Anatel não considera irregular bloqueio de internet
Prática tem sido adotada por empresas de telefonia móvel para clientes que atingem franquia contratada.
23/04/2015 - 16:08 - Atualizado em 24/04/2015 - 11:17A redução da velocidade da internet nos celulares de clientes que atingem a franquia contratada do serviço pode causar congestionamentos na rede e prejudicar a qualidade de navegabilidade do consumidor. Esse motivo, que também está agregado a uma limitação de disponibilidade de rede, é o que justifica a decisão adotada pelas operadoras de telefonia móvel de bloquear o acesso à internet dos clientes que atingem a franquia contratada no mês. A medida foi defendida pelas operadoras de telefonia Vivo, TIM, Oi e Claro e ratificada pela Anatel, durante audiência pública promovida pela Comissão de Defesa do Consumidor e do Contribuinte da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta quinta-feira (23/4/15).
“A Anatel não é contrária à cobrança pelo pacote de dados e à interrupção de serviço quando se atinge a franquia. Isso não é irregular. O que está falho é a transparência nas ofertas”, defendeu a superintendente de relacionamento com os consumidores da Anatel, Eliza Vieira Leonel. Segundo ela, a proposta que vem sendo defendida – de uma eventual regulamentação por parte da Anatel de modo a proibir o bloqueio do acesso à internet – acarretaria um aumento da tarifa paga pelo consumidor, motivo pelo qual a agência reguladora se coloca contrária à medida.
As mudanças adotadas pelas operadoras de telefonia (no sentido de bloquear o acesso à internet dos clientes que atingem a franquia contratada) vêm sendo justificadas pelo artigo 52 da Resolução 632/14 da Anatel, que contém o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC). Essa norma permite que a empresa altere os planos de serviço, desde que isso seja avisado com 30 dias de antecedência. Por sua vez, os órgãos de defesa do consumidor contestam a medida, alegando que o regulamento não se sobrepõe ao Código de Defesa do Consumidor, que determina que os fornecedores não podem fazer mudanças unilaterais nos serviços contratados.
Eliza Leonel esclareceu que, caso o cliente tenha aderido a um contrato por prazo determinado e ainda esteja dentro do período de fidelização, ele tem o direito de cancelá-lo, sem nenhum ônus, se não concordar com as mudanças relativas à interrupção do serviço de internet após o término da franquia contratada. No entanto, caso o contrato não se enquadre mais no prazo de fidelização, a empresa tem o direito de fazer a alteração no contrato, nos termos previstos pela resolução.
Para Eliza Leonel, do ponto de vista técnico, o corte da internet após o consumo da franquia se mostra mais adequado do que a redução da velocidade do serviço. Isso porque, segundo ela, a rede de telefonia móvel tem uma limitação natural de radiofrequência, que independe de mais investimentos das operadoras. Ela comparou essa limitação da rede a uma rodovia que tenha todas as suas pistas ocupadas e que, por isso, não possibilita um fluxo maior de veículos.
A representante da Anatel ainda disse que a cobrança de um pacote adicional por parte das operadoras para que o serviço de internet seja disponibilizado após o término da franquia é uma maneira de fazer o consumidor pagar pelo que usa. Eliza Leonel também explicou que essas mudanças decorrem do novo perfil do usuário, que atualmente utiliza muito mais a internet 3G do que antigamente. Para ilustrar esse uso crescente do serviço, ela disse que, hoje, 80% dos consumidores checam seus telefones com intervalos inferiores a 30 minutos.
Falta transparência – Por outro lado, ao contrário do que afirmaram os representantes das operadoras de telefonia, Eliza Leonel disse que a Anatel acredita que as empresas falharam ao não informarem devidamente os consumidores sobre a mudança no serviço e sobre o bloqueio da internet. Nesse sentido, ela disse que a agência já notificou as operadoras quanto à transparência dos planos e que serão anunciadas medidas de melhoria na transparência das relações entre as empresas e o consumidor.
