WALMIR FERREIRA COUTINHO, Presidente da Federação Latino-Americana de Sociedade de Obesidade - FLASO.
Discurso
Comenta o tema: "Legislação e políticas voltadas para a prevenção da
obesidade".
Reunião
23ª reunião ESPECIAL
Legislatura 15ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 22/07/2006
Página 40, Coluna 1
Evento Fórum Técnico "Obesidade: desafios e perspectivas".
Assunto SAÚDE PÚBLICA.
Legislatura 15ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 22/07/2006
Página 40, Coluna 1
Evento Fórum Técnico "Obesidade: desafios e perspectivas".
Assunto SAÚDE PÚBLICA.
23ª REUNIÃO ESPECIAL DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 15ª
LEGISLATURA, EM 6/7/2006
Palavras do Sr. Walmir Ferreira Coutinho
Bom-dia a todos. Antes de mais nada, gostaria de falar da minha
satisfação em tratar do tema da obesidade neste ambiente
legislativo. Agradeço o convite e parabenizo a Assembléia
Legislativa de Minas por ter tido a importante iniciativa de
trazer o debate para esta Casa.
Nos próximos 30 minutos, vou tentar abordar esse tema da forma
mais objetiva e abrangente possível, falando não somente dos
riscos da obesidade, com alguns dados do panorama da epidemia da
obesidade no Brasil e em outros países em desenvolvimento, mas
também de alguns desafios, com possíveis perspectivas de solução
de médio e longo prazo. Já se foi o tempo em que a obesidade era
considerada um problema de ricos. Já se sabe que hoje, nos países
desenvolvidos, a obesidade é mais prevalente entre as classes de
renda mais baixa que entre as classes mais altas. Quando
comparamos os países das chamadas economias em transição com os
países chamados de economia de mercado, a prevalência de obesidade
é quase a mesma. Existe um agravante: as taxas de crescimento da
obesidade nos países em desenvolvimento é maior que nos países já
desenvolvidos, como veremos mais adiante.
Esses dados são alarmantes. A obesidade infantil, até em países
africanos, começa a representar um problema de saúde pública.
Quando comparamos com dados de desnutrição - esse já é um estudo
antigo, de 1995 -, vemos a convivência do problema da obesidade
com o problema da desnutrição. Em uma mesma comunidade podemos ter
a convivência dos dois aspectos, sendo que o sobrepeso e a
obesidade chegam a superar a prevalência da desnutrição, mesmo em
populações de renda mais baixa.
Quando comparamos a prevalência da obesidade infantil no Brasil,
por exemplo, com os Estados Unidos, vemos que lá o problema é
ainda mais grave. Mas, se analisamos o intervalo de tempo de mais
ou menos 20 anos entre essa primeira pesquisa e a segunda, e
comparamos com a taxa de crescimento da obesidade no Brasil e a
norte-americana - e estamos falando de obesidade infantil -,
observamos que, no mesmo período de tempo, enquanto o crescimento
lá foi de 66%, aqui o crescimento foi de 239%.
O que poderia explicar essa elevada taxa de crescimento? Os dados
já mencionados pelo Deputado Adelmo Carneiro Leão, na abertura da
reunião, recentemente divulgados pelo IBGE, mostram números
alarmantes, principalmente entre adolescentes do sexo masculino.
De uma prevalência, em 1975, de 3,9% de adolescentes obesos, hoje
18% de adolescentes do sexo masculino estão com problemas de
excesso de peso, e 5,9 milhões de jovens brasileiros estão
incluídos nessa categoria. O que pode explicar esse crescimento
tão rápido, e tão mais rápido se comparado, por exemplo, com os
líderes mundiais em obesidade, os norte-americanos? É provável que
os dados do IBGE nos dêem uma das respostas ou parte da resposta a
isso.
Aqui vemos a evolução, em um período de duas décadas, do
percentual de lares brasileiros com acesso a três itens de
conforto: carro, televisão e telefone. Vemos que praticamente
duplicou o percentual de famílias com acesso a esses itens de
conforto. São itens comprovadamente "obesogênicos", relacionados a
um risco maior de obesidade.
