Pesquisador defende debate técnico, e não político, sobre
OGM
"A discussão dos transgênicos não pode ser feita do
ponto de vista ideológico e político, mas sim do científico". A
avaliação é do pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo, Antônio Álvaro
Corserti Porcino, que prestou esclarecimentos sobre o tema na
reunião desta quarta-feira (15/10/2003) da Comissão de Meio Ambiente
e Recursos Naturais. A reunião discutiu o Projeto de Lei (PL)
12/2003, do deputado Ricardo Duarte (PT), que tramita na Assembléia
de Minas e cria normas de segurança e fiscalização no uso da
engenharia genética e para a liberação dos Organismos Geneticamente
Modificados (OGM). Ricardo Duarte, que também solicitou a reunião,
afirmou que as exposições dos convidados serão importantes na coleta
de informações para subsidiar o projeto.
Antônio Álvaro considera a legislação brasileira
sobre transgênicos avançada, séria e capaz de atender às
necessidades do País. Ele defendeu o controle, pelo governo, dos
excessos do mercado - que privilegia só o lucro, mas sem impedir as
pesquisas. Na opinião do pesquisador, a tendência é de que o Brasil
adote o modelo australiano, em que a liberação do plantio e da
comercialização de cada transgênico precisa que passar pela
aprovação de um conselho de ministros.
Transgênicos têm que ser avaliados caso a
caso
O deputado Ricardo Duarte fez alguns
questionamentos, como sobre as diferenças das pesquisas de OGM de
acordo com o produto. Antônio Álvaro respondeu que "não se pode
colocar os transgênicos numa cesta só; cada caso é um caso". Ele
citou o exemplo do algodão transgênico BT, introduzido na China com
sucesso e que, na Índia, fracassou. Na China, segundo Corserti, o
governo investiu em pesquisas e introduziu na melhor variedade de
algodão do país uma proteína, tóxica para pragas, mas não para
animais de sangue quente. Hoje, 5 milhões de agricultores usam o
algodão BT, reduzindo de 18 para 3 a quantidade de aplicações de
inseticida na lavoura por ano, o que também fez diminuir de 500 para
3 o número de mortes no meio rural causadas pela aplicação de
inseticidas.
Já na Índia, a introdução do algodão BT foi feita
pela multinacional Monsanto, sem pesquisas por parte do governo.
Introduziu-se o gene resistente em uma variedade ruim de algodão,
sujeito a muitas pragas, o que levou o projeto a fracassar. Diante
dos dois exemplos, o pesquisador da Embrapa defendeu que o País
deveria desenvolver diversas pesquisas com transgênicos. Ele citou o
problema de baixa produtividade do milho, causado pelo índice
insuficiente de fósforo do solo, que poderia ser resolvido com o
desenvolvimento de uma variedade de milho que absorvesse mais esse
mineral.
Respondendo a outro questionamento, sobre
produtividade e custos dos OGM comparados aos não-transgênicos,
Corserti declarou que não se criou essa tecnologia para aumentar a
produtividade e sim para oferecer acesso mais fácil, maior
comodidade e custos mais baixos para o produtor rural. Quanto às
conseqüências do domínio da tecnologia dos transgênicos por empresas
estrangeiras, o pesquisador declarou que "o Brasil cometerá um erro
se deixar essas pesquisas nas mãos de multinacionais, e não dos
institutos de pesquisa brasileiros". Para ele, os produtores seriam
prejudicados, uma vez que os interesses dessas empresas são apenas
produzir e exportar para obter lucro, e não os interesses nacionais:
"Temos que ter nosso transgênico para resolver os problemas da
agricultura brasileira. Nenhum país vai dar cidadania a seu povo se
não tiver soberania tecnológica". Depois de informar que a Monsanto
detém, hoje, 75% do mercado contra 12% da Embrapa, ele enfatizou a
importância de uma empresa nacional no setor para haver
competitividade e variedade (aspecto interessante só ao pequeno
produtor, pelo qual as multinacionais não têm interesse).
