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Pacientes com urticária crônica sofrem sem tratamento adequado pelo SUS

Dificuldades com diagnóstico e acesso a medicamentos eficazes expõem desafios no enfrentamento da doença em MG.

- Atualizado em 26/11/2025 - 13:50
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A dentista Ana Caroline Ferreira da Silva, de 27 anos, passou a vida com crises que provocavam coceira pelo corpo todo e inchaço nos pés e nas mãos, uma situação que ela descreve como angustiante e desesperadora. O diagnóstico só veio há quatro anos: ela tem urticária crônica espontânea (UCE), uma doença que afeta milhares de pessoas e cujo tratamento ainda não foi incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS).

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A história de Ana Caroline ilustra os problemas enfrentados pelos pacientes diagnosticados com UCE, silenciados pela dor, pela invisibilidade e pela falta de políticas públicas adequadas. O assunto foi discutido por médicos e especialistas nesta terça-feira (25/11/25), em audiência pública da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) convocada pela deputada Lud Falcão (Podemos).

Nascida e criada em João Pinheiro (Noroeste de Minas), Ana Carolina convive com a UCE desde os 3 anos de idade. As crises são repentinas e provocam grande incômodo, com uma coceira que vai dos pés à cabeça, nas suas palavras. Sem um diagnóstico correto, ela tentou de tudo: dietas restritivas e tratamentos com antialérgicos e corticoides, sem resultado. 

Depois de se mudar para Patos de Minas (Alto Paranaíba), finalmente ela foi diagnosticada com UCE em 2021, quando iniciou o tratamento com anti-histamínicos. Mesmo assim, não ficou livre da doença. No ano passado, ela chegou a ficar seis meses com urticária todos os dias. “É uma coceira insuportável”, contou. 

Em maio deste ano, ela conseguiu acesso ao tratamento mais moderno, feito com omalizumabe, um medicamento imunobiológico eficaz no controle de doenças alérgicas e inflamatórias graves. “Agora eu consigo trabalhar, estudar e viver tranquilamente. Agora eu estou em paz”, comentou. 

Cada seringa de omalizumabe pode custar até R$ 4 mil na farmácia, e Ana Caroline precisa de duas injeções por mês. Para conseguir acesso ao medicamento, ela precisou recorrer à Justiça. Segundo o defensor público Bruno Barcala Reis, as decisões judiciais para obrigar o SUS a fornecer o remédio podem demorar de 30 dias a seis meses, o que agrava o sofrimento dos pacientes.

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Como lembrou o vice-presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia, Eduardo Magalhães de Souza Lima, na prática, não há acesso real às terapias eficazes para os casos graves de UCE pelo SUS. Uma vez que não existe um protocolo clínico estadual, o tratamento é feito com doses repetidas de corticoides, que a longo prazo são prejudiciais à saúde, além de anti-histamínicos, que são ultrapassados e têm efeito sedativo.

O alergista ressaltou que a UCE é uma doença inflamatória crônica, imprevisível e profundamente incapacitante, mas é considerada por muitos médicos apenas um incômodo passageiro. “Pessoas deixam de trabalhar, de produzir, de viver plenamente porque o tratamento, que pode devolver qualidade de vida, simplesmente não está disponível”, lamentou.

Estima-se que a UCE acometa cerca de 1,4 milhão de pessoas no Brasil. Cerca de 10% dos pacientes vão desenvolver a forma grave da doença, que afeta principalmente as mulheres com idade entre 20 e 40 anos. Por ser uma doença autoimune, ela não tem cura e pode se manifestar ao longo de toda a vida dos pacientes. 

Protocolo clínico pode reduzir custos para o SUS

A médica alergista Elisângela Aparecida Galdino Menezes completou que a ausência de um protocolo clínico perpetua a judicialização para garantir o acesso ao tratamento da UCE. Ela disse que o modelo atual oferecido pelo SUS não funciona, uma vez que não há um fluxo assistencial padronizado, o Estado compra os medicamentos de forma fragmentada e os pacientes ficam expostos à descontinuidade da terapia.

Atualmente, segundo a médica, existem 602 pacientes recebendo omalizumabe graças a decisões judiciais em Minas Gerais. O preço pago pela Secretaria de Estado de Saúde (SES) por cada seringa é de R$ 2.230,00, o que representa um custo anual de R$ 53.520,00 por cada paciente. Se fosse criado um protocolo de tratamento, esse custo poderia ser reduzido para R$ 14.400,00, nas contas da alergista. 

Na avaliação de Elisângela Menezes, a implementação de um fluxo assistencial, associada à negociação de preços, não apenas ampliaria o acesso ao tratamento, como também poderia gerar economia aos cofres públicos, evitando internações, consultas e complicações decorrentes da doença não controlada.

Por isso, ela defendeu a criação de um grupo de trabalho para elaborar um protocolo clínico estadual, de modo a assegurar o acesso ao omalizumabe pelo SUS. Também será necessário capacitar profissionais de saúde para a realização de diagnósticos corretos e negociar acordos de preço para aquisição de medicamentos pela SES.

A deputada Lud Falcão defendeu que é preciso garantir a dignidade dos pacientes com UCE, que têm suas vidas seriamente afetadas pela doença. Ao final da reunião, ela apresentou uma nota técnica que será encaminhada à SES, para subsidiar a elaboração de uma política estadual de diagnóstico e tratamento da doença. Ela também vai elaborar um projeto de lei para garantir a implementação de um protocolo de tratamento pelo SUS.

Tópicos: Saúde Pública
Comissão de Saúde - debate sobre a urticária crônica no Estado

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Protocolo para tratamento de urticária crônica é discutido na Assembleia TV Assembleia

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