DEPUTADO LELECO PIMENTEL (PT)
Discurso
Legislatura 20ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 09/07/2025
Página 56, Coluna 1
Indexação
42ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 8/7/2025
Palavras do deputado Leleco Pimentel
O deputado Leleco Pimentel – A nossa saudação de boa-tarde a todas e todos aqui, no Plenário. Deputada Leninha, é importante que a gente faça aqui, neste Plenário, nesta data, uma homenagem ao companheiro deputado federal Padre João. Hoje, dia 8 de julho, é a data em que ele recebia das mãos de D. Luciano, nosso servo, a importante missão que desempenhou na política, tendo sido eleito, em 2002, junto com o presidente Lula. A esta Casa, ele trouxe também sua missão e luta. Padre João, que foi deputado estadual por dois mandatos e está cumprindo o quarto mandato de deputado federal, até agora foi o único da esquerda que esteve à frente, como presidente, da Comissão de Agricultura desta Casa, trazendo a pauta da agricultura familiar. Ele também contribuiu com as comissões, inclusive com a Comissão de Direitos Humanos. Então parabéns, Padre João, pelos seus 30 anos de ordenação sacerdotal vividos sem a hipocrisia daqueles que separam a fé da política, porque a fé e a política andam juntas, são como o corpo e a alma.
Eu aproveito para dizer aos deputados que uma vez ou outra sobem a esta tribuna para falar sobre a vida do Padre João, o que acho muito importante, que, se a gente tiver coerência, a gente não pede a suspensão desta sessão por falta da presença dos deputados, como já fizeram diversas vezes. Digo isso porque a gente tem respeito pela opinião; em que pese a divergência, nós não resolvemos as coisas na hostilidade. Então saibam que não terão a mesma forma de ação deste deputado, neste Plenário, porque eu não ajo para que o outro se cale. Nós temos o direito de trazer a nossa opinião ao Plenário. E aos deputados a quem me dirijo, Bruno Engler e Caporezzo, quero lhes dizer que não é minha postura pedir encerramento, de plano, em razão de terem deputados que colocaram o dedo aqui e possibilitaram que esta sessão fosse aberta. De minha parte, não há incoerência, mesmo quando a opinião é divergente. Eu não estou dando recado, eu estou dizendo diretamente ao deputado Bruno Engler que, há semanas, ele estava aqui com as pessoas podendo fazer o seu pronunciamento, e eu julgo que, numa atitude intempestiva, pediu encerramento, de plano. Em que pese tenha o estatuto – e aqui também a possibilidade que chamamos de Regimento Interno –, temos aqui respeito pela fala dos outros e faço isso com toda a tranquilidade, assim como também já apresento meu repúdio a esse negócio que está rodando aqui nesta sessão. Além de barulhento é símbolo daqueles que estão colocando veneno para matar as abelhas. Infelizmente os drones hoje estão fazendo o serviço sujo de jogar agrotóxico para matar as comunidades, as abelhas e a biodiversidade. Se eu puder, farei uma nota de repúdio para que a gente não tenha drone aqui no Plenário, mesmo porque há uma série de violações que a gente tenta não infringir e que este equipamento, sem sombra de dúvida, além da barulheira infernal, é para nós uma invasão do espaço aéreo aqui. Ora, eu não confio nesse povo, não confio nem nessa turma de Elon Musk, vou confiar em drone? A gente tem que fazer aqui também de forma mais jocosa essa nossa forma de repúdio.
Gostaria de dirigir a palavra aos meus conterrâneos ouro-pretanos e parabenizá-los. Vila Rica de Albuquerque e a Vila de Antônio Dias foram elevadas à categoria de vila em 8/7/1711 completando 314 anos oficialmente. Na verdade, Ouro Preto tem na história a referência do dia 24/6/1698, portanto, Ouro Preto completa 327 anos de história. Já editei um livro, Ita poemas, e dediquei diversos versos inspirados em Epaminondas, em escritores e na vida política. Ouro Preto, que foi a capital política de Minas Gerais, dividia, àquela época, nos anos 1800, 1700 e nos anos de 1900 ainda a influência de ser o lugar onde as decisões políticas da nossa Minas Gerais eram emanadas. E é por esta razão que Ouro Preto, a quem eu dedico aqui este tempo precioso e importante, ainda está no imaginário do povo mineiro e da humanidade. Assim como recebeu, em 1980, o título de Patrimônio da Humanidade da Unesco, em 1938, teve o reconhecimento pelo Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional – Iphan –, que é, para nós, a declaração de tombamento do conjunto de telhados, da arquitetura, do arruamento, da URB que se ergueu sob os ombros da escravidão na exploração do ouro.
Por esta razão, Ouro Preto tem as duas datas competindo uma com a outra, deputada Lohanna: 314 ou 327 anos? É verdade que todo o povoamento foi estimulado a partir das bandeiras e ali se estabelecia o arraial. Hoje a Capela de São João fica lá onde nasce o nosso Rio das Velhas, na Cachoeira das Andorinhas, que é afluente da Bacia do São Francisco. Ali, pouco abaixo da Praça Tiradentes, no trevo de Ouro Preto, nasce também o Rio Ribeirão Funil, que é o Ribeirão do Carmo, que é a Bacia do Rio Doce. Duas bacias nacionais divididas ali por menos de 20Km em linha reta, por aquele talvegue, que no Pico do Itacolomi chega a 1.720m de altitude. E ali ao lado, onde está a região que vai verter as águas para o Colégio do Caraça, dentro do Município de Ouro Preto, nasce também o Rio Piracicaba. Por que não dizer que as contribuições das águas que nascem no território de Ouro Preto também banham o Rio Paraopeba, fazendo com que aquele conjunto de serras, a do Trovão, a da Soledade, vão recebendo as contribuições das águas que vertem para o Paraopeba? Portanto, antes de ser um patrimônio da humanidade, a nossa cidade é um patrimônio hídrico, a única razão, sem dúvida, para dizer que, se a gente preservar, haverá vida num futuro muito próximo. Sem água não há vida. E, como um bem mineral, esse patrimônio está correndo risco pela ganância com que a mineração ainda hoje, tendo construído no século XVIII o barroco, tem deixado como rastro de destruição e exclusão o barraco. Do barroco ao barraco, a mineração construiu essa beleza da arquitetura da humanidade. Mas o patrimônio hídrico, hoje ameaçado, tem exatamente a ameaça que as mineradoras fazem a partir da Serra de Ouro Preto.
