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Deputados cobram mutirão da Defensoria e ação coletiva do Ministério Público para ex-clientes da Arcata

Audiência da Comissão de Defesa do Consumidor ouve queixas emocionadas de lesados por fechamento repentino de clínica de BH especializada em implantes.

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Um mutirão de assistência jurídica da Defensoria Pública e uma Ação Civil Pública por parte do Ministério Público podem ser os caminhos para amparar as vítimas lesadas, de condição financeira precária e que podem chegar a casa das centenas em todo o Estado, do encerramento suspeito das atividades da Clínica Odontológica Arcata, em Belo Horizonte, em 8 de março deste ano.

Esses são dois dos pedidos feitos por meio de requerimentos pelos deputados da Comissão de Defesa do Consumidor e do Contribuinte da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) ao final de audiência pública realizada na tarde desta quarta-feira (10/5/23).

Entre os convidados da reunião estavam dezenas de ex-clientes da Arcata, que foram unânimes em acusar os responsáveis pela empresa pela prática do crime de estelionato e cobrar mais agilidade das autoridades na punição e ressarcimento dos valores devidos.

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Com unidades na Savassi, em Belo Horizonte, em Betim e no Rio de Janeiro (RJ), a empresa era especializada em implantes dentários e, segundo estimativa da Polícia Civil, que investiga o caso em um inquérito, pode ter lesado em torno de 700 pessoas em diversas regiões de Minas Gerais e provocado prejuízo em torno de R$ 4 milhões.

Uma advogada que representa a Arcata foi convidada para a audiência, mas não compareceu. Na data de fechamento, a Arcata informou, por meio de comunicado em uma rede social, que vinha enfrentando dificuldades financeiras causadas principalmente pela pandemia que resultaram no encerramento das atividades. Também prometeu negociar a suspensão dos pagamentos, o que, segundo relato de ex-clientes na audiência, ainda não aconteceu.

Segundo os relatos feitos na audiência, os tratamentos custavam entre R$ 10 mil e R$ 30 mil. Como a maioria dos pacientes eram pessoas humildes, muitos idosos, esses valores eram pagos parceladamente por meio de cheques, boletos, cartão de crédito ou mesmo de empréstimos em financeiras.

Essa situação deixou a maioria deles em dificuldades e, para piorar, com tratamentos incompletos, na qual dentes foram extraídos e substituídos apenas por parafusos ou próteses provisórias, algumas de qualidade inferior ao acordado, conforme os relatos feitos.

O autor do requerimento que possibilitou a reunião, o deputado Leleco Pimentel (PT) cobrou mais agilidade das autoridades. “Precisamos de coragem de enfrentar aqueles que fazem esse tipo de maldade com naturalidade. É preciso fazer justiça”, afirmou.

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O presidente da comissão, Adriano Alvarenga (PP), prometeu empenho da comissão no caso para garantir a punição dos culpados. “Roubaram não só o dinheiro das pessoas, mas o sonho. Vamos até o fim para colocar esses bandidos na cadeia, que é onde eles merecem ficar”, afirmou.

O parlamentar lembrou que até a véspera do fechamento, os responsáveis pela Arcata ainda trabalhavam ativamente na captação de novos clientes, mesmo cientes de que algumas horas depois, de madrugada, os equipamentos da clínica seriam retirados antes da chegada dos primeiros clientes agendados para a manhã do dia 8 de março. 

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Relatos emocionados de um drama sem fim

Os relatos emocionados feitos na audiência comoveram os presentes. Marta Ferreira Simão teve todos os dentes extraídos na Arcata para o implante de pinos em 11 de janeiro último. Com o fechamento da clínica, desde então ela se alimenta apenas de líquidos e pastosos e convive com uma rotina de muita dor e vergonha.

“Eu só peço socorro. Não sei mais o que vou fazer”, disse, com dificuldade e entre lágrimas, já que não tem recursos para concluir o tratamento.

O drama de Sônia Aparecida Resende começou ainda antes da pandemia e, da mesma forma, parece não ter prazo para terminar. “Já são anos com vergonha, sem sorrir, sem poder ir a festas. Eu só queria ficar mais bonita. De alguma forma eles têm que se presos”, lamentou, também chorando muito, antes de se sentir mal e ser retirada da audiência. Ela alega ter sido lesada em cerca de R$ 28 mil.

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Deficiente auditivo, Amilsey Paixão teve o mesmo destino após saber da empresa por meio de um comercial de TV em 2019. Como os demais relatos, após entregar diversos cheques para pagamento das parcelas do tratamento, o atendimento na clínica, segundo ele, mudou completamente. Foram adiamentos constantes de consultas que, quando realizadas, limitavam-se a raios x e avaliações sem que nada fosse efetivamente executado.

“Eles continuaram descontando os cheques durante a pandemia mesmo sem atendimento. Depois colocaram pinos que não eram de qualidade e, por fim, dentes falsos que não eram de porcelana, como eu paguei, que se desgastaram em pouco tempo. Como era surdo, eu não tinha como me comunicar com eles, mas percebi na maioria das vezes eles apenas fingiam que estavam me avaliando”, contou, com o auxílio de um intérprete de Libras.

