Parada LGBTQIA+ demanda financiamento público
Em audiência pública, convidados também trataram da necessidade de interiorização da parada.
15/07/2024 - 15:10A necessidade de se construir uma política pública de apoio para a realização anual das paradas LGBTQIA+ foi uma das demandas discutidas em audiência pública na manhã desta segunda-feira (15/7/24). A importância de se promover a interiorização das paradas, levando a manifestação e o apoio a outras demandas do movimento para fora da Capital, fez parte do debate.
A reunião foi realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para tratar dos direitos e da cidadania LGBTQIA+. O encontro aconteceu a uma semana da 25ª Parada do Orgulho LGBTQIA+ de Belo Horizonte, a ser realizada no próximo domingo (21), e tratou em especial de temas relacionados à manifestação.
Os presentes destacaram que, entre outros recursos, emendas parlamentares têm ajudado na construção das paradas LGBTQIA+ nos municípios mineiros. Embora reconheçam a importância dessas verbas, eles ressaltaram que não são suficientes, sendo preciso apoio público mais perene. Uma das convidadas que defendeu uma política de financiamento foi Soraya Menezes, uma das precursoras do movimento em Belo Horizonte.
Além do financiamento, seria necessário um diálogo permanente com diferentes órgãos, como destacou Thiago Santos Lima, coordenador estadual da Rede Afro LGBT. Em especial, o participante indicou a necessidade do diálogo com as forças de segurança pública para que elas atuem na segurança da parada sem constranger os presentes.
Ao explicarem as demandas, os convidados ressaltaram a importância da parada. Thiago Lima ressaltou que a parada abriga diferentes pautas, não apenas aquelas relacionadas à orientação sexual e identidade de gênero. Assim, as reivindicações antirracistas, por exemplo, fazem parte da manifestação. “A gente chega na parada dizendo sobre a nossa pluralidade”, disse.
“Não é um evento, embora tenha grandes contornos. É uma manifestação popular em busca e na afirmação de direitos”, disse, por sua vez, Maicon Chaves, presidente do Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (Cellos).
O presidente do Cellos acrescentou que esta seria então a maior manifestação popular de Minas Gerais, salientando que a parada em Belo Horizonte leva cerca de 350 mil pessoas para a rua e devolve para o município, em um único dia, R$ 20 milhões.
A deputada Bella Gonçalves (Psol), autora do requerimento que deu origem à reunião, concordou com a necessidade de financiamento público permanente para a parada. Nesse sentido, ela sugeriu a construção de um fundo público com esse fim.
Interiorização das paradas ainda é desafio
Outro assunto debatido na reunião é a necessidade de apoiar as paradas nos municípios do interior de Minas Gerais. Nesse sentido, Michel Bruce, do Conselho Municipal LGBTQUIA+ de Juiz de Fora (Zona da Mata), destacou que, em 2006, cerca de 120 mil pessoas participaram da parada no município. Segundo ele, foi naquele ano a maior parada das cidades do interior do Brasil. Desde então, porém, o público vem reduzindo.
Para ele, a situação é reflexo de uma inércia do poder municipal. Ele ressaltou que Juiz de Fora publicou há 24 anos o que ele chamou de “primeira lei do País que pune discriminações por orientação sexual”, a Lei Municipal 9.791, de 2000. Apesar disso, determinações da lei, como a instituição de um Centro de Referência, ainda não avançaram.
A situação é vivida por outros municípios. Renato Ribeiro, de Uberlância (Triângulo Mineiro), também indicou que a cidade não tem Centro de Referência nem Conselho Municipal LGBTQIA+. Ele é do coletivo de paradas do Triângulo Mineiro e classificou a região como bastante conservadora, mas disse que os movimentos sociais locais têm buscado fortalecer as paradas.
Já em Ribeirão das Neves (Região Metropolitana de Belo Horizonte), a prefeitura estaria dificultando a realização da segunda parada do município, segundo Alê Gonçalves, da Associação Neves da Diversidade. Ela explicou que têm sido feitas exigências, como a realização da manifestação na mesma data todos os anos. Além disso, o apoio de um vereador à parada tem sido usado para questionar sua realização em ano eleitoral.
Segundo Ralpho Seraphim, fundador do Movimento LGBT de Esmeraldas (RMBH), a parada na cidade será em setembro, sendo "feita na raça" pelo movimento, em virtude da falta de apoio municipal. Conforme Ralpho Seraphim, a Câmara de Vereadores e a prefeitura também não têm apoiado outras demandas, como realização da Conferência Municipal LGBTQIA+ e a criação do Conselho LGBTQIA+.
Moara Saboia, vereadora de Contagem (RMBH), apontou dificuldades ainda existentes para atuação política na temática, mas frisou que a cidade vive uma conquista histórica por ter conseguido este ano a implantação de um centro de referência LGBTQIA+.
Convidados apresentam demandas para educação, saúde e segurança
Durante a reunião, outras pautas importantes para a comunidade LGBTQIA+ foram levantadas. “O Judiciário muitas vezes está à frente do Legislativo, que tem medo de votar algumas das nossas pautas, mas temos que trazer as demandas para esta Casa”, disse Soraya Menezes, do Brejo das Sapas.
Uma das pautas que, para ela, precisa ser enfrentada é no âmbito da educação. Ela defendeu que os currículos abranjam discussões sobre diversidade sexual. Já Heddy Lemp, do Coletivo Mães pela Liberdade, falou sobre a importância de revisar o conceito de família utilizado pelos programas sociais e de fortalecer as políticas de abrigamento.
No âmbito da saúde, a demanda é por atendimentos de saúde que não sejam estigmatizantes, como destacou Gab Lamounier, do Centro de Convivência Akasulo. Nesse sentido, para além de atendimentos médicos individualizados, a comunidade demanda a construção de espaços de convivência e socialização para o cuidado coletivo.
Outras pautas importantes para a comunidade são as relacionadas à segurança pública. Alexandre Franco Bahia, da Comissão de Diversidade Sexual e Gênero da OAB/MG, indicou que, embora os boletins de ocorrência em Minas Gerais contenham os campos de orientação sexual e identidade de gênero, esses não são preenchidos. Assim, não há dados sobre violência contra membros da comunidade LGBTQIA+.
Ele também falou sobre a situação do Presídio de São Joaquim de Bicas, que abriga a população LGBTQIA+. O advogado denunciou a dificuldade de membros da sociedade civil visitarem o local e denunciou o alto índice de suicídios e a dificuldade para acesso a medicamentos, por exemplo.