Deputados cobram providências em casos de violência policial

Dois casos de violência policial - um no Sul de Minas que resultou em morte e outro no campus da Universidade Federal...

10/04/2008 - 00:01
 

Deputados cobram providências em casos de violência policial

Dois casos de violência policial - um no Sul de Minas que resultou em morte e outro no campus da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na Capital - mobilizaram nesta quinta-feira (10/4/08) a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Como resultado da reunião, os deputados decidiram que vão visitar a Auditoria Militar, a fim de reivindicar que seja alterada, de crime de lesão corporal grave para tortura seguida de morte, a tipificação da conduta criminosa, no caso do Sul. Outro resultado é que a comissão vai visitar a reitoria da UFMG para discutir a ação dos policiais, a maioria sem identificação ao ocupar o campus. Foram aprovados 17 requerimentos após ouvir oito convidados e seis denunciantes. A data das visitas não está agendada.

O primeiro caso foi a denúncia de que Thiago Zanin de Lima, 24 anos, morreu em decorrência de brutal espancamento por policiais militares, após ser preso em São José da Barra, em dezembro de 2007, por conta de uma discussão de trânsito. O segundo caso envolve episódio de violência policial contra estudantes no Instituto de Geociências da UFMG, no último dia 3, devido à tentativa de exibição de um vídeo, divulgado por revista em banca de jornal, que traz um debate sobre a legalização das drogas e uma abordagem da questão nos Estados Unidos, na década de 20. O corregedor da Polícia Militar (PM), coronel Cezar Romero Machado Santos, afirmou que o órgão vai apurar o caso da UFMG. "Quem falhou, se falhou, será punido. A PM não coaduna com ações que vão contra a lei", disse. Vários estudantes também estiveram no Auditório.

Comissão avalia que houve tortura; deputados querem ficha funcional dos acusados

A comissão definiu que visitará o juiz da 2ª Auditoria Militar, onde está o processo relativo aos PMs do Sul de Minas. Os deputados querem reivindicar a mudança da tipificação da conduta criminosa dos envolvidos na denúncia: de crime de lesão corporal grave para tortura seguida de morte. "Por que a polícia tem tanto medo de usar a palavra tortura?", questionou o presidente da comissão, deputado Durval Ângelo (PT), que pediu o debate desta quinta por solicitação do deputado Rêmolo Aloise (PSDB). O presidente e o deputado João Leite (PSDB) enfatizaram que a comissão vai acompanhar o assunto, respondendo a Gilberto de Lima, pai de Thiago, presente à reunião.

Caso a Justiça Militar entenda que o crime é de tortura, o caso seria encaminhado à Justiça comum. Segundo o deputado Durval Ângelo, em todos os três casos de PMs condenados no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por tortura em Minas, a caracterização inicial foi de violência arbitrária ou outro nível de agressão. A atitude da comissão, segundo o deputado, pode contribuir para criar uma cultura diferente do que é o crime de tortura, tendo em vista que a lei sobre o assunto é muito recente, de 1997.

O inquérito policial civil e o inquérito policial militar (IPM) que apuram as causas da morte de Thiago Zanin de Lima já foram concluídos. O sargento José do Patrocínio Oliveira e os cabos Evandiu Gonçalves Vilela e Luiz Carlos Pereira foram indiciados, no inquérito conduzido pela Delegacia de Alpinópolis, por lesão corporal seguida de morte, segundo informou o delegado regional, Fábio de Oliveira. Houve indiciamento, no IPM, por lesão corporal grave qualificada com violência arbitrária. Essa informação foi dada pelo comandante do 12º Batalhão de Passos, tenente-coronel Marcelo Alves Aleixo, que informou não ter "a convicção para comprovar, de forma concreta, que a morte foi em decorrência da lesão."

Outros requerimentos tratam do envio das notas taquigráficas da reunião ao juiz e ao promotor de Justiça Militar e ao juiz e ao promotor da comarca de Alpinópolis, no Sul de Minas, para providências. Também serão enviadas as notas taquigráficas a Gilberto de Lima, pai de Thiago. Ao corregedor-geral da PM foram solicitadas informações e cópias das fichas funcionais dos policiais acusados, com as apurações administrativas e os IPMs em andamento ou encerrados. Esses dados terão que ser encaminhados à comissão em 30 dias, prazo constitucional. Todos os requerimentos relacionados com o episódio do Sul de Minas são do deputado Durval Ângelo.