Estamos vivendo ainda um processo de mudança que nos países
desenvolvidos ocorreu há algumas décadas. Há 20 anos,
provavelmente, todos os norte-americanos tinham acesso a esses
itens de conforto. A perspectiva é muito sombria. O que mais
preocupa é que, como sabemos bem, a obesidade está relacionada com
doenças muito graves, de alta taxa de mortalidade. A cintura
abdominal, hoje, tem sido considerada mais importante, do ponto de
vista clínico, que o peso corporal, para avaliar o risco
metabólico do indivíduo. Esse acúmulo de gordura na região infra-
abdominal aumenta os riscos da chamada síndrome metabólica e de
todas as doenças cardiovasculares das quais o obeso geralmente vai
acabar falecendo: acidente vascular cerebral, infarto agudo do
miocárdio, ele tem um risco enorme de se transformar em diabético.
Esse processo vascular que acomete o obeso não se inicia na vida
adulta. Temos estudos que mostram claramente que as crianças
obesas, hoje, não estão simplesmente em risco, já estão doentes. O
processo de arteriosclerose já se encontra em franca progressão,
ainda na infância, quando a criança está obesa.
A diabetes é uma epidemia que caminha de mãos dadas com a
obesidade. Muita gente tem usado o termo "diabesidade" para deixar
bem clara a relação íntima que existe entre a obesidade e o
chamado diabetes tipo 2.
Aqui vemos dados alarmantes da região da América Latina e do
Caribe mostrando que o diabetes responde por mais de 300 mil
mortes anuais no nosso continente, com um gasto para os cofres
públicos de US$65.000.000.000,00, sendo US$10.000.000.000,00 de
custos diretos e R$55.000.000.000,00 de custos indiretos.
Este gráfico mostra claramente que o brasileiro ou qualquer
habitante de país em desenvolvimento, embora a desnutrição deva
ser erradicada, sofre de doenças relacionadas a excessos
alimentares. Aqui vemos, em vermelho, vários tipos de câncer; em
verde, doenças isquêmicas do coração, doenças cardiovasculares.
São as doenças que mais matam nos países em desenvolvimento,
inclusive no Brasil.
Ao verificar o que causa essa epidemia e qual o impacto da
genética e do meio ambiente, temos fortes evidências nos dois
lados: tanto genes como o ambiente conspiram para o crescimento da
epidemia. Obviamente, a genética explica vários casos de
obesidade, mas não explica a epidemia, pois, nas últimas décadas,
nosso patrimônio genético, logicamente, não mudou.
Há evidências importantes tanto do lado da genética como do
ambiental. Foi publicado um estudo demonstrando que cachorros e
gatos de donos obesos são mais obesos que os de donos magros,
mostrando claramente que o convívio ambiental e os fatores
culturais representam um papel importante.
A questão da genética é muito importante. Nossos genes, muitas
vezes, enviam sinais que seriam vantajosos, há milhares de anos, e
que hoje, na sociedade em que vivemos, tornaram-se extremamente
desvantajosos. É a chamada hipótese do gene poupador, ou seja,
esse homem das cavernas, caso tivesse um gene que o fizesse poupar
energia, teria muito maior chance de sobreviver e deixar
descendentes. Esses genes, hoje, transformaram-se em genes que
predispõem a pessoa à obesidade. Genes que participam da produção
e da regulação de várias dessas moléculas.
Temos aqui, do lado esquerdo dessa balança, pelo menos umas oito
ou nove moléculas que sabidamente aumentam o apetite. Nessa aqui,
temos umas 15 ou 20 que diminuem o apetite. Qualquer alteração nos
genes que regulam qualquer dessas moléculas pode predispor o
indivíduo à obesidade.
Mas é claro que não é disso que falamos hoje. Falamos de uma
epidemia que tem suas causas claramente em fatores ambientais.
Esse é o desafio que se impõe: de que maneira podemos controlar e
interferir nesses fatores ambientais que criam o que alguns
atualmente têm chamado de ambiente tóxico ou ambiente obesogênico.
Sabemos que as duas grandes causas do problema são a alimentação e
a inatividade física. Existem causas acessórias, e aqui poderíamos
listar mais umas 10, que não têm tanta relevância. O principal
está aqui: alimentação e atividade física, apesar de que a
televisão merecerá uma consideração mais detalhada.
Outro fator: cada vez mais se come fora. Trazemos um dado do
exterior porque não encontramos dados brasileiros sobre o assunto.
