Em reunião nesta terça (6/2), grupo de trabalho formado por deputados estaduais debateu questões agrárias e pediu providências ao Executivo e ao Judiciário
Os deputados consideram que a atuação do Governo do Estado é fundamental para evitar violência nas ações de reintegração de posse

Promotores denunciam abusos na Vara de Conflitos Agrários

Juiz é acusado de atuar contra movimentos sociais em ações de reintegração de posse.

06/02/2013 - 15:46

Denúncias de irregularidades na atuação do juiz Otávio de Almeida Neves, titular da Vara de Conflitos Agrários do Estado, foram debatidas por grupo de trabalho formado por deputados estaduais na Assembleia Legislativa de Minas Gerais em reunião realizada nesta quarta-feira (6/2/13). Representantes do Ministério Público, Incra, Iter, Defensoria Pública, Pastoral da Terra, CUT e outros movimentos sociais ligados à questão da terra apresentaram fatos que comprovariam a parcialidade do magistrado em favor dos proprietários de terra e em prejuízo dos trabalhadores rurais.

De acordo com o promotor do Centro de Apoio Operacional de Conflitos Agrários do Ministério Público, Afonso Henrique de Miranda Teixeira, a Vara de Conflitos Agrários está atuando contra os movimentos de luta pela terra. Para ele, o juiz não aplica o princípio norteador do direito agrário da função social da terra, descumpre normas processuais legais e revoga dispositivos que criaram a própria vara.

O promotor Renato Augusto de Mendonça apontou evidências de que o magistrado teria afrontado os deveres de imparcialidade. Ele deu exemplos de casos que comprovariam a denúncia, tais como emissão de liminares sem que elas sequer tenham sido pedidas, além de reintegrações de posse consideradas arbitrárias até por magistrados federais.

Ouvidor agrário corrobora denúncias

O ouvidor do Ministério do Desenvolvimento Agrário, desembargador Gercino José da Silva Filho, disse que, apesar de diversas tentativas, não tem sido recebido pelo Tribunal de Justiça para discutir a situação. Segundo ele, a intenção não é recomendar decisões judiciais, mas exigir o cumprimento da legislação vigente. “Vamos buscar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para solicitar que a atuação desse magistrado seja feita de forma ética”, disse. Ele fez ainda uma extensa explanação sobre as leis ligadas à questão agrária para demonstrar as supostas irregularidades cometidas pelo titular da Vara de Conflitos Agrários. “Para suspender as reintegrações de posse em fase de execução, a comissão pode e deve procurar o Tribunal de Justiça, para que se defina um plano de ação para cada caso”, sugeriu.

Já as lideranças do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) que participaram da reunião expuseram as insatisfações dos movimentos sociais com relação à atuação da Vara de Conflitos Agrários. Eles cobraram a regularização de terras em Minas Gerais, ações de prevenção de massacres contra trabalhadores rurais e a suspensão dos processos de reintegração de posse.

Entidades demonstram apoio aos movimentos sociais

Os demais participantes da reunião manifestaram apoio à luta pela terra. O deputado federal Padre João (PT-MG) destacou que a reforma agrária está estagnada no Brasil e que o desafio é buscar avanços ao longo de 2013. Ele defendeu os movimentos sociais em contraposição ao poder econômico do agronegócio.

O superintendente regional do Incra, Carlos Calazans, anunciou que foi criada uma comissão, com presença dos movimentos sociais, de representantes do Estado e da própria autarquia, para tratar de ações de reintegração de terra em Minas. Esse grupo foi definido em reunião realizada com o alto comando da Polícia Militar e o secretário de Estado de Defesa Social, Rômulo Ferraz. Ainda segundo Calazans, o secretário de Estado extraordinário de Regularização Fundiária, Wander Borges, será o coordenador da comissão, que fará sua primeira reunião após o carnaval.

A coordenadora da Defensoria Pública de Direitos Humanos, Ana Cláudia Silva Alexandre, afirmou que várias arbitrariedades vêm sendo percebidas nos processos que vêm da Vara de Conflitos Agrários, sobretudo com relação a reintegrações de posse. "Recentemente chegaram a limites que beiram o absurdo, por obterem imediata reitegração sem conhecimento da real situação das partes envolvidas", disse.

Paulo Roberto Faccion, da Comissão Pastoral da Terra, denunciou que as varas agrárias violam os direitos humanos e facilitam a ação dos policiais. Já o representante do Instituto de Terras de Minas Gerais (Iter-MG), Aldemir Vianna Pereira, disse estar vendo ir por água abaixo o que se construiu ao longo de dez anos, "uma justiça agrária conduzida por pessoas sensíveis às questões do campo". Para ele, hoje há situações que demonstram o oposto.

Deputados questionam atuação do Governo do Estado

Os parlamentares reforçaram as denúncias de que o principal gargalo dos conflitos de terra em Minas Gerais passa pela parcialidade da Vara de Conflitos Agrários. Mas eles ponderaram que a atuação do Governo do Estado é fundamental para evitar que ocorra violência nas execuções de reintegração de posse. O deputado Rogério Correia (PT) disse que existem mais de 50 ordens de despejo em execução em Minas, e por isso é preciso que a Polícia Militar seja orientada pelo governador para que não haja violência nesses processos.

O deputado Durval Ângelo (PT) afirmou que o problema de injustiça agrária é antigo em Minas Gerais, apesar de o Estado ter sido pioneiro na criação de uma vara especializada em conflitos agrários. Segundo ele, nos últimos anos, a Justiça tem respeitado apenas o direito à propriedade, e não a função social da terra. “A polícia deve fazer planejamento para que se faça a reintegração de posse, mas a corporação já confessou que não tem condições de executar essas ações em segurança”, alertou.

Parlamentares pedem providências ao Executivo e ao Judiciário

Após os debates, o grupo de trabalho cobrou providências a órgãos ligados à questão da terra. O deputado Durval Ângelo pede o encaminhamento das notas taquigráficas da reunião para todas os órgãos e movimentos sociais presentes; o imediato afastamento do juiz da Vara de Conflitos Agrários e da juíza da Vara Federal Especializada; a realização de audiência com presidente do TJMG, desembargador Joaquim Herculano, para tratar das reintegrações de posse em fase de execução no Estado; a assinatura de um manifesto nacional pedindo afastamentos e mudanças nas varas agrárias; e a agilização do pagamento de indenizações aos proprietários de terra de Brejo dos Crioulos, que fizeram acordo com os trabalhadores rurais. Ele também solicitou a realização de visita da Comissão de Direitos Humanos a Rio Pardo de Minas (Norte do Estado) para verificar a situação das ocupações de terra na região.

O deputado Rogério Correia solicitou o envio de ofício ao governador do Estado, para que seja feita uma orientação formal à Polícia Militar no sentido de não executar as ações de reintegrações de posse até que as situações sejam regularizadas.