Construção de barragem gera insatisfação com a Copasa
Moradores de cidades da Bacia do Rio Sapucaí, no
Sul de Minas, reivindicaram nesta quarta-feira (9/7/08) mais
transparência do Governo do Estado e da Copasa quanto ao projeto de
construção de barragens para conter enchentes em três pontos da
bacia. Eles participaram de audiência da Comissão de Assuntos
Municipais e Regionalização da Assembléia Legislativa de Minas
Gerais, realizada em Brazópolis, a requerimento do deputado Almir
Paraca (PT).
Os moradores alegam que desconhecem o projeto, não
participaram de sua elaboração e sequer foram consultados. Muitos
temem ter que deixar suas terras recebendo indenizações injustas. A
obra está orçada em R$ 310 milhões e prevê a remoção de pelo menos
850 famílias.
O objetivo do sistema de contenção de cheias, de
acordo com a Copasa, é evitar enchentes como a do ano 2000, que
deixou cinco mortos, 1.600 desabrigados e 20 mil residências
atingidas nos municípios de Itajubá, Santa Rita do Sapucaí e Pouso
Alegre, grandes beneficiários do projeto. A área de alagamento das
barragens, porém, atinge outros municípios, gerando os
questionamentos. De acordo com informativo distribuído pela Copasa
durante a audiência, a barragem do Rio Sapucaí abrange os municípios
de Itajubá, Piranguçu e Wenceslau Braz. A do Rio Lourenço Velho
alagaria área em Itajubá, Maria da Fé e São José do Alegre. E a do
Rio Vargem Grande envolveria Brazópolis, Cachoeira de Minas,
Conceição dos Ouros e Piranguinho.
O deputado Almir Paraca salientou a preocupação dos
prefeitos da região com os agricultores familiares, que seriam os
mais atingidos pelas barragens, e lembrou que o assunto já foi
discutido pela ALMG em outras ocasiões. "Agora, com a iminência das
obras, voltamos a debater o tema", afirmou. Já o prefeito de
Brazópolis, João Mauro, afirmou que, enquanto os municípios menores
serão prejudicados pelos alagamentos, não há clareza quanto aos
benefícios para Pouso Alegre, Santa Rita do Sapucaí e Itajubá. "A
obra afeta o meio ambiente e nossa economia, pois atinge a produção.
Isso não está quantificado, e teria que haver uma indenização",
afirmou.
João Mauro lembrou ainda o movimento dos atingidos
por barragens em Minas, que congrega, justamente, pessoas que não
foram indenizadas ou receberam pagamento considerado injusto. "A
terra tem uma história de vida, tem raízes, foi herança dos pais.
Não há como compensar isso", afirmou. Para o prefeito, as famílias
removidas precisam de um local digno e de acompanhamento por parte
do Poder Público. "Há projetos alternativos, com menor impacto
social. Queremos o debate para evitar esse projeto imposto de forma
autoritária e centralizadora", criticou.
Também o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica
do Rio Sapucaí, Renato de Oliveira Aguiar, criticou a falta de
clareza do projeto. Segundo ele, o comitê conseguiu se reunir com a
Copasa após insistência de seus membros, mas não foi chamado a
discutir a obra ou a participar da elaboração do projeto e sequer
foi ouvido. "Há mais de quatro anos discutimos o Plano Diretor da
Bacia, que é um instrumento de gestão importante para se conhecer a
região. E agora vem um projeto complexo, sem que se saiba sequer a
demanda hídrica de cada município", criticou. Ele listou como
prioridades a elaboração do Plano Diretor; a definição de medidas
complementares às barragens, para sanar de vez o problema das
cheias; e a análise de propostas alternativas ao sistema de
contenção.
Copasa garante que alagamento não será permanente
O gerente da Copasa do Distrito Alto Mantiqueira,
Tales Augusto de Noronha Mota, lembrou que os estudos para
construção de barramentos na região foram iniciados ainda na década
de 60 e retomados após a enchente de 2000. Segundo ele, uma comissão
formada por órgãos de governo e universidade estudou uma área de
mais de 5 mil quilômetros quadrados e identificou os pontos
vulneráveis de cada cidade. "A estrutura de saúde e educação dessas
grandes cidades é essencial à região. Há também estradas e fábricas
que ficam alagadas", afirmou. Segundo Mota, 30 locais foram
analisados, até que os técnicos definiram os pontos das três
barragens do projeto.
