Pronunciamentos

DURVAL ÂNGELO, presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – TCEMG

Discurso

Agradece a homenagem recebida pelo 90º aniversário de fundação do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – TCEMG.
Reunião 34ª reunião ESPECIAL
Legislatura 20ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 07/10/2025
Página 3, Coluna 1
Indexação

34ª REUNIÃO ESPECIAL DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 2/10/2025

Palavras do Sr. Durval Ângelo

Boa noite a todos e a todas; boa noite aos telespectadores da TV Assembleia que nos acompanham neste momento. Uma saudação muito especial à Mesa dos trabalhos; ao deputado Tadeu Leite, presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais; ao desembargador Luiz Carlos de Azevedo Corrêa Junior, presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais; ao desembargador Júlio César Lorens, presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais. Uma saudação ao vice-presidente do tribunal, conselheiro Agostinho Patrus, que está compondo a Mesa, amigo e parceiro nessas festividades, ex-presidente desta Casa. Saúdo o Sr. Hugo Barros de Moura Lima, procurador-geral de justiça adjunto institucional, aqui representando o procurador-geral; a Sra. Caroline Loureiro Goulart Teixeira, defensora pública e chefe de gabinete da Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, representando a defensora pública-geral; o Sr. Marcílio Barenco Corrêa de Mello, procurador-geral do Ministério Público de Contas; o Ten-Cel. Jésus Cássio de Abreu Júnior, comandante do 22º Batalhão de Polícia Militar, aqui representando o comandante-geral; a Cel. BM Clélia Gonçalves Mota, diretora de Assuntos Institucionais do Corpo de Bombeiros, aqui representando a comandante-geral; a delegada-geral Adriana de Barros Monteiro, representando a chefe da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais. Permita-me também saudar os pares de trabalho no dia a dia do Tribunal de Contas: Sr. Gilberto Diniz, conselheiro-corregedor do Tribunal de Contas, em cuja gestão muitas dessas atividades dos 90 anos foram planejadas; os Srs. Telmo de Moura Passareli, Hamilton Antônio Coelho e Adonias Fernandes Monteiro, colegas conselheiros; os procuradores de contas Daniel, Sara, Cecília e Glaydson, que são imprescindíveis na ação de controle externo do Tribunal de Contas; o superintendente, os diretores, os coordenadores, os supervisores, os servidores e os colaboradores do Tribunal de Contas que estão aqui.

A primeira palavra, neste momento, é “agradecer”. Agradecer ao presidente esta homenagem ao tribunal pelos seus 90 anos; agradecer aos deputados e às deputadas de Minas Gerais que votaram esta homenagem – vários deles estão presentes, e alguns justificaram a sua ausência; agradecer aos servidores desta Casa Legislativa, com os quais tive a alegria de conviver aqui por 24 anos. A todos vocês, muito obrigado! O sentimento que primeiro nos move é de gratidão.

Falar de 90 anos de um tribunal, de um órgão de controle, remete-nos, de alguma forma, a duas reflexões fundamentais que quero fazer aqui. A primeira reflexão é sobre a questão da democracia e sobre a questão da desigualdade ou das desigualdades sociais e econômicas em nossa sociedade. O Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais foi criado num momento democrático, no dia 9/9/1935, e o Tribunal de Contas da União foi criado em 1890.

É interessante que, sob a direção, a inspiração e a defesa do grande jurista Rui Barbosa, o Tribunal de Contas da União foi criado antes da primeira Constituição Republicana de 1891, porque a grande inteligência da Águia de Haia entendia que, para pensar a democracia, para pensar um regime novo e diferente do vivido antes, no Brasil, era preciso ter um órgão de controle externo. O interessante é que, se nós lermos o discurso de Rui Barbosa de 1890 – ele, como ministro da recém-proclamada República –, especialmente a parte da justificativa, nós vamos ver só atualidades. Rui Barbosa fala que, na democracia, tem que se ter controle, controle efetivo de todos os gastos públicos. Rui Barbosa preconiza a questão da transparência numa democracia e da participação do povo. Rui Barbosa aponta a corrupção como um dos vícios e dos males dessa democracia que tem que ser controlado, evitado e punido.

Então é interessante que os tribunais de contas, tanto em 1935 quanto em 1890, tenham surgido sob a égide da democracia. A democracia é fundamental. A ditadura não quer controle: nem o controle social, nem o controle Legislativo, nem o controle interno e, muito menos, o controle externo de contas – existe uma prova cabal a respeito disso.

Em 1939, o Tribunal de Contas foi extinto por um ato autoritário do governador, sob a inspiração do governo autoritário da ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas, e os três ministros de contas, dentre eles José Maria Alkmim, foram compulsoriamente afastados de suas funções. Os servidores públicos do tribunal também foram afastados ou aposentados compulsoriamente. Foi criado um departamento no governo estadual para exercer o controle de contas, mas ele nunca exerceu esse controle. Ditadura e autoritarismo não combinam com nenhum tipo de controle, porque é despótico o poder exercido pelo grupo que comanda e dirige os destinos da nação naquele momento.