Depoimento emocionado - Gilberto de Lima, pai de Thiago, trouxe um relato emocionado à comissão. "Peço a Deus que faça justiça para que outros pais e mães não chorem igual a mim. Meu filho não volta mais. O que estou fazendo agora é para que não aconteça com os outros o que aconteceu comigo", disse, aos prantos.

Ele contou que o filho foi preso no dia 9 de dezembro de 2007 em um bar, após uma discussão de trânsito. Ele foi preso pelo sargento José do Patrocínio Oliveira e pelos cabos Evandiu Gonçalves Vilela e Luiz Carlos Pereira às 21h47, segundo o boletim de ocorrência. De acordo com o pai, Thiago foi levado ao batalhão da PM em Furnas, onde foi espancado. Depois, foi conduzido pelos policiais ao hospital de São José da Barra, para sutura do supercílio. Ele recebeu 11 pontos. Após o atendimento, foi levado, de acordo com o pai, a um local conhecido como "lixão", onde os policiais teriam prosseguido com as agressões. Somente às 4 horas foi levado à delegacia de Alpinópolis.

O rapaz ficou preso até o dia seguinte, sendo libertado sob pagamento de fiança. Ele se queixava das agressões, contando que sentia fortes dores na garganta, onde um dos policiais teria enfiado o cano do revólver. No dia 11 de dezembro foi levado ao hospital de São José da Barra e depois à Santa Casa de Passos, sendo diagnosticadas fraturas em duas clavículas, perfuração do pulmão e lesões nos órgãos genitais, nas costas, pernas e barriga. Morreu em 14 de dezembro. O laudo de necrópsia apontou como causa da morte fratura na base do crânio e mediastinite, inflamação da cavidade que separa os pulmões, cujo foco de infecção primário é a boca ou a faringe.

Fala do delegado - De acordo com o delegado de Alpinópolis, Paulo Queiroz, Thiago Zanin de Lima teria sido preso depois que os policiais atenderam ao chamado de uma moradora de São José da Barra, que tentava entrar na garagem de sua casa quando o rapaz quase bateu nela, dirigindo em alta velocidade. A moradora chamou a polícia, pois disse ter sido ameaçada por Thiago. Alcoolizado, ele seria preso num bar por crime de ameaça e direção perigosa. No entanto, teria depois desacatado um policial, reagido ao ser colocado na viatura policial e, ao se debater dentro da viatura, teria estragado parte do veículo e machucado o supercílio. Após sair do hospital, disse o delegado, é que Thiago teria sido agredido, no quartel de Furnas. De acordo com Paulo Queiroz, a autuação em flagrante, na delegacia, foi por causa do dano ao patrimônio público, ou seja, à viatura.

O corregedor da PM, coronel Cezar Romero Machado Santos, e o ouvidor da Polícia, Paulo Vaz Alkimin, informaram que estão acompanhando o caso de São José da Barra. Já a coordenadora do Escritório de Direitos Humanos, Mariana Septimio, considerou positivo o fato de o processo já estar na Justiça Militar. Já o promotor Rodrigo Filgueira reforçou a indagação quanto ao fato de não ter sido inserida, no inquérito, a questão da tortura seguida de morte.

Deputados cobram providências da Corregedoria da PM e da Ouvidoria no caso UFMG

Estudantes e o professor de Geologia da UFMG Luiz Guilherme Knauer falaram à comissão sobre a atuação dos policiais militares. O professor disse que houve desrespeito, ameaça e agressão física, e informou que a maioria dos PMs estava sem identificação. "É impressionante como a PM se mostrou despreparada para lidar com seres humanos", avaliou. Suas palavras foram ratificadas pelos estudantes Mateus Malta e Marina Teixeira, que cobraram da universidade não uma postura burocrática, mas política, de conversar com a comunidade acadêmica. Segundo Malta, até agora não está claro para os estudantes quem acionou a polícia para tentar impedir a exibição do vídeo. A polícia recebeu reforços, com o envio de viaturas, motos e até helicóptero.