Num intervalo de 30 anos, vejam como aumentou o percentual do que
é gasto em alimentação, nos Estados Unidos, fora de casa. De 34%,
passou-se a 47%. E, quando se vai comer fora, encontramos porções
de alimentos cada vez maiores. Vejam os senhores como aumentou, de
forma dramática, o tamanho médio de cada porção dos alimentos aqui
citados.
Uma cadeia de "fast food" que, no começo da década de 80, tinha
como típico um lanche com 627 calorias, hoje tem seu lanche típico
com 1.805 calorias, tendo a gordura sido aumentada de 19g para 84g
em média.
Aqui vemos o que as crianças bebem e como isso variou, nos Estados
Unidos, de 1965 a 1996. Cresceu o consumo de refrigerantes, embora
não sejam os grandes consumidores. O maior consumo "per capita" de
refrigerante, no mundo, dá-se no México. Isso quer dizer que eles
investem maciçamente para que, nos países em desenvolvimento,
consigam um incremento de vendas a fim de compensar a perda de
vendas nos países desenvolvidos. O consumo de sucos praticamente
se mantém, e o de leite está caindo nitidamente ao longo desse
período. Gosto muito desse cartum, que demonstra a interação entre
a genética e o meio ambiente, ou seja, é uma interação muito forte
e clara, em que o pai, além de já ter provavelmente transmitido ao
seu filho algum genes que podem predispô-lo à obesidade, ainda,
por meio de maus hábitos, de uma cultura equivocada, acaba, de
certa forma, condicionando-o a herdar também seu problema de
obesidade.
Há uma frase de Pitágoras muito adequada ao desafio da prevenção
da obesidade infantil, que diz que temos de educar as crianças
hoje para que elas não sejam punidas na vida adulta, como veremos
mais adiante. Por meio dos maus exemplos, serão geradas nessas
crianças atitudes negativas. Nossos jovens tenderão a ter os
péssimos hábitos que seus pais já lhes transmitiram. Além disso,
há o bombardeio do "marketing" da economia globalizada, para que a
criança consuma, com exagero, esse tipo de alimento. Já foram
feitos estudos comparativos entre a média de calorias anunciadas
no horário infantil pela televisão e a média de calorias
anunciadas no horário adulto. No horário infantil, é anunciado o
dobro ou o triplo das calorias. Assim, as crianças estão sendo,
quando diante de seus televisores, bombardeadas por uma propaganda
que praticamente as condiciona ao consumo daquelas novidades e
guloseimas. Elas são condicionadas a consumir mais calorias,
quando saem da frente da televisão e, muitas vezes, quando ainda
estão à frente da tevê.
Moro numa cidade que tem fama, até internacional, de ser muito
saudável. Já ouvi, em alguns congressos internacionais, as pessoas
falarem como seria bom se todos fossem como os cariocas, que se
exercitam o tempo todo. Sempre que passamos pelas Praias de
Ipanema e Copacabana, vemos pessoas pedalarem e correrem. Isso é
um mito, pois o Rio de Janeiro, como a grande maioria das cidades
brasileiras, é uma cidade sedentária. Os números do sedentarismo
são alarmantes. Em mulheres, chega a quase 80%.
Em todas as cidades, há dificuldades enormes de se promover
atividade física. É claro que o problema da segurança acaba
agravando a questão ambiental da obesidade. É muito difícil
convencer uma criança obesa a se exercitar mais quando ela não
encontra segurança nem para descer à rua. Ela praticamente fica
presa na frente da televisão por praticamente 4, 5 horas por dia.
O sedentarismo, na verdade, é a regra no Brasil e na maioria dos
países.
Algo aconteceu aqui, e vários "slides" ficaram para trás. Fomos
diretamente para o final da apresentação.
Só mais um comentário sobre a televisão. Foi feito um grande
estudo longitudinal na Nova Zelândia, que conseguiu fazer
demonstrações com muita elegância. Eles compararam o que chamam de
tamanho do efeito, ou seja, compararam o tamanho do efeito das
duas grandes causas da obesidade, a má alimentação e a inatividade
física, com o tamanho do efeito das horas de televisão a que as
crianças assistem. Constataram, assim, que o maior efeito é o das
horas de televisão, que apresentou maior impacto na incidência de
novos casos de obesidade que a má alimentação ou a inatividade
física. Claro que podemos dizer que o hábito de ver televisão é
mediado pela inatividade física e pela má alimentação, vindo a
desencadear a obesidade; todavia, precisamos fazer esse alerta,
que é muito importante.
