O Debate Público Plano Estadual de Educação: Fundamentos para Discussão e Monitoramento foi realizado durante toda a segunda-feira (25), no Plenário da ALMG
Bruno Lazzarotti apresentou dados para mostrar a desvalorização dos professores no Brasil
Segundo Beatriz Cerqueira, o número de escolas em tempo integral em 2014 é menor que em 2010
O deputado Léo Portela mostrou-se preocupado com a elaboração dos planos de educação

Pesquisador defende maior investimento em educação

Especialistas apontam também desafios para o ensino, como a valorização dos educadores.

25/05/2015 - 20:41 - Atualizado em 26/05/2015 - 11:58

Além de ser importante aperfeiçoar os métodos de gestão da educação brasileira, também é preciso ampliar os investimentos nesse setor. Essa foi a opinião defendida por Bruno Lazzarotti, professor da Fundação João Pinheiro (FGV). Ele participou do painel "Plano Estadual de Educação: Alinhamento ao Plano Nacional de Educação, diretrizes complementares e especificidades da educação mineira", que encerrou o Debate Público Plano Estadual de Educação: Fundamentos para Discussão e Monitoramento, realizado nesta segunda-feira (25/5/15) pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

“Quando economistas tratam da educação brasileira, ficam espiritualizados, não se apegando a bens materiais, afirmando que dinheiro não é tanto o problema, que a questão é gastá-lo bem”, ironizou Lazzarotti. Para contrapor esse argumento, ele apresentou gráfico cruzando dados sobre o desempenho no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) com o percentual de recursos aplicados na área por países desenvolvidos e em desenvolvimento.

Na avaliação do professor, o gráfico mostra que, quando o investimento no ensino é alto (caso de Coreia do Sul, Finlândia, Japão e Canadá), a maneira como os recursos são gastos tem uma importância maior, determinando variações de desempenho. Isso não ocorre quando o percentual de recursos na educação é baixo, como ocorre em países como Brasil, México, Rússia e Turquia, em que o investimento inferior, por si só, já determina um pior resultado no Pisa.

Nessa linha de raciocínio, Bruno Lazzarotti faz uma projeção. “Vamos pensar no aumento do investimento em educação no País, sem melhoria na qualidade: ainda assim, 70% dos recursos seriam bem gastos, porque estaríamos investindo principalmente nos professores, que têm salários baixíssimos”, afirmou.

Desvalorização profissional - Outros dados que mostram a desvalorização dos trabalhadores da educação foram apresentados pelo especialista. Segundo Lazzarotti, as notas de corte mais baixas no Sistema de Seleção Unificada (Sisu) são aquelas para cursos de formação de professores. De 47 cursos superiores analisados, os relacionados ao magistério estão entre as piores profissões. “A verdade é que não se tem sacerdotes da educação”, afirmou, defendendo a melhoria salarial para os docentes.

Quanto aos níveis de ensino, o pesquisador avalia que o Brasil está em piores condições na educação infantil e no ensino médio. “O acesso à educação fundamental está praticamente universalizado, mas falta muito na educação infantil. É um direito das crianças e também das mulheres, por dar maior autonomia a estas”, avaliou.

Sobre o ensino médio, Bruno Lazzarotti fez outra ironia, afirmando que “esse nível deveria ser considerado tratamento cruel e desumano a prisioneiros”. Para ele, o modelo atual está completamente superado, com a transmissão de conhecimento feita de forma fragmentada. “Se não mudarmos esse modelo, não vamos superar o impasse do ensino médio”, disse. De acordo com Lazzarotti, hoje, a juventude está conectada o tempo todo e as escolas estão combatendo o que deveria ser a ferramenta principal do ensino: a tecnologia. “Está sendo ampliado cada vez mais o desencontro entre a necessidade juvenil e o que as escolas oferecem ”, lamentou.

Por fim, Lazzarotti atacou um problema que considera o principal: a desigualdade educacional. “Em Minas Gerais, ela é muito alta e sobreposta: desigualdade de acesso, de permanência, de progressão, de desempenho”, afirmou. Para ele, há grupos historicamente prejudicados por essa assimetria: os moradores da zona rural, os negros, os habitantes do Jequitinhonha e do Norte de Minas. “A educação, funcionando por si, já reproduz ou mesmo acentua as desigualdades que estão fora da educação”, concluiu.

Escolas sucateadas, professores mal remunerados

Já para Beatriz Cerqueira, coordenadora geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT-MG), o grande desafio do Plano Estadual de Educação é envolver quem está dentro da escola e das superintendências de ensino. “Precisamos saber se há interesse real de nos ouvir ou se será como nos governos anteriores. Fomos bombardeados com peças publicitárias que diziam que professores ganhavam bem e que a educação era ótima. E a realidade não era essa: escolas sucateadas, professores mal remunerados”, contrapôs.

