PL PROJETO DE LEI 342/2011
Projeto de Lei nº 342/2011
Institui a Taxa de Carboneutralização - TCB.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1° - Fica instituída a Taxa de Carboneutralização - TCB -, gerada pela prestação de serviço público de carboneutralização, efetiva ou potencial, de gases de efeito estufa - GEEs - emitidos por motores a explosão de qualquer espécie, movidos a combustíveis fósseis, por meio da conversão, para vegetação nativa, de áreas rurais submetidas a uso alternativo de solo.
Parágrafo único - Para os efeitos desta lei, considera-se combustível fóssil toda substância obtida de petróleo ou gás natural.
Art. 2° - A TCB é devida pela prestação do serviço público de efetiva ou potencial carboneutralização de GEEs emitidos por motores a explosão de qualquer espécie, movidos a combustíveis fósseis.
Art. 3° - O produto da arrecadação da TCB deverá ser aplicado integralmente na conversão, para vegetação nativa, de áreas necessárias à proteção dos recursos hídricos, à recarga de aquíferos e à proteção da biodiversidade, submetidas a uso alternativo de solo.
§ 1° - A fiscalização e o recolhimento da TCB cabem ao Poder Executivo, através de seus órgãos.
§ 2° - Compete ao Poder Executivo, direta ou indiretamente, a prestação do serviço público de carboneutralização de que trata esta lei.
§ 3º - O Poder Executivo divulgará com periodicidade quadrimestral, em sua página oficial na internet, o demonstrativo da receita e da despesa da TCB, que conterá no mínimo:
I - a receita mensal e a acumulada do ano, discriminadas por região;
II - a despesa executada com os recursos da TCB mensal e acumulada no ano, discriminada por região, delegatário, natureza e grupo de despesa;
III - área convertida, por estágio de implantação e por região.
§ 4° - As despesas com a administração da prestação dos serviços públicos de carboneutralização não serão superiores a 10% do valor aplicado por área convertida.
§ 5° - O Poder Executivo definirá em regulamento o índice de carboneutralização a ser aplicado para cada tipo de combustível fóssil.
Art. 4° - O valor da TCB será o custo da carboneutralização dos gases de efeito estufa emitidos pelo consumo potencial ou efetivo de combustível fóssil adquirido.
§ 1° - O valor básico da TCB por unidade de medida de combustível fóssil, referente ao índice de 100% (cem por cento) de carboneutralização dos gases de efeito estufa emitidos, corresponde a:
I - R$0,083 (oito centavos e três décimos de centavo) por litro de gasolina;
II - R$0,101 (dez centavos e um décimo de centavo) por litro de diesel;
III - R$0,045 (quatro centavos e cinco décimos de centavo) por metro cúbico de gás natural veicular.
§ 2° - O valor da TCB a ser recolhido será proporcional ao índice de carboneutralização definido em regulamento.
§ 3° - Os valores estabelecidos no § 1º deste artigo serão atualizados anualmente pelo índice de correção da Unidade Fiscal do Estado de Minas Gerais - Ufemg.
Art. 5° - Contribuinte da TCB é a pessoa física ou jurídica que realiza a aquisição de combustível fóssil em postos de abastecimento de veículos ou distribuidoras de combustíveis para consumo final.
Art. 6° - O valor da TCB será retido pelos postos de abastecimento de veículos e pelas distribuidoras de combustíveis e recolhido ao Poder Executivo na forma, na condição e no prazo definidos em regulamento.
Parágrafo único - A ausência de retenção torna os postos de abastecimento e as distribuidoras responsáveis pelo pagamento do tributo integral, sem prejuízo da imposição de penalidades por descumprimento de obrigação acessória.
Art. 7º - Os postos de abastecimento e as distribuidoras de combustíveis deverão entregar declaração eletrônica trimestral ao órgão competente, conforme dispuser o regulamento.
Parágrafo único - O não cumprimento da obrigação de que trata o "caput" deste artigo acarretará ao infrator multa de 500 (quinhentas) Ufemgs por declaração não entregue, nos termos de regulamento próprio, sem prejuízo da obrigação tributária principal.
