PL PROJETO DE LEI 4103/2025
Projeto de Lei nº 4.103/2025
Institui a Política Estadual de proteção e atenção integral às crianças e aos adolescentes em orfandade.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituída no Estado a política estadual de proteção e atenção integral às crianças e aos adolescentes em orfandade, voltada para a promoção de atenção multissetorial e multi-institucional, e para a garantia da proteção social deste público.
Art. 2º – Para os fins desta lei, considera-se:
I – orfandade bilateral: a condição da criança ou adolescente que perdeu ambos os pais, biológicos ou por adoção, em decorrência de falecimento;
II – orfandade unilateral: a condição da criança ou adolescente que perdeu um de seus pais, biológicos ou por adoção, em decorrência de falecimento;
III – orfandade em família monoparental: a condição da criança ou adolescente cuja família é constituída por apenas um genitor (pai ou mãe, biológico ou por adoção), e este falece;
IV – orfandade por perda da pessoa de referência do cuidado: a condição da criança ou adolescente que perdeu o indivíduo legalmente responsável por seu cuidado, proteção e assistência, em decorrência de falecimento, como tutores, guardiões ou qualquer pessoa que detenha legalmente a parentalidade ou responsabilidade sobre a criança ou adolescente.
Art. 3º – São princípios desta política:
I – o fortalecimento do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Sistema Único de Saúde e do Sistema Único de Assistência Social – Suas –, em sua rede de atendimento especializada no atendimento de crianças e adolescentes e de suas famílias;
II – a garantia do direito das crianças e dos adolescentes em orfandade a atendimento especializado e por equipe multidisciplinar, com prioridade, considerada a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;
III – a garantia do direito ao acolhimento e à proteção integral como dever norteador do trabalho dos serviços públicos e conveniados implicados no atendimento das crianças e adolescentes em orfandade;
IV – a promoção de iniciativas que impeçam a ocorrência da violência institucional, praticada por instituição pública ou conveniada, a fim de evitar a revitimização dos atendidos, nos termos da legislação vigente.
Art. 4º – São diretrizes desta política:
I – atendimento humanizado, pelo conselho tutelar da localidade, de crianças e adolescentes em orfandade, para encaminhamento de denúncias de violações de direitos ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais, para que sejam aplicadas as medidas protetivas cabíveis e o referenciamento na rede de atendimento, nos termos da legislação vigente;
II – garantia do atendimento a crianças e aos adolescentes em orfandade e seus responsáveis legais por serviços e por unidades de referência do Suas, preferencialmente por Centros de Referência Especializados de Assistência Social – Creas – e/ou por Centros de Referência de Assistência Social – Cras –, conforme o caso;
III – garantia do atendimento a crianças e adolescentes em orfandade e seus responsáveis legais por unidade de referência do Sistema Único de Saúde – SUS –, preferencialmente por linhas de atenção à saúde específicas, como Unidades Básicas de Saúde e Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenil – Caps –, conforme necessidade do caso;
IV – observância em decisões de processos judiciais relativos à guarda de crianças e adolescentes em orfandade, bem como os relativos a perda do poder familiar nos casos que a situação de orfandade decorrer da prática de feminicídio, nos termos da legislação vigente;
V – promoção de estratégias de assistência jurídica gratuita, de forma prioritária, a crianças e adolescentes em orfandade;
VI – promoção da capacitação, acompanhamento e apoio de famílias que ofertarem lar provisório a crianças e adolescentes em orfandade que tenham sido afastados do convívio familiar por medida protetiva determinada judicialmente ou, para adesão voluntária, de membros da família extensa que passarão a ser seus responsáveis legais;
VII – inserção das crianças e dos adolescentes em orfandade e de seus familiares ou responsáveis legais em programas de proteção policial do Estado, quando for o caso;
