Renovação de concessão ferroviária pode gerar retrocessos
Comissão da ALMG quer extensão de prazo pela ANTT para resolver questões relativas a recursos e conflitos urbanos.
25/10/2018 - 14:06“Nem sempre as audiências públicas cumprem a sua finalidade. Às vezes, empresas enchem o auditório de pessoas que desviam os debates do que realmente importa”. A afirmação é do diretor da ONG Trem, André Tenuta, ao descrever o cenário da reunião realizada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), em Governador Valadares (Rio Doce), no último dia 18/10.
Ele e os demais presentes em reunião da Comissão Extraordinária Pró-Ferrovias Mineiras da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais (ALMG) criticaram, nesta quinta-feira (25/10/18), a forma como as discussões para antecipação da renovação do contrato de concessão com a Vale para uso da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM) têm sido feitas . A renovação, na forma como tem sido proposta pela ANTT e pela Vale, será, na avaliação de André Tenuta, desastrosa para Minas Gerais.
O debate na ALMG teve como objetivo ouvir convidados que estiveram na audiência da ANTT em Governador Valadares para decidir como a comissão vai se posicionar. Diante das colocações dos presentes, que foram unânimes em dizer que é necessário estender o prazo dos debates sobre a renovação, o presidente da comissão, deputado João Leite (PSDB), disse que a comissão vai realizar outra reunião para tentar evitar que a renovação se dê este ano.
Nesse encontro ainda a ser marcado, o deputado salientou que serão convidados representantes de órgãos como o Ministério Público Federal (MPF) e o Tribunal de Contas da União (TCU). O primeiro porque o órgão teria, segundo o parlamentar, acabado de entrar com uma ação judicial exigindo a recuperação de trechos e estações da linha férrea em questão. Já a presença do TCU seria importante porque a renovação depende do parecer favorável do órgão, que ainda não se manifestou.
Renovação de contrato poderá acabar com transporte de passageiros
Em seu relato da reunião em Governador Valadares, André Tenuta disse que muitos dos participantes estiveram lá para desviar as discussões do tema principal. Segundo ele, falas como “a Vale não pode ser fechada” ou “a Vale ajuda a Apae” atrapalharam o andamento dos debates.
“Ninguém está falando em fechar a Vale, o que está em pauta é como a Vale vai continuar operando uma ferrovia que é pública”, disse, ressaltando que a proposta atual impede avanços com relação à atual estrutura e oferta de serviços por mais 40 anos.
Mais do que não alcançar avanços nas próximas décadas, a renovação antecipada pode resultar, na avaliação de André, em retrocessos para a população. Ele disse, por exemplo, que uma das demandas dos moradores é a criação de mais um horário para transporte de passageiros pela linha. Segundo ele, o único horário em cada sentido atualmente disponível só existe em função de uma cláusula explícita no contrato de concessão original.
Tal cláusula não estaria, ainda de acordo com André, presente na renovação agora em discussão. Assim, para ele, não só o novo horário não será criado como o atual tende a ser extinto. Outro dispositivo do contrato de renovação questionado por ele é o de que o governo estaria impedido de cobrar pela outorga da linha.
Transferências de recursos para outros estados é uma das preocupações
O deputado Bonifácio Mourão (PSDB) também esteve na reunião em Governador Valadares e fez seu relato sobre as principais questões discutidas. Segundo ele, ficou claro durante a reunião que é necessário estender o prazo para as discussões antes de conceder a renovação por mais 30 anos, como agora proposto. Somados aos dez anos ainda restantes da concessão atual, novos debates sobre a linha só poderão ser feitos daqui a 40 anos.
Segundo o parlamentar, um dos pontos mais importantes que precisam ser repensados é a destinação dos recursos gerados a partir da renovação. A proposta atual é que grande parte da verba seja destinada para a construção de linhas férreas na Região Centro-Oeste do País para o escoamento de grãos e um ferroanel em São Paulo.
“Minas Gerais mandando dinheiro para obra em São Paulo? Isso não faz sentido!”, disse Bonifácio Mourão, defendendo que todo o dinheiro dessa origem seja aplicado em Minas.
Conflitos urbanos - O deputado também disse que os conflitos urbanos gerados pela linha férrea também foram levantados. Bonifácio Mourão apresentou o dado de que Governador Valadares é o município atravessado pela linha férrea de maior extensão entre aqueles que estão no caminho da Vitória-Minas: seriam 54 quilômetros dentro dos limites municipais, 28 deles no perímetro urbano.
A demanda é que o transporte de cargas, que gera transtornos na cidade, seja revertido para outra região e a linha aproveitada para deslocamento de passageiros dentro do município.
Problemas se repetem em outros municípios
O deputado Glaycon Franco (PV) disse que os problemas são semelhantes em todos os municípios atravessados por ferrovias. Ele citou os conflitos vividos em Conselheiro Lafaiete (Região Central), como dificuldades no tráfego de veículos e poluição sonora. Disse também que não é favorável ao envio de recursos de uma possível renovação da concessão para fora do Estado.
Por sua vez, o deputado Sargento Rodrigues (PTB) lembrou que as discussões também devem envolver a área de segurança pública. Tanto questões relativas à proteção dos patrimônios ao longo das linhas e dos passageiros quanto à proteção dos cidadãos que vivem no entorno devem, para ele, ser foco de preocupação.