DEPUTADA MARIA CLARA MARRA (PSDB), autora do requerimento que deu origem à homenagem
Discurso
Legislatura 20ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 30/09/2025
Página 5, Coluna 1
Indexação
Proposições citadas RQN 11833 de 2025
32ª REUNIÃO ESPECIAL DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 25/9/2025
Palavras da deputada Maria Clara Marra
Pessoal, boa noite. Boa noite, pessoal! Essa é a força jovem. Gostaria de agradecer, na pessoa da nossa presidenta Nina, a presença de todos vocês, de cada um e de cada uma. Alguns já são rostos conhecidos, rostos familiares, como o Lucas, e outros eu estou tendo a oportunidade de conhecer agora. Fico muito feliz de poder ver este Plenário cheio – cheio de pessoas jovens, pessoas famintas por conhecimento e ávidas pelo debate neste Parlamento, o maior símbolo do nosso Legislativo Mineiro.
Cumprimento, de forma muito especial, a presidenta desta reunião, a minha amiga deputada Carol Caram, excelente advogada, nossa referência na produção legislativa aqui na Casa, sobretudo na produção com enfoque na área consumerista. Você pode ter certeza de que aqui há pessoas, além de mim, que também conhecem o seu trabalho e o usam como referência dentro da nossa UFMG. Reitero a presença da Nina e agradeço sua confiança e empenho para que esta reunião, de fato, fosse realizada e para que a gente pudesse honrar a magnitude do Senatus. Por meio de sua pessoa, estendo meu abraço a todos os membros. Agradeço também a presença dela, que foi minha professora, mas não deve se lembrar de mim, porque eu entrava atrasada e conversava fiado, a Profa. Renata Maia. Ela é uma grande companheira e um alvo da minha grande admiração na universidade. Hoje fico feliz de poder homenageá-la e poder recebê-la nesta Casa. Ela é professora orientadora da Sociedade de Debates da Universidade Federal de Minas Gerais – Senatus. Agradeço ainda a presença daquele que vem representando o nosso presidente Luiz Carlos, o desembargador José Marcos. Seja muito bem-vindo. Estamos muito felizes em recebê-lo aqui. Lembro e registro a presença do amigo desembargador Octavio Boccalini, cidadão honorário mineiro, que desempenhou brilhante trabalho à frente do nosso TRE. Também registro e agradeço a presença do amigo Hugo Barros de Moura Lima, nosso procurador-geral de justiça adjunto institucional, que é uma liderança jovem no nosso Ministério Público e está representando o procurador-geral Paulo de Tarso Morais, nosso Paulinho. Registro e agradeço a presença do Prof. João Alberto de Almeida, decano da UFMG, que está representando a nossa reitora Sandra Regina.
Renovando a nossa admiração pelo poder das palavras e celebrando a arte da argumentação, hoje homenageamos a renomada Sociedade de Debates da Universidade Federal de Minas Gerais, o Senatus. Desde 2014 vocês se consolidaram como uma referência em argumentação e oratória, não apenas em Minas Gerais e no Brasil, mas em todo o mundo lusófono, como atesta o seu título de campeão mundial de debates em língua portuguesa. Essa trajetória vitoriosa é testemunho do talento, da dedicação e do rigor intelectual que permeiam esse grupo. A UFMG e toda a sociedade mineira têm muito a se orgulhar de vocês. A existência de grupos como o Senatus no ambiente acadêmico é fundamental para a formação de cidadãos capazes de se posicionar diante dos desafios da vida. A universidade, por sua natureza, deve ser um espaço de efervescência de ideias, de confronto respeitoso, de diferentes perspectivas e de formação de cidadãos críticos e engajados. O incentivo e o aprimoramento das habilidades de argumentação, de pesquisa, de escuta ativa e de pensamento crítico, orientados por grupos como o Senatus, desempenham esse importante papel na formação de líderes capazes de dialogar, de construir consensos e de influenciar positivamente o futuro da nossa sociedade.
Na Roma Antiga, o Senatus era a mais antiga e distinta assembleia política, composta pelos conselhos de membros sábios e influentes da sociedade. Era o centro da boa oratória e do debate político e jurídico que influenciava as decisões e moldava a sociedade da época. Aqui, na Assembleia, hoje, é um grupo de estudantes ávidos pelo conhecimento e pelo bom debate. Vê-los aqui hoje, neste Parlamento, o palco da política mineira, nos faz lembrar da permanente missão cidadã que habita em cada um de nós e nos brinda com um referencial de pragmatismo e de rigor dialógico, que deve permear e conduzir a boa política.