VIII – garantia de prioridade na matrícula escolar de crianças e adolescentes em orfandade, em instituição educacional mais próxima ao domicílio, ou a transferência para a unidade escolar requerida, independentemente da existência de vagas, e no acompanhamento educacional, nos termos da legislação vigente, visando o combate a evasão escolar;
IX – priorização de crianças e adolescentes em orfandade em programas, projetos e ações sociais no âmbito do Estado, em especial aquelas em situação de vulnerabilidade e de risco pessoal e social;
X – priorização de adolescentes em orfandade, com 16 anos completos, em programas de qualificação profissional e aprendizagem;
XI – integração operacional de órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, do Conselho Tutelar e dos órgãos encarregados da execução das políticas sociais, para o efetivo atendimento multissetorial de crianças e adolescentes em orfandade, inclusive nos casos que envolvam direitos trabalhistas, previdenciários e/ou a herança;
XII – intersetorialidade na promoção da atenção e da proteção das crianças e adolescentes em orfandade e de seus responsáveis legais pelo poder público, de modo a integrar os serviços da Rede Estadual de Proteção, Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes em Situação de Orfandade, o Sistema de Garantias dos Direitos da Criança e do Adolescente e a Rede de Proteção às Mulheres em Situação de Violência, quando for o caso, inclusive com a capacitação continuada dos servidores;
XIII – promoção de campanhas permanentes e ações de sensibilização sobre os direitos das crianças e dos adolescentes em orfandade e de seus familiares e da importância da parentalidade ativa;
XIV – prevenção a adoção em desacordo com a legislação vigente, a exploração do trabalho infantil e outras formas de negligência, violação e exploração a que crianças e adolescentes em situação de orfandade possam estar expostas;
XV – garantia da capacidade de comunicação efetiva e de compartilhamento entre os sistemas e cadastros públicos de dados com vistas a assegurar a notificação aos órgãos competentes pela execução desta Política, acerca da existência de casos de crianças e adolescentes em orfandade;
XVI – garantia de destinação de benefício especial para a manutenção e subsistência da criança e adolescente em orfandade;
XVII – garantia da adesão voluntária de familiares de vítimas de feminicídio e de vítimas da covid-19 aos serviços no âmbito da política de que trata esta lei.
Art. 5º – Fica instituída a Rede Estadual de Proteção, Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes em Orfandade, com a finalidade de formular e propor estratégias de articulação de políticas públicas e serviços de atendimento visando a promoção, proteção, defesa dos direitos da criança e do adolescente em situação de orfandade, de que trata esta lei.
Parágrafo único – São objetivos da rede:
I – estabelecer fluxos e protocolos simplificados de atendimento e enfrentamento a violação de direitos das crianças e dos adolescentes em situação de orfandade, com vistas à desburocratização, com ampliação e facilitação do acesso deste público a todos os direitos a elas assegurados;
II – atuar na promoção e efetivação dos direitos da criança e do adolescente de forma integrada e compartilhada;
III – promover ações de prevenção e redução de violências contra a criança e o adolescente através da sensibilização da comunidade, com ênfase no acolhimento, orientação e denúncia;
IV – fomentar a implementação dos serviços públicos e da própria comunidade local que atendem crianças e adolescentes órfãos e suas famílias;
V – debater os casos e situações que violam os direitos das crianças e dos adolescentes em situação de orfandade com a finalidade de estabelecer ações a fim de cessar as violações de direitos identificadas.
Art. 6º – A rede será composta por serviços governamentais, não- governamentais, entidades, profissionais e instituições da área da educação, saúde, assistência social e segurança pública, além de representantes do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário que atuam para garantir apoio e resguardar os direitos de crianças e adolescentes no Estado.
Art. 7º – Fica criado o Observatório de Proteção Integral à criança e ao adolescente em orfandade, no âmbito do Estado de Minas Gerais, que terá a finalidade de efetuar o monitoramento, o controle e a fiscalização das políticas públicas de proteção e promoção social da criança, do adolescente e da família.
