Audiência sobre crise em conselhos vira embate entre governo e oposição
Em protesto contra inclusão de representante da Fiemg na mesa, deputadas e convidados abandonam reunião.
01/12/2022 - 19:10 - Atualizado em 05/12/2022 - 08:08Uma audiência pública que tinha o objetivo de esclarecer as motivações que levaram à renúncia coletiva de ambientalistas dos Conselhos Estaduais de Política Ambiental (Copam) e de Recursos Hídricos (CERH) transformou-se em confronto entre parlamentares da base do governador Romeu Zema e da oposição. A reunião foi solicitada pela deputada Ana Paula Siqueira (Rede), mas conduzida pelo deputado Raul Belém (Cidadania), por ser o único membro presente da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). A reunião acabou ocorrendo sem a presença de deputadas da oposição e dos convidados originais.
O deputado Raul Belém não seguiu a lista de convidados previamente escolhida por Ana Paula Siqueira e chamou para fazer parte da mesa representantes de órgãos ambientais do Estado e da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). As deputadas Ana Paula Siqueira e Beatriz Cerqueira (PT) tentaram reverter a decisão, sob argumentação de desvirtuamento do objetivo da audiência, mas não obtiveram êxito. Pessoas que estavam na plateia e que apoiavam as posições manifestadas pela Fiemg vaiavam, xingavam e interrompiam as argumentações das parlamentares.
Em protesto, os representantes das organizações não governamentais (ONGs) convidadas se retiraram. Após o insucesso na tentativa de retomar a pauta, as deputadas Ana Paula Siqueira e Beatriz Cerqueira igualmente abandonaram a reunião, que foi suspensa várias vezes ao longo de duas horas, mas mantida por Raul Belém. Ao final, a reunião teve a participação apenas de representantes do governo estadual e da Fiemg e de algumas pessoas do público, que se inscreveram para falar.
Deputada acusa transgressão ao Regimento Interno
A autora do requerimento de audiência pública acusou o deputado Raul Belém de descumprir o Artigo 125 A do Regimento Interno da ALMG. O dispositivo determina que cabe ao requerimento da reunião a indicação da matéria a ser debatida e da lista de convidados. Nenhuma das pessoas chamadas pelo deputado para falar estavam na lista publicada na pauta da audiência pública.
“Considero pouco democrática uma mudança da construção de uma audiência da qual o senhor não participou. Foi proposta uma audiência pública para debater questões que impactam o povo mineiro. O que está acontecendo aqui é um desvirtuamento da proposta da reunião”, argumentou Ana Paula Siqueira.
Beatriz Cerqueira lamentou o impasse e considerou que a decisão do deputado demonstra o poder político e econômico da Fiemg sobre o parlamento mineiro. “Essa dinâmica vem impedindo o bom andamento dos conselhos onde devia ser garantido o controle social”, criticou.
Na carta divulgada pelas ongs que renunciaram ao conselho, uma das denúncias é de que o governo estadual tem dificultado o trabalho dos representantes da sociedade civil. Um das formas é o tratamento diferenciado entre eles e os representantes dos setores empresarial e oficial.
Raul Belém rebateu, dizendo que sua intenção foi permitir a participação do setor produtivo como forma de garantir o contraditório.
A deputada Celise Laviola (Cidadania) e o deputado Bruno Engler (PL), também participaram da reunião. O deputado Bartô (PL) se posicionou em busca de consenso entre a autora do requerimento, deputada Ana Paula, e o presidente da comissão, deputado Raul Belém, a fim de que se abra espaço para o contraditório, no intuito de engrandecer a discussão.
Sem debate
A única convidada da lista original que permaneceu na mesa, Valéria Cristina Rezende, secretária-executiva da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), afirmou que o governo está sempre aberto ao diálogo com a sociedade civil.
Para tentar ilustrar, ela citou o portal da secretaria, dizendo que está disponível o calendário de reuniões com as entidades ambientalistas. Por outro lado, explicou que nenhuma reunião foi realizada este ano porque “nenhum tema foi proposto”.
A presidenta do Conselho de Relações do Trabalho da Fiemg, Érika Morreale, acusou as entidades ambientalistas que renunciaram aos conselhos de “ongs de fachada”, que prestariam consultorias ambientais, mesmo tendo assentos no Copam. “Eles vivem de criar problemas para as empresas para poder vender soluções”, afirmou.
Representantes de duas ongs que também fazem parte dos conselhos, mas não aderiram ao movimento, lamentaram tanto a renúncia das entidades como a falta delas na audiência pública. Pedro Lima, presidente da Pró-Mutuca, e Fernando Benício, da Zeladoria do Planeta, criticaram a postura das instituições.
Já o representante da União das Associações Comunitárias de Congonhas, Sandoval de Silva Pinto Filho, criticou a política ambiental do governador Romeu Zema. Segundo ele, as comunidades estão perdendo o direito de falar e participar do processo de licenciamento.