PL PROJETO DE LEI 3162/2024
Projeto de Lei nº 3.162/2024
Autoriza o Poder Executivo a criar o Fundo de Exaustão e Assistência aos Municípios Mineradores – Fexam – e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica o Poder Executivo autorizado a criar o Fundo de Exaustão e Assistência aos Municípios Mineradores – Fexam.
Art. 2º – O fundo terá os seguintes objetivos:
I – diversificar a economia dos municípios mineradores;
II – promover o desenvolvimento socioeconômico dos municípios mineradores;
III – permitir distribuição dos recursos advindos da atividade minerária para o enfrentamento dos impactos provocados por esse setor;
IV – apoiar a gestão ambiental, o descomissionamento e a descaracterização de minas, barragens, reservatórios e pilhas de rejeitos.
Parágrafo único – O Estado, por meio de regulamento, disporá sobre o reconhecimento de município minerador.
Art. 3º – São diretrizes do fundo de que trata esta lei:
I – o respeito à autonomia municipal;
II – o uso responsável dos recursos públicos;
III – o estímulo a cadeias produtivas não relacionadas com a cadeia produtiva da mineração;
IV – o apoio à agricultura familiar, à produção de sistemas agroecológicos e agroflorestais;
V – o apoio ao turismo de base comunitária;
VI – o apoio às atividades produtivas de reduzido impacto ambiental;
VII – o apoio a atividades de pesquisa e inovação;
VIII – a redução das disparidades regionais no Estado;
IX – a aquisição de ativos que promovam princípios de governança social e ambiental para a composição do fundo.
Art. 4º – Poderão ser beneficiários de operações de financiamento com recursos do Fexam:
I – municípios onde ocorrer a exploração mineral;
II – municípios onde não ocorrer a exploração mineral, mas que sejam atingidos pela atividade minerária.
Parágrafo único – Os municípios a que se referem os incisos I e II que demonstrarem interesse de participar do Fexam e que nele aportarem recursos financeiros na forma do art. 5º desta lei serão beneficiários prioritários de suas ações.
Art. 5º – São receitas do Fundo:
I – 20% dos recursos da parcela destinada ao Estado da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais – Cfem –, nos termos do art. 2º, § 2º, inciso V da Lei 8.001, de 13 de março de 1990;
II – até 20% dos recursos da parcela da Cfem, nos termos do art. 2º, § 2º, incisos VI e VII da Lei 8.001, de 1990, destinada a cada município interessado na participação do fundo, nos termos de regulamento;
III – recursos orçamentários de outras naturezas, conforme dispuser a lei orçamentária anual.
Art. 6º – Os recursos do Fexam serão aplicados na execução de projetos de diversificação produtiva, de sustentação da economia popular, de saneamento básico e de proteção ao meio ambiente, nos termos de regulamento.
Art. 7º – O órgão gestor do Fexam é a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, nos termos de regulamento.
Art. 8º – O agente financeiro do Fexam é o Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais – BDMG –, nos termos de regulamento do Poder Executivo Estadual.
Art. 9º – Integram o grupo coordenador do Fexam, nos termos da Lei Complementar nº 91, de 19/1/2006, os seguintes representantes:
I – um representante da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico;
II – um representante da Secretaria de Estado de Fazenda;
III – um representante da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão;
IV – um representante do BDMG;
V – um representante da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – Fapemig;
VI – cinco representantes de municípios mineradores.
Parágrafo único – A representação prevista no inciso VI observará a participação de pessoas atingidas pelos danos provocados pela atividade minerária, de povos e comunidades tradicionais.
Art. 10 – Compete ao grupo coordenador, além das funções estabelecidas na Lei Complementar nº 91, de 2006:
I – aprovar o plano de aplicação dos recursos, conforme as diretrizes estabelecidas nos planos de ação governamental e outros instrumentos de planejamento governamental;
II – acompanhar a execução do plano de aplicação dos recursos do Fexam;
III – elaborar o cronograma financeiro de receita e despesa do Fexam;
IV – elaborar a proposta orçamentária do Fexam;
V – definir a aplicação das disponibilidades transitórias de caixa do Fexam.
Art. 11 – Os demonstrativos financeiros do Fexam obedecerão ao disposto na Lei Federal nº 4.320, de 17 de março de 1964, e às normas do Tribunal de Contas do Estado.
Parágrafo único – Os demonstrativos a que se refere o caput serão atualizados mensalmente e ficarão disponíveis para consulta pública, por meio da internet.
Art. 12 – O Poder Executivo regulamentará esta lei, no que couber, no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data da publicação desta lei.
Art. 13 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 5 de dezembro de 2024.
Beatriz Cerqueira (PT), presidenta da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia.
Justificação: Sabendo-se que os bens minerais são finitos, o constituinte estadual reconheceu a importância do apoio aos municípios atingidos pela mineração, no estado de Minas Gerais.
Nesse sentido, a Carta previu, em seu art. 253, caput, que o Estado assistirá, de modo especial, o município que é explorado pela atividade minerária, com vistas a diversificar sua matriz econômica e a mitigar os impactos da exaustão mineral. O § 3º do referido artigo, definiu que será criado o Fundo de Exaustão e Assistência aos Municípios Mineradores, formado por recursos advindos do Estado e dos municípios interessados, cuja gestão dará prioridade à diversificação de atividades econômicas desses municípios. Apesar da relevância do tema e da previsão constitucional, o Fundo de Exaustão nunca foi instituído. Tampouco foi localizado, em pesquisa sobre matérias nesta Casa, projeto com tal finalidade.