Beatriz Cerqueira apresentou como um dos desafios a educação infantil. No caso de Minas Gerais, só 35% das crianças de 0 a 6 anos têm acesso a essa modalidade de ensino. No ensino fundamental, 6% das crianças estão fora das escolas. No ensino médio, a situação é pior: o número de vagas ofertadas diminuiu nos últimos anos, com 900 adolescentes não conseguindo vagas nas escolas. Ainda segundo a sindicalista, o número de escolas em tempo integral em 2014 é menor que as existentes em 2010.

A dirigente da CUT-MG considerou “vergonhosa” a meta de apenas sete anos de escolaridade prevista no atual Plano Nacional de Educação. Além disso, defendeu que não se pode falar em qualidade quando se vê, na prática, que a maioria das escolas mineiras não oferece as condições mínimas necessárias para a educação: 51% das escolas do ensino médio e 61% do fundamental não têm quadra de esporte, segundo ela. A maioria dos alunos não tem lugar adequado para comer: 59% no ensino médio e 60% no fundamental. E 75% das escolas não têm laboratório, de acordo com a sindicalista.

Por último, ela criticou a maneira como os governos vêm usando os índices de qualidade do ensino. “O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) se tornou nosso pesadelo porque o Estado nos responsabiliza pelos resultados e nós internalizamos essa culpa. O objetivo de gestão era detectar erros e corrigi-los, e não é isso o que ocorre: eles simplesmente transferem a responsabilidade para o educador”, lamentou.

Sistemas de avaliação - O deputado estadual pelo Rio de Janeiro Waldeck Carneiro (PT) concordou que os sistemas de avaliação devem ser aprimorados. “Exames em larga escala não devem ser eliminados, mas devem ser combinados com outras formas de avaliação da qualidade da educação”, apontou.

Para elaborar o novo Plano Nacional de Educação (PNE), o parlamentar defendeu que se observem os erros do passado. Na opinião de Carneiro, no PNE passado, do governo Fernando Henrique Cardoso, houve pouco monitoramento e controle, além de pouca participação da sociedade. Já na gestão Lula, segundo ele, a criação do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) atropelou o PNE, que deveria ser concebido como plano de estado, e não de governo.

Com base nas experiências passadas, o deputado estadual tentou resumir as prioridades do novo PDE. “Tem que haver recursos suficientes, gerenciamento qualificado e estruturas de controle social do uso do dinheiro”, afirmou. E por fim, defendeu a participação de universidades na construção do plano, de modo a aproveitar melhor o conhecimento científico produzido sobre a educação.

'É preciso incentivar o professor a atuar na periferia', diz pesquisadora

Representando o Grupo de Pesquisa Política e Administrativa de Sistemas Educacionais da UFMG, Marisa Ribeiro Teixeira Duarte destacou, em sua fala, a necessidade de se adotar políticas de permanência do aluno na escola que levem em conta a segregação social do sistema educacional. “Temos escolas para setores médios e escolas para a periferia”, afirmou. Para enfrentar essa realidade, ela defendeu que se incentive o profissional que está em sala de aula e que atue nas escolas de periferia. “Hoje, quanto mais longe se está da sala de aula, mais se ganha”, declarou ela.

Marisa Duarte também defendeu a adoção de fatores de ponderação do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Por exemplo, que municípios sejam recompensados pelos gastos com creches e pré-escola, que são mais caros. 

Ideologia de gênero gera polêmica

O deputado Léo Portela (PR) revelou sua preocupação quanto à elaboração do PNE e, principalmente, do Plano Estadual de Educação. De acordo com ele, estão sendo abertas brechas para a inserção de termos da chamada ideologia de gênero, apesar de o PNE ter rejeitado essas premissas. “A ideologia de gênero é aquela que estimula a emancipação sexual infantil, dizendo que as crianças nascem ambíguas, bissexuais, e podem experimentar diferentes papeis antes de escolherem seu sexo. Isso é uma afronta às famílias mineiras e brasileiras”, disparou.

Ainda segundo o parlamentar, mesmo com a norma nacional tendo retirado a ideologia de gênero do texto, vários planos municipais e estaduais estão recheados de termos dessa linha de pensamento, o que seria uma diretriz da última Conferência Nacional de Educação (Conae). “Essa alteração do paradigma civilizacional nós não queremos para Minas Gerais; a resolução do Conae não pode se sobrepor à lei maior”, protestou.

No encerramento do debate, diversos participantes criticaram a fala do deputado Léo Portela. O presidente da Fundação Joaquim Nabuco, Paulo Rubem Santiago, comparou as observações contrárias à ideologia de gênero com as reações do passado a conquistas como a abolição da escravatura, voto feminino e divórcio. “Deixa passar, essas coisas retrógradas vão ficar para trás”, afirmou.

Financiamento - Outra questão ressaltada por Santiago foi o perigo representado pela expansão da demanda privada no Fundo Público de Educação. Segundo ele, empresários da educação tentam aprovar o uso de recursos do fundo para o ensino à distância, por meio do Programa Universidade para Todos (Prouni) e do Financiamento Estudantil (Fies). Se isso for permitido, em sua avaliação, a disponibilidade de recursos para a educação pública ficaria irremediavelmente comprometida.