Produção de energia solar no campo pode impulsionar a agricultura familiar
PL propõe que cooperativas possam vender energia limpa, mas entraves com a Cemig ainda dificultam o acesso dos pequenos produtores ao sistema de distribuição.
Redução de custos, valorização do imóvel, desenvolvimento econômico e a possibilidade de permanência no campo. É extenso o rol de benefícios da geração autossuficiente de energia solar fotovoltaica no meio rural, mas pequenos produtores ainda encontram dificuldades para usufruir efetivamente da geração distribuída de energia limpa.
Reunidos nesta terça-feira (4/11/25) em audiência conjunta das Comissões de Minas e Energia e de Agropecuária e Agroindústria da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), autoridades e especialistas discutiram formas de impulsionar unidades de microgeração na agricultura familiar.
O pano de fundo de debate foi o Projeto de Lei (PL) 3.159/24, da deputada Leninha (PT), 1ª-vice-presidenta da ALMG, que solicitou a reunião em companhia dos deputados Gil Pereira (PSD) e Raul Belém (Cidadania), presidentes de ambas as comissões, respectivamente.
A proposta prevê a compra de energia, pelas concessionárias, de agricultores organizados em associações e cooperativas, além da reserva de sistema de armazenamento e da capacidade de subestações para a absorção dessa energia.
A deputada Leninha destacou a descentralização na produção de energia solar e a garantia de mercado como um compromisso com a justiça social, a sustentabilidade e o fortalecimento da agricultura familiar.
O deputado Raul Belém também defendeu, por meio do projeto de lei, uma transição energética inclusiva e cooperativa, de forma que os pequenos produtores sejam ao mesmo tempo executores e beneficiários de programas voltados à implantação de usinas de microgeração (com potência instalada de até 75 kW).
O deputado Dr. Maurício (Novo) lembrou que Minas Gerais é líder no País na geração distribuída (modelo de produção de energia elétrica perto do local de consumo, geralmente por fontes renováveis), aliada do agronegócio moderno.
Principal desafio é conexão ao sistema de distribuição da Cemig
Vitório Freitas, diretor da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado (Emater), e Gilmar Braga, diretor da Coopersolar, cooperativa focada na produção e consumo de energia renovável, reforçaram o retorno de investimentos na geração de energia por agricultores familiares.
Entre outras vantagens, Vitório citou a baixa necessidade de manutenção, a geração de emprego e renda ao comercializar a energia excedente por meio das cooperativas e a economia de até 99% na conta de energia.
A geração solar distribuída no Estado, segundo dados da Emater, é 73% concentrada em unidades residenciais, frente a apenas 14,5% no meio rural. Para ajudar a mudar essa realidade, Vitório sugeriu que os cerca de R$ 500 milhões destinados à tarifa social de energia para 1,4 milhão de famílias em Minas banquem a construção de 16,2 mil usinas de microgeração. Além de atender o mesmo número de pessoas com a mesma quantidade de energia, as unidades trariam uma renda extra mensal de aproximadamente R$ 2,6 mil para cada família da agricultura familiar.
Gilmar, da Coopersolar, ressaltou o reajuste acima da inflação dos investimentos atrelados à energia, mas colocou em discussão a maior preocupação do setor: a autorização de novas conexões por parte da Cemig.
Conforme relatou, enquanto nega acesso a pequenos produtores, a estatal possui contratos assinados com uma grande reserva de fluxo de energia para usinas nem construídas ainda.
De acordo com Catherine Capdeville, conselheira da Comissão de Agronegócio da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), a Cemig alega inversão de fluxo de potência na rede, pela injeção excessiva de energia solar durante o dia, mas se recusa a oferecer relatório técnico atestando essa sobrecarga.
Conduta que, ainda segundo a advogada, abre espaço para especulações como reserva de mercado, para favorecer grandes investidores do setor. Ela apresentou como solução imediata o armazenamento da energia produzida nas unidades de microgeração em baterias, dispensando a conexão com o sistema de Cemig.
Catherine ainda sugeriu aperfeiçoamentos no PL 3.159/24. No seu entender, o projeto deve complementar a legislação federal, mas não pode obrigar as concessionárias a comprar energia das cooperativas, iniciativa de competência da União. Uma alternativa seria a instituição de benefícios fiscais para esse tipo de energia limpa, como a redução da alíquota de ICMS.
Como desdobramento da audiência, os parlamentares Raul Belém e Leninha apresentaram requerimento para o agendamento de nova reunião, desta vez com representantes da Cemig, para tratar das negativas da estatal para conexões ao sistema de distribuição de energia.