Art. 8º – O observatório criará e manterá um cadastro atualizado e periódico de crianças e adolescentes em situação de orfandade de forma a subsidiar as políticas previstas nesta lei.
Art. 9º – O Observatório de Proteção Integral à Infância e Adolescência estabelecerá metodologia e fluxo de procedimentos para análise da eficácia das políticas públicas sob sua supervisão ou seu acompanhamento.
Art. 10 – São objetivos do observatório:
I – contribuir para a proteção integral da criança e do adolescente em situação de orfandade;
II – favorecer a promoção das políticas de proteção aos direitos da criança e do adolescente em orfandade como prioridade de governo;
III – subsidiar e fomentar a democratização do processo de acompanhamento, fiscalização, controle e avaliação das políticas públicas de proteção e promoção social da criança e do adolescente órfãos;
IV – favorecer o aperfeiçoamento da base normativa das políticas executadas pela Administração Pública para proteção e promoção social da criança e do adolescente;
V – aprimorar o processo de acompanhamento da execução orçamentária específica, privilegiando a qualidade do serviço executado;
VI – contribuir para melhor integração das atividades desenvolvidas pelos órgãos da Administração Pública que atuem na proteção e promoção social da criança e do adolescente;
VII – difundir informações pormenorizadas sobre os temas relativos à criança e ao adolescente, preferencialmente por meio eletrônico;
VIII – manter portal colaborativo na internet para a prestação de serviços, a difusão de informações e o recebimento de críticas e sugestões a respeito de assuntos relativos aos direitos da criança e do adolescente em orfandade;
IX – contribuir para a promoção da transparência na gestão pública;
X – ampliar a participação da sociedade civil na formulação e no controle das políticas estaduais de proteção e promoção social da criança e do adolescente em orfandade;
XI – promover a cooperação entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário com vistas à proteção eficaz dos direitos da criança e do adolescente em orfandade;
XII – promover a cooperação entre órgãos da Administração Pública, conselhos tutelares, organizações não governamentais, pesquisadores e outras entidades e pessoas que tenham por objeto a proteção e promoção social da criança e do adolescente em orfandade.
Art. 11 – Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente lei em todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.
Art. 12 – Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.
Sala das Reuniões, 18 de julho de 2025.
Ana Paula Siqueira (Rede), presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.
Justificação: A orfandade, em suas diversas formas – seja bilateral, monoparental ou decorrente da perda da pessoa de referência –, representa uma situação de profunda vulnerabilidade para crianças e adolescentes. O falecimento de um ou ambos os pais, ou do responsável legal, impacta drasticamente a vida desses jovens, que se veem desprovidos de apoio emocional, financeiro e social, essenciais para seu desenvolvimento integral. Atualmente, Minas Gerais carece de uma política pública estruturada e abrangente que atenda especificamente às necessidades desse público, deixando lacunas significativas na proteção e garantia de seus direitos fundamentais.
O projeto de lei, elaborado com o apoio do Comitê Estadual de Orfandade e Direitos, surge da necessidade de amparar esses indivíduos, que, muitas vezes, enfrentam não apenas o luto, mas também desafios como a desestruturação familiar, a perda de moradia, a interrupção dos estudos, dificuldades financeiras e o risco de exploração ou violência. A ausência de uma política coordenada expõe essas crianças e adolescentes a um ciclo de vulnerabilidade que pode comprometer irreversivelmente seu futuro.
Assim, a criação de uma Política Estadual de proteção e atenção integral às crianças e adolescentes em orfandade é uma medida urgente e indispensável para Minas Gerais. Este projeto de lei representa um avanço significativo na garantia dos direitos desses jovens, proporcionando-lhes as condições necessárias para superar a adversidade e construir um futuro digno. A sua aprovação demonstra o compromisso do Poder Legislativo com a proteção das parcelas mais vulneráveis da população mineira, reafirmando o princípio da prioridade absoluta à criança e ao adolescente.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, do Trabalho e de Fiscalização Financeira para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.