A presente proposição responde às relevantes preocupações que parcelas crescentes da sociedade civil têm suscitado em relação ao inevitável fim do ciclo da mineração nos locais explorados atualmente, bem como às preocupações diante da premente necessidade de superação da dependência da atividade minerária, o que vem sendo caracterizado por “minério dependência” por acadêmicos e movimentos sociais que atuam nesse contexto.
De acordo com Tadzio Coelho, doutor em ciências sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ – e professor adjunto da Universidade Federal de Viçosa – UFV – “a minério dependência gera subordinação frente a mercados globais de commodities, onde são definidos os preços dos minérios exportados, instabilizando social e economicamente os locais minerados devido a flutuações, cíclicas ou não, dos preços. A arrecadação por meio da Compensação Financeira pela Exploração Mineral – CFEM – é extremamente sensível a alterações e crises no mercado internacional porque o seu cálculo incide sobre a receita bruta das empresas mineradoras. Assim, a quantia de divisas repassadas aos municípios, estados, órgãos ambientais e União, com o objetivo de compensá-los por possíveis prejuízos causados pela produção mineral, pode diminuir, aumentar ou manter-se estável de acordo com as flutuações dos preços dos minerais no mercado internacional. Os postos de trabalho podem ser fechados de acordo com as quedas dos preços nos mercados globais de commodities, tornando essas regiões extremamente sensíveis à instabilidade de dinâmicas que ocorrem em mercados financeiros globais.”
Tal dependência, extremamente nociva e desestabilizadora, impõe-se nas searas econômica, política e social, dos municípios e do estado. A atividade minerária implica em diversos impactos danosos à população e ao meio ambiente, que são, em muitos casos, irreversíveis. Tais como, danos à vida, à saúde, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, aos modos de vida, trabalho e renda, às relações comunitárias, à segurança hídrica, à cultura e ao lazer.
A mineração figura entre os setores econômicos mais insalubres para o trabalho no mundo, pois provoca recorrentes acidentes, doenças ocupacionais e proporciona elevados índices de morte e invalidez dos seus trabalhadores. No Brasil, a violação dos direitos ambientais e da população, no setor mineral, diante dos trabalhadores e das comunidades atingidas pelos projetos é sistemática. Ademais, a problemática tem se mostrado estrutural nas empresas de mineração do país (COELHO, 2015). Dados disponíveis em bancos de dados nacionais e internacionais mostram a magnitude dos acidentes de trabalho no Brasil e no mundo. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, ocorrem anualmente cerca de 270 milhões de acidentes de trabalho no mundo, dos quais, 2 milhões seriam fatais. O Brasil é considerado recordista mundial de acidentes de trabalho com três mortes a cada duas horas e três acidentes de trabalho não fatais a cada minuto (FACHINI et al., 2005).
Este mandato parlamentar tem acompanhado de perto a realidade das populações atingidas pela mineração e pelos crimes socioambientais praticados pelas empresas mineradoras. Além das vidas humanas ceifadas nos acidentes tecnológicos e crimes que ocorreram em Mariana (2015) e em Brumadinho (2019), milhares de famílias, em Minas Gerais, vivem em áreas de risco imposto pelas barragens de rejeitos de minério, sob o medo constante, submetidas ao terrorismo de barragens.
De acordo com a Agência Nacional de Mineração – ANM –, Minas Gerais é o estado com o maior número de barragens de mineração do país (38,7%, 350 barragens), possui 58 municípios com barragens cadastradas, sendo que 48 barragens estão em nível de alerta.
Nesse contexto, identifica-se que a diversificação da matriz econômica dos municípios e, por conseguinte, do estado, impõe-se como uma prioridade para enfrentar um modelo econômico que perpetua graves violações de direitos trabalhistas e humanos, não é perene e renovável, além de dificultar o desenvolvimento de outras atividades econômicas mais sustentáveis, que distribuem melhor os seus recursos, no mercado interno.
Cumpre notar que se encontra vigente a Lei nº 22.381, de 5 de dezembro de 2016, que dispõe sobre a política estadual de diversificação produtiva dos municípios atingidos pela mineração. Apesar da edição dessa lei, o Poder Executivo pouco tem realizado com vistas à diversificação da matriz produtiva desses municípios. Trata-se de oportunidade deste Parlamento, a partir desta proposição, instar o Poder Executivo a suprir o comando constitucional de criar o Fundo de Exaustão, oportunidade em que a temática poderá ser discutida em profundidade.
A presente proposição tem, portanto, a finalidade de autorizar o Poder Executivo a instituir o citado fundo, além de trazer disposições gerais, típicos de lei, sobre o seu funcionamento.
Pela importância da matéria aludida, conto com o apoio dos nobres pares para aprovação deste projeto de lei.
Fontes de pesquisa:
ANM. Boletim Mensal. Disponível em: https://www.gov.br/anm/pt-br/assuntos/barragens/boletim-de-barragens-de-mineracao/boletim-mensal-marco-2024.pdf . Acesso em: 11/04/2024.
COELHO TP. Projeto Grande Carajás: trinta anos de desenvolvimento frustrado. Marabá, Pará: Editora iGuana, 2015. Pag 160.
FACHINI LA, Nobre LCC, FARIA NMX, FASSA AG, THUMÉ E, TOMASI E, SANTANA VS. Sistema de Informação em Saúde do Trabalhador: desafios e perspectivas para o SUS. Ciência & Saúde Coletiva 2005; 10(4): 857-867.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo deputado Coronel Sandro. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 1.556/2023, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.