PL PROJETO DE LEI 152/2019

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 152/2019

Comissão de Segurança Pública

Relatório

De autoria do deputado João Leite, o Projeto de Lei nº 152/2019 “obriga os hospitais públicos e privados a comunicarem às delegacias de polícia, quando do atendimento em suas unidades de pronto atendimento, os casos de idosos, mulheres, crianças e adolescentes vítimas de agressões físicas” e foi distribuído às Comissões de Constituição e Justiça, de Segurança Pública e de Defesa dos Direitos da Mulher, para receber parecer.

A Comissão de Constituição e Justiça concluiu pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade da matéria na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou.

Cabe agora a esta comissão emitir parecer sobre o mérito, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, XV, do Regimento Interno.

Fundamentação

O Projeto de Lei nº 152/2019 pretende obrigar os hospitais públicos e privados a comunicarem às delegacias de polícia os casos de idosos, mulheres, crianças e adolescentes vítimas de agressões físicas, quando tais casos forem atendidos em suas unidades de pronto atendimento. A proposição visa, conforme evidenciado por sua justificação, contribuir para o enfrentamento da violência contra esses segmentos, a qual seria praticada, muitas das vezes, “por familiares ou outras pessoas que vivem no mesmo domicílio”, o que levaria as vítimas a não registrarem a ocorrência “seja por medo de represálias ou vergonha de ter seus problemas expostos ou até mesmo para não causar transtorno, (...) aceitando o desgaste psicológico causado pela sensação de impunidade, e assim abrindo espaço a se tornar hábito, e impossibilitando, assim, a ação do Estado no sentido de promover a justiça”. Ainda segundo a sua justificação, ao sugerir a obrigatoriedade da comunicação, o projeto em comento estaria atendendo a reivindicações acerca da necessidade dos serviços de saúde assumirem, para além da atenção a tais vítimas, essa responsabilidade, de modo a tentar diminuir essa prática criminosa.

A Comissão de Constituição e Justiça ressaltou inicialmente, em seu parecer, “a inexistência de impedimentos formais ou materiais de ordem constitucional que inviabilizem a tramitação da proposta nesta Casa Legislativa”. No entanto, ponderou, em seguida, acerca da falta de originalidade de parte da proposição, “condição inarredável para a edição de uma lei nova”, haja vista já existirem leis, em Minas Gerais, que disciplinam em parte a matéria: a Lei nº 17.249, de 2007, que criou a Notificação Compulsória de Violência contra o Idoso; e a Lei nº 15.218, de 2004, que criou a Notificação Compulsória de Violência contra a Mulher (e a Comissão de Monitoramento da Violência contra a Mulher). Dessa forma, apresentou o Substitutivo nº 1, a fim de suprir lacuna e criar, no Estado, a compulsoriedade de notificação, para estabelecimentos públicos ou privados de serviço de saúde, à autoridade policial acerca de atendimentos médicos a casos sugestivos de violência física contra criança ou adolescente.

No tocante ao mérito da proposição sob a ótica da segurança pública, deve-se enfatizar que, de fato, a prática de violência contra os segmentos ditos vulneráveis infelizmente constitui uma realidade, assim como a subnotificação desses casos às instâncias competentes. Idosos, mulheres e crianças e adolescentes, entre outros públicos, encaixam-se nesse perfil e têm sido vítimas contumazes de abusos e maus-tratos – não só físicos, mas também sexuais, psicológicos, morais e patrimoniais –, comumente no próprio ambiente intrafamiliar.

Nesse cenário, a subnotificação constitui um desafio constante, a ser enfrentado com a consciência de sua centralidade no combate ao problema. Afinal, apenas em face de dados fidedignos e de um sistema que permita de fato encarar essa dura realidade, oferecendo às vítimas todo o amparo necessário e a consciência acerca da gravidade da situação, será possível reverter esse quadro, em que idosos, mulheres e crianças e adolescentes se veem isolados, até mesmo por questões estruturais e culturais as quais, por vezes, não lhes permitem sequer se identificarem como vítimas. Relevante também pontuar que a constatação desse processo de vitimização, o reconhecimento desse tipo de violência como problema de saúde pública e as políticas de notificação compulsória sobre tal violência são fenômenos relativamente recentes, não só no Brasil, mas também no mundo. No caso brasileiro, tem-se a previsão de:

– compulsoriedade de notificação, pelos serviços de saúde públicos e privados a diversos órgãos, de violência suspeita ou confirmada praticada contra idosos no art. 19 da Lei Federal nº 10.741, de 2003 (Estatuto do Idoso);

– obrigatoriedade de notificação de casos de violência contra mulheres atendidas em serviços de saúde públicos ou privados na Lei Federal nº 10.778, de 2003, regulamentada pelo Decreto Federal nº 5.099, de 2004;

– obrigatoriedade de comunicação ao Conselho Tutelar de casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, tratamento cruel ou degradante ou maus-tratos contra criança ou adolescente no art. 13 da Lei Federal nº 8.069, de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);

– notificação compulsória de violência doméstica, sexual e/ou outras violências no item 45 do Anexo I da Portaria nº 104, de 25/1/2011, do Ministério da Saúde (define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Internacional 2005 – RSI 2005 –, a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde).

