DEPUTADO RICARDO DUARTE (PT)
Discurso
Legislatura 15ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 30/04/2005
Página 29, Coluna 2
Assunto EDUCAÇÃO.
Aparteante Edson Rezende, Weliton Prado, Elisa Costa.
Proposições citadas PEC 78 de 2004
12ª REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 15ª LEGISLATURA, EM 26/4/2005
Palavras do Deputado Ricardo Duarte
O Deputado Ricardo Duarte* - Sr. Presidente, Sras. Deputadas, Srs. Deputados, há dois anos na Casa temos mostrado aos nossos companheiros a preocupação com a criação de escolas médicas no Estado sem autorização do Conselho Nacional de Saúde e do MEC. O art. 82, § 4º da Constituição Mineira permite que as fundações do Sistema Estadual de Ensino, que são 27, possam criar cursos superiores sem avaliação federal, ferindo o que determina a LDO que exige que o Conselho Nacional ou o MEC possam avaliar, não só a necessidade, como os critérios de criação desses cursos. Esse art. 82, na minha opinião, é inconstitucional e fez com que, em 1996, o Ministério Público entrasse com ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, para impedir a criação dos vários cursos superiores.
Enquanto essa ação direta de inconstitucionalidade não é julgada, os mais diversos cursos estão sendo criados. Sem pretender generalizar, alguns não têm a menor condição de funcionamento. É muito séria a nossa responsabilidade com a formação profissional de vários segmentos, especialmente em relação à medicina, pois escolas estão sendo criadas sem biblioteca, laboratórios e hospital-escola e sem o mínimo de condições para oferecer residência médica, cobrando mensalidades que variam de R$2.500,00 a R$3.000,00. Alguns cursos estão formando profissionais que não têm condições mínimas de formação ética e profissional no que diz respeito à saúde pública. O Conselho Regional de Medicina está disposto a não conceder carteiras profissionais aos formandos das escolas contra as quais acionaram a justiça. Em Minas Gerais, cinco escolas da área de medicina encontram-se nessa situação. Estão formando bacharéis que não estão aptos para exercer a sua profissão.
Além disso, há a questão séria referente ao direito do consumidor. Permitimos que cursos, sem condições de funcionar, cobrem mensalidades excessivamente altas e não devolvam ao indivíduo um mínimo do que foi contratado.
Diante disso, apresentamos essa proposta de emenda à Constituição para adequar a Constituição Mineira à LDB. Inicialmente, a proposta era a seguinte: todos os cursos do ensino superior só poderiam ser criados mediante autorização do MEC ou do conselho nacional da área correspondente. Foi anexada a essa proposta uma outra, de autoria dos Deputados José Henrique e Rêmolo Aloise, estabelecendo exatamente o contrário do que pretendia essa proposta de emenda. Apresentado o substitutivo pela Comissão Especial que analisou essa proposta, permitiram que apresentássemos emendas, excluindo os cursos da área de saúde da autorização do Conselho Estadual da Educação. A criação da UEMG acabou sendo, na prática, a causa da permissão desse artigo da Constituição Mineira, que vem se arrastando por 15 anos, já que essa universidade existe apenas no papel. Isso causou-nos uma situação absolutamente imprópria em relação à discussão do ensino superior em Minas. Ou adequamos a nossa legislação mineira à Constituição Federal, ou perdurará essa situação esdrúxula de ser possível realizar coisas aqui que, em outros lugares, não são permitidas. A nossa responsabilidade, ao legislar, é a de fornecer condições mínimas às faculdades criadas, a fim de educarem adequadamente os nossos jovens que sonham com uma universidade.
Não há mais curso técnico, todos querem estudar na universidade, o que é necessário na disputa do mercado, mas não é possível continuarmos formando pessoas sem condições adequadas. Não podemos permitir que escolas que se tornaram absolutamente mercantilistas e não têm nenhum compromisso com a educação e a formação profissional, de fato, continuem a existir, nas várias áreas.
