Norma sobre exploração da Mata Seca causa polêmica em
comissão
A polêmica envolvendo a Deliberação Normativa (DN)
Copam 72, que prevê normas para exploração da Mata Seca, marcou a
reunião desta quarta-feira (16/11/05), da Comissão de Meio Ambiente
e Recursos Naturais da Assembléia. De um lado, representantes de
órgãos que lidam com o meio ambiente e de uma ONG, defenderam a DN
72, de 2004, como forma de preservar a pequena parcela remanescente
dessa vegetação no Estado. De outro lado, deputados do Norte do
Estado, onde fica a maior parte das reservas de Mata Seca de Minas,
e o representante dos produtores rurais condenaram a medida que, na
opinião deles, inviabilizaria a atividade rural na região.
O diretor-geral do IEF, Humberto Candeias
Cavalcanti, avaliou que a Deliberação 72, em vez de impor restrições
extras aos produtores nortistas, veio permitir o uso das
propriedades rurais onde ocorre a Mata Seca. O texto permite o uso
de, no máximo 20% das propriedades rurais, onde ocorre Mata Seca em
fase primária e com cobertura florestal remanescente nativa igual ou
superior a 80% da área. A supressão de vegetação será permitida
apenas em outros estágios da Mata Seca e para implantação de
empreendimentos agropecuários sustentáveis, em até 60% da área da
propriedade.
Decreto - "Pelo contrário,
nós estamos deixando inclusive de aplicar a norma federal", reforçou
Humberto Candeias, referindo-se à legislação federal sobre o assunto
- o decreto 750, de 2003. Essa norma, editada pelo então presidente
Itamar Franco, considera a Mata Seca como ecossistema associado à
Mata Atlântica, equiparando-as para efeito de uso alternativo de
solo. Candeias também alertou para a destruição sofrida pela mata
estacional decidual, mais conhecida como Mata Seca, ecossistema de
transição entre a Mata Atlântica e o Cerrado. Candeias informou que,
de um total de mais de 58,8 milhões de hectares remanescentes dessa
vegetação no Estado, restam apenas 1,6 milhão, segundo dados de
2004, o que corresponde a 2,85 % da área original.
Produtores rurais condenam Deliberação 72
"A Deliberação 72 impõe, de forma injusta e ilegal,
restrições inaceitáveis quanto ao direito de propriedade no Norte de
Minas". De maneira veemente, o assessor de Meio Ambiente da
Federação da Agricultura de Minas Gerais (Faemg), Carlos Alberto
Santos de Oliveira, condenou a medida. Ele reforçou sua opinião
informando que ela expressava a visão de mais de 6 mil produtores,
que haviam se reunido na última semana em Montes Claros e coletaram
3 mil assinaturas contra a DN 72.
Oliveira criticou também o artigo 1º da
deliberação, que reconhece a "magnificência da biodiversidade da
Mata Seca": "não há nenhum documento científico respeitável que
destaque essa magnificência quanto à biodiversidade". Sobre o
decreto federal 750, que restringe o desmate desse tipo de
vegetação, o dirigente avalia que a Lei Estadual 14.309, de 2002, o
suplanta. A lei, que trata das políticas florestal e de proteção à
biodiversidade no Estado, estabelece, de acordo com Oliveira, apenas
a reserva legal de 20% sobre a área total da propriedade rural. Mas
o promotor de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional
do Meio Ambiente (CAO-MA), Rodrigo Cançado Anaya Rojas, discordou
dessa visão. "O Decreto 750 não se submete à Lei Estadual",
declarou.
Indenização - Já a
deputada Ana Maria Resende (PSDB) apoiou os produtores, afirmando
que eles são conscientes sobre a preservação, pois sofrem as
conseqüências dos danos ambientais. Para ela, a vocação do Norte de
Minas é a agropecuária e a DN 72 apenas proíbe sem apresentar
alternativas para a região. A parlamentar defendeu por último que,
se o governo julgar conveniente manter a Mata Seca intocável, que
ele pague por isso. "Que o Estado indenize com justiça o produtor
rural; o Norte de Minas não pode pagar sozinho pelo passivo
ambiental", enfatizou ela. Nessa mesma linha, o deputado Paulo Piau
(PPS) avaliou que os maiores culpados pela devastação do meio
ambiente são os governos, apesar de reconhecer a "dívida" dos
produtores rurais.
Mata Seca demora 100 anos para se regenerar
Contrariando essa visão, a assessora jurídica da
Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda), Cristina Kistemann
Chiodi, avaliou que assim como a Mata Atlântica, também merece
proteção especial a Mata Seca, entre outras razões, porque demora
100 anos para se regenerar. Sobre a perda de empregos na região, que
ficaria entre 70 e 90 mil empregos, segundo a imprensa, Cristina
duvidou dos dados. "Fica parecendo que todas as propriedades do
Norte de Minas são cobertas por Mata Seca, o que não é verdade",
rebateu ela. O biólogo e conselheiro da Amda, Francisco Mourão,
destacou a interdependência da Mata Seca com as matas ciliares e sua
importância para a preservação da biodiversidade. Ele afirmou que
todas as espécies de mamíferos desse ecossistema dependem de
ambientes úmidos, daí a necessidade de as áreas de Mata Seca e
ciliares se comunicarem. "O que ocorre no Norte de Minas é o
contrário: devido ao desmatamento, há uma fragmentação das áreas",
alertou.
O deputado João Leite (PSDB), que requereu a
reunião, posicionou-se favoravelmente ao Decreto 750. "Não podemos
negar a dívida ambiental do Norte de Minas. Minha expectativa é de
preservação total da Mata Seca". Para definir qual a legislação
adequada para o assunto, foi aprovado o requerimento de sua autoria
pedindo o envio de ofício à Advocacia-Geral do Estado solicitando
manifestação em relação à aplicabilidade do Decreto 750. Sobre a
forma de garantir a preservação da Mata Seca no Norte de Minas, ele
disse que é preciso discutir a proposta da deputada Ana Maria de
indenizar os produtores, prevendo no orçamento estadual recursos
para isso.
Também o deputado Sávio Souza Cruz (PMDB) defendeu
o Decreto 750, que possibilitou ao governo federal obter à época
recursos a fundo perdido para preservação da Mata Atlântica. Ele
discordou da deputada Ana Maria quanto à vocação agropecuária do
Norte de Minas. "Essa região tem sim, vocação para outras
atividades, como a alta tecnologia e indústrias", disse. O deputado
Márcio Kangussu (PPS) defendeu o equilíbrio na discussão.
Entretanto, ele acredita que "a preservação ambiental nas
propriedades rurais não deve ser feita às expensas do produtor".
Requerimentos - Foram
aprovados outros requerimentos dos deputados: João Leite, pedindo o
envio de manifestação de pesar à família do ambientalista Francisco
Anselmo Barros, de Campo Grande (MS); Roberto Carvalho (PT),
requerendo debate público para discutir planejamento e execução de
ações integradas na Região Metropolitana de Belo Horizonte nas áreas
de meio ambiente, saneamento, recursos hídricos e resíduos sólidos;
Sávio Souza Cruz, João Leite e Doutor Ronaldo (PDT), pedem o envio
de ofício ao MP solicitando providências urgentes quanto a recente
concessão, pelo Comam, de licença prévia a empreendimento
imobiliário na área do Cercadinho.
Presenças - Deputados
Doutor Ronaldo (PDT), vice-presidente da comissão; João Leite
(PSDB), Sávio Souza Cruz (PMDB), Márcio Kangussu (PPS) e a deputada
Ana Maria Resende (PSDB) e os convidados citados.
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