Encontrei uma frase do Pe. Antônio Vieira, que dizia "que é nosso
artifício afear a dificuldade para fazer mais formosa a solução".
Já que tentamos pintar esse quadro sombrio da epidemia da
obesidade, podemos discutir agora algumas soluções que se impõem.
Em primeiro lugar, acho que é muito importante termos em mente...
Não vamos analisar em detalhes estes "slides", mas são "slides" da
IOTF, em que vários níveis de intervenção têm que ser analisados,
para que cheguemos a um bom resultado. Não se pode atuar
simplesmente em nível local, comunitário e esquecer o nível
nacional e o impacto dos fatores internacionais, como a própria
globalização de mercado. Tudo isso tem que ser gerenciado em
conjunto.
Exemplos de idéias criativas que funcionaram: na Universidade de
Minnesotta, simplesmente oferecendo um desconto de 50% no preço,
conseguiram aumentar em até 300% o consumo de cenouras e frutas.
Quer dizer, algo muito simples deu resultado. Na Universidade de
Stanford, o Dr. Robson acompanhou 195 crianças obesas durante nove
meses, e a única intervenção que propôs foi limitar a televisão a
1 hora diária, e elas emagreceram. Sem fazer mais nada, apenas
limitando o tempo que assistiam à televisão, as crianças
emagreceram.
Há outros exemplos mais radicais e que dificilmente seriam
aplicados num país como o Brasil. Em Cingapura, preocupados com o
aumento da obesidade infantil, lançaram um grande programa escolar
pelo qual a criança obesa que não conseguia emagrecer repetia o
ano. É algo que logicamente só pode funcionar num Estado pequeno,
cujo regime de governo é totalitário.
Algumas iniciativas brasileiras são muito louváveis, e devemos
tentar apoiá-las, fazê-las surgir em outras partes e para elas
contribuir. Por exemplo, ações legislativas que funcionaram:
proibição de guloseimas em cantinas escolares - isso foi válido
pelo menos em Florianópolis e no Rio de Janeiro, no Rio está
funcionando mais na rede pública -; rotulagem nutricional
obrigatória.
Isso será abordado depois pela Dra. Ana Beatriz, mas posso dizer
que o Brasil teve um grande avanço, foi o primeiro país em
desenvolvimento a ter uma lei de rotulagem nutricional
obrigatória. Agora fica o desafio: "como transformar isso em uma
medida mais compreensível pela população?".
Intervenções em escolas do Rio de Janeiro e de Recife; ações
educativas que o Ministério realizou há cinco ou seis anos - não
sei se ainda estão em andamento, mas, por meio do programa TV
Escola, foram divulgados vídeos educativos para escolas de
diversas partes do País.
Enfim, são medidas importantes que precisam também do respaldo da
sociedade e do ambiente acadêmico. As sociedades médica e de
nutrição, neste ano, estão dando um passo importante para que
consigamos avançar nessa questão. Por sugestão da Globo On-Line,
para a prevenção de doenças crônicas, diversas sociedades
brasileiras que estão aqui representadas pelas suas logomarcas -
de endocrinologia, obesidade, diabetes, nutrição, alimentação e
nutrição, pediatria, hipertensão e cardiologia - juntaram-se e
criaram a Aliança Brasileira para Prevenção da Obesidade e das
Doenças Associadas. Essa Aliança pretende propor ações e
estratégias, para que se consiga avançar nessa questão,
principalmente na prevenção da obesidade infanto-juvenil.
Quando se trata de proteger o consumidor, a minha visão pessoal é
a de que há passos que precisam ser dados, mesmo difíceis, não só
quanto ao controle da propaganda, mas também quanto à rotulagem
nutricional. Já sabemos que a população não compreende bem o que
está exposto nos rótulos. Então, o que podemos fazer para
transformar isso em algo mais prescritivo, que diga claramente que
aquele alimento é perigoso ou saudável? Queremos estimular o
consumo do alimento? Vamos estampar um rótulo verde, como se fez
na Suécia, ou um rótulo vermelho ou uma advertência nos perigosos?
