Obesos esperam oito anos na fila da cirurgia redutora do estômago

A fila de espera para a realização da cirurgia de obesidade na rede pública de saúde tem hoje 700 pacientes em Minas ...

15/10/2003 - 14:25
 

Obesos esperam oito anos na fila da cirurgia redutora do estômago

A fila de espera para a realização da cirurgia de obesidade na rede pública de saúde tem hoje 700 pacientes em Minas Gerais, sendo que cada um espera pelo menos oito anos até ser beneficiado. O problema está na falta de recursos, que tem como conseqüência o atendimento somente em dois hospitais: a Santa Casa de Belo Horizonte e o Hospital das Clínicas. As informações foram prestadas durante reunião da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas, nesta quarta-feira (15/10/2003), que discutiu os problemas da obesidade classe III, conhecida como obesidade mórbida.

A discussão foi provocada por requerimento do deputado Mauro Lobo (PSB), que informou ter sido procurado por movimentos de defesa dos direitos dos obesos. A Comissão se propôs, além de discutir, encaminhar o problema para que sejam encontradas soluções. Para tanto, aprovou dois requerimentos. Um do presidente da Comissão, deputado Durval Ângelo (PT), pedindo informações ao Ministério da Saúde sobre as verbas repassadas ao Estado, especificamente para o tratamento da obesidade mórbida, bem como solicitando o aumento dos recursos. E outro, de Mauro Lobo, que pede mais verbas à Secretaria de Estado da Saúde, bem como o credenciamento de novos hospitais.

Minas apresenta quadro crítico

Informações prestadas pelo representante da Secretaria da Saúde, Marcílio Stortini, e pelo representante da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), Cristiano Canedo indicam que a situação em Minas é bem crítica: apenas dois hospitais realizam a gastroplastia na rede pública, para uma demanda crescente de pacientes obesos. Stortini explicou que a cirurgia está regulamentada pela Portaria 628/2001, do Ministério da Saúde, onde estão definidos os critérios de atendimento para os hospitais e para os pacientes.

Os hospitais precisam ser credenciados no Sistema Único de Saúde (SUS), bem como estar equipados com CTI, sala de cirurgia e material adequados e profissional especializado. Já o paciente precisa estar com massa corporal acima de 85 quilos e que tenha sido submetido a um tratamento de redução de peso, baseado em regime alimentar por dois anos, com acompanhamento de endocrinologista, além do acompanhamento com psicólogo. Marcílio Stortini informou ainda que a Secretaria de Saúde tem um programa de educação alimentar, com folhetos indicando as formas de se evitar a obesidade mórbida.

O representante da Fhemig, Cristiano Canedo disse que já foi feito o pedido de credenciamento do Hospital Júlia Kubitschek para a realização da gastroplastia, há um ano. O hospital está sendo preparado com equipamento e treinamento do corpo clínico, segundo Canedo. O credenciamento é feito pela Secretaria Municipal de Saúde. Ele destacou a necessidade de programas educativos nas escolas de ensino fundamental e médio, que orientem sobre a obesidade.

Pesquisa mostra hábitos alimentares errados

A necessidade de educar crianças e jovens vem do resultado de uma pesquisa realizada pela área de pesquisa da Fhemig, que constatou índices altos de obesidade e de maus hábitos alimentares. De 1.450 alunos entrevistados, de 6 a 18 anos da rede pública e privada, 8,4% apresentaram peso acima do normal, sendo 3,1% desses, com obesidade diagnosticada. Do total pesquisado, 88,4% mostraram hábitos alimentares irregulares, com dietas baseadas em altos índices de gordura. Do total, 32,9% apresentaram colesterol acima do desejável e 12%, pressão alta.

A médica da Santa Casa, Galzuinda Figueiredo Reis afirmou que a obesidade tem índices de morte maior do que a da desnutrição. E que a estimativa de doentes com obesidade das três classes na Região Metropolitana de Belo Horizonte, é de 15 a 30 mil pacientes. A médica enfatizou a falta de infra-estrutura para a doença no Estado, comparando com os números de outras regiões do País. De um total de 44 hospitais credenciados para a gastroplastia no Brasil, São Paulo tem 15, Paraná e Mato Grosso do Sul têm cinco, Santa Catarina tem quatro e Minas, com área e população maiores tem só dois.

Ela disse que além da demanda reprimida pela operação, há um aumento progressivo da doença em todo o País. Galzuinda Reis lembra que há desinteresse de credenciamento pelo SUS, pelos baixos valores pagos pela cirurgia, em torno de R$ 2.800, enquanto na rede privada ela é remunerada em cerca de R$ 4 mil. "Por isso, enquanto somente dois hospitais fazem a gastroplastia na rede pública de Belo Horizonte, 15 o fazem na rede privada", informou.

A médica criticou os mandados de segurança para garantir operações, lembrando que eles resolvem o problema individualmente e não a doença, além de nem sempre poderem ser atendidos, devido às condições do paciente. Coordenador da cirurgia de obesidade da Santa Casa, o médico Eduardo Nacur Silva apresentou estudos feitos nos Estados Unidos que comprovam a mortalidade em grupos de obesos mórbidos e o custo maior para a saúde pública dos que não são operados.

Eduardo Nacur informou que a verba destinada pelo SUS para a cirurgia de obesidade dá para 60 procedimentos por ano. Mas que há um acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, para que o órgão pague o que exceder a este número, "mas nem sempre operamos mais por problemas com greves, falta de vaga em CTI e outros", disse. Segundo Nacur, se houvesse mais credenciados, mais cirurgias poderiam ser feitas, já que o Ministério remunera de acordo com as operações realizadas no ano anterior. O médico informou que o estado de Pernambuco tem quatro vezes mais verbas para a gastroplastia do que Minas.

Obesos acompanham reunião com expectativa

A presidente da Associação Mineira para Acompanhamento e Recuperação, Joana D'Arc Lima Parreiras pediu uma legislação que garanta o direito à cirurgia. Segundo ela, existem de 20 a 30 pacientes com guias autorizando a operação, algumas com mais de três anos, à espera do benefício. Para ela, falta esclarecimentos a esses pacientes, sobre os procedimentos exigidos pela portaria do Ministério da Saúde. Joana, que já pesou 205 quilos e perdeu 140 após a intervenção, pede instrumentos mais contundentes para que os hospitais se credenciem.

Marcelo Oliveira, da comissão de obesos mórbidos da Santa Casa que, aos 42 anos, com 180 quilos, espera há quatro anos na fila, disse que o País descumpre suas leis, enquanto Kelsey Fernando, de 22 anos, e 198 quilos, tem esperança de ser operado em breve.

Requerimentos - Foram aprovados os requerimentos: do deputado Durval Ângelo, que pede audiência da Comissão com o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, para discutir o projeto de lei 1.443/2003, do vereador Walter Tosta, que reduz benefícios de portadores de deficiência física; que a reunião ordinária da Comissão, de 5 de novembro, seja realizada em Itaúna, na Apac, para verificação dos métodos de recuperação de presos; do deputado Roberto Ramos (PL), que seja realizada audiência em Montes Claros, dia 27 de outubro, para discutir conflitos agrários na região; de Weliton Prado (PT), que pede audiência conjunta da Comissão de Direitos Humanos e de Trabalho, para discutir demissões e desrespeito à legislação trabalhista de empresa de Nova Ponte, no Triângulo Mineiro.

Presenças - Participaram da reunião os deputados Durval Ângelo (PT), presidente da comissão; Roberto Ramos (PL), vice; Mauro Lobo (PSB), Biel Rocha (PT) e Célio Moreira (PL).

 

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