Para advogado-geral do Estado, há indícios de descumprimento contratual pela Vale, mas é preciso conhecer conteúdo de relatórios de fiscalização da ANTT
Para Onofre, recursos da indenização pela concessão da malha devem vir para Minas
Prefeituras devem ser parceiras na conservação do patrimônio, disse Ariston, do Dnit
Dnit pede autonomia regional para gerir os trens em Minas

Advocacia do Estado pretende abrir caixa preta da União

Em audiência, advogado-geral explica por que contesta renovação antecipada da concessão de malha ferroviária.

09/08/2018 - 17:11

O advogado-geral do Estado, Onofre Alves Batista Júnior, anunciou nesta quinta-feira (9/8/18), em audiência da Comissão Extraordinária Pró-Ferrovias Mineiras, que a finalidade da interpelação extrajudicial apresentada ao Presidente da República e à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), solicitando a suspensão da renovação antecipada, até 2057, da concessão da Estrada de Ferro Vitória Minas (EFVM) à Vale, é abrir a “caixa preta” da União.

A contestação da Advocacia Geral do Estado de Minas Gerais (AGE) foi motivada pela previsão da União de que os recursos provenientes da contrapartida pela renovação seriam aplicados na construção da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), ligando Água Boa (MT) ao entroncamento da Ferrovia Norte-Sul em Capinorte (GO), no lugar de destinar o investimento à malha existente em Minas Gerais.

Ainda durante a reunião realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Onofre Júnior explicou que aguarda o posicionamento do órgão federal para ter acesso a informações sobre o contrato de concessão ainda vigente. Ele afirma que a interpelação prevê prazo de 15 dias para que os documentos e dados sejam enviados.

Para o advogado-geral, embora haja indícios de descumprimento contratual por parte da Vale, somente após ter conhecimento dos relatórios de fiscalização da ANTT, sobre os estudos realizados até pela própria empresa, dentre outros esclarecimentos, o Estado terá condições concretas de tomar as providências necessárias, e, se for o caso, acionar o Poder Judiciário. Segundo ele, não há transparência sobre o tema, que originou “uma verdadeira caixa preta”.

Passivo - Não só a Advocacia-Geral do Estado, mas representantes de outros órgãos e entidades da sociedade civil defenderam que os recursos oriundos da indenização prevista pela concessão do transporte ferroviário sejam integralmente destinados a Minas. Isso porque, segundo os participantes, já existe hoje um passivo enorme relativo aos contratos realizados ainda na década de 1990.

A desativação e o abandono de trechos ferroviários, além da inviabilização do transporte de passageiros nos municípios mineiros, foram lembrados como algumas das irregularidades. "O investimento alhures desses recursos poderá ser objeto de lide judicial”, afirma Onofre.

Recuperação da malha enfrenta desafios

As linhas férreas que não foram consideradas economicamente viáveis pelas concessionárias do transporte ferroviário têm sido devolvidas ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).

A servidora do órgão, Vânia Silveira de Pádua Cardoso, que atua na Unidade Ferroviária de Belo Horizonte, informou que grande parte dos 800 quilômetros de linhas devolvidas, em Minas, já se encontra sem trilhos.

Trechos como o que integra o município de Sabará a Itabirito (ambos na região Central) são um exemplo do estado de precariedade no qual se encontra a malha, afirma Vânia Cardoso. Ela conta que, além dos furtos e das ações de depredação, há casos em que as linhas, cedidas pelo Dnit aos municípios, têm os equipamentos deliberadamente retirados pelas próprias administrações locais.

Ariston Ayres Rodrigues, coordenador de Manutenção Ferroviária do Dnit, explicou que, quando a concessionária pretende devolver um bem, ela apresenta o pedido junto à agência reguladora. Ao Dnit, cabe se manifestar sobre o valor da indenização devida à União, considerando inclusive os danos. De acordo com Ariston, essa análise não era padronizada. Após a revisão do processo, foram estabelecidos parâmetros de avaliação.

“O Dnit não tem como cuidar da preservação das linhas sozinho”, lamenta Ariston Rodrigues. O servidor ressalta que as prefeituras precisam, na verdade, serem orientadas a fim de que se tornem parceiras no trabalho de conservação do patrimônio ferroviário, pois são os representantes do poder público mais próximos desses bens.

O presidente da comissão da ALMG, deputado João Leite (PSDB), anunciou que já está em estudo a criação de força-tarefa a ser coordenada pelas polícias para auxiliar na proteção das linhas férreas mineiras. “É preciso agir, pois as estruturas do transporte ferroviário que se encontram abandonadas estão sendo utilizadas até por criminosos”, alerta.

Transporte de passageiros – A vice-presidenta da comissão, deputada Marília Campos (PT), destacou a necessidade de os recursos, advindos da indenização pela renovação da concessão, que, segundo ela, gira em torno de R$ 1 bilhão, sejam aplicados também em projetos de transporte ferroviário de passageiros.

Ao ser interpelado pela deputada a respeito da possibilidade de o Dnit realizar um estudo de viabilidade das linhas férreas para essa finalidade, o superintende regional do órgão, Fabiano Martins Cunha, explicou que a mobilidade urbana não é competência do Ministério dos Transportes. Sendo assim, o departamento não estaria apto a fazer tal estudo.

Ele ainda defendeu que os modais (rodoviário, ferroviário e hidroviário) sejam pensados de forma complementar e não excludente.

Requerimentos - Os deputados João Leite, Roberto Andrade (PSB) e a deputada Marilia Campos aprovaram 12 requerimentos, solicitando, dentre outras, a realização de audiência pública para debater estudos elaborados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o processo de renovação antecipado das concessões ferroviárias.

Consulte o resultado da reunião.