Encaminhamentos – Durante a audiência, a comissão aprovou requerimentos assinados por todos os seus membros, para que a Anatel seja oficiada sobre a grande quantidade de reclamações relativas ao bloqueio do acesso à internet no celular e realize uma fiscalização mais efetiva; para que a Defensoria Pública ajuíze uma ação civil pública com o objetivo de impedir o bloqueio do acesso à internet após o término da franquia contratada; para que as notas taquigráficas da reunião sejam enviadas à Associação Procon Brasil; e para que a Defensoria Pública ajuíze ação civil pública para que as operadoras sejam proibidas de cancelar o serviço de SMS ilimitado.
Empresas defendem bloqueio de internet
De acordo com a executiva de relacionamentos institucionais da TIM, Fernanda Oliveira Laranja Pinto, o uso da rede 3G no Brasil é três vezes maior do que no restante do mundo. Ainda segundo ela, 68% da população brasileira tem acesso à internet quando se fala em banda móvel e, nos próximos cinco anos, verifica-se que haverá um incremento de cinco a dez vezes na utilização do trafego de dados pelo consumidor. “Temos que melhorar a qualidade banda larga”, disse. Dessa forma, ela defendeu que o bloqueio do acesso à internet é a melhor solução técnica para a manutenção da qualidade do serviço.
“A velocidade reduzida nivela os consumidores, porque um consumidor que já usou sua franquia prende a rede e utiliza a capacidade de rede do consumidor que está com a franquia adequada”, explicou Fernanda, que ainda disse que a redução da franquia antes adotada era uma liberalidade da empresa. Segundo ela, o cliente da TIM foi e continua sendo previamente avisado sobre as mudanças adotadas, sendo também disponibilizada a ele a opção de mudança do pacote ou a adesão de um serviço extra de internet.
Mensagem – Ao ser questionada pelo deputado Noraldino Júnior (PSC) quanto ao bloqueio do envio de SMS nos planos em que o serviço é vendido como ilimitado, a representante da TIM afirmou que a medida se dá com base em um cálculo do quanto uma pessoa física é capaz de usar por mês, e que a prática seria uma forma de coibir o uso do serviço para publicidade. Sobre o assunto, a representante da Anatel, Eliza Leonel, considerou a prática irregular, uma vez que a propaganda feita aos consumidores é que o serviço será ilimitado.
Melhor qualidade – O consultor de relações institucionais da Vivo, Ricardo Mascarenhas Lopes Cançado Diniz, reforçou a tese de que a interrupção do serviço de internet potencializa a prestação do serviço. “O bloqueio não visa só o caráter financeiro, mas também garantir que a utilização do serviço seja maximizada”, explicou.
Ele também ratificou a informação de que há uma propensão ao aumento da venda de smartphones e de aplicativos que consomem cada vez mais dados, causando uma explosão do tráfego na rede. Segundo ele, como há uma limitação de frequência, é necessário racionalizar o uso, para que o cliente que ainda não tenha chegado ao seu limite de franquia tenha assegurada a qualidade da transmissão.
Ricardo Mascarenhas também reforçou o fato de que o consumidor que continua usando a internet depois que há uma diminuição da sua velocidade “congestiona” toda a rede. “Não ha condições de fornecer serviço de qualidade, com os novos anseios do cliente, com velocidade reduzida”,disse. Diniz também afirmou que essas mudanças de paradigmas nos serviços da empresa foram comunicados aos clientes e que os bloqueios de acesso à internet não têm sido feitos para os clientes de planos pós-pago.
O diretor de relações institucionais da Oi, José Luiz Gattás Hallak, defendeu que as empresas não conseguem fazer um atendimento que cubra mais de 8 milhões de quilômetros quadrados de superfície, o que acaba gerando certa insatisfação e desconforto do cliente. Segundo ele, a empresa somou investimentos de R$ 624 milhões no ano passado, em Minas Gerais. Ele também afirmou que os clientes têm sido sistematicamente avisados por meio de SMS sobre as mudanças que instituíram o bloqueio da internet nos planos pré-pago e controle.