Quer dizer, são decisões politicamente difíceis, mas que
precisamos ter em mente e guardar como ferramentas importantes no
arsenal de intervenção. Diante de uma epidemia que se considera
grave, talvez as soluções tenham de ser bem rigorosas.
Iniciativas de alimentação saudável em escolas: no Rio de Janeiro,
existe uma iniciativa municipal que já atendeu a mais de 1.050
escolas e continua funcionando também com ações educativas. As
merendeiras que preparam os alimentos recebem treinamento para uma
alimentação saudável.
Enfim, existem diversas iniciativas que são louváveis e merecem
ser expandidas e copiadas. Estamos vendo hoje avanços legislativos
no Estado de Minas Gerais sobre segurança nutricional. Precisamos
talvez pensar em como transformar a saúde em algo contagioso e
fazer com que essas ações sejam reproduzidas em outros Estados
brasileiros e difundidas por todo o País.
Aproveito os últimos seis ou sete minutos que me restam para
abordar um tema. Acabo de ver a chegada de um grande amigo, Dr.
Saulo Cavalcanti, de Minas Gerais, que está nesta luta conosco há
alguns anos, junto à Sociedade de Diabetes e Endocrinologia. Hoje,
estamos tratando da obesidade como uma questão de saúde pública.
Acho que os tratamentos da obesidade hoje são um escândalo
sanitário, são um problema gravíssimo, do ponto de vista
sanitário, não somente do ponto de vista clínico. Acabaram de ser
divulgados pela ONU dados que dão conta de que o Brasil acaba de
assumir a liderança mundial em consumo de inibidores de apetite.
Provavelmente, nós, que vamos começar a ouvir certos deboches
sobre futebol quando sairmos do Brasil, ouviremos também sobre a
questão da obesidade. Tive notícia de que um psiquiatra brasileiro
muito famoso sofreu um tipo de deboche em uma reunião promovida
pela ONU para falar sobre controle de anorexia. Um estrangeiro lhe
disse: "Agora entendo o problema da fome zero no Brasil, por que
isso vai funcionar tão bem: é porque, com o que vocês consomem de
inibidores de apetite, não vai existir mais fome no País". Quer
dizer, internacionalmente, essa situação de descalabro nos
tratamentos da obesidade atingiu uma proporção que está
preocupando as Nações Unidas. Aqui no Brasil estamos muito
preocupados em controlar, de alguma maneira.
Nestes cinco minutos, gostaria de falar um pouquinho sobre essa
questão e propor algumas soluções que são viáveis para tentar
controlar isso. Em grande parte, esse é nosso desafio. A imagem
que a pessoa com excesso de peso tem, quando procura qualquer
tratamento para emagrecer, é de um resultado milagroso, mais ou
menos como isto, que só se consiga por meio de recursos gráficos e
de programas de computador. Diante do resultado prático, que é o
que preconizamos que a pessoa consiga atingir, geralmente os
pacientes se desesperam. Preconizamos uma perda de 2kg a 4kg por
mês. Todo mundo quer perder de 7kg a 10kg. Nessa busca da perda de
7kg a 10kg por mês, essas pessoas procuram soluções mágicas,
soluções rápidas, por meio de dietas da moda.
Trouxe a primeira dieta de que se tem registro, proposta por
Hipócrates, o grande gênio da medicina. Ele dizia que quem precisa
emagrecer deveria fazer suas refeições enquanto estivesse ainda
ofegante, em suas atividades físicas, e dormir, toda noite, em
cama bem dura. Não sei como a cama dura entra nesse processo de
emagrecimento, mas ele propôs isso.
Daí a coisa evoluiu para propostas cada vez mais sem sentido.
Listamos algumas aqui, como a dieta do tipo sangüíneo, que agora
começa a dar até metástase. Está sendo lançado um livro para cada
tipo sangüíneo. Nada disso tem o menor fundamento. Não vou nem
discutir mais essas dietas, mas é um problema que atrapalha muito
a promoção da alimentação saudável, a estratégia de tentar induzir
essas pessoas a ter um hábito alimentar mais saudável.
