PL PROJETO DE LEI 49/2023

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 49/2023

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria do deputado Charles Santos, o Projeto de Lei nº 49/2023 acrescenta inciso ao art. 4º da Lei nº 22.256, de 27 de julho de 2016, que institui a política de atendimento à mulher vítima de violência no Estado.

Publicada no Diário do Legislativo de 25/2/2023, a proposição foi encaminhada às Comissões de Constituição e Justiça e de Defesa dos Direitos da Mulher. Em cumprimento ao disposto no art. 173, § 2º, do Regimento Interno, foi anexado à proposição o Projeto de Lei nº 720/2023, de autoria do deputado Enes Cândido, que institui o programa de capacitação profissional e geração de renda para vítimas de violência doméstica.

Compete a esta comissão, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno, emitir parecer sobre a juridicidade, constitucionalidade e legalidade da matéria.

Fundamentação

O projeto de lei em análise visa determinar que o Estado desenvolva e amplie os mecanismos destinados a fomentar a oferta de vagas de emprego a mulheres vítimas de violência por empresas prestadoras de serviços por ele contratadas.

O reconhecimento da vulnerabilidade da mulher à violência tem mobilizado diversos países a efetuar mudanças importantes nas políticas nacionais, regionais e internacionais, abordando a questão da violência baseada em gênero. Entre as ações de referência, podemos citar a Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena, em 1993, que inovou ao reconhecer os direitos humanos das mulheres como parte indivisível e inalienável dos direitos humanos universais e ao afirmar que a violência de gênero é incompatível com a dignidade e o valor da pessoa humana. Destaque-se, também, no plano internacional, o Comitê para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, que atua sobre questões conexas à violência contra a mulher.

Entre os principais documentos relacionados à luta contra a discriminação da mulher, temos os seguintes: Declaração e Plataforma de Ação da III Conferência Mundial sobre Direitos Humanos (Viena, 1993); Declaração e Plataforma de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (Cairo, 1994); Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – Convenção de Belém do Pará (1994); Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Beijing, 1995); Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher – Cedaw (1979); Protocolo Facultativo à Cedaw (1999); Declaração e Programa de Ação da III Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata (Durban, 2001); Cúpula do Milênio: Objetivos de desenvolvimento do milênio (2000); Recomendação nº 90, de 29/6/1951, da Organização Internacional do Trabalho – OIT –, sobre a igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor; e Recomendação nº 165, de 23/6/1981, da OIT, sobre a igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores com encargo de família.

No Brasil, destaca-se a promulgação da Lei Federal nº 11.340, de 2006, a chamada Lei Maria da Penha, que representa o reconhecimento do Estado brasileiro de que a violência doméstica e familiar contra a mulher é um fato social relevante, nocivo e merecedor da intervenção estatal para coibir sua ocorrência e prevenir sua proliferação, bem como que ela representa um fenômeno que repercute em medidas integrativas de garantias relacionados ao trabalho e à renda. A referida lei, que, no dizer da desembargadora Maria Berenice Dias, “busca nada mais do que resgatar a cidadania feminina”1, impõe a realização de ações afirmativas a cargo das diferentes esferas do Estado brasileiro em favor das mulheres vítimas de violência intrafamiliar ou doméstica.

Essa lei federal tem fundamento de validade e visa dar concretude ao disposto no art. 226, § 8º, da Constituição Federal, cuja redação é a seguinte:

“Art. 226 – A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(…)

§ 8º – O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.”.

Nesse contexto normativo, conclui-se que compete ao estado legislar sobre política de proteção e amparo à mulher vítima de violência doméstica e familiar. Portanto, inexiste vedação constitucional a que o Estado trate da matéria mediante lei, devendo a proposta ser apreciada por esta Casa Legislativa, nos termos do que dispõe o art. 61, XIX, da Constituição Mineira. E, não se vislumbra, ademais, vício no que tange à inauguração do processo legislativo, pois a matéria de que cogita a proposição não se encontra arrolada entre as de iniciativa privativa, previstas no art. 66 da Constituição do Estado.

O Estado de Minas Gerais, no uso dessa sua competência, promulgou a Lei nº 22.256, de 2016, que institui a política de atendimento à mulher vítima de violência no Estado. No seu art. 4º, descreve que, na implementação da política de que trata, poderão ser adotadas ações voltadas para a criação de banco de empregos para mulheres vítimas de violência, com a participação de entidades e órgãos públicos estaduais, federais e municipais e o estabelecimento de parcerias com o setor privado, observadas a vocação profissional da beneficiária e a busca de padrões remuneratórios compatíveis com os praticados no mercado de trabalho.

O Projeto de Lei nº 49/2023 complementa esse dispositivo ao prever que ao Estado caberá o incremento de parcerias com as empresas prestadoras de serviços por ele contratadas, com vistas ao aproveitamento das vagas de emprego por mulheres vítimas de violência cadastradas no banco de empregos a que se refere a Lei nº 22.256, de 2016. Por isso, não vislumbramos obstáculos jurídico-constitucionais para a tramitação da matéria nesta Casa. Apresentamos, ao final deste parecer, o Substitutivo nº 1, para a realização de adequações legais.

Ressalta-se, por fim, que por determinação da Decisão Normativa da Presidência nº 12, de 2003, esta comissão deve também se pronunciar a respeito da proposição anexada ao projeto de lei sob comento. Todos os argumentos aqui apresentados se aplicam também a ele, tendo em vista a semelhança que guarda com a proposição em análise.

Conclusão

Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, legalidade e constitucionalidade do Projeto de Lei nº 49/2023, na forma do Substitutivo nº 1, a seguir apresentado.

SUBSTITUTIVO Nº 1

Acrescenta o inciso X ao art. 4º da Lei nº 22.256, de 26 de julho de 2016, que institui a política de atendimento à mulher vítima de violência no Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Fica acrescentado ao art. 4º da Lei nº 22.256, de 26 de julho de 2016, o seguinte inciso X:

“Art. 4º – (…)

X – incremento de parcerias com as empresas prestadoras de serviços contratadas pelo Estado, com vistas ao aproveitamento das vagas de emprego por mulheres vítimas de violência cadastradas no banco de empregos a que se refere o inciso VII deste artigo.”.

Art. 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 22 de agosto de 2023.

Arnaldo Silva, presidente e relator – Lucas Lasmar – Doutor Jean Freire – Charles Santos – Cássio Soares – Bruno Engler – Thiago Cota.

1DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça: A efetividade da Lei 11.340 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. RT, 3ª ed, 2ª tir., 2012, pág. 15-16