Na esfera estadual, tem-se as já mencionadas Leis nºs 15.218, de 2004, e 17.249, de 2007. Esse arcabouço jurídico revela: por um lado, a relevância da temática, evidenciada pelas tentativas de cercar o problema, inclusive na perspectiva do enfrentamento da subnotificação; por outro, e conforme apontou o parecer da Comissão de Constituição e Justiça, uma lacuna a ser preenchida na legislação estadual no tocante à compulsoriedade da notificação no caso de a vítima ser criança ou adolescente. Portanto, concordamos com a pertinência da apresentação de um substitutivo ao projeto de lei em comento; no entanto, com vistas a abarcar todas as adequações necessárias ao aperfeiçoamento da proposição na ótica da segurança pública, bem como no prisma de uma melhor proteção a crianças e adolescentes vítimas de violência, apresentamos, ao final deste parecer, o Substitutivo nº 2.

Conclusão

Em face do exposto, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei nº 152/2019, no 1º turno, na forma do Substitutivo nº 2, a seguir apresentado.

SUBSTITUTIVO Nº 2

Institui a Notificação Compulsória da Violência contra a Criança e o Adolescente e dá outras providências.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Fica instituída a Notificação Compulsória da Violência contra a Criança e o Adolescente, a ser feita por estabelecimento público ou privado de serviço de saúde que prestar atendimento a criança ou adolescente vítima de violência ou maus-tratos.

Parágrafo único – A violência e os maus-tratos contra a criança e o adolescente constituem formas de violação dos direitos humanos.

Art. 2º – Para os efeitos desta lei, considera-se:

I – criança a pessoa com até doze anos de idade incompletos;

II – adolescente a pessoa entre doze e dezoito anos de idade;

III – violência e maus-tratos contra a criança ou o adolescente a ação ou conduta que resulte em morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico, ocorrida em âmbito público ou doméstico.

Art. 3º – Os casos de violência contra a criança e o adolescente são considerados de âmbito:

I – doméstico, quando praticado por pessoa que seja aparentada ou assim considerada, unida ao agredido por laços naturais, por afinidade ou vontade expressa, ou que tenha com ele relação íntima de afeto, independentemente de coabitação;

II – público, quando praticado por pessoa que não se enquadre nas situações descritas no inciso I.

Parágrafo único – Inclui-se no caso previsto no inciso II o ato de violência e maus-tratos praticado por agente do poder público ou por este tolerado, independentemente do local de ocorrência do fato.

Art. 4º – A Notificação Compulsória da Violência contra a Criança e o Adolescente conterá:

I – identificação da criança ou do adolescente atendido, com as iniciais de seu nome completo, sua idade e seu grau de escolaridade;

II – identificação dos pais ou responsáveis ou do acompanhante da criança ou adolescente atendido, com nome completo, número de documento nacional de identidade, profissão e endereço e, sempre que possível, meio de contato direto;

III – motivo do atendimento;

IV – descrição objetiva dos sintomas e das lesões apresentadas pelo paciente, especificando a violência sofrida conforme os tipos de consequência a que se refere o inciso III do art. 2º;

V – descrição das circunstâncias em que ocorreu a prática da violência ou dos maus-tratos, especificando o âmbito de ocorrência nos termos do art. 3º, sempre que possível;

VI – diagnóstico;

VII – descrição da situação social, familiar, econômica e cultural da criança ou adolescente, quando relevante.

Art. 5º – A notificação de que trata esta lei será preenchida em formulário oficial e será encaminhada cópia, no prazo de 48 horas contados da data do atendimento pelo profissional de saúde:

I – ao Conselho Tutelar da localidade onde foi realizado o atendimento pelo estabelecimento público ou privado de serviço de saúde;

II – à Polícia Militar em cuja circunscrição esteja a localidade onde foi realizado o atendimento pelo estabelecimento público ou privado de serviço de saúde;

III – à delegacia de Polícia Civil em cuja circunscrição esteja a localidade onde foi realizado o atendimento pelo estabelecimento público ou privado de serviço de saúde;

IV – à autoridade de saúde responsável pela vigilância em saúde na localidade onde foi realizado o atendimento pelo estabelecimento público ou privado de serviço de saúde.

§ 1º – Caberá ao estabelecimento público ou privado de serviço de saúde manter arquivo contendo as Notificações Compulsórias da Violência contra a Criança e o Adolescente.

§ 2º – Os dados do arquivo a que se refere o § 1º serão sigilosos, sendo o acesso a eles restrito, salvo determinação judicial, a representantes do Conselho Tutelar, da Polícia Militar, da Polícia Civil e da autoridade de saúde, mediante solicitação expressa.

Art. 6º – O descumprimento do disposto nesta lei, por estabelecimento público ou privado de serviço de saúde, acarretará as seguintes penalidades:

I – na primeira ocorrência, o estabelecimento receberá advertência e deverá, no prazo de trinta dias a contar da data da advertência, comprovar sua aptidão para atender ao disposto nesta lei;

II – no caso de reincidência ou descumprimento do prazo fixado no inciso I, o estabelecimento será apenado com multa diária no valor de 3.202,56 (três mil duzentas e duas vírgula cinquenta e seis) Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais – Ufemgs.

Art. 7º – O Poder Executivo indicará, por meio de regulamento, o órgão ou a entidade responsável pela aplicação desta lei.

Art. 8º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 20 de novembro de 2019.

Sargento Rodrigues, presidente e relator – João Leite – Bruno Engler.