Na verdade, o exercício político mineiro, desde a República, conta com a formação da Faculdade de Direito da UFMG, com influência e participação de seus professores e acadêmicos, em momentos emblemáticos da nossa história, desde a República Velha como verdadeiro centro de articulação política, passando pela luta pela redemocratização, tanto no Estado Novo, com o Manifesto dos Mineiros, quanto como pilar de oposição intelectual durante o Regime Militar, até a Constituinte, com contribuição decisiva para a construção do arcabouço legal que sustenta atualmente a democracia brasileira. Ora, um debate público robusto e qualificado é o alicerce de uma democracia saudável. Ele permite que diferentes vozes sejam ouvidas, que outras perspectivas sejam consideradas e que as decisões sejam tomadas de forma mais consciente e legítima. E desenvolver essa habilidade é, sem dúvida, uma poderosa ferramenta para um posicionamento no mundo contemporâneo.
A Faculdade de Direito da UFMG, mais uma vez atenta às necessidades do seu tempo, oferece esse importante programa de extensão, que é o Senatus, orientando grupos de acadêmicos de diferentes posicionamentos ideológicos e políticos para debaterem com técnica, conhecimento e honestidade. Essa faculdade, cuja história é intimamente ligada à vida política, intelectual e cultural do Estado de Minas Gerais, que já formou tantos líderes e que por tantas vezes já foi palco de intensos debates, estruturou o Senatus como seu braço de perpetuação da tradição da boa argumentação. Essa atividade extensionista revela-se uma verdadeira trincheira de resistência nos tempos desafiadores que vivemos, marcados pela crescente disseminação da desinformação.
Manuel Castells, em sua análise sobre a crise da democracia liberal, alerta-nos para o impacto profundamente negativo que a desinformação exerce sobre o debate público. A proliferação de notícias falsas, de informações distorcidas e de narrativas polarizadas mina a confiança nas instituições, dificulta o diálogo racional e impede que os cidadãos tomem decisões conscientes e bem fundamentadas. A capacidade de a desinformação se espalhar rapidamente pelas redes sociais, muitas vezes de forma mais eficaz do que a informação verificada, cria bolhas informacionais, em que as pessoas são expostas apenas a opiniões que confirmam suas próprias crenças, dificultando a empatia e a compreensão de pontos de vista divergentes. O resultado é um conhecimento fragmentado, polarizado e, muitas vezes, improdutivo.
Diante desse cenário, a argumentação com base em evidências, na verificação de informações, na oitiva atenta e, principalmente, na capacidade de expressar ideias de forma clara e respeitosa, são balizas indispensáveis para o debate público saudável e construtivo. As inspirações não faltam. Da Vetusta, tivemos Tancredo Neves, conhecido pela sua capacidade de conciliar, emocionar e construir consensos; tivemos Milton Campos, com o seu raciocínio lógico impecável; tivemos Afrânio de Melo Franco, que, com sua argumentação refinada, defendeu os interesses do Brasil no cenário global. Temos a Ministra Cármen Lúcia, que, com rigor técnico, é capaz de esclarecer e expor seus posicionamentos, ilustrando o seu grande conhecimento, inclusive da nossa literatura brasileira.
São tantos exemplos de oradores mineiros que desenvolveram a capacidade argumentativa com muita maestria e técnica! Alguns grandes oradores ganham destaque ao percebermos que suas falas vêm carregadas de método. É o caso de Benjamin Franklin, cuja sabedoria transcendeu a ciência e a política. Ele cultivava três formas de comunicação essenciais para um diálogo construtivo: a modéstia na expressão, evitando a imposição de certezas absolutas e abrindo espaço para a consideração de outras perspectivas; a busca pela clareza e concisão, garantindo que as ideias fossem acessíveis e facilmente compreendidas; e, fundamentalmente, a valorização da persuasão racional, construindo argumentos sólidos baseados em evidências, em vez de recorrer a falácias ou à mera autoridade. Franklin nos ensina que um bom debatedor busca convencer pela razão, não pela imposição.
Assim a persuasão racional guiava a argumentação de Franklin, fazendo-nos encontrar uma forma singular da arte do debate na figura simples de Riobaldo Tatarana. Longe dos palcos de discussões formais, Riobaldo exerce sua maestria através da narrativa e do diálogo íntimo. Sua capacidade de explorar ideias complexas, de apresentar múltiplas perspectivas sobre o sertão e a vida e de envolver o ouvinte em sua busca por compreensão o consagra como uma figura inesquecível da literatura brasileira. Sua força e sua argumentação residem na autenticidade da sua voz, forjadas nas experiências do Grande Sertão e na profundidade de suas reflexões, que nos convidam a ponderar sobre as ambiguidades da existência. Através da sua linguagem rica, magnética e imagética, Riobaldo nos persuade a enxergar o mundo sob diferentes ângulos. Tal como um debatedor habilidoso, apresenta seus argumentos não para vencer, mas para iluminar a complexidade da realidade.
Para concluir, eu gostaria de reforçar a importância de nós cultivarmos um ambiente onde a busca pela verdade, o respeito pelas diferentes opiniões e a disposição para o diálogo sejam os valores centrais. A qualificação do debate público não é apenas um ideal a ser almejado, mas uma necessidade urgente para a saúde da nossa democracia e para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa. Que o exemplo do Senatus continue a inspirar e a formar debatedores políticos, engajados e éticos, capazes de elevar o nível da discussão e de contribuir para um futuro onde a razão e a empatia prevaleçam.