O estudante Guilherme Antunes Abjaudi relatou que recebeu voz de prisão por desacato à autoridade, ao cobrar do tenente Maurício que o tratasse "como gente". Ele foi abordado ao sair do instituto. Algemado, foi agredido e impedido de falar com um advogado. Já na viatura, disse que foi ameaçado e afirmou ter circulado por vários locais, antes de ser finalmente encaminhado à Delegacia de Justiça Especial Criminal. Ele ficou com os PMs de 19 horas às 21h30. Somente neste horário foi lavrado o boletim de ocorrência, onde se registra desacato à autoridade, resistência, incitação ao crime e à baderna.

Providências - Sobre o episódio na UFMG, ficou definido que a comissão visitará o reitor da universidade a fim de discutir a atuação dos PMs, a requerimento do deputado João Leite. Outro requerimento cobra do Comando-Geral da PM e da Corregedoria da corporação providências para apurar a atuação dos policiais. Serão remetidas à Corregedoria da PM e à Ouvidoria de Polícia, para providências, cópias das notas taquigráficas da reunião desta quinta (10), bem como da gravação de imagens do episódio.

A comissão também solicita ao corregedor, coronel Cezar Romero Machado Santos, providências para submeter o tenente Maurício a exames toxicológicos e de sanidade mental, em função de sua atuação na ocupação da UFMG. São solicitadas, ainda, providências à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG) quanto ao cerceamento da atuação da advogada Glória Trogo na defesa dos estudantes.

Além da resposta do corregedor, coronel Cezar Romero, de que o caso será apurado, a comissão ouviu do ouvidor da Polícia, Paulo Vaz Alkimin, que já foi aberto procedimento sobre o assunto. Para o deputado Durval Ângelo, o episódio de violência policial afronta a autonomia universitária e remete aos tempos de ditadura. "Queremos que policiais entrem na universidade por um único instrumento legal, o vestibular, e não para reprimir estudante ou cercear o direito à liberdade de expressão e discussão", disse. O deputado João Leite ratificou as palavras, classificando o episódio como lamentável. Fazendo um paralelo com o futebol, lembrou que "treino é treino, jogo é jogo". "O jogo do policial militar é na rua, no contato com as pessoas, com os estudantes", disse.

Um outro requerimento, também aprovado, trata do envio das notas taquigráficas da reunião ao juiz responsável pela audiência do estudante Guilherme Abjaudi no Juizado Especial Criminal, no próximo dia 17. O deputado informou que um assessor do gabinete deverá acompanhar essa audiência.

Itabira - Também foi aprovado requerimento para realização de audiência pública para esclarecer a morte do jovem Paulo Cesar Biondo, que teria sido agredido por seis homens em um posto de gasolina de Itabira, sendo espancado até falecer. A audiência será no dia 17, às 14h30. Também será feita visita a desembargador da Comissão Criminal do Tribunal de Justiça para discutir questões ligadas ao crime.

Outros requerimentos - Do deputado Durval Ângelo, foi aprovado requerimento para envio de ofício à Comissão de Anistia do Conselho Estadual de Direitos Humanos, encaminhando cópia da documentação apresentada pelo Comitê de Solidariedade de Anistia dos Praças Negros da PM, para providências. Também foi aprovado requerimento de Durval Ângelo para que a Ouvidoria do Sistema Penitenciário apure a denúncia de práticas criminosas de homicídio e tortura no presídio Carlos Vitoriano, em Araçuaí, bem como à Corregedoria do Sistema Penitenciário. A mesma solicitação de providências é feita ao secretário de Estado de Defesa Social, Maurício Campos Júnior. O caso foi trazido à comissão pela Promotoria de Araçuaí.

Também aprovado requerimento do deputado Carlin Moura (PCdoB) para cobrar informações da Secretaria de Defesa Social sobre a transferência de detentos do 2º Distrito Policial de Contagem. De Durval Ângelo, aprovado requerimento para remeter cópias da reunião do dia 8 de abril à Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público da Comarca de BH e à Coordenadoria de Defesa de Direitos Humanos da PBH.

Presenças - Participaram da reunião os deputados Durval Ângelo (PT), presidente; João Leite (PSDB), Rêmolo Aloise (PSDB) e Antônio Júlio (PMDB).

 

 

 

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