Só em 1948, após a Constituinte e a Constituição da democracia, de 1946, é que o Tribunal de Contas é recriado, volta a funcionar e readquire as suas prerrogativas. O interessante é que, no governo de Getúlio, nós tivemos ministro do Tribunal de Contas da União cassado porque votou contra uma conta do governo do Estado Novo.

Então, para aqueles que têm saudade da democracia – digo, da ditadura – eu quero dizer que nós só estamos aqui por causa da democracia. Em um regime despótico, nós não estaríamos aqui, nós não teríamos uma assembleia aberta. E, se houvesse uma assembleia aberta mas sem funcionar com suas prerrogativas plenas, nós não teríamos Judiciário livre e independente. Isso só ocorre no ambiente democrático.

É interessante que nós vivemos hoje, na sociedade, um saudosismo de AI-5, de ditadura, de militares, de poder autoritário. É interessante que nós só podemos… Só é possível haver aqueles que negam a democracia na própria democracia, porque, na ditadura, eles não vão ter como se expressar nem para defender princípios que antes consideravam caros. Então, gente, eu acho que hoje, mais do que nunca, a defesa da democracia é fundamental. É evidente que a democracia, a partir desse grande gesto que foi a nova Constituição de 5/10/1988, não entregou tudo que assumiu entregar em termos de avanços sociais, de construção de um país, da forma como está no art. 3º, I, ou seja, uma sociedade justa, livre e solidária. Não entregou. Mas, com toda certeza, os exemplos no mundo inteiro mostram que você só tem redução da desigualdade, combate da desigualdade no espaço democrático, onde as instituições são fortes, onde as instituições são respeitadas e onde o povo pode criticar, pode manifestar a sua opinião, pode participar. Entre os países, os exemplos são evidentes. As pessoas se perguntam: “Por que em estados democráticos você tem mais igualdade, você tem mais acesso à educação, à saúde, às políticas sociais?”. Porque é só na democracia que você tem um ambiente possível para isso.

Recentemente, eu vi um estudo a respeito da desigualdade na própria Itália, mostrando porque você tem o Norte da Itália desenvolvido, com mais inclusão social, com condições de vida melhores, enquanto essas coisas não existem no Sul daquele país. O autor explicitava essa questão dizendo: “Só com instituições fortes e democráticas, você consegue ter desenvolvimento econômico, você consegue ter uma igualdade maior”. Podemos pegar outro exemplo: você tem a situação da Coreia do Norte e da Coreia do Sul, onde esses valores ficam evidentes. Ainda somos um país desigual, ainda somos um país em que pessoas morrem de fome. Somos um país onde a tragédia do feminicídio nos assusta cada vez mais. Ainda somos um país em que a igualdade de gênero só existe no papel ou numa lei recentemente aprovada, mas, com toda certeza, nós só vamos conseguir superar tudo isso com a democracia.

O Tribunal de Contas de Minas Gerais é um defensor da democracia. Há pouco tempo, eu manifestei todo o apoio ao Supremo Tribunal Federal, no sentido de punir golpe de Estado, atentado contra o Estado Democrático de Direito de forma muito forte. Eu disse uma palavra que, para nós, mineiros, é muito cara. Em 1983, Tancredo Neves, naquele célebre discurso realizado na Praça da Liberdade, na sacada do Palácio da Liberdade… Há até uma contradição: aqueles que falam tão a favor da ditadura ainda fazem manifestação na Praça da Liberdade. Deveriam ir para outra praça, porque o nome da praça é uma contradição com os atos que eles praticam lá. Mas, da sacada da Praça da Liberdade, Tancredo manifestou ser a democracia o novo nome de Minas. E eu quero, deputado Tadeu Leite, dizer que, hoje, o novo nome da democracia neste país é o Poder Judiciário. Presidente Luiz Carlos, do Poder Judiciário, grande garantidor da democracia neste país hoje – infelizmente até, porque poderíamos ter outras instituições cumprindo esse papel –, a autonomia e a independência é a democracia. Por isso, às 15h50min, numa sessão que havia começado às 15h30min, no dia 5/10/1988, o deputado federal Ulysses Guimarães proclamava a nossa Constituição, a nossa Constituição da democracia, a que se referiu como Constituição Cidadã. Naquele discurso histórico, ele diz – palavras dele – que “traidor da Constituição é traidor da Pátria”. E disse mais: que tinha ódio a qualquer ditadura – ódio e nojo.

Então, que nos 90 anos do tribunal isso nos motive a lutar contra as desigualdades, a defender a democracia e a saber que só vamos avançar numa sociedade, como está no texto da Constituição, livre, justa e solidária, se tivermos mais democracia. Só a democracia é remédio para construir a própria democracia. Obrigado.