PL PROJETO DE LEI 3644/2016

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 3.644/2016

Comissão de Transporte, Comunicação e Obras Públicas

Relatório

O Projeto de Lei nº 3.644/2016, de autoria da deputada Ione Pinheiro, pretende criar o Programa Parada Segura, para mulheres, em horário noturno, no itinerário dos ônibus de transporte coletivo urbano.

A proposição foi distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, de Defesa dos Direitos da Mulher, de Transporte, Comunicação e Obras Públicas e de Desenvolvimento Econômico.

Em análise preliminar, a Comissão de Constituição e Justiça concluiu pela constitucionalidade, legalidade e juridicidade do projeto na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou. A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, por sua vez, opinou pela aprovação, na forma do Substitutivo nº 2º, por ela apresentado.

Vem agora a proposição a esta comissão para que também sobre ela emita parecer quanto ao mérito, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, XII, do Regimento Interno.

Fundamentação

A proposição em análise objetiva instituir no Estado o Programa Parada Segura, com vistas a garantir às mulheres a possibilidade de desembarcar fora dos pontos regulamentados para embarque e desembarque – PEDs – das linhas de transporte coletivo no horário noturno. De maneira geral, define o público-alvo, os horários e as vias em que tal parada seria permitida e as exceções à nova regra proposta, bem como estipula obrigações para as empresas concessionárias do transporte coletivo no intuito de divulgar e cumprir suas disposições.

Em sua análise, a Comissão de Constituição e Justiça argumentou, entre outras questões, que a matéria poderia versar apenas sobre o transporte coletivo de jurisdição estadual – excluindo, portanto, o interestadual e o municipal – e que deveria ser destinada a todas as pessoas usuárias do serviço, e não só às mulheres, diferentemente do que previa o texto original. Para materializar seu posicionamento, apresentou o Substitutivo nº 1.

Já a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher trouxe, entre outras colocações, informações e dados para ressaltar o grau de violência sofrido pelo público feminino, apontou que as mulheres ficam muito vulneráveis a estupros e roubos no traslado entre o ponto de ônibus e sua residência, quando no período noturno, e que em razão desses aspectos, necessitariam ser objeto de políticas públicas e ações específicas para elas. Assim, opinou que a intenção do projeto original deveria ser mantida – a de direcionar o programa Parada Segura para as mulheres –, e que o benefício deveria ser ampliado também para o embarque das passageiras, o que motivou a apresentação do Substitutivo nº 2.

No que compete a esta comissão avaliar, corroboramos a preocupação da deputada autora e da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher com o alto grau de violência sofrido pelas mulheres e com a necessidade de se instituírem políticas públicas visando ao enfrentamento desse problema. Essa coincidência de posicionamentos, contudo, não significa, necessariamente, que concordamos em propor a adoção das mesmas ações ora propostas.

Assim, em nosso entendimento, incluir no público-alvo do programa todos os usuários do transporte coletivo, independentemente do gênero, não deixará as usuárias mulheres desassistidas pela iniciativa pretendida. Pelo fato de serem elas as principais vítimas de violência, como corretamente indicam os dados trazidos pela deputada autora e pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, a permissão de que também homens possam desembarcar fora dos pontos regulamentados em nada interferirá na eficácia da medida.

Além disso, autorizar que todos os usuários possam desembarcar fora dos pontos regulamentados traz facilitadores de ordem prática que muito podem contribuir para a aplicação e a aceitação do programa. Basta pensarmos, por exemplo, em uma situação na qual um homem e uma mulher têm a intenção de desembarcar num mesmo local, fora do PED. Como justificar que somente a mulher possa fazê-lo e o homem não? Outros públicos vulneráveis, como idosos, adolescentes e homens com deficiência não mereceriam tal prerrogativa? Que grau de conflito entre os operadores do transporte coletivo e os usuários poderia advir no caso de esse programa ser destinado apenas às mulheres? Essas e outras questões poderiam implicar que a norma não fosse realmente aplicada, o que nos leva a concordar com o entendimento da Comissão de Constituição e Justiça, de ampliar o público destinatário da medida proposta.

Já a inovação trazida pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, de incluir também a permissão do embarque – e não só o desembarque – fora dos pontos regulamentados, nos parece bastante pertinente e, inclusive, já encontra guarida nos ônibus municipais de Belo Horizonte, nos termos da Portaria DRO 002/2002, da Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte – BHtrans, citada nos pareceres pelas comissões que nos antecederam.

Além dessas questões, consideramos importante também abordar algumas outras, igualmente caras à temática desta comissão. Uma delas diz respeito a sistemas, veículos e linhas aos quais a norma se aplicaria. Observamos que o texto original e os substitutivos propostos anteriormente divergem entre si acerca desse ponto. Importante registrarmos que, em Minas Gerais, existem inúmeros sistemas de transporte coletivo, cada qual com suas especificidades. Quanto aos sistemas municipais, o parecer da Comissão de Constituição e Justiça já afastou a possibilidade de eles serem objeto desta matéria, por significar interferência indevida na esfera de outros entes federados, com o que concordamos. Igualmente o sistema de transporte interestadual, de jurisdição da União, não pode ser alcançado pela norma.

