feita em audiência
Um dos pontos destacados foi a recusa à incorporação, na rede pública, de medicação para doença rara que compromete a visão e a mobilidade do paciente.
Além da dificuldade para diagnóstico precoce, pacientes com neuromielite óptica (NMO), doença rara que causa a inflamação dos nervos do olho e da medula espinhal, ainda enfrentam a falta de um protocolo do SUS para tratamento, conforme exposto nesta quinta-feira (27/3/25) em audiência na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Realizada na Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência, a pedido do deputado Zé Guilherme (PP), a reunião marcou o Dia Estadual de Conscientização sobre a NMO, celebrado em 27 de março. Em função da data, nesta sexta (28), a fachada do Palácio da Inconfidência e o Espaço Democrático José Aparecido de Oliveira (Edjao) serão iluminados na cor verde, ação que integra o programa da ALMG Laços da Consciência.
O deputado e demais convidados criticaram parecer recente da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), contrário ao medicamento satralizumabe, que seria eficaz para o tratamento da doença.
A Conitec é o órgão do Ministério da Saúde que avalia tecnologias em saúde para incorporação no SUS. Sobre o satralizumabe, a comissão concluiu em dezembro de 2024 que "os dados sobre a relação custo-efetividade e o impacto orçamentário para o SUS foram considerados desfavoráveis", o que foi rebatido pelo deputado Zé Guilherme.
Segundo ele, a luta do setor público e da sociedade civil é por garantir que cada paciente tenha dignidade e que a doença não continue sendo invisível e ignorada pelas políticas públicas.
"Precisamos exigir do nosso governo o acesso a tratamento, não ouvir que medicamentos são caros", também criticou Marco Aurélio Lana Peixoto, presidente do Centro de Investigação em Esclerose Múltipla (Ciem) da UFMG.
Fundado há 25 anos, o centro tem cadastradas mais de 2.500 pessoas com esclereose e com neuromielite óptica, atendidas de forma voluntária.
Conforme frisou Marco Aurélio Lana Peixoto, o Ciem é coautor de vários protocolos internacionais e tem estudos publicados nos maiores periódicos do mundo.
"Os pacientes do SUS não conseguem acesso a remédios para NMO já usados no mundo inteiro. Estamos falando de uma doença que cega e paralisa, então lutemos para que tenham acesso aos remédios" , destacou ele.
Defensora pública federal, Carolina Godoy Leite frisou que a Defensoria Pública da União já observou que há uma grande omissão do poder público em relação aos casos de NMO. Ela pontuou que a incorporação da medicação ao SUS se torna ainda mais necessária desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) criou requisitos mais rigorosos para processos que pedem na Justiça acesso a uma medicação não incorporada ao SUS.
Nesse sentido, ela ressaltou a importância de a sociedade médica emitir relatórios científicos robustos para questionar e reverter os posicionamentos da Conitec e até mesmo analisar se cabe recurso administrativo contra o relatório da comissão nacional.
A neurologista Raquel Vassão endossou as falas anteriores e mencionou ter participado de um dossiê para incorporação ao SUS de um teste para diagnóstico da doença que o grupo espera ser avalizado.
Ela disse que a Santa Casa de Belo Horizonte, por esforços internos, tem conseguido com custeio próprio atuar em diagnóstico e tratamento. "Mas já perdemos pessoas aguardando medicações", advertiu.
Doença atinge mais as mulheres
A NMO pode comprometer a visão e a mobilidade e, no mundo, é uma doença que afeta 65 pessoas a cada 100 mil. Estima-se que no Brasil o número de pacientes não chegue a 3 mil.
Davi Urzêdo Queiroz, coordenador do Núcleo de Neuroimunologia do Hospital Felício Rocho, alertou que 83% dos pacientes são pessoas no auge de suas vidas, mas que vão ter que parar de trabalhar ou reduzir sua carga horária, sendo acometidas por surtos imprevisíveis.
Há 10 anos com o diagnóstico da doença, Karina Domingues, cofundadora da NMO Brasil - Associação Brasileira de Pacientes de Neuromielite Óptica e Doenças do seu Espectro -, informou que a enfermidade é mais comum em mulheres, com maior prevalência em afrodescententes e asiátcas, apresenta-se em surtos ou crises e a idade média dos pacientes é de 30 a 40 anos.
"É uma doença que mata e ainda limita, e 80% dos companheiros abandonam essas mulheres", frisou. Karina ainda enumerou que a doença tem como características principais diminuição da visão, alterações da sensibilidade, redução de força nos membros e alteração do controle da urina e do intestino.
Por causa na NMO, Viviane Maia, enfermeira voluntária da mesma entidade, contou ter chegado à tetraplegia, revertida por um tratamento a que poucos têm acesso. Hoje atua da associação, mas para cuidados diários depende da mãe idosa, que parou de trabalhar para cuidar da filha.
Segundo Viviane Maia, sua cadeira de rodas foi conseguida na Prefeitura de Contagem, onde reside, mas há pacientes recorrendo à Justiça para conseguir junto a prefeituras insumos básicos, como sondas.
Ações para pacientes raros
Raquel Guieiro Cruz, diretora de Políticas Estratégicas da Secretaria de Estado de Saúde (SES), disse que o governo tem se dedicado a ações voltadas para pacientes raros e destacou que, desde 2019, foi incrementado em mais de R$100 milhões o recurso destinado à área, citando exemplos como a ampliação do teste do pezinho em recém-nascidos e da rede de atenção à saúde de pessas com doenças raras.
Daniella Matta Machado, vice-presidente da Associação Maria de Proteção e Apoio aos Raros - Casa de Maria, ressaltou que há no País 13 milhões de brasileiros com doenças raras. Ela também frisou a importância do acolhimento às famílias dos pacientes.


