PL PROJETO DE LEI 4073/2025
Projeto de Lei nº 4.073/2025
Institui a Política Estadual de Proteção Social aos Motoboys e Entregadores das plataformas digitais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituída a Política Estadual de Proteção Social aos Motoboys e Entregadores.
Parágrafo único – Para os efeitos desta lei, considera-se motoboys e entregadores o grupo populacional heterogêneo de condutores de motocicletas, veículos acionados a pedal ou a braços, de tração humana ou motorizados, que exercem a atividade de entrega de mercadorias e transporte de passageiros.
Art. 2º – São princípios da Política Estadual de Proteção Social aos Entregadores de plataformas digitais:
I – o respeito à dignidade da pessoa humana;
II – a valorização e o respeito à vida e à cidadania;
III – a garantia do exercício ao trabalho digno, saudável e seguro;
IV – a garantia do meio ambiente sadio e seguro, nele compreendido o meio ambiente do trabalho;
V – o tratamento humanizado e universalizado;
VI – a valorização e a garantia do exercício do direito à economia popular;
VII – a melhoria da mobilidade urbana.
Art. 3º – São diretrizes da Política Estadual de Proteção Social aos motoboys e entregadores de plataformas digitais:
I – a promoção dos direitos humanos e fundamentais, civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais;
II – a promoção do trabalho decente;
III – a promoção do meio ambiente de trabalho que assegure a saúde e a segurança do trabalhador com ações que previnam, protejam, recuperem e preservem a higidez física e mental dos trabalhadores no âmbito das relações laborais;
IV – a promoção de ações orientativas e educativas de segurança no trânsito, destinadas a instruir os trabalhadores quanto às medidas de prevenção a acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, sobretudo, nas capitais regionais;
V – a garantia de proteção social e preservação da renda em casos de redução, permanente ou temporária, da capacidade laboral;
VI – a responsabilidade do poder público pela sua elaboração, financiamento, execução, monitoramento e avaliação;
VII – a articulação com as políticas públicas federais de proteção social à categoria;
VIII – a integração dos esforços e iniciativas do poder público e da sociedade civil para a sua execução;
IX – a participação da sociedade civil, por meio de entidades, fóruns, movimentos sociais e organizações da economia popular, na elaboração, na execução, no monitoramento e na avaliação das políticas públicas;
X – a democratização do acesso e da fruição dos espaços, equipamentos e serviços públicos;
XI – a erradicação de atos violentos, das ações vexatórias e dos preconceitos sociais que produzam ou estimulem a discriminação e a marginalização, seja pela ação ou omissão;
XII – a não discriminação de qualquer natureza no acesso a bens, equipamentos e serviços públicos;
XIII – a integração com princípios e diretrizes da política nacional de mobilidade urbana.
Art. 4º – Para atingir suas finalidades, a Política Estadual de Proteção Social aos motoboys e entregadores será organizada com base nos seguintes objetivos:
I – a disponibilização, em todos os municípios mineiros com mais de 200.000 (duzentos mil) habitantes e nos municípios com mais de 50.000 (cinquenta mil) habitantes integrantes de Regiões Metropolitanas no Estado de Minas Gerais, de pontos de apoio que garantam aos motoboys e entregadores das plataformas digitais acesso a equipamentos, bens, serviços e estruturas básicas ao exercício do direito ao trabalho decente, tais como, banheiros masculinos e femininos, com a devida adaptação sanitária para o uso exclusivo por mulheres, água potável, energia elétrica e internet, e a devida proteção contra intempéries;
II – a criação de espaços infantis noturnos que acolham crianças cujos pais exerçam atividades profissionais durante o período da noite, enquanto ambientes aconchegantes e seguros que garantam o direito à atenção individual, à proteção e ao acesso a alimentação sadia e adequada;
III – a promoção de financiamento, através do subsídio público, da renovação das frotas de motocicletas no Estado de Minas Gerais, visando garantir a idade mínima e média da frota adequada à atividade econômica exercida;
IV – a garantia do direito à ampla defesa e ao contraditório, com os meios e recursos a eles inerentes, de forma a inibir o exercício do poder discricionário e sem contornos legais pelos tomadores de serviços, como os bloqueios e as desativações indevidas e a externalização aos trabalhadores dos riscos oriundos da insatisfação ou da má índole dos clientes;
V – a disponibilização de atendimento por humano, em todas as etapas dos canais de comunicação, com a finalidade de dar tratamento a todas as demandas dos motoboys e entregadores observadas, com o rigor, a tempestividade e a resolutividade do atendimento, a segurança das informações, a privacidade e a proteção de dados.