Restam, assim, os sistemas gerenciados pelo Estado de Minas Gerais: o intermunicipal rodoviário e o metropolitano, conforme definido no Decreto nº 44.603/2007. O primeiro possui como característica fazer a ligação entre municípios do Estado. Utiliza na maior parte do tempo as rodovias, com veículos de maior porte, que têm apenas uma porta. Como é específico para tal fim, não pode transitar com passageiros em pé e opera majoritariamente por meio de compra antecipada de passagens. Ao iniciar uma viagem, o motorista possui um mapa de ocupação do veículo e sabe de antemão o destino de parcela considerável dos passageiros. Pode haver embarques e desembarques ao longo do itinerário, em pontos de parada e seções pré-definidos, com preços de tarifa proporcionais.

Lembramos, que existem algumas linhas do transporte rodoviário intermunicipal que operam de forma um pouco distinta, definidas no decreto supracitado como serviço comercial. Em geral, têm veículos menores, alguns com duas portas, permissão para o tráfego de passageiros em pé, sob condições, e algumas delas não possuem seções com tarifas diferenciadas. Essas linhas ligam algumas localidades específicas de municípios mineiros relativamente próximos entre si e trafegam mais em áreas urbanas que o transporte rodoviário convencional.

Por seu turno, o transporte coletivo metropolitano opera nas regiões metropolitanas do Estado, nos mesmos moldes dos sistemas municipais mas, por ligarem localidades de municípios distintos, é gerenciado pelo Estado de Minas Gerais. Os veículos são em sua maioria de menor porte, possuem duas ou mais portas e tarifas únicas para cada linha. De modo geral, trafegam em áreas e vias urbanas e são autorizados a parar para embarque e desembarque apenas nos PEDs regulamentados.

Parece-nos clara a conclusão da inviabilidade de a norma que ora se discute se aplicar aos veículos do transporte coletivo intermunicipal rodoviário, em função de suas características operacionais. Entre outras impossibilidades, destacamos que seria muito arriscado um veículo desse serviço parar em qualquer ponto do acostamento de uma rodovia. Poderia também haver conflitos contratuais entre concessões de linhas diferentes, caso o passageiro de uma linha de longa distância pedisse para embarcar ou desembarcar em um ponto intermediário que não fosse seção daquela linha.

Assim, entendemos que a proposição deveria abarcar o sistema de transporte coletivo metropolitano, que guarda semelhança com os sistemas municipais, entre os quais, como já apontado nos pareceres das comissões precedentes, o de Belo Horizonte, que já regulamentou a possibilidade de os veículos pararem fora dos pontos regulamentados e definiu critérios específicos que devem atender às demandas dos usuários da cidade. Consideramos, outrossim, que as linhas do transporte coletivo intermunicipal rodoviário, classificadas como serviço comercial, também poderiam ser objeto da proposição, quando os veículos estiverem trafegando em áreas urbanas.

Importante destacar que a regulamentação na Capital se deu por meio de portaria, como já mencionado. Nela, há um detalhamento das regras, como a diferenciação entre dias e períodos em que a parada é permitida. Há também a nominação das vias em que a disposição não se aplicaria. Parece-nos que, assim como em Belo Horizonte, o detalhamento das regras deveria ser de responsabilidade do órgão gestor. Somente ele poderá avaliar as peculiaridades das linhas que gerencia e defini-las com precisão, sem causar riscos aos usuários, aos operadores e demais cidadãos.

Ressaltamos, nesse mesmo sentido, que o sistema metropolitano da RMBH ganhou complexidade com a operação de parte de sua rede como BRT – Bus Rapid Transit –, o que pressupõe o tráfego dos ônibus em pistas exclusivas, a existência de linhas diretas e de veículos articulados, o pré-pagamento da passagem e outras características que poderiam impactar na aplicabilidade da futura norma tal como veiculada nos textos original e nos substitutivos apresentados durante a tramitação desta matéria.

Aproveitamos a oportunidade para também sugerir que o programa também possa se aplicar aos finais de semana e feriados, visto que o tráfego de pessoas e veículos reduz-se significativamente nesses períodos, o que justificaria e possibilitaria essa inovação, tal como já ocorre em Belo Horizonte.

Assim, optamos por apresentar um novo substitutivo, para materializar todas as nossas ponderações e sugestões e para adequar o texto a melhor técnica legislativa.

Conclusão

Diante do exposto, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei nº 3.644/2016, em 1º turno, na forma do Substitutivo nº 3, a seguir redigido, e pela rejeição dos Substitutivos nºs 1, da Comissão de Constituição e Justiça, e 2, da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.

SUBSTITUTIVO Nº 3

Dispõe sobre a “Parada Segura” no transporte coletivo metropolitano e no serviço comercial do transporte coletivo intermunicipal rodoviário gerenciados pelo Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – É obrigatória a “Parada Segura” no transporte coletivo metropolitano e no serviço comercial do transporte coletivo intermunicipal rodoviário gerenciados pelo Estado.

Parágrafo único – Para efeitos desta lei, entende-se por “Parada Segura” a obrigatoriedade de o motorista do ônibus, quando solicitado por usuário, parar o veículo fora dos pontos de embarque e desembarque regulamentados, durante a noite e nos finais de semana e feriados, dentro do itinerário previsto da linha, com a observância da legislação de trânsito e desde que não haja riscos à segurança de veículos e pedestres.

Art. 2º – Regulamento disporá sobre os dias e horários em que se aplicará a “Parada Segura” e sobre as exceções ao disposto nesta lei, incluídas as linhas, vias e localidades em que a obrigatoriedade prevista no art. 1º não se aplicará, bem como sobre as formas de divulgação da “Parada Segura” aos usuários.

Art. 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 3 de dezembro de 2019.

Léo Portela, presidente – Professor Irineu, relator – Cleitinho Azevedo.