Pronunciamentos

WALMIR FERREIRA COUTINHO, Presidente da Federação Latino-Americana de Sociedade de Obesidade - FLASO.

Discurso

Comenta o tema: "Legislação e políticas voltadas para a prevenção da obesidade".
Reunião 23ª reunião ESPECIAL
Legislatura 15ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 22/07/2006
Página 40, Coluna 1
Evento Fórum Técnico "Obesidade: desafios e perspectivas".
Assunto SAÚDE PÚBLICA.

23ª REUNIÃO ESPECIAL DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 15ª LEGISLATURA, EM 6/7/2006 Palavras do Sr. Walmir Ferreira Coutinho Bom-dia a todos. Antes de mais nada, gostaria de falar da minha satisfação em tratar do tema da obesidade neste ambiente legislativo. Agradeço o convite e parabenizo a Assembléia Legislativa de Minas por ter tido a importante iniciativa de trazer o debate para esta Casa. Nos próximos 30 minutos, vou tentar abordar esse tema da forma mais objetiva e abrangente possível, falando não somente dos riscos da obesidade, com alguns dados do panorama da epidemia da obesidade no Brasil e em outros países em desenvolvimento, mas também de alguns desafios, com possíveis perspectivas de solução de médio e longo prazo. Já se foi o tempo em que a obesidade era considerada um problema de ricos. Já se sabe que hoje, nos países desenvolvidos, a obesidade é mais prevalente entre as classes de renda mais baixa que entre as classes mais altas. Quando comparamos os países das chamadas economias em transição com os países chamados de economia de mercado, a prevalência de obesidade é quase a mesma. Existe um agravante: as taxas de crescimento da obesidade nos países em desenvolvimento é maior que nos países já desenvolvidos, como veremos mais adiante. Esses dados são alarmantes. A obesidade infantil, até em países africanos, começa a representar um problema de saúde pública. Quando comparamos com dados de desnutrição - esse já é um estudo antigo, de 1995 -, vemos a convivência do problema da obesidade com o problema da desnutrição. Em uma mesma comunidade podemos ter a convivência dos dois aspectos, sendo que o sobrepeso e a obesidade chegam a superar a prevalência da desnutrição, mesmo em populações de renda mais baixa. Quando comparamos a prevalência da obesidade infantil no Brasil, por exemplo, com os Estados Unidos, vemos que lá o problema é ainda mais grave. Mas, se analisamos o intervalo de tempo de mais ou menos 20 anos entre essa primeira pesquisa e a segunda, e comparamos com a taxa de crescimento da obesidade no Brasil e a norte-americana - e estamos falando de obesidade infantil -, observamos que, no mesmo período de tempo, enquanto o crescimento lá foi de 66%, aqui o crescimento foi de 239%. O que poderia explicar essa elevada taxa de crescimento? Os dados já mencionados pelo Deputado Adelmo Carneiro Leão, na abertura da reunião, recentemente divulgados pelo IBGE, mostram números alarmantes, principalmente entre adolescentes do sexo masculino. De uma prevalência, em 1975, de 3,9% de adolescentes obesos, hoje 18% de adolescentes do sexo masculino estão com problemas de excesso de peso, e 5,9 milhões de jovens brasileiros estão incluídos nessa categoria. O que pode explicar esse crescimento tão rápido, e tão mais rápido se comparado, por exemplo, com os líderes mundiais em obesidade, os norte-americanos? É provável que os dados do IBGE nos dêem uma das respostas ou parte da resposta a isso. Aqui vemos a evolução, em um período de duas décadas, do percentual de lares brasileiros com acesso a três itens de conforto: carro, televisão e telefone. Vemos que praticamente duplicou o percentual de famílias com acesso a esses itens de conforto. São itens comprovadamente "obesogênicos", relacionados a um risco maior de obesidade. Estamos vivendo ainda um processo de mudança que nos países desenvolvidos ocorreu há algumas décadas. Há 20 anos, provavelmente, todos os norte-americanos tinham acesso a esses itens de conforto. A perspectiva é muito sombria. O que mais preocupa é que, como sabemos bem, a obesidade está relacionada com doenças muito graves, de alta taxa de mortalidade. A cintura abdominal, hoje, tem sido considerada mais importante, do ponto de vista clínico, que o peso corporal, para avaliar o risco metabólico do indivíduo. Esse acúmulo de gordura na região infra- abdominal aumenta os riscos da chamada síndrome metabólica e de todas as doenças cardiovasculares das quais o obeso geralmente vai acabar falecendo: acidente vascular cerebral, infarto agudo do miocárdio, ele tem um risco enorme de se transformar em diabético. Esse processo vascular que acomete o obeso não se inicia na vida adulta. Temos estudos que mostram claramente que as crianças obesas, hoje, não estão simplesmente em risco, já estão doentes