Art. 8° - A TCB não recolhida nos prazos e nas condições estabelecidas nesta lei e em seu regulamento será cobrada com os seguintes acréscimos:
I - juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, contados do mês seguinte ao do vencimento;
II - multa de 30% (trinta por cento), reduzida a 20% (vinte por cento), se o pagamento for efetuado de forma espontânea pelo responsável pela retenção.
Art. 9º - A remuneração do serviço público de carboneutralização, anual e por hectare convertido, será disciplinada em regulamento e levará em consideração, entre outros parâmetros:
I - o plano de carboneutralização por sub-bacia hidrográfica;
II - o protocolo de conversão definido por bioma e tipo de vegetação.
Parágrafo único - O fornecimento de mudas, insumos agrícolas e materiais para proteção e cercamento da área objeto de conversão poderá compor a remuneração de que trata o "caput" deste artigo.
Art. 10 - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 23 de fevereiro de 2011.
Fred Costa
Justificação: A justificação de qualquer projeto de lei deveria abordar a razão jurídica pela qual determinada pretensão legislativa deve ser aprovada para produzir efeito; entretanto, a razão técnica instrumentalista não deve ser preponderante às situações fáticas que resultam de uma demanda.
O modelo republicano de Estado prevê em análise simples a procura pelo bem comum, ou melhor, o modelo que atenda, da melhor maneira possível, ao interesse geral.
A partir desse entendimento, a história do constitucionalismo escreveu um percurso de tutela progressiva dos interesses comuns. O estudo contemporâneo do direito constitucional indica a percepção de dimensões de direitos, isto é, um crescimento progressivo na amplitude dos direitos individuais e coletivos.
Os chamados direitos de primeira geração - mais modernamente de primeira dimensão - remontam ao início do constitucionalismo. Essa gama de direitos previa um estatuto constitucional restritivo ao poder público, de limitação, imposição de obrigações negativas à atividade estatal.
O abstencionismo dessa dimensão de direitos tornou-se inadequado à evolução social. Assim, foi criada a segunda dimensão de direitos, trazida à tona pelo "welfare state". Essa modalidade de Estado social calcada na separação entre Estado e sociedade, acabou por tornar-se anacrônica, pois concebia o Estado como tutor da sociedade civil.
Por fim, chegamos à última dimensão de direitos, o Estado Democrático de Direito, caracterizada pela tutela das coletividades e dos direitos difusos, pela participação dos cidadãos na definição do interesse público, por meio de procedimentos que garantam a emancipação política e o exercício de direitos. O direito ambiental, próprio desse novo momento do constitucionalismo, constitui instrumento de proteção ao direito coletivo.
Essa nova disciplina tornou-se própria da vanguarda jurídica, e um de seus aspectos mais recente é constituído da fusão dos institutos de direito tributário com os princípios ambientais. O direito tributário ambiental apresenta-se como a vertente inovadora, apta a oxigenar os formais institutos do direito tributário. Apesar de celebrada pela academia tributarista, a matéria ainda é pouco explorada pelo Poder Legislativo.
Este projeto de lei pretende (valendo-se do princípio do poluidor-pagador) instituir taxa de proteção ambiental pela prestação do serviço de efetiva ou potencial carboneutralização, como instrumento próprio à minimização das maléficas, porém ainda necessárias, emissões de gases de efeito estufa advindos de combustíveis fósseis e imediata conversão de áreas degradadas e de baixa produção agropecuária para vegetação nativa.
Como interesse coletivo, a tutela dos direitos ambientais é de competência concorrente entre os entes políticos. Assim, é dever do Estado de Minas Gerais a manutenção de programas de vigilância e proteção ambiental. Para realizar tal mister, dispõe do Instituto Estadual de Florestas, órgão incumbido de promover a proteção das áreas produtivas com restrição de uso, em especial as Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal, motivo pelo qual foi ele o escolhido como entidade dotada de capacidade tributária para o recolhimento, a fiscalização e a gestão das receitas recolhidas pela TPA.