Como o objetivo dessa PEC era fechar as portas para todas as faculdades de Minas, não foi possível um acordo para isso. Pensamos que fechar as portas para a criação de escolas na área de saúde, no caso, sem autorização federal... Não é uma questão de não se ter escolas. Admitimos que elas são necessárias, sim. Algumas áreas de Minas não têm... Um paralelo acima de Belo Horizonte, o Norte, o vale do Jequitinhonha e o Noroestes, precisa da criação de novas escolas superiores. Não há dúvida quanto a isso. A questão é qualidade. Temos obrigação de zelar pela qualidade da formação do ensino superior em Minas.
No ano passado, o Governador autorizou o funcionamento de seis escolas de medicina, mas nenhuma delas ficava no Norte, na área que necessitava. Todas elas foram contestadas na Justiça pelo Conselho Regional de Medicina. Ficaremos aqui de braços cruzados, se temos a obrigação de legislar nessa área? Precisamos acordar para essa questão. Somos 13 médicos nesta Assembléia, e temos a visão clara da gravidade do que é um jovem sem formação generalista mínima, sem condições e sem uma visão humanista e ética dessa profissão. Não podemos permitir que isso ocorra. Proponho a todos que aprofundemos no estudo dessa questão e que aprovemos esse pequeno avanço, a Emenda nº 3 da PEC 78, para não permitirmos mais que o Conselho Estadual de Educação autorize a criação de escolas da área de saúde, sem as necessárias manifestações do Ministério de Educação e do Conselho Nacional de Saúde.
O Deputado Edson Rezende (em aparte)* - Muito obrigado, Deputado Ricardo Duarte, a quem parabenizo pela PEC. Quero dizer da minha experiência por 6 anos como professor da faculdade de Medicina, nos anos 80, e como profissional. Se compararmos os meados dos anos 80 com 20 anos depois, veremos o quanto proliferaram faculdades de medicina e outras. Falemos daquela que conhecemos bem e sabemos ser importante, porque forma médicos que cuidam da vida, e esta está na vida dos profissionais. A questão da abertura de novas escolas médicas e outras prima mais pelo aspecto comercial, porque virou um bom negócio abri-las. Os cursos são muito caros e possuem mensalidades que variam de R$2.000,00 a R$3.000,00. Mudaram a forma e o conceito defendidos pelas escolas de medicina do mundo, especialmente as da Europa e dos Estados Unidos. Precisamos formar profissionais em quantidade e qualidade, de acordo com a demanda da população, para atender com segurança o cidadão.
Digo isso com a experiência de quem esteve na escola no início dos anos 80, quando havia determinado quantitativo de instituições médicas, e 20 anos depois parte delas formam, sem condições, centenas, milhares de profissionais, não têm hospital-escola para dar a atenção adequada aos alunos nem quadro de professores para dar atenção a inúmeras outras escolas que são abertas. Até a demanda por professores com mestrado ou doutorado está acima do que é ofertado.
Duas questões devem ser levadas em conta: primeiramente, a LDB está acima da Constituição do Estado de Minas Gerais, portanto, tem de ser ajustada, como V. Exa. abordou muito bem. Em segundo lugar, é preciso alertar a população mineira para o fato de que precisamos de profissionais adequados, porque, no momento da decisão médica, eles precisam estar bem qualificados. É essa a defesa que faz o Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, que começa a colocar a sua avaliação como pressuposto para liberar ou não, aceitar ou não o diploma expedido por determinada escola. Sua função principal é fiscalizar o exercício profissional da classe. Louvamos a atitude desse Conselho, que se posiciona com muita coragem. É preciso fiscalizar o exercício profissional, mas também é fundamental que isso seja feito na origem, ou seja, no momento de formação dos profissionais, avaliando-se as condições e as instalações das faculdades que ministram o curso superior de Medicina. Fazer medicina não é brincadeira. V. Exa. é médico e sabe disso. Em momentos de decisão sobre uma doença agudizada ou crônica, que caminha para a piora, está-se decidindo sobre a vida. Assim, uma decisão boa pode salvar uma vida, e uma decisão equivocada pode ser letal.