Eu apresentei um projeto de lei que transforma o decreto de 1953 do governador Francelino Pereira como uma forma de evitarmos que a mineração depredatória tome conta do nosso território e coloque em risco as duas bacias e as nascentes. Assim como hoje, a comunidade de Botafogo, próxima ao Apiário Flores, corre risco. A mineração que ali chegou não reconhece vida nem fauna nem flora, muito menos a antropização que ocorre ali, na Capela de Santo Amaro, com formação no final do século XVII.
É essa a razão de a gente dizer que, para parabenizar uma cidade tricentenária, é fundamental considerar as ameaças que essa cidade e o seu povo enfrentam. E é por isso que o Município de Ouro Preto é para nós referência de onde a política, de onde a decisão… Aliás, eu comecei a falar do padroado. Foi dado a Mariana, a primaz, o poder religioso. A Arquidiocese de Mariana recebeu os filhos da caridade, que se instalaram no Seminário de Nossa Senhora da Boa Morte. Mariana foi a primeira cidade planejada do Brasil, após uma forte chuva que destruiu o povoado à beira do Rio Santo Antônio, na Prainha. Por essa razão a cidade foi planejada em formato quadriculado em 1738. A Mariana que conhecemos hoje, com seu traçado em quadras, estava sendo reconstruída naquela época.
Mas a Ouro Preto coube o poder temporal, o poder político. Infelizmente, o Conde de Assumar, em 1720, aquele degredado dos Açores… Os degredados filhos de Eva – muitos que rezam não sabem que o degredo era uma forma de castigo da coroa. E aquele degredado filho de Eva, o Conde de Assumar, trouxe para Ouro Preto um cenário que, além de histórico, foi de maltrato à vida dos trabalhadores. Apesar de muitos associarem o Conde de Assumar ao fato de os pescadores terem achado a imagem de Aparecida no Rio Tietê, onde hoje se ergue o Santuário de Aparecida, há também a história de que ele mandou atear fogo em 420 moradias, onde atualmente é o Morro da Queimada, em Ouro Preto. Aquele conjunto de ruínas foi fruto da devassa, daquele ato de destruir a vida comunitária e as moradias de mais de quatrocentas e vinte famílias, incluindo pessoas escravizadas, cujas casas foram queimadas. Em 1720, a visão dele era de que tudo deveria estar sob o seu controle; explicando-se como um déspota esclarecido e se considerando um rei, justificava-se ser o representante de Deus. É claro que o padroado, como cultura e como sistema político, precisa ser enterrado junto com o colonialismo, que ainda impera. Por essa razão nós vivemos até hoje os tentáculos da história, que vão fazendo com que muitos coronéis, muitos que ainda se acham donos do poder, que estão nas prefeituras, nas câmaras, aqui, na Assembleia… Vamos dizer assim: nós temos um traço histórico de uma cultura colonialista que ainda lança sobre a política formas que não pertencem ao atual mundo democrático. Ouro Preto: 314 anos de elevação à vila e 327 anos de fundação.
O Pe. Faria Fialho é aquele que teve uma capela. Existe um bairro em Ouro Preto chamado Padre Faria, em reverência ao nome dele. Não foi à toa que o presidente Juscelino Kubitschek, ao inaugurar Brasília, buscou o sino da igreja do Pe. Faria para dar a primeira badalada de inauguração da capital. Mas por quê? Exatamente porque foi aquele o sino que não deixou de tocar quando esquartejaram e enforcaram o Tiradentes, o alferes Joaquim José da Silva Xavier, no Rio de Janeiro.
A história nos mostra que todos os elementos estão interligados a uma cultura que precisa ser rememorada, porque um povo que não recupera a sua história não sabe para onde vai e não sabe condenar os atos que porventura perduram do colonialismo, da ditadura, daqueles que, investidos na carreira pública, mandavam matar e esquartejar pessoas.
Ouro Preto: uma cidade que merece uma revisão histórica. Aliás, foi o que fez o ex-presidente de Portugal, Mário Soares, quando, ao invés de dar o título de Inconfidentes, tratou como confidentes aqueles que lutaram para que o nosso Brasil não continuasse a praticar a injusta usura na cobrança de impostos. É por essa razão que faço este pronunciamento parabenizando a minha cidade de Ouro Preto, cidade que é referência em Minas Gerais, no Brasil e no mundo. Ouro Preto: Patrimônio da Humanidade.
O dia 8 de julho é o dia de comemorar uma Ouro Preto que pode e deve trabalhar para a libertação do seu povo, que ainda continua pendurado nos morros, com muita pobreza. Isso nos revela um traço da mineração que excluiu, degradou e matou. É por essa razão que lutamos tanto por territórios livres de mineração! Lutamos para que o patrimônio hídrico, patrimônio da humanidade, seja referência na vida de quem precisa da nossa luta. Muito obrigado, presidenta. Gratidão a todos que estão no Plenário.