Acredita-se que o serviço prestado molda-se àqueles que podem ser custeados por taxas, uma vez que podem ser identificados os contribuintes que dão azo à atividade estatal de carboneutralização, e se identificam os adquirentes de combustíveis cuja queima libera os GEEs. É inquestionável que o serviço de carboneutralização também traz benefícios genéricos, não individualizáveis. Isso ocorre, no entanto, com tantos outros serviços custeados por taxas, como o serviço de coleta de lixo ou o serviço de extinção de incêndio. No primeiro, a população em geral é beneficiada pelo recolhimento de lixo urbano, pois se garante ambiente mais hígido e seguro. No segundo, caso ainda que não se valha do serviço prestado pelo Corpo de Bombeiros, a população, tomada genericamente, é protegida pela simples existência da corporação, que pode entrar em ação sempre que necessário.
Os tribunais também já se pronunciaram quanto à constitucionalidade da afetação flexível do valor à prestação do serviço. Esse é o exemplo da Taxa de Segurança Pública - popularmente chamada de Taxa de Incêndio -, que tem apenas parcela da receita afetada à manutenção do Corpo de Bombeiros. O restante da receita é destinado à Secretaria de Estado da Defesa Social.
Por fim, o STF já demonstrou a sua predileção pela tutela dos direitos difusos, em detrimento do formalismo tributário. Ao apreciar a constitucionalidade da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA -, promovida pelo Ibama, a Corte Suprema julgou improcedentes as críticas quanto à técnica tributária empregada na Lei Federal nº 6.938, de 1981, e reafirmou a validade do tributo.
Dessa maneira, aplicamos o mesmo raciocínio a este projeto de lei. É próprio da prestação de serviço de carboneutralização o privilégio comum - assim como é próprio do interesse republicano a promoção desse interesse comum -, entretanto, é compatível com a justiça fiscal a incidência do tributo sobre aqueles que efetivamente poluem, pois, sem essa poluição, não seria necessária a prestação estatal do serviço.
Acrescente-se a isso a especificidade da alíquota, que deve ser progressiva de acordo com a emissão de poluentes, uma vez que quanto maior a emissão dos poluentes, maior a necessidade da prestação do serviço de carboneutralização.
Para estabelecer o valor das alíquotas, foram utilizados dados de custo de conversão das áreas agrícolas, e estes foram relacionados com a emissão de GEEs, em tonelada equivalente de CO2, por unidade de cada tipo de combustível fóssil vendido em postos de abastecimento (gasolina, diesel e gás natural) e com a massa de CO2 sequestrada por hectare de vegetação nativa em 20 anos de condução de recomposição. Os dados técnicos estão demonstrados na tabela a seguir:
Tabela - Cálculo do valor da Taxa de Proteção Ambiental - TPA
Item |
Unidade de Medida |
Gasolina (Litro) |
Diesel (Litro) |
Gás Natural (m3) |
Emissão direta de CO2 por unidade de combustível |
gCO2/un |
2.168 |
2.662 |
1.188 |
Área necessária para carboneutralização de 1000 unidades de combustível fóssil |
m2/1000un |
144 |
177 |
79 |
Unidades de combustível fóssil carboneutralizadas por hectare convertido |
un/ha |
6.944,4 |
56.497,2 |
12.6582,3 |
Custo da carboneutralização por meio da conversão de área em produção (em 20 anos) |
||||
Reflorestamento + manutenção |
R$/ha |
5.746,25 |
||
Valor da Taxa |
Centavos de R$/un |
8,3 |
10,1 |
4,5 |
Valor anual do pagamento por serviços ambientais |
||||
Reflorestamento + manutenção |
R%/ha |
362 |
O estudo da vanguarda tributarista aponta para a aplicação pacífica dos preceitos de direito ambiental na esfera tributária, relativizando os institutos do próprio direito tributário. As escolas jurídicas não podem seguir caminho diverso daquele apontado pela evolução social. O direito tributário não pode ser entendido na contramão da atualidade, mas compreendido como instrumento dinâmico, apto a buscar soluções fiscais e extrafiscais para os problemas cotidianos.
Contamos com o apoio de nossos nobres pares à aprovação deste projeto de lei.
- Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, de Meio Ambiente e de Fiscalização Financeira para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.