PL PROJETO DE LEI 2383/2020

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 2.383/2020

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria da deputada Beatriz Cerqueira, a proposição em epígrafe “dispõe sobre a Política Estadual de Incentivo à Iniciação da Pesquisa Científica e Estudos nas escolas públicas da educação básica da rede estadual de ensino e dá outras providências”.

Publicada no Diário do Legislativo em 4/2/2021, a proposição foi distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, Administração Pública e de Educação, Ciência e Tecnologia para receber parecer.

Compete a esta comissão, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno, examinar a juridicidade, a constitucionalidade e a legalidade da proposta.

Fundamentação

A proposição em exame dispõe, em síntese, sobre a Política Estadual de Incentivo à Iniciação da Pesquisa Científica e Estudos nas escolas públicas da educação básica da rede estadual de ensino.

A autora destaca, em sua justificação, que “a pesquisa contribui, sobremaneira, para a promoção das atividades humanísticas, científicas e tecnológicas como estratégia para o desenvolvimento econômico e social do Estado, e de toda a humanidade”.

Ainda em sua justificação, a autora destaca que na pandemia de Covid-19 “restou demonstrada a importância da ciência na busca de solução para conter a grave crise de saúde pública”. Acrescentou ainda que “é necessário maior investimento por parte do Poder Público em ações que fortaleçam e estimulem o desenvolvimento da ciência, pesquisa e tecnologia a partir do envolvimento dos estudantes das escolas públicas”.

Os artigos primeiro e segundo da proposição tratam da instituição da referida política e da sua finalidade. O artigo terceiro dispõe que a Política de Incentivo à Iniciação Científica e Estudos “se dará por meio da formação de grupos de iniciação à pesquisa científica e estudos nas escolas estaduais, sendo, preferencialmente, para estudantes do ensino médio”. O artigo quarto estabelece as diretrizes da política a que se refere a proposição. O artigo quinto pretende autorizar o Executivo estadual a formar parcerias ou convênios com instituições de pesquisa, apontando, de forma específica, cada uma delas. O artigo sexto dispõe sobre a forma de funcionamento dos grupos de iniciação à pesquisa científica. O artigo sétimo dispõe sobre a possibilidade de destinação de dotação orçamentária. O artigo oitavo dispõe sobre o prazo de regulamentação da lei e o artigo nono contém a cláusula de vigência.

Do ponto de vista jurídico-formal, não há óbice à tramitação da matéria, a qual se insere no âmbito da competência legislativa concorrente, à vista do disposto no inciso IX do art. 24 da Constituição da República.

Ademais, a matéria não se encontra entre aquelas de iniciativa reservada, nos termos do art. 66 da Constituição do Estado e, portanto, a propositura por parlamentar é viável. Vale registrar, a respeito, que o cerne do projeto de lei em exame não interfere na organização administrativa do Poder Executivo, tampouco dispõe sobre a competência de seus órgãos.

A temática da proposição articula-se com o disposto na Lei nº 23.197, de 26 de dezembro de 2018, que instituiu o Plano Estadual de Educação – PEE – para o período de 2018 a 2027, notadamente com a meta 2.15 do referido plano. A norma em comento tem a seguinte redação:

“Meta 2 – Universalização do ensino fundamental de nove anos para a população de seis a quatorze anos, com a garantia de que, no mínimo, 95% (noventa e cinco por cento) dos estudantes concluam essa etapa da educação na idade recomendada até o final do último ano de vigência deste PEE.

2.15 – Desenvolver, em parceria com Instituições de Ensino Superior – IES – e Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação – ICTs –, ações para estimular o interesse dos estudantes do ensino fundamental pela pesquisa científica”.

O cerne da proposição também guarda relação com a Base Nacional Comum Curricular – BNCC. Este é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da educação básica, conforme disposto no art. 26 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

No âmbito da BNCC, existem numerosas referências à investigação científica, seja como eixos estruturantes dos itinerários formativos, seja como estratégia da escola que acolhe juventudes.

Ao descrever a escola que acolhe juventudes, a BNCC faz os seguintes registros:

Para tanto, a escola que acolhe as juventudes precisa se estruturar de maneira a: (...)

- viabilizar o acesso dos estudantes às bases científicas e tecnológicas dos processos de produção do mundo contemporâneo, relacionando teoria e prática – ou o conhecimento teórico à resolução de problemas da realidade social, cultural ou natural; (...)

– proporcionar uma cultura favorável ao desenvolvimento de atitudes, capacidades e valores que promovam o empreendedorismo (criatividade, inovação, organização, planejamento, responsabilidade, liderança, colaboração, visão de futuro, assunção de riscos, resiliência e curiosidade científica, entre outros), entendido como competência essencial ao desenvolvimento pessoal, à cidadania ativa, à inclusão social e à empregabilidade; (...)”.

Sobre o papel da investigação científica nos itinerários formativos no ensino médio, a BNCC faz os seguintes registros:

“Assim, a oferta de diferentes itinerários formativos pelas escolas deve considerar a realidade local, os anseios da comunidade escolar e os recursos físicos, materiais e humanos das redes e instituições escolares de forma a propiciar aos estudantes possibilidades efetivas para construir e desenvolver seus projetos de vida e se integrar de forma consciente e autônoma na vida cidadã e no mundo do trabalho. Para tanto, os itinerários devem garantir a apropriação de procedimentos cognitivos e o uso de metodologias que favoreçam o protagonismo juvenil, e organizar-se em torno de um ou mais dos seguintes eixos estruturantes:

I – investigação científica: supõe o aprofundamento de conceitos fundantes das ciências para a interpretação de ideias, fenômenos e processos para serem utilizados em procedimentos de investigação voltados ao enfrentamento de situações cotidianas e demandas locais e coletivas, e a proposição de intervenções que considerem o desenvolvimento local e a melhoria da qualidade de vida da comunidade; (…)”.

Assim, entendemos que a proposição suplementa de forma adequada as normas nacionais vigentes e está alinhada à legislação estadual sobre a matéria educacional.

Resta, ainda, pontuar alguns aspectos que merecem reparo no texto.

A primeira situação diz respeito ao art. 5º da proposição que pretende autorizar a celebração de parcerias e convênios. Tal cláusula invade a esfera de ação privativa do Poder Executivo e viola o princípio da separação dos Poderes. Esta foi a razão pela qual o TJMG declarou inconstitucional o inc. XXV do art. 62 da Constituição Estadual (ADI 165. Acórdão publicado no Diário da Justiça em 26/9/1997). Por este motivo, faz-se necessária emenda supressiva ao referido art. 5 da proposição.

Por motivo semelhante deve ser excluído o § 3º do art. 6º da proposição, pois dispõe, de modo específico, sobre a organização das funções nos grupos de iniciação científica. Desse modo, o dispositivo interfere na organização interna do Poder Executivo e viola a regra de iniciativa privativa na matéria.

Também devem ser excluídos os arts. 7º e 8º. No caso do art. 7º por tratar de matéria orçamentária que, além de depender de iniciativa privativa do governador, deve tramitar nessa Casa na forma do processo legislativo da matéria orçamentária. No caso do art. 8º, ele deve ser retirado por estabelecer prazo para regulamentação da lei, cláusula similar a outras cuja inconstitucionalidade já foi reconhecida.

Tais exclusões não atingem o cerne da proposição e esta ainda poderá, no contexto da discussão de mérito, ser aperfeiçoada sob a forma de um substitutivo.

Conclusão

Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 2.383/2020, com a Emenda nº 1 a seguir apresentada.

EMENDA Nº 1

Suprima-se o art. 5º, o § 3º do art. 6º, o art. 7º e o art. 8º.

Sala das Comissões, 13 de julho de 2021.

Charles Santos, presidente – Sávio Souza Cruz, relator – Bruno Engler – Cristiano Silveira – Guilherme da Cunha.