Em 1999, a Abeso lançou uma campanha nacional chamada Dieta Não,
propondo como alternativa à dieta o plano alimentar equilibrado,
orientado por profissionais de saúde. Na época, essa campanha foi
coordenada por uma nutricionista de Minas, da Universidade Federal
de Viçosa, Dra. Josefina Bressan Monteiro. Do ponto de vista
clínico, hoje fala-se mais sobre o plano alimentar, sobre algo
definitivo do que sobre dietas propondo soluções fáceis.
Isto aqui é o que gera essa situação de descalabro do tratamento
da obesidade. Grande parte da chamada indústria do emagrecimento,
no Brasil, está girando em torno disso. São as chamadas fórmulas
mágicas de emagrecimento, que muita gente chama de bombas para
emagrecer. Mostrarei exemplos de dois lados nefastos desse
tratamento medicamentoso. Um lado é este. Aqui há mais de 40
produtos listados. Isso foi prescrito para um mesmo paciente, a um
custo mensal de R$1.200,00. Podem analisar que não há aqui nenhum
agente que tenha evidência científica de eficácia no tratamento da
obesidade.
Esse paciente procurou o médico com o único objetivo de emagrecer.
É o uso de substâncias sem respaldo científico de eficácia. Essa é
a bomba que faz perder de 7kg a 10kg por mês, que provoca o
milagre, sempre contendo hormônios de tireóide em doses
excessivas. Quando se fala em controlar o anorexismo, tem-se que
tirar esses hormônios de tireóide das fórmulas. Diversos óbitos já
foram registrados e também complicações gravíssimas. E essas
pessoas que perdem de 7kg a 10kg por mês, quando param de tomar o
produto, engordam mais do que emagreceram. Isso se tornou um
problema de saúde pública no Brasil. Temos um estudo feito no Rio
de Janeiro, por amostragem domiciliar, mostrando que, em mulheres
adultas, o consumo de hormônios tireoidianos para emagrecer, em
fórmulas, chega a 20%. É uma coisa calamitosa.
Temos vários consensos e diretrizes respaldando o que realmente
deve ser feito em termos de tratamento medicamentoso. Não vamos
deter-nos nisso, mas existem sete medicamentos que têm eficácia
comprovada cientificamente e que podem ser usados. Fizemos um
levantamento e descobrimos que são usados aproximadamente 200
produtos no tratamento da obesidade.
Uma imagem fala mais que mil palavras. Este "slide" mostra que é a
mudança de hábito que leva aos melhores resultados, e não a
solução mágica. Não são os remédios que fazem emagrecer, eles
ajudam no programa de emagrecimento, mas nenhum deles faz milagre
em resolver um problema que é resultado da interação da genética
com o meio ambiente obesogênico, como estamos enfrentando hoje.
Concluindo, queria chamar a atenção para essa questão da obesidade
como um problema grave de saúde pública. E, como tal, é um
problema que requer medidas urgentes não somente de prevenção, mas
também de tratamento.
Apesar de conhecermos cada vez mais o importante papel que tem o
gene na obesidade, certamente esses fatores ambientais é que fazem
crescer a epidemia da obesidade. O meio ambiente é o que precisa
ser atingido de forma mais direta. Os maus hábitos alimentares só
podem ser combatidos por meio de mudanças ambientais na escola, no
lar, no trabalho e na comunidade. Essas mudanças só podem ser
alcançadas por um esforço coordenado de toda a sociedade. É muito
importante que os profissionais de saúde estejam conscientes disso
e engajados nessa luta, porque o ambiente está conspirando para
que a obesidade continue crescendo. Precisamos do engajamento de
toda a sociedade, do nosso Poder Legislativo, para nos ajudarem a
vencer as dificuldades de enfrentamento desse problema.
Infelizmente, essas intervenções se mostram insuficientes para
mudar o estilo de vida no caso de crianças e adultos que já têm
excesso de peso e obesidade. Torna-se necessário o uso de
medicamentos e, em casos extremos, da cirurgia bariátrica. E esse
extremo também é preocupante, mas fico feliz em ver que ele será
debatido neste fórum, que debaterá como tornar disponível para a
população de baixa renda a cirurgia bariátrica.
Muito obrigado pela atenção.
- No decorrer do pronunciamento, procede-se à apresentação de
"slides".