Professores do socioeducativo demandam regras específicas para funcionamento de escola
Necessidade de contrato mais longos e de adicional de periculosidade para educadores foram algumas das reivindicações feitas em audiência pública.
Profissionais da educação denunciaram a redução de profissionais e condições de trabalho inadequadas na Escola Estadual Jovem Protagonista em audiência pública nesta quinta-feira (10/7/25). A instituição atende jovens em conflito com a lei em quatro unidades socioeducativas, e os trabalhadores expuseram as especificidades da atividade.
A reunião foi realizada pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Durante o encontro, representantes da Secretaria de Educação minimizaram os problemas e afirmaram que a pasta trata da situação com olhar diferenciado para as escolas em ambiente socioeducativo.
Um dos problemas apresentados é a decisão da Secretaria de Educação de deixar apenas um professor de biblioteca, um supervisor e um professor eventual para a escola. Atualmente são quatro profissionais para cada um desses cargos, um para cada unidade socioeducativa em que a escola atua. Esses trabalhadores seguem atuando por meio de liminar judicial, já que, desde abril, a Secretaria tenta acabar com as vagas.
A grande distância entre a realidade das unidades e os direitos dos alunos foram ressaltados por Ada Ferreira, professora de filosofia da escola, para demandar a permanência dos quatro profissionais. Ela explicou, por exemplo, que todas as unidades têm biblioteca e reduzir os professores que cuidam do espaço significa privar os estudantes do direito ao equipamento.
Sobre a supervisão, a professora Ada Ferreira salientou que a profissional é importante em especial para articular as áreas pedagógica e de segurança, necessárias para o funcionamento da escola nas unidades socioeducativas. Já o professor eventual garante a continuidade das aulas para os alunos em especial quando algum professor precisa se ausentar.
Além de reivindicar a permanência dos profissionais que já estão na escola, os convidados demandaram a contratação de professores de apoio para todas as unidades. A professora Sidyamara do Socorro Barros contou que é comum ter nas salas de aula adolescentes em sofrimento mental e outros com problemas de abuso de drogas.
A ação que garantiu a liminar que atualmente mantém os profissionais na escola foi iniciada pela promotora Ângela Fábero. Ela apontou que o Ministério Público, que acompanha o cumprimento das medidas socioeducativas, deveria ter sido informado da decisão de desligamento dos trabalhadores pela secretaria. A comunicação, porém, não foi feita.
Assim, a situação só chegou ao conhecimento do órgão em uma fiscalização realizada em uma das unidades. A poucos dias do prazo estipulado para o desligamento dos profissionais, não houve tempo hábil sequer para uma reunião com o Poder Executivo para entender as motivações da decisão, como explicou Ângela Fábero. Por isso, a saída foi a ação judicial.
Rotatividade de professores é um dos problemas
Especifidades da organização escolar em ambiente socioeducativo também geraram demandas por legislação e medidas administrativas direcionadas.
O formato das contratações foi um dos temas. Segundo a professora Ada Ferreira, todos os educadores da instituição atualmente têm vínculos temporários com o Estado e a seleção é feita com os mesmos critérios para outras escolas. Os convidados indicaram que é necessário construir um perfil direcionado para a atuação com adolescentes em conflito com a lei, de forma a reduzir a alta rotatividade.
Outra reivindicação apresentada pela professora Ada Ferreira em nome dos colegas é de que os contratos sejam de 24 meses, tempo máximo previsto pela legislação. Ela explicou que nas unidades socioeducativas é comum que os alunos tenham uma permanência curta, de poucos meses. Ao saírem, turmas podem ser extintas e, com isso, no formato atual, os contratos também o são.
Não raramente, a dispensa dos professores é seguida por nova contratação poucos dias depois, já que sempre novos adolescentes chegam e obrigam a reabertura de turmas fechadas. Essas novas contratações por vezes demoram pela falta de interessados, de forma que os alunos ficam fora da escola por períodos longos.
A promotora Ângela Fábero apoiou a demanda dos professores. Ela defendeu que a solução precisa levar em consideração pelo menos três formatos de internação atendidos pelas unidades socioeducativas: a provisória, que dura 45 dias; a sanção, que dura 90 dias; e a sentença, que tem tempo indeterminado.
O diretor educacional da Secretaria de Educação, André Luiz Caviola, disse que o modelo ainda não é o ideal, mas que a legislação existente já permite flexibilizações para as escolas em unidades socioeducativas. Ele informou, por exemplo, que é possível manter abertas turmas com poucos ou nenhum aluno nessas escolas, o que não é possível em outras instituições.
Ele admitiu, porém, que o sistema informatizado utilizado pela Secretaria de Educação pode, por vezes, excluir turmas. Isso exige um trabalho a mais para os gestores das ecolas, que precisam preencher formulários, fazer pedidos e esperar respostas para a retomada das turmas. O representante da Secretaria se colocou à disposição para repensar o funcionamento do sistema.
Por sua vez, o diretor de pessoal da superintendência da Secretaria de Educação, Kelson Amaral, disse que as vagas fechadas são coerentes com o número de turmas e alunos. Ele informou, ainda, que o aumento de alunos resultaria em reabertura das vagas. A manifestação dele suscitou a indignação da deputada Beatriz Cerqueira (PT), que o acusou de desconsiderar as especificidades da escola apresentadas ao longo da reunião.
Professores reivindicam adicional de periculosidade
A necessidade de regras específicas para as escolas em unidades socioeducativas também foi apontada para os projetos pedagógicos elaborados pela Secretaria de Educação e pelas condições funcionais da escola.
No caso dos projetos, a cobrança por entrega de resultados seria, de acordo com Ada Ferreira, irreal para o trabalho com adolescentes em conflito com a lei. Em especial porque a maioria deles está distante do ambiente escolar há muitos anos e, não raramente, são analfabetos.
Já no que tange às condições funcionais, os professores demandaram em especial o pagamento de adicional de periculosidade similar ao devido aos agentes socioeducativos. Eles contaram que há muitas situações de agressões físicas entre os adolescentes e deles em relação aos educadores que ficam trancados com eles nas salas.
A professora Gleice Braz contou que já ficou machucada em uma rebelião iniciada quando ela estava em sala de aula e, em outro momento, foi atingida por uma cadeira que um aluno jogou em outro, mas acertou nela. Além disso, ela falou sobre a exposição a doenças, como sarna, que são comuns entre os adolescentes internados.
Apoio
A deputada Beatriz Cerqueira (PT), autora do requerimento que deu origem à reunião, apoiou as demandas dos professores. Ela indicou a necessidade de se construir, com a participação dos profissionais e das famílias dos adolescentes, uma resolução específica para a educação em ambiente socioeducativo.
Ao final da audiência, a superintendente de Atendimento ao Adolescente da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), Alice Emmanuele Teixeira Peixoto, reconheceu que o atendimento no sistema ainda necessita de aprimoramentos, inclusive na forma de legislação, mas destacou o desafio de cuidar de um público que já enfrentava defasagens mesmo antes de iniciar o cumprimento de medida socioeducativa.
Nesse aspecto, ela apontou que 97% dos acautelados são do sexo masculino, entre 15 e 17 anos, majoritariamente pretos e pardos, o mesmo público que, segundo ela, fora dos muros do sistema, também é o de maior vulnerabilidade social e alvo da violência.
“É uma responsabilidade gigante cuidar desse indivíduo como pessoa em desenvolvimento, mas estamos abertos ao diálogo para sempre evoluir. Alguns deles estão tendo contato com alguns atendimentos pela primeira vez na vida e, na educação, não é diferente”, avaliou Alice.