Pesquisador rebate argumento de que não haveria
pesquisa suficiente sobre OGM
O argumento de que não haveria pesquisas
suficientes sobre os efeitos dos transgênicos no organismo humano
também foi refutado por Corserti. Segundo ele, a OMS divulgou um
relatório mostrando que, em 2000, a Europa investiu 80 milhões de
euros para avaliar, por 15 anos, o consumo de OGM em 400 grupos de
pesquisa. A conclusão foi que os transgênicos não são nada
diferentes dos outros alimentos. Os ministérios do Meio Ambiente e
da Agricultura da Europa queriam liberar os OGM, mas não conseguiram
porque a sociedade civil pressionou, segundo o pesquisador: "A
sociedade tem medo porque não conhece. O conhecimento tem que chegar
a ela". Por fim, ele disse acreditar que os transgênicos vão
melhorar a vida das pessoas.
O chefe do Departamento de Pesquisa, Sânzio
Vidigal, concordou com o representante da Embrapa de que as leis do
Brasil são adequadas à realidade do País. Para ele, as polêmicas com
OGM devem ser sanadas pela Comissão Técnica Nacional de Biosegurança
(CTN-Bio), "um núcleo de excelência para esclarecimento com
pareceres científicos". Ele defende a mudança constante da
legislação para uma adequação às novas descobertas científicas, o
que já acontece na Europa.
Argumentos - Já o professor
de Nutrição da Ufop e membro do Conselho Regional de Nutrição, Élido
Buono, apesar de reconhecer os avanços da biotecnologia, contestou
alguns argumentos usados em defesa dos transgênicos. Quanto à
produtividade e efeitos dos OGM no organismo humano, ele afirmou que
os estudos não são conclusivos e são divergentes. Ele apresentou,
inclusive, um parecer do Conselho Federal de Nutrição contra a
liberação da soja transgênica, com base nesses argumentos.
Deputados defendem amplo debate sobre
transgênicos
Ricardo Duarte comentou que as exposições dos
debatedores confirmam a validade da aprovação do PL 12/2003 sobre o
assunto. Para ele, Minas deveria tomar medidas de precaução
relacionadas ao assunto, seguindo inclusive outros estados, como o
Paraná, que aprovou projeto proibindo o plantio e a comercialização
de OGM até 2006. A presidente da comissão, deputada Maria José
Haueisen (PT), lembrou que a polêmica provocada pela liberação do
plantio e da comercialização da soja transgênica em 2003 e 2004
ocorreu porque o tema é realmente complexo. O deputado Paulo Piau
(PP) afirmou que reuniões como essa são importantes para que a
sociedade discuta a questão, e mostrou-se contrário à inclusão de
membros da sociedade civil na CTN-Bio, para não transformar em um
debate político-ideológico uma discussão que é técnica e científica.
Parecer - Na reunião, foi
também aprovado o parecer do relator, deputado Fábio Avelar (PTB)
pela rejeição do Projeto de Lei 539/03, do deputado Antônio Carlos
Andrada (PSDB). O PL trata da elaboração de planos de manejo
florestal simplificados. No parecer, o relator afirma que o
procedimento previsto no PL já está contemplado pela legislação
ambiental vigente.
Requerimentos dos deputados - Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) solicita reunião conjunta da
comissão com a de Constituição e Justiça para debater, em audiência
pública, o PL 1.071/2003; Weliton Prado (PT) pede audiência pública,
na cidade de Ibiá, para debater o desastre ambiental no Rio
Misericórdia devido ao descarrilamento de trem da FCA; Marília
Campos (PT) solicita audiência pública sobre os loteamentos na Bacia
da Lagoa Várzea das Flores e suas repercussões; Doutor Ronaldo (PDT)
requer audiência pública para discutir a destinação do lixo
industrial produzido em Minas Gerais; e Rogério Correia (PT) e Maria
José Haueisen (PT) solicitam audiência pública, na cidade de
Jequitinhonha, para debater a situação e destino das famílias
quilombolas atingidas pela criação da Reserva Biológica da Mata
Escura.
Presenças - Participaram da
reunião os deputados Maria José Haueisen (PT), presidente da
comissão; Doutor Ronaldo (PDT), vice; Ricardo Duarte (PT), Paulo
Piau (PP) e Fábio Avelar (PTB).
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