De acordo com o gerente, ao contrário de um
barragem de usina hidrelétrica, por exemplo, que fica inundada
durante todo o ano, os barramentos projetados para o Bacia do
Sapucaí ficariam cheios por menos de 15 dias. Eles seriam usados
apenas para controlar o excesso de água em dias de chuva volumosa,
sem alterar o sistema natural dos rios. E seriam monitorados por um
sistema de telemetria (transmissão de dados à distância). "Na chuva,
passaria mais água no rio, mas sem o risco de inundação",
esclareceu. Tales Mota disse ainda que uma das possibilidades de
negociação com os agricultores é o pagamento de uma espécie de
aluguel prévio pela área que será inundada temporariamente,
permanecendo a propriedade na posse do morador, para uso como pasto
ou outra atividade nos períodos mais secos.
Durante os debates, moradores enfatizaram a falta
de informações sobre o projeto e criticaram a forma autoritária como
ele vem sendo imposto pelo Governo do Estado. O pastor Elmir
Pereira, de Maria da Fé, destacou que o Bairro São João, responsável
por 12% da receita da cidade - com fábrica de doces e engenhos -,
será alagado, assim como áreas que abastecem a região de
hortigranjeiros. Também o agricultor Tarcísio Caetano afirmou que a
miséria será maior com o projeto, em função do desemprego das
famílias. "Não queremos viver de cesta básica. Somos trabalhadores.
Deveriam investir no desassoreamento do rio", opinou.
Até a legislação ambiental foi questionada pelos
produtores rurais. "Somos impedidos de cortar um pau, mas o projeto
pode alagar tudo", disse Lúcio Silva. Outro temor dos moradores é
quanto ao risco de epidemias de doença quando a água dos barramentos
baixar e sobrar apenas lama. Já Péricles Pinheiro, morador da
região, alegou que há um abismo entre o que a Copasa se propõe a
fazer e o que vem sendo entendido pela população. "Tem gente
pensando em montar pousada com sistema de pesca nas barragens",
exemplificou. Pinheiro sugeriu a formação de comissões nas
prefeituras para informar melhor os moradores sobre os detalhes do
projeto.
A superintendente regional de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável do Sul de Minas, Valéria Cristina
Rezende, adiantou que serão feitas audiências em todas as regiões
atingidas pelo projeto na fase de licenciamento ambiental. E o
prefeito de Brazópolis, João Mauro, deu início, ao final da
audiência, à criação de uma comissão com representantes dos
municípios, ONGs, igrejas e agricultores para acompanhar todo o
projeto.
Requerimentos - O deputado
Almir Paraca apresentou quatro requerimentos que deverão ser votados
nas próximas reuniões da comissão. O primeiro solicita ao Executivo
e à Copasa que enviem cópia do projeto aos órgãos ambientais,
inclusive federais, ao Ministério Público estadual e federal e à
Comissão de Meio Ambiente da ALMG, para análise. O segundo,
endereçado ao Executivo, solicita a elaboração do Plano Diretor da
Bacia do Sapucaí, junto com o Comitê de Bacia Hidrográfica, antes da
execução do projeto das barragens. Outra solicitação é para que o
Governo e a Copasa analisem e considerem projetos alternativos para
contenção de enchentes. E o quarto requerimento solicita um
planejamento minucioso das indenizações e reassentamentos antes da
execução da obra, com a realização de audiências públicas
previamente divulgadas e com espaço para manifestação dos
moradores.
Presenças - Além das
autoridades citadas, compuseram a mesa o perfeito de Maria da Fé,
Walter Mussolini; o vice-prefeito de Piranguinho, Francisco
Mendonça; o presidente da Câmara Municipal de Brazópolis, Rubens de
Almeida; o vereador Danilo, representando o município de Cachoeira
de Minas; João Ederson Correia, secretário de Saúde de São José do
Alegre; e José Alexandre Ribeiro, de Piranguçu. Vários outros
representantes de prefeituras também participaram da audiência.
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