VI – a disponibilização de atendimento por humano, especializado e emergencial, que promova a escuta qualificada das trabalhadoras em situação de violência;
VII – a proibição de uma lógica organizacional do trabalho que empregue mecanismos de controle de desempenho prejudiciais a saúde e a segurança dos trabalhadores;
VIII – a disponibilização de dados e informações sobre acidentes envolvendo motoboys e entregadores, os quais devem ser publicizados e remetidos aos órgãos responsáveis pelos serviços públicos de transporte e saúde;
IX – a transparência da política remuneratória e a segurança de sua continuidade, bem como dos termos de uso dos tomadores de serviços, inclusive os automatizados pelas plataformas digitais, e de todas as suas empresas subcontratadas, de maneira acessível e em linguagem de fácil compreensão;
X – a disponibilização pelos tomadores de serviços, de forma acessível e por tempo razoável, do local de coleta e de entrega, bem como da distância do trajeto, seja do transporte de passageiros ou de mercadorias, inclusive o multiplicador e o valor base da corrida nas situações que importam a denominada tarifa dinâmica;
XI – a garantia do exercício do direito ilimitado à rejeição de pedidos, vedada a aplicação de medidas punitivas de qualquer natureza pelos tomadores de serviços;
XII – a implementação, pelos tomadores de serviços, de medidas especiais que protejam os trabalhadores contra a insolação excessiva, o calor, o frio, a umidade e os ventos inconvenientes;
XIII – o fornecimento, de forma não onerosa, pelos tomadores de serviços, de equipamentos de proteção individual – EPI –, bem como o estabelecimento de procedimentos para sua manutenção periódica e substituição, considerando os perigos identificados e os riscos ocupacionais inerentes à atividade exercida por motoboys e entregadores, tais como capacetes, capuz ou balaclava, óculos, protetor facial, vestimentas, luvas, entre outros.
XIV – a oferta de seguros diante de sinistros sofridos pelos trabalhadores, que garantam proteção integral, considerando os riscos inerentes à atividade e suas consequências, como os lucros cessantes;
XV – o estabelecimento de Notificação Compulsória de casos suspeitos ou confirmados de Acidente de Trabalho relacionados à função de motoboys e entregadores em todo o território estadual que provoquem dano físico ou material ao trabalhador ou que provoque lesão corporal ou perturbação funcional, podendo causar a perda ou redução temporária ou permanente da capacidade para o trabalho ou a morte;
XVI – garantia de acesso aos serviços públicos necessários à recuperação física e psicológica de motoboys e entregadores acidentados, com oferta de serviços de fisioterapia, psicologia e reabilitação, dentre outros, integralmente gratuitos;
XVII – estimular parcerias com os serviços sociais autônomos e com autoescolas credenciadas para promover, sem custos aos entregadores, cursos de formação, atualização e especialização na atividade de motoboys e entregadores, incluindo aulas teóricas e práticas;
XVIII – estimular a implementação de um padrão de sinalização do trânsito para o tráfego de motocicletas, a denominada “Faixa Azul”, não exclusiva, com o objetivo de promover a organização visual do trânsito, garantir a segurança viária e prevenir os sinistros com mortos e feridos.
Art. 5º – A política de que trata esta lei será executada em parceria com os Municípios do Estado de Minas Gerais e as empresas operadoras das plataformas digitais.
Art. 6º – Fica autorizado o Poder Executivo a promover o incentivo ao financiamento, via subsídio, da renovação das frotas de motocicletas e dos demais direitos de proteção social aos Entregadores de plataformas digitais, inclusive por meio do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais.
Art. 7º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 11 de julho de 2025.
Bella Gonçalves
Justificação: O presente projeto de lei é fruto da necessidade de estruturação de um sistema que garanta a proteção social dos trabalhadores, motoboys e entregadores, submetidos a organização plataformizada do trabalho. Esse tipo de organização laboral, que terceiriza as atividades para uma multidão, tem como elemento estruturante a precarização, destacados o elevado índice de acidentes com mortos e feridos, os riscos à segurança e à saúde do trabalhador, a instabilidade ocupacional e financeira e a baixa remuneração. Todos esses aspectos, prejudiciais ao ambiente sadio e seguro de trabalho, resultam do elevado nível de dependência econômica que essa forma organizacional alimenta.
Em que pese os registros recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD-Contínua – do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE –, que confirmam o crescimento da taxa de ocupação no Brasil, sustentada essencialmente pelo emprego formal, quando comparada a expansão do setor informal, este último ainda representa parcela expressiva da força de trabalho no País, abarcando um contingente de quase 40 milhões de trabalhadores. Inseridos nesse universo, estão os trabalhadores, motoristas e entregadores, de plataformas digitais de mobilidade que, entre 2022 e 2024 cresceram 18% e 35%, respectivamente.
Esta dinâmica de organização da força de trabalho, em ascensão, acentua a assimetria de poder entre as empresas e os trabalhadores, uma vez que preserva a coexistência de modelos de subordinação, próprios das plataformas digitais, e de um estado de plena ausência de direitos, justificado por uma falsa autonomia. A zona cinzenta em que se desenvolvem as relações de trabalho mediadas por aplicativos, legitimam o exercício discricionário e ilimitado do poder regulamentador dos tomadores de serviços, produzindo um cenário de total insegurança, jurídica, ocupacional e financeira.
Destaca-se que a presente proposição é decorrente dos debates travados na audiência pública, realizada em 22/5/2025, pela Comissão de Direitos Humanos, tendo como convidada a Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social, com a finalidade de debater as condições que garantem a dignidade e a eficácia dos direitos fundamentais das pessoas que trabalham como entregadoras de aplicativo, bem como dos demais debates feitos junto com a categoria que visa atingir.
Diante deste quadro, se faz imperativo o estabelecimento de um patamar normativo mínimo, que garanta a efetividade e a eficácia de direitos humanos e fundamentais, um ambiente de trabalho sadio, digno e seguro, bem como a promoção da justiça social e laboral.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Ione Pinheiro. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 2.114/2020, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.