Com consulta agendada para 8 de março, dia do fechamento da Arcata, coube à servidora da Polícia Civil Ednéia dos Santos Costa, que também não teve o tratamento concluído, reunir dezenas de vítimas para prestar queixa. Após um prejuízo de R$ 30 mil e ter que usar máscara para esconder a ausência dos dentes, ela está concluindo o implante com outro profissional.

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Sem dinheiro e sem acesso à Justiça

Além do prejuízo financeiro e dos transtornos com tratamentos incompletos, os ex-clientes da Arcata relatam dificuldades em mover ações contra a empresa no âmbito do Juizado Especial, já que, ao contrário da justiça comum, cabe a quem aciona, que não precisa ser representado por um advogado, fornecer todas as provas e informações sobre os acusados, como endereços, para que o processo tenha andamento.

Esse problema foi confirmado na audiência pelo presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB-MG), Thiago Augusto de Freitas, que teme que os processos nesses juizados sejam mesmo ineficazes nesse caso.

Ele recomendou que todos os lesados busquem o auxílio da Defensoria Pública ou de alguma assessoria jurídica gratuita ou, se puderem, contratem um advogado de sua confiança para buscar a reparação na esfera cível.

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Na esfera criminal, um inquérito na Polícia Civil é conduzido pela delegada Danúbia Helena Soares Quadros, titular da Divisão Especializada de Defesa do Consumidor. Segundo ela, os trabalhos começaram já no dia 8 de março, quando dezenas de vítimas formaram uma fila na porta da delegacia para prestar queixa.

Apesar de as investigações transcorrerem em segredo de Justiça, ela adiantou que já foi cumprido um mandado de busca e apreensão em endereços dos acusados para reunir provas.

“É uma situação muito triste. Até gostaríamos de resolver tudo, mas só trabalhamos com a parte criminal. Orientamos as vítimas para buscar indenização na esfera cível porque é preciso atuar nas duas frentes para que a Justiça seja feita”, pontuou.

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O gerente-geral do Procon Assembleia e do Espaço Cidadania da ALMG, Marcelo Barbosa, lembrou que também há procedimento investigatório em andamento no Ministério Público estadual, já que além de estelionato, os responsáveis pela Arcata também podem ser enquadrados pelos crimes de publicidade enganosa e até pirâmide financeira.

“É assim que funciona. Eles atendem bem os primeiros clientes para assim atrair mais vítimas, arrecadar mais dinheiro, e depois fecharem as portas sem prestar serviços para os últimos a chegar”, explicou. Ele confirmou a dificuldade de se processar os responsáveis nesse tipo de caso, que muitas vezes se utilizam de “laranjas” (intermediários), trocam de endereço e ocultam os bens.

Nessa linha, entre os demais requerimentos formulados ao final da audiência também será acionado o CRO para obter mais informações sobre os responsáveis técnicos da Arcata e se há alguma investigação interna do caso em andamento na entidade para punição dos culpados.

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Leleco Pimentel e Adriano Alvarenga também querem o apoio da entidade para que os ex-clientes da empresa possam ter acesso aos seus prontuários odontológicos e assim possam continuar seu tratamento em outra clínica.

Os nomes de quatro dentistas supostamente responsáveis pelas operações da Arcata em Minas Gerais foram citados na audiência por Leleco Pimentel e também serão informados, assim como seus endereços, por meio de ofício, ao MP e ao Juizado Especial.

Por fim, os parlamentares querem apurar como outra clínica especializada em implantes teve acesso aos dados cadastrais dos ex-clientes da Arcata, já que muitos deles relatam terem sido procurados para continuar o tratamento mesmo sem nunca ter tido contato prévio com a empresa.

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Comissão de Defesa do Consumidor e do Contribuinte - debate sobre o fechamento da Arcata
Comissão de Defesa do Consumidor e do Contribuinte - debate sobre o fechamento da Arcata
Comissão de Defesa do Consumidor e do Contribuinte - debate sobre o fechamento da Arcata
“Muitos dos que estão aqui se desfizeram das economias de uma vida para fazer um tratamento de saúde, ou para melhorar a autoestima, e agora foram deixados mutilados, desdentados, não podendo nem mais sorrir e com problemas psicológicos graves.”
Leleco Pimentel
Dep. Leleco Pimentel
“As vítimas não conseguiram sequer cancelar os boletos dos bancos. Tenho lúpus e o estresse dessa situação me deixou de cama. Eu exijo o bloqueio de todos os bens deles para nosso ressarcimento e a cassação dos registros de todos os sócios e profissionais pelo Conselho Regional de Odontologia (CRO).”
Ednéia dos Santos Costa, ex-cliente da Arcata
“Dói no coração ver o que aconteceu com essas pessoas aqui, mas lembrem-se sempre de que vocês são vítimas e nada poderiam fazer para evitar isso. O estelionatário, o fraudador, é um profissional do crime. Ele sabe como fazer isso independentemente da classe social e da escolaridade da vítima.”
Thiago Augusto de Freitas, da OAB-MG
“É um processo investigatório complexo e demorado. É bom deixar claro que ninguém vai receber seu dinheiro de volta nos próximos dias. O mais importante é punir criminalmente para que isso não se repita.”
Marcelo Barbosa, do Procon Assembleia
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Pacientes denunciam clínica odontológica de BH e Betim TV Assembleia
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