Deputado Ricardo Duarte, não somente nos aliamos à proposta de emenda à Constituição apresentada por V. Exa., como também a uma discussão maior: a formação de médicos não pode ser fonte econômica para sustentar empresários que querem explorar o mercado superlotado que aí está. Por um lado, é preciso que haja qualidade, e, por outro, é preciso garantir condições para os profissionais. À medida que se multiplica o número de médicos por ano, a disputa pelo mercado não lhes dá condições de sobrevida. Aí, esses profissionais passam a trabalhar em dois, três ou quatro lugares no mesmo dia. Sua vida fica sacrificada e estressante, diminuindo muito sua qualidade.
Não poderia deixar de manifestar o meu apoio a sua proposta. Avançando na nossa preocupação, ressaltamos que é preciso que as instituições médicas participem dessa discussão. Lembro-lhes que foi organizada e constituída a Ordem dos Médicos de Portugal, naquele país, para definir as questões da qualidade e do mercado, de forma que as pessoas, ao se formarem, tenham condições de exercer sua profissão dignamente e receber seus proventos para manter sua vida. Esse é um caminho interessante que começa a ser discutido no Brasil e que está bastante avançado em Minas, além de ser uma maneira de os médicos brasileiros avaliarem o processo de forma crítica.
Parabenizamos V. Exa. pela iniciativa do projeto e pela qualidade da discussão que tem trazido a esta Casa.
O Deputado Ricardo Duarte* - Deputado Edson Rezende, obrigado. Na verdade, a idéia era fazer isso com todas as escolas de ensino superior. É preciso encararmos a educação superior não somente como espaço de mercado. Antes de mais nada, ela deve ter o compromisso com a qualidade. Como nos sobrou somente a área de saúde - Medicina, Odontologia e Psicologia - para a negociação com as várias forças da Casa - isso é normal aqui -, conseguimos um pequeno avanço na área da saúde. Apesar disso ser pouco para o que queremos, é o melhor que temos hoje.
A mercantilização em todas as áreas de ensino superior é um absurdo. Na área de Medicina, pomos em risco a vida das pessoas. Além disso, os companheiros formados não teriam condições de disputar o mercado.
O Deputado Weliton Prado (em aparte) - Deputado Ricardo Duarte, parabenizo V. Exa. pelo brilhante trabalho que desenvolveu à frente da Comissão de Saúde como Presidente. Sinto-me feliz e honrado pela sua fascinante atuação. Hoje V. Exa. apresenta questões sérias como a da UEMG. Infelizmente a UEMG não é universidade estadual, não é pública nem gratuita. O Governo não cumpriu a sua promessa de campanha, ou seja, ainda não teve peito para isso. O Governador Aécio Neves prometeu que descentralizaria a UEMG com vários campos avançados em todas as regiões de Minas Gerais. Infelizmente, até hoje isso não saiu do papel. Não há vontade política. Além disso, não cumpre o que manda a Constituição do Estado de aplicar os 2% de tudo que é arrecadado para a UEMG e 1%, em pesquisa. Por várias vezes disse isso. Paulo Freire já dizia que, “se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”. Isso é verdade. Se não investirmos em ciência e tecnologia e em pesquisa e extensão de maneira séria e realmente comprometidos com o projeto de inversão de prioridades, não promoveremos as mudanças de que tanto precisam o nosso Estado e o nosso País.
V. Exa. aborda questões sérias. Se me permite, gostaria de fazer uma cobrança ao Líder de Governo desta Casa que, até hoje, não deu resposta. Há alguns dias apresentei uma denúncia na tribuna desta Casa. No dia 9 de abril, publicou-se no “Minas Gerais” um contrato entre a CEMIG e a Adser Serviços Ltda., de prestação de serviços para o acompanhamento do processo legislativo no Congresso Nacional, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Estranhamos um fato. Quando verificamos a razão social dessa empresa, descobrimos que a sua razão jurídica, ou seja, a sua prestação de serviços é de limpeza de imóveis. Como uma empresa de limpeza poderá acompanhar o processo legislativo em Brasília? Além disso, essa empresa é de São Paulo. Esse contrato tem a validade de 12 meses, num valor de R$2.000,00 por mês, totalizando aproximadamente R$25.000,00. O Governo de Minas, já tem um escritório de representação em Brasília. O Governo do Estado paga mais de R$600.000,00 para que esse escritório funcione em Brasília. O responsável por ele é o Sr. Henrique Hargreaves, que esteve no Governo anterior junto com o Presidente da CEMIG. Aliás, eram amigos. Com toda infra-estrutura, corpo técnico e administrativo e grande número de advogados, com escritório de Minas em Brasília, com Deputados Federais e Senadores para ajudá-la a acompanhar esses projetos, a CEMIG teve de fazer um contrato de consultoria, de acompanhamento com uma empresa, cuja razão social é a limpeza.
