PL PROJETO DE LEI 878/2023

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 878/2023

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria do governador do Estado, a proposição em epígrafe “autoriza o Poder Executivo a prestar contragarantia à União em face das garantias por ela oferecidas nas operações de crédito externo a serem celebradas pelo Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais S/A junto ao New Development Bank”.

Publicado no Diário do Legislativo de 15/6/2023, o projeto foi distribuído para as Comissões de Constituição e Justiça e de Fiscalização Financeira e Orçamentária para parecer.

Cumpre-nos, preliminarmente, examinar a matéria em seus aspectos de juridicidade, constitucionalidade e legalidade, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno.

Fundamentação

A proposição em análise pretende autorizar o Poder Executivo a prestar contragarantia à União em face das garantias por ela oferecidas nas operações de crédito externo em moeda estrangeira a serem celebradas pelo Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais S/A – BDMG junto ao New Development Bank – NDB, até o valor equivalente a US$200.000.000,00 (duzentos milhões de dólares americanos), destinadas ao Programa de Financiamento à Infraestrutura e ao Desenvolvimento Sustentável no Estado de Minas Gerais.

Os recursos obtidos nas operações de créditos serão aplicados exclusivamente na execução do Programa de Financiamento à Infraestrutura e ao Desenvolvimento Sustentável no Estado de Minas Gerais, executado pelo BDMG.

Nos termos do art. 2º da proposição, o Poder Executivo poderá oferecer à União, a título de contragarantia às operações de crédito, em observância ao § 4º do art. 167 da Constituição da República: suas cotas da repartição constitucional das receitas tributárias previstas no art. 157 e na alínea “a” do inciso I e inciso II do art. 159, ambos da Constituição da República; e suas receitas tributárias próprias previstas no art. 155 da Constituição da República.

Em sua justificação, o autor da proposição explica que o programa de financiamento a ser executado pelo BDMG, ao qual serão direcionados os recursos objeto da operação financeira, tem como objetivo fomentar o investimento em infraestrutura no Estado, abrangendo tanto o setor público quanto o privado, buscando o desenvolvimento de áreas como transporte e mobilidade urbana, saneamento básico, energia renovável e eficiência energética, inovação, além de outros vinculados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Explica também que se trata de matéria de alta relevância estratégica e amplo interesse social, com potencial estimado de geração de mais de vinte e quatro mil novos postos de trabalho e de aumento de R$2.000.000.000,00 (dois bilhões de reais) em investimentos em infraestrutura pelos setores público e privado até 2026.

Apresentada uma breve síntese da proposição, passamos a analisar os aspectos jurídico-constitucionais que cercam o tema.

Quanto aos aspectos da competência legislativa e da iniciativa para a deflagração do processo legislativo, não vislumbramos óbices jurídico-constitucionais capazes de impedir o prosseguimento da sua tramitação.

Ao tratar de matéria consistente em norma específica de direito financeiro e orçamentário, a proposição observa tanto a competência legislativa suplementar do Estado prevista no art. 24, incisos I e II, da Constituição da República, como a iniciativa do governador do Estado para deflagração do processo legislativo prevista no art. 66, III, da Constituição estadual.

Quanto ao conteúdo, também não encontramos óbices ao prosseguimento da tramitação.

Cabe lembrar que a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal –, em seu art. 29, inciso IV, define a concessão de garantia como o compromisso de adimplência de obrigação financeira ou contratual assumida por ente da Federação ou entidade a ele vinculada.

De acordo com as lições de Misabel Abreu Machado Derzi, “a contragarantia tem a mesma natureza e extensão da garantia, ou seja, qualquer caução contraprestada pelo devedor ao garantidor, terceiro estranho ao vínculo obrigacional que lhe garantiu o pagamento” (Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal, 4ª ed., Ed. Saraiva, 2009, p. 290).

A Lei de Responsabilidade Fiscal, em sua Seção V, que trata da garantia e da contragarantia, prescreve, no art. 40, que os entes poderão conceder garantia em operações de crédito internas ou externas, observado o disposto nesse artigo e no art. 32. Este último traça normas gerais sobre a contratação de operações de crédito pelos entes da Federação. O principal requisito previsto no artigo é que o pleito formalizado pelo Estado ao Ministério da Fazenda esteja fundamentado em parecer elaborado por seus órgãos técnicos e jurídicos, demonstrando a relação entre o custo e o benefício e o interesse social e econômico da operação.

Além disso, o cumprimento dos limites e das condições relativas à realização de operações de crédito de cada ente da Federação, inclusive das empresas por ele controladas, deve ser verificado pelo Ministério da Fazenda. O parecer que fundamenta o pleito deve considerar: 1) a existência de prévia e expressa autorização para a contratação em lei específica, na Lei Orçamentária Anual ou em créditos adicionais; 2) a inclusão, no orçamento ou em créditos adicionais, dos recursos provenientes da operação; 3) a observância dos limites e das condições fixadas pelo Senado Federal e 4) a autorização específica do Senado, quando se tratar de operação de crédito externo.

O art. 40 traz ainda as normas gerais sobre garantia e contragarantia. Em seu § 1º, determina que a garantia está condicionada ao oferecimento de contragarantia, em valor igual ou superior ao da garantia a ser concedida, e à adimplência da entidade que a pleitear quanto a suas obrigações junto ao garantidor e às entidades por este controladas, sendo que a contragarantia exigida pela União dos estados pode consistir na vinculação das receitas tributárias diretamente arrecadadas e das provenientes de transferências constitucionais, com outorga de poderes ao garantidor para retê-las e empregar o respectivo valor na liquidação da dívida vencida.

No caso de operação de crédito contraída com organismo financeiro internacional ou com instituição federal de crédito e fomento para o repasse de recursos externos, a União só presta garantia a ente que atenda, além da prestação da contragarantia, às exigências legais para o recebimento de transferências voluntárias.

É nula a garantia concedida acima dos limites fixados pelo Senado Federal e também é vedado às entidades da administração indireta, inclusive suas empresas controladas e subsidiárias, conceder garantia, ainda que com recursos de fundos.

Saliente-se, ainda, que, quando honrar dívida de outro ente, em razão de garantia prestada, a União pode condicionar as transferências constitucionais ao ressarcimento daquele pagamento.

De acordo com o art. 61, inciso IV, da Carta Mineira, compete à Assembleia Legislativa dispor sobre dívida pública, abertura e operação de crédito.

A efetivação da operação de crédito depende, ainda, do cumprimento do que dispõe o art. 167, inciso III, da Carta da República, que veda a realização de operações de crédito que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo, por maioria absoluta, requisito também previsto no art. 32 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Cumpre destacar que a autorização legislativa é apenas uma condição prévia para a efetivação do empréstimo e a prestação de garantia ou contragarantia. Outras medidas de cunho normativo ou administrativo ainda hão de ser tomadas para que a pretensão do Poder Executivo se concretize em definitivo.

Diante dos aspectos aqui apresentados, não encontramos óbices capazes de impedir o prosseguimento da sua tramitação. Isso porque a proposição observa os contornos da competência legislativa estadual e da iniciativa do chefe do Poder Executivo.

A proposição é uma autorização para a concessão da contragarantia a qual somente será concretizada após posterior verificação pelo Ministério da Fazenda acerca do preenchimento dos requisitos exigidos pela LRF, conforme prevê o art. 40 combinado com o art. 32 da LRF.

Conclusão

Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 878/2023.

Sala das Comissões, 4 de julho de 2023.

Arnaldo Silva, presidente e relator – Charles Santos – Doutor Jean Freire – Thiago Cota – Zé Laviola.