Permitam-me quebrar o protocolo, porque acabaram-se as palavras no papel, mas não se acabaram as palavras no coração. Estou profundamente emocionada de ver este Parlamento cheio de rostos. Estou vendo o Prof. David, que foi meu professor na faculdade, no início do curso. Fico mais feliz ainda de ver a nossa força jovem neste Parlamento. Hoje, Carol, talvez nós tenhamos a bancada mais jovem que a Assembleia já teve. Você está aí, uma mulher jovem, representando o presidente desta Casa, um jovem que se consolidou na política.
Por meio dessas tantas referências que nós temos, quando eu digo que vocês nos brindam com um exemplo, com um referencial, isso é verdadeiramente no sentido de honrar aquilo que a UFMG cultivou dentro de cada um de nós. Eu aprendi a gostar de história quando estudei história do direito na faculdade. Eu brincava dizendo que eu era de exatas, tanto que me formei em contabilidade, antes de ser advogada.
Durante esses dias eu estava meditando sobre a história de Joana d'Arc. Sou um pouco piegas, mas eu queria trazer para vocês esse dado que me surpreendeu e muito. Refiro-me à Guerra dos Cem Anos. O ano era 1353, quando a França estava perdendo feio para a Inglaterra. Joana d'Arc, em 1429, toma decisões extremamente impactantes que, de certa forma, desenharam os rumos da vitória da França posteriormente. Em 1430, ela é capturada, depois da Batalha de Orleans, e executada. Morre em 1431, se eu não me engano, e a guerra acaba dali a alguns poucos anos, com a vitória da França. Joana d'Arc foi capturada em 1429. Sabe quando nasceu Joana d'Arc? Em 1412. Ela tinha 17 anos. Eu acho que a gente se atenta muito pouco a esses detalhes que são decisivos. Acho que a história nos guia e, muitas vezes, as frivolidades e o cotidiano acabam ofuscando a força que os nossos jovens têm, a força que cada um de vocês têm.
Ver tanto rigor técnico dentro de cada um de vocês, hoje, dentro desta Casa, dentro deste Parlamento, me obriga a fazer-lhes um convite: participem do Senado, da Assembleia, das nossas casas legislativas, do Executivo; estejam na política, porque falta isso, e muito, para que o nosso país possa se desenvolver. É de arrepiar ver o movimento. Nós vimos isso no último domingo. Eu acho que o bonito do Senatus é poder defender pontos diversos.
Carol, nunca consegui entrar no Senatus, professora, porque eu brincava dizendo que eu era da área de exatas; então eu preferia entrar no GD. Os horários coincidiam. Eu até desabafei com a Nina algumas vezes. Gente, muitas vezes, o Senatus obriga os meninos a assumirem posições com as quais, ideologicamente, não concordam, mas eles se munem de argumentos para defender aquilo. Isso é muito bonito porque obriga cada um de vocês a estudar. Hoje, este lugar onde estou, este lugar onde nós estamos é um dos espaços em que, sem dúvida nenhuma, nós tomamos grandes decisões que impactam muito mais do que a vida dos 21 milhões de mineiros e mineiras no Estado de Minas. Nós somos parte dessa história – vocês são. Eu fico feliz de poder me inspirar e de poder contar com vocês, de poder enxergar em vocês o futuro do nosso estado, o futuro do nosso país.
E, falando em futuro, eu quero finalizar com uma referência que muito me toca a uma frase do Galeano que nos obriga a refletir sobre o horizonte, o belo horizonte. Muitas vezes o direito eivado dessas palavras e desse… Despejam sobre nós o que é o direito. Depende, depende. É um monte de “dependes”. O horizonte, da mesma forma, assim caminha. A gente dá dois passos, o horizonte caminha dois passos. Eu corro 10 passos, o horizonte se afasta 10 passos. E aí, Galeano pergunta: “Mas, então, por quê? Qual a importância de querer atingir o horizonte, se a gente nunca vai chegar lá, a gente nunca vai chegar à sociedade ideal?”. A importância é que a gente continue caminhando. Eu acho que isso é muito parte do Senatus e se funde com o propósito também do nosso Legislativo, com o propósito da nossa política, que é continuar lutando, continuar desenhando, ainda que a gente não consiga atingir jamais o ideal, mas vai conseguir evoluir.
A todos vocês o meu muito obrigado por estarem aqui, nesta noite. Levem aos seus pares que não conseguiram comparecer essa centelha de esperança que nós temos no bom debate, que nós temos na boa política. Levem o nosso abraço, o abraço desta Casa, da deputada Carol Caram e do deputado e presidente Tadeu Martins Leite. Muito obrigada a cada um de vocês, mais uma vez, e as nossas autoridades que aqui estão compondo o dispositivo.