Reintegrações de posse truculentas são denunciadas na ALMG
Críticas foram feitas por moradores de ocupações de BH, despejados sem mandados judiciais e alternativas de moradia.
14/07/2016 - 13:32 - Atualizado em 14/07/2016 - 17:29Reintegração de posse sem mandados judiciais e ausência de alternativas de moradias para as famílias despejadas foram denunciadas na manhã desta quinta-feira (14/7/16), em reunião conjunta das Comissões de Participação Popular e de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). As maiores críticas foram direcionadas à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), responsável pelas ações.
As ocupações Maria Vitória e Maria Guerreia, no bairro Copacabana, e Filadélfia, na Região Noroeste da Capital, foram alvo de despejo no último mês. No caso das duas primeiras, as famílias viviam no local há cerca de um ano e meio e foram desalojadas sem opções de moradia.
De acordo com o representante dos moradores, Juliano Rego dos Santos, antes da desocupação da área, realizada por mais de 400 policiais, a PBH não fez o cadastro das famílias. Além disso, conforme relatou Juliano, o Executivo municipal informou que os moradores seriam encaminhados para abrigos municipais, mas não havia vagas.
A maioria das famílias foi encaminhada para outras ocupações urbanas, por militantes de movimentos sociais. “Tem gente em Betim, outros em Ribeirão das Neves (ambas cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte). É por isso que muitos não puderam vir hoje, eles não tiveram dinheiro para passagem”, contou Juliano.
“Os movimentos e as outras ocupações, que acolheram essas pessoas, fizeram política pública ao direcionar as famílias para outros lugares, para que não ficassem nas ruas”, destacou a advogada membro do Coletivo Margarida Alves, Thaís Lopes Santana Isaías. Ela informou, também, que crianças removidas tiveram que deixar as escolas.
A advogada ressaltou, ainda, que decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que nenhuma reintegração pode ser feita sem que seja garantida alternativa de moradia digna.
Filadélfia - Abusos ainda maiores teriam acontecido na Ocupação Filadélfia. “Fomos escorraçados e, no lugar em que estávamos, jogaram lixo depois. Fomos tratados pior que lixo”, relatou o representante dos moradores, Luciano Pereira da Paz.
Segundo ele, a ação foi feita pela Guarda Municipal, sem ação judicial e de forma truculenta. Luciano narrou que um jovem foi agredido com cassetete quando já estava no chão, rendido e algemado, e que crianças foram atingidas por spray de pimenta nos olhos.
Também representante dos moradores, Fabiano Santos de Oliveira alegou que foram utilizadas armas letais para ameaçar os moradores. “A arma foi apreendida e o agente usou uma alegação precária de legítima defesa, que o próprio delegado do caso já descartou. Essa militarização da Guarda Municipal é muito perigosa”, advertiu.
PBH não participa de negociações
A disposição das três ocupações em negociar foi ressaltada pela militante das Brigadas Populares, Isabela Gonçalves Miranda. Ela lembrou que, no caso da Maria Guerreira e Maria Vitória, quase metade da área originalmente ocupada era propriedade privada. Depois de algumas conversas com o poder público, essa parte teria sido deixada pelas famílias para que a negociação sobre a outra, da PBH, fosse negociada.
Na opinião do Frei Gilvander Moreira, que trabalha com ocupações urbanas da Região Metropolitana de Belo Horizonte, o problema habitacional tem solução, basta que os envolvidos estejam dispostos a negociar. Ele citou estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com dados de 2007 a 2012, que aponta BH como a segunda capital brasileira com maior aumento no déficit habitacional.
“É mentira quando a prefeitura diz que não existe terreno. Existem evidências de que algumas áreas ocupadas são griladas, outras são terrenos públicos usados por empresas privadas sem nenhum tipo de licitação ou processo legal”, salientou Frei Gilvander.
A negativa da PBH em negociar foi reafirmada pelo defensor público Aílton Magalhães. Ele explicou que a prefeitura criou um sistema de reintegração de posse sem mandado judicial, no qual seus próprios agentes se ocupam de tudo, desde a notificação até o despejo. “Estão usando a Guarda Municipal como tropa de choque”, criticou. Para ele, todo o processo é ilegal, já que não se pode violar o domicílio de alguém sem mandado.
A promotora Cláudia do Amaral Xavier completou que o Executivo municipal estabeleceu o ano de 2009 como marco e reconheceu as ocupações existentes antes disso. Depois deste ano, determinou que não haveria diálogo ou negociação. “É uma opção política convicta e inabalável. É por isso que eles não participam das negociações”, afirmou.
Cláudia disse, ainda, que é preciso garantir que os juízes, antes de emitirem mandados, visitem os locais, entendam o perfil de quem vive lá e em que condições.
Planos diretores - A fim de conseguir avanços na criação de áreas de interesse social, a deputada Marília Campos (PT) defendeu a participação de todos os envolvidos na discussão dos Planos Diretores Municipais.
O deputado Cristiano Silveira (PT), por sua vez, mostrou-se decepcionado pela recorrência de denúncias de violência policial e déficit habitacional, mas falou que é preciso ter persistência. Ele elogiou os movimentos sociais e afirmou que não é preciso esperar pela ação das prefeituras, já que o Estado também pode fazer um inventário dos seus terrenos e buscar soluções para o problema.
Requerimentos - Ao fim da audiência, foram aprovados: requerimento de visita ao presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Herbert Carneiro, para discutir a situação das ocupações; requerimento de audiência pública, com a presença de representantes dos municípios da RMBH, para mapear áreas que podem ser disponibilizadas; e pedidos de providências sobre, por exemplo, o uso da Guarda Municipal em ações de despejo pela PBH.