O gerente de marketing da Claro, Gabriel Guimarães, afirmou que desde o dia 20 de janeiro deste ano a empresa aderiu ao bloqueio de acesso à internet para os clientes que alcançaram a franquia contratada. Apesar disso, segundo ele, a empresa disponibilizou um aumento de 29% da franquia de internet para os clientes pré-pago e controle e de 33% para os clientes de planos mensais.
Consumidor quer mais informações sobre serviços contratados
O coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa, destacou que as principais reclamações do consumidor se baseiam na interrupção do serviço de transmissão de dados, em vez de ter a velocidade reduzida; na contratação pelo cliente de um plano ilimitado, mas que após determinado uso tem o serviço de internet bloqueado; na pouca publicidade a respeito do bloqueio do serviço de internet, que não é feito de forma abrangente e cria no consumidor a expectativa de que o serviço lhe será oferecido de forma ilimitada; e na falta de controle por parte do cliente com relação ao consumo do pacote de internet.
De acordo com Barbosa, em relação ao bloqueio do uso de internet do cliente que atinge sua franquia de dados, a Vivo é a empresa com o maior número de reclamações, seguida da Oi e Tim. Segundo ele, o Procon ainda não registrou reclamações contra a Claro com relação à interrupção da internet. Ainda segundo Barbosa, os dados de Procons de todo o País apontam o segmento de telefonia fixa e móvel como o campeão de reclamações dos consumidores.
Barbosa também reforçou que o consumidor não é devidamente informado a respeito da extinção do pacote de dados de internet após o alcance da franquia e que a Secretaria Nacional do Consumidor abriu investigações contra as quatro operadoras, baseando seus questionamentos nas questões de oferta, lealdade e clareza.
Segundo o deputado Sargento Rodrigues (PDT), autor do requerimento para a audiência, todas as empresas de telefonia vêm adotando práticas abusivas, que não correspondem à correta prestação do serviço. “A relação com o consumidor requer uma prática mais respeitosa”, cobrou Rodrigues, ao lembrar que o artigo 4º do CDC garante, entre outras coisas, o respeito à dignidade do consumidor, a proteção de seus interesses econômicos e a transparência nas relações de consumo. “Esperamos que as empresas que fizeram o acordo na CPI da Telefonia tenham um zelo maior e apresentem propostas mais concretas. As empresas têm um papel importante, recolhem tributos, geram empregos, mas é necessário equilibrar. O consumidor está muito prejudicado. Esperamos ações concretas das empresas e maior fiscalização da Anatel”, disse.
O deputado Elismar Prado (PT) lembrou do trabalho realizado no âmbito da CPI da Telefonia da Assembleia e mencionou que o relatório final, assinado por todos os representantes das empresas, estabelece um plano de melhorias nos serviços prestados.
O deputado Noraldino Júnior lembrou que, em 2010, foi instituída na Câmara Municipal de Juiz de Fora uma comissão especial de telefonia. Ele disse que, embora a comissão tenha se reunido por duas vezes com a Anatel, solicitando maior fiscalização, a agência até hoje não deu uma resposta aos vereadores do município. “O que me impressionou é a inoperância da Anatel na defesa dos interesses do cidadão. A Anatel tem demostrado ineficácia e ineficiência com o cidadão”, disse.
O deputado Douglas Melo (PSC) também defendeu que o consumidor tenha um serviço de telefonia de qualidade. Já o deputado Roberto Andrade (PTN) defendeu que as empresas de telefonia melhorem seus canais de comunicação com o cliente.
A defensora pública especializada em Defesa do Consumidor, Sabrina Ielo,cobrou uma maior aproximação com os fornecedores dos serviços de telefonia, no sentido de possibilitar que as demandas dos consumidores sejam resolvidas fora do judiciário.