PL PROJETO DE LEI 2218/2020

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 2.218/2020

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria do deputado Cristiano Silveira, a proposição em epígrafe “institui o Sistema Estadual de Atendimento Integrado à Pessoa com Transtornos do Espectro Autista no âmbito do Estado de Minas Gerais e dá outras providências”.

Publicada no Diário do Legislativo, em 16/10/2020, a proposição foi distribuída às Comissões de Comissões de Constituição e Justiça, de Defesa da Pessoa com Deficiência e de Fiscalização Financeira e Orçamentária para receber parecer.

Compete a esta comissão, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno, examinar a juridicidade, a constitucionalidade e a legalidade da proposta.

Fundamentação

A proposição em exame dispõe, em síntese, sobre a instituição do Sistema Estadual de Atendimento Integrado à Pessoa com Transtornos do Espectro Autista – TEA. Tal sistema destina-se à promoção do atendimento às necessidades específicas das pessoas com Transtornos do Espectro Autista.

O autor, em sua justificação argumenta:

“Nas últimas décadas, o Brasil tem consolidado sua política para pessoa com Transtornos do Espectro Autista. Contudo, ainda faltam medidas legais efetivas para garantir os direitos e possibilitar a igualdade de fato para esses cidadãos. Nesse sentido, a Lei Federal nº 12.764, de 2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista é um passo importante. Em Minas Gerais, a Assembleia Legislativa se destacou nos últimos anos com a discussão e a aprovação de legislações importantes em defesa da pessoa com TEA.

Não obstante, existem gargalos em áreas fundamentais para uma vida plena, notadamente saúde e educação. É necessário, portanto, implementar sistemas integrados de cuidado, inclusão e amparo para as pessoas com TEA e suas famílias. Este projeto de lei visa inovar nas políticas mineiras precisamente por trazer o caráter integrativo não só entre as diferentes áreas de atuação do Estado, mas também entre os diversos órgãos e entes federativos.”

Do ponto de vista jurídico-formal, não há óbice à tramitação da matéria, a qual se insere no âmbito da competência legislativa concorrente, à vista do disposto nos incisos XII e XIV do art. 24 da Constituição da República.

Ademais, a matéria não se encontra entre aquelas de iniciativa reservada, nos termos do art. 66 da Constituição do Estado e, portanto, a propositura por parlamentar é viável. Vale registrar, a respeito, que o cerne do projeto de lei em exame não interfere na organização administrativa do Poder Executivo, tampouco dispõe sobre a competência de seus órgãos.

O art. 1º do projeto de lei declara a instituição do referido sistema e suas finalidades. O art. 2º estabelece o significado dos conceitos de “tecnologia assistiva”, “rastreamento precoce” e de “profissional de apoio escolar”. O art. 3º estabelece que a atendimento pelo Estado à pessoa com TEA poderá ser prestado de forma integrada, em regime de colaboração com os municípios e com assistência da União, pelos serviços de saúde, educação e assistência social. O art. 5º garante a educação da pessoa com TEA dentro do mesmo ambiente escolar dos demais alunos. O art. 8º estabelece que o Estado buscará formas de incentivar o desenvolvimento de pesquisas e projetos multidisciplinares com foco no autismo e na melhoria da qualidade de vida das pessoas com TEA. O art. 10 estabelece que nos processos de tomada de decisão relativos às pessoas com TEA, o Estado promoverá a audiência das pessoas e entidades interessadas.

Tais disposições estão alinhadas ao disposto na Lei Federal nº 12.764, de 2012, e representam, de forma coerente com o campo de atuação da competência legislativa concorrente, o desdobramento e a densificação de suas determinações no âmbito estadual. Alguns outros dispositivos merecem, ainda, registros específicos.

O art. 4º estabelece que o Estado disponibilizará “avaliação por equipe multiprofissional para rastreamento precoce de possíveis sinais de autismo com vistas à intervenção precoce, à reabilitação e à atenção integral (...)”. Com esse propósito o § 1º do referido dispositivo estabelece um rol apriorístico com 16 especialidades de atenção à saúde, além de uma cláusula segundo a qual outras especialidades, não listadas, podem ser incluídas caso o profissional de saúde entenda necessário. Ocorre que estabelecer, em lei, um rol tão extenso de especialidades não é de boa técnica legislativa. Mormente quando a enumeração de especialidades, de caráter nitidamente exemplificativo, é seguida de cláusula de ampliação do rol, a critério do profissional de saúde. As características e as necessidades das pessoas com TEA são muito particulares e, assim, a indicação da terapêutica necessária deve ser indicada e motivada em cada caso concreto.

O art. 6º dispõe sobre as ações que o Estado, por meio de suas secretarias competentes, poderá realizar em cumprimento aos objetivos da lei. O caput de tal dispositivo contém, todavia, menção muito concreta a órgãos do Poder Executivo. Tal especificação deve ser evitada para que seja preservada a prerrogativa de auto-organização dos Poderes.

Ademais, o parágrafo único do art. 6º, assim como o art. 7º, autorizam o Estado a firmar parcerias e convênios com o propósito de fazer cumprir determinações da lei. Tais cláusulas invadem a esfera de ação privativa do Poder Executivo e violam o princípio da separação dos Poderes. Esta foi a razão pela qual o TJMG declarou inconstitucional o inc. XXV do art. 62 da Constituição Estadual (ADI 165. Acórdão publicado no Diário da Justiça em 26/9/1997).

Por fundamento semelhante não se coaduna com o ordenamento jurídico a proposta contida no art. 9º do projeto de lei em exame, visto que tal dispositivo autoriza o Executivo a regulamentar e gerenciar a utilização dos recursos humanos e materiais necessários à execução da lei. Isso porque a autorização legislativa para execução de um determinado programa e de certa competência autoriza, de modo implícito, todas as providências administrativas conexas, sendo, portanto, desnecessário o disposto no referido art. 9º da proposição.

Para correção dos óbices apontados constam, na conclusão deste parecer, emendas que visam o aperfeiçoamento da matéria. Tais modificações não atingem o cerne da proposição e esta ainda poderá, no contexto da discussão de mérito, ser aperfeiçoada sob a forma de um substitutivo.

Conclusão

Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 2.218/2020 com as Emenda nº 1, 2 e 3, a seguir apresentadas.

EMENDA Nº 1

Dê-se ao § 1º do art. 4º do Projeto de Lei nº 2.218/2020 a seguinte redação:

“§ 1º – A intervenção precoce, a reabilitação e a atenção integral citados no caput deste artigo serão decorrentes de atendimentos nas especialidades que o profissional de saúde entender por necessária.”

EMENDA Nº 2

Dê-se ao caput do art. 6º do Projeto de Lei nº 2.218/2020 a seguinte redação:

“Art. 6º – O Estado, por meio de seus órgãos competentes, poderá:”

EMENDA Nº 3

Suprimam-se o parágrafo único do art. 6º, o art. 7º e o art. 9º do Projeto de Lei nº 2.218/2020.

Sala das Comissões, 10 de agosto de 2021.

Charles Santos, presidente e relator – Bruno Engler – Cristiano Silveira – Glaycon Franco – Guilherme da Cunha.