PL PROJETO DE LEI 896/2023

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 896/2023

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria da deputada Nayara Rocha, o projeto em análise “institui o Programa de Promoção de Autocuidado e Rede de Apoio para Mães de Crianças com Transtorno do Espectro Autista – TEA –, Síndrome de Down e outras Deficiências no Estado”.

Publicada no Diário do Legislativo de 22/6/2023, a proposição foi distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, de Saúde, de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e de Fiscalização Financeira e Orçamentária.

Vem a matéria, preliminarmente, a esta comissão para receber parecer sobre a sua juridicidade, constitucionalidade e legalidade, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno.

Fundamentação

O projeto de lei em análise pretende instituir o Programa de Promoção de Autocuidado e Rede de Apoio para Mães de Crianças com Transtorno do Espectro Autista – TEA –, Síndrome de Down e Crianças com Deficiência no Estado. Dispõe que o programa tem por objetivo a oferta de suporte e assistência às mães dessas crianças, por meio da criação de centros de apoio materno-infantil. Determina, ainda, nos termos de seu art. 3º, que os centros de apoio materno-infantil contarão com uma equipe multidisciplinar capacitada, composta por profissionais das áreas de saúde, educação e serviço social, que garantirão o atendimento adequado e individualizado das crianças durante sua estadia em suas dependências.

Quanto aos aspectos constitucionais, a matéria diz respeito à proteção e à integração social das pessoas com deficiência e à proteção e defesa da saúde, razão pela qual, nos termos do art. 24, incisos XII e XIV, da Constituição da República, o estado possui competência para legislar concorrentemente com a União e o Distrito Federal.

No que se refere ao exame da iniciativa parlamentar, não existe vedação para que se instaure o processo legislativo no caso em exame. A matéria não está arrolada entre aquelas em que a Constituição deferiu competência ao chefe do Poder Executivo, ao presidente do Tribunal de Justiça, ao presidente do Tribunal de Contas ou à Mesa da Assembleia para, privativamente, iniciar o processo legislativo.

O ordenamento jurídico contempla uma série de disposições voltadas para o atendimento dos chamados hipossuficientes, de modo a possibilitar a efetivação do princípio da igualdade, considerado em sua dimensão substancial, o que importa em dispensar um tratamento preferencial a tais pessoas com vistas a compensar eventuais diferenças.

Nota-se que a legislação de proteção às pessoas com deficiência tem sido ampliada com o intuito de amparar e facilitar o dia a dia de seus responsáveis a fim de viabilizar os cuidados necessários a estes, diminuir a sobrecarga decorrente da situação de dependência e prestação de cuidados prolongados e, em último caso, mitigar a exclusão social, tanto do dependente, quanto do cuidador.

A Lei Federal nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista e, no seu art. 3º, inciso III, dispõe que é seu direito o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde.

Por sua vez, a Lei Federal nº 13.146, de 6 de julho de 2015 – Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência –, prevê, em seu art. 18, § 4º, inciso V, que as ações e os serviços de saúde pública destinados à pessoa com deficiência devem assegurar atendimento psicológico, inclusive para seus familiares e atendentes pessoais.

É preciso, contudo, observar que, em análise jurídica da proposição, verifica-se que há dispositivos em seu conteúdo original que buscam dar um status legal à matéria que, por sua natureza, tem caráter eminentemente administrativo, situada no campo de atuação do Poder Executivo. A instituição de ações ou programas de saúde abrange as atividades e as ações desenvolvidas pela administração pública e pelos seus órgãos e é tarefa que não cabe a lei de iniciativa parlamentar.

Com esse entendimento, tem-se pronunciado exaustivamente o Supremo Tribunal Federal – STF – em inúmeros julgados, em especial:

(…) O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe, desse modo, ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de Poderes, desconstituir, por lei, atos de caráter administrativo que tenham sido editados pelo Poder Executivo, no estrito desempenho de suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação ultra vires do Poder Legislativo, que não pode, em sua atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais. (Medida Cautelar na ADI 2364).

(…) Separação e independência dos Poderes: pesos e contrapesos: imperatividade, no ponto, do modelo federal. 1. Sem embargo de diversidade de modelos concretos, o princípio da divisão dos Poderes, no Estado de Direito, tem sido sempre concebido como instrumento da recíproca limitação deles em favor das liberdades clássicas: daí constituir em traço marcante de todas as suas formulações positivas os “pesos e contrapesos” adotados. 2. A fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é um dos contrapesos da Constituição Federal à separação e independência dos Poderes: cuida-se, porém, de interferência que só a Constituição da República pode legitimar. 3. Do relevo primacial dos “pesos e contrapesos” no paradigma de divisão dos Poderes, segue-se que à norma infraconstitucional – aí incluída, em relação à Federal, a Constituição dos estados-membros –, não é dado criar novas interferências de um Poder na órbita de outro que não derive explícita ou implicitamente de regra ou princípio da Lei Fundamental da República. 4. O poder de fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é outorgado aos órgãos coletivos de cada câmara do Congresso Nacional, no plano federal, e da Assembleia Legislativa, no dos estados; nunca, aos seus membros individualmente, salvo, é claro, quando atuem em representação (ou presentação) de sua Casa ou comissão. III. Interpretação conforme a Constituição: técnica de controle de constitucionalidade que encontra o limite de sua utilização no raio das possibilidades hermenêuticas de extrair do texto uma significação normativa harmônica com a Constituição. (ADI 3046/SP).

Por essa razão, ressalta-se que esta Comissão de Constituição e Justiça já se manifestou diversas vezes pela inconstitucionalidade, antijuridicidade e ilegalidade de projetos de lei que visam instituir ações ou programas de natureza administrativa.

Diante do exposto, a fim de preservar o escopo da proposta e adequá-la aos preceitos constitucionais vigentes, apresentamos a seguir o Substitutivo nº 1, que altera a Lei nº 13.799, de 21 de dezembro de 2000, que dispõe sobre a política estadual dos direitos da pessoa com deficiência e cria o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Conclusão

Em face do exposto, concluímos pela legalidade, constitucionalidade e juridicidade do Projeto de Lei nº 896/2023, na forma do Substitutivo nº 1, a seguir apresentado.

SUBSTITUTIVO Nº 1

Altera o art. 2º da Lei nº 13.799, de 21 de dezembro de 2000, que dispõe sobre a política estadual dos direitos da pessoa com deficiência e cria o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Fica acrescentado ao art. 2º da Lei nº 13.799, de 21 de dezembro de 2000, o seguinte inciso IX:

“Art. 2º – (…)

IX – a oferta de suporte e assistência multidisciplinar para as mães de pessoas com deficiências em centros de apoio materno-infantil.”.

Art. 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 16 de abril de 2024.

Arnaldo Silva, presidente e relator – Lucas Lasmar – Bruno Engler – Thiago Cota – Zé Laviola.