Isso muito nos estranha. Já pedimos uma explicação. Apresentamos um requerimento solicitando informações da CEMIG e do Governo do Estado ou que alguém representando o Governo nesta Casa apareça e dê uma justificativa. A imprensa anunciou em praticamente todos os jornais, mas, infelizmente, até agora nem uma vírgula foi esclarecida. Todos os Deputados da Base do Governo se calaram em relação a esse assunto. Queremos um esclarecimento, uma informação do que aconteceu nesse caso da CEMIG, que contratou uma empresa de limpeza para acompanhar os projetos no Congresso Nacional.
Por fim, quero parabenizá-lo, Deputado. Realmente sinto orgulho. Estamos aprendendo muito com você nesta Casa. No entanto, temos que aprofundar a discussão principalmente na área da saúde e pedir um posicionamento sério do Governo do Estado, porque não podemos brincar com a saúde, com a vida humana. Já dissemos que o déficit na saúde é da ordem de R$700.000.000,00 por ano. Não se cumpre a Emenda à Constituição Federal nº 29. Cobramos do Ministério Público e do Poder Judiciário que tomem providências, porque, se não estão cumprindo a legislação, com certeza o Governador e o Secretário de Saúde, que são os gestores da área, devem ser punidos, até impedidos de se candidatar. A lei tem que ser para todos, e não apenas para ladrões de galinhas, como muitas vezes vemos. Infelizmente é assim que, em alguns casos, funciona a justiça no nosso País. Tem que ser cumprida a Lei de Responsabilidade Fiscal, e esperamos que o Governo dê exemplo e aplique, de fato, os 12% que são exigidos pela Emenda Constitucional nº 29. Mais uma vez, faço essa cobrança.
Sr. Presidente, quero aproveitar para dizer que estão aqui presentes na Assembléia o Presidente da Câmara Municipal de Uberlândia, Vereador Ten. Lúcio, a Vereadora Jerônima Carlesso e o Vereador Antônio Carrijo. Obrigado.
A Deputada Elisa Costa (em aparte) - Deputado Ricardo Duarte, quero fazer um registro do significado, da importância da proposta de emenda à Constituição de sua autoria, um registro solidário.
Existe na realidade brasileira, em função da implantação e da universalização do SUS e do Programa de Saúde da Família, uma grande necessidade de profissionais. Mas isso não quer dizer que tenhamos que aceitar aqueles que não primam pela qualidade de ensino, principalmente as universidades. Assim, tanto precisamos ampliar os recursos na saúde, na esfera dos municípios, do Estado e do Governo Federal, quanto temos de cuidar para que tenhamos institutos, escolas de nível superior, universidades e faculdades que venham, de fato, preparar profissionais qualificados, humanizados e que possam contribuir com o SUS e com o Programa de Saúde da Família, enfim, com os programas e a política nacional e estadual.
Acho que, se tivéssemos mais recursos no Estado de Minas Gerais principalmente, teríamos uma oferta melhor na área da saúde. Mas quero registrar a importância do projeto e deixar o nosso apoio, o nosso voto favorável, para que projetos como esse, que mostram que educação deve ser prioridade - mas educação de qualidade, educação gratuita - ocupem o espaço do debate nesta Assembléia. Esse projeto mostra o compromisso da sua luta como médico, como militante e, principalmente, como ser humano preocupado com a população mais pobre do nosso País e de Minas Gerais. Parabéns.
O Deputado Ricardo Duarte* - Obrigado, Deputada Elisa Costa. Na verdade, a luta pela educação pública e gratuita vai continuar. Não podemos desprezar a iniciativa privada nessa área, porque ela é complementar, é importante, mas precisamos exigir qualidade. Sem qualidade estaremos falhando nos nossos compromissos com a população.