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Dívida de Minas

Oligopólio é uma das preocupações com privatização do saneamento

Pesquisador explica experiências nacionais de privatização e chama a atenção para casos internacionais de reestatização, que indicam que modelo privado não funciona na área.

- Atualizado em 05/11/2025 - 16:03
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As preocupações com a possível privatização dos serviços de fornecimento de água e saneamento estão em discussão em audiência pública nesta quarta-feira (5/11/25), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O professor Léo Heller, do Instituto René Rachou (Fiocruz), explicou os dois tipos de privatização que têm sido feitas no Brasil e citou experiências de outros estados.

A reunião é realizada pela Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), no Auditório José Alecar. Enquanto isso, os deputados encaminham, no Plenário, a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/23, que acaba com a necessidade de realização de referendo para consultar a população sobre a desestatização da Copasa.

Trabalhadores da companhia e outros movimentos contra a privatização da empresa lotaram as galerias do Plenário e da audiência pública.

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Serviços são prestado por oligopólio

Segundo o professor convidado, o processo de privatização dos serviços de água e saneamento tem sido acelerado no Brasil. Em 2020, 10% da população no País era atendida por empresas privadas, atualmente esse índice já é de 50%. A velocidade, de acordo Léo Heller, dificulta que se aprenda, de forma gradual, com as experiências implementadas.

O marco inicial do rápido avanço foi a Lei Federal 14.026, de 2020, que cria diretrizes para os serviços de água e saneamento abrindo espaço para a privatização. A partir daí, dois modelos têm sido adotados, como explicou o pesquisador. Um deles é a regionalização dos serviços com concessões às empresas, como fez o Rio de Janeiro. O outro é a venda das estatais, modelo em discussão pelo governo mineiro, que foi o caminho seguido por São Paulo e Rio Grande do Sul.

Além de criticar a velocidade do processo, Léo Heller manifestou preocupação com empresas do setor financeiro, comandadas por fundos de investimentos, assumirem os contratos em lugar das tradicionais empresas de engenharia que prestam o serviço. “O negócio delas é aumentar receita, não fazer saneamento básico”, disse.

Ele também chamou a atenção para a concentração de serviços nas mãos de poucas empresas. De acordo com o pesquisador da Fiocruz, cinco empresas detêm 92% dos serviços prestados hoje.

Outros países têm reestatizado os serviços

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O representante do Instituto René Rachou indicou, ainda, que 12% da população mineira não têm acesso a água encanada e 15% não têm serviços de saneamento básico. Segundo explicou, a privatização, em geral prejudicial para a universalização dos serviços, não resolveria o gargalo, pois a maior parte da população desassistida, normalmente vulnerável, não poderia pagar tarifas de empresas privadas.

O professor apontou que as experiências de outros países mostram como a privatização é negativa. Segundo ele, há uma tendência no mundo, em todos os continentes, de reestatização dos serviços de água e esgoto privatizados nas décadas de 1990 e 2000. “Dados indicam que mais de 300 cidades do mundo remunicipalizaram esses serviços nas últimas décadas”, disse.

Ele deu o exemplo de Paris, que é berço das duas maiores multinacionais do mundo que trabalham na área. A prefeitura encerrou os contratos com ambas as empresas e criou uma autarquia, Águas de Paris, para assumir as demandas de toda a capital francesa. “Relatos indicam que as tarifas diminuíram, os sistemas obsoletos foram substituídos, a qualidade da água aumentou”, afirmou.

No cenário nacional, ele chamou a atenção para o caso do Rio de Janeiro. O consórcio que assumiu os serviços entrou na Justiça pedindo indenização do governo estadual a partir da alegação de que o contrato foi fechado com erros nas informações fornecidas. Agora, o grupo quer abrir mão da indenização para aumentar a tarifa dos serviços em 16%.

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Resistência

O coordenador-geral do Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais (Sindieletro), Emerson Andrada Leite, falou durante a reunião sobre a responsabilidade dos parlamentares que votarem favoravelmente ao fim do referendo da Copasa, em discussão no Plenário da Casa. "A culpa será também deles, não só do (governador) Zema", disse.
 
Ele também afirmou que a resistência contra a privatização da Copasa vai continuar mesmo se o fim do referendo for aprovado. Ele lembrou que, para privatizar a companhia, ainda seria necessário outro projeto de lei para autorizar a venda. Os deputados Betão e Leleco Pimentel, ambos do PT, fizeram coro com ele e chamaram de "vergonha" para a Casa Legislativa a possível aprovação do fim do referendo. 

Diretor-presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado de Minas Gerais (Sindágua), Eduardo Pereira de Oliveira disse que a entidade já está em campanha contra o processo de privatização nas cidades onde os deputados favoráveis à PEC têm maior votação. Antecipou que a mobilização vai continuar e aumentar para evitar a aprovação do projeto da desestatização.

A continuidade da pressão para impedir a privatização da Copasa foi estimulada por outros parlamentares, como os deputados federais Rogério Correia e Padre João (PT/MG); e vereadores e vereadoras de Belo Horizonte, Contagem e Pedro Leopoldo.

Tragédia de Mariana é lembrada

Muitos dos participantes da audiência pública lamentaram a escolha da data de votação do projeto, que coincide com os 10 anos da tragédia de Mariana, quando, em 2015, ocorreu o rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco/BHP/Vale, matando 20 pessoas.

“Hoje lembramos a maior tragédia ambiental, consequência de uma privatização que provoca mortes porque tem ganância pelo lucro acima da sociedade”, afirmou Eduardo Oliveira.

A deputada Bella Gonçalves também criticou não só o dia, como o processo de tramitação da PEC. Ela reclamou da votação de 1º turno, na madrugada do dia 24 de outubro, “na calada da noite, segundo ela”, do impedimento de discussão de emendas rejeitadas na Comissão Especial e na recusa sobre o questionamento apresentado à Mesa, para anulação da reunião. “Hoje deveria ser um dia de luto, de reflexão e de valorização da Copasa, porque quem tem condição de recuperar a bacia do Rio Doce é o trabalho de saneamento que a Copasa faz”, completou.

Manifestação contra a privatização da Copasa
Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social - debate sobre a privatização da Copasa
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Pela terceira vez em audiência pública, trabalhadores da Copasa lotaram a Assembleia na Comissão do Trabalho, para um debate sobre a possível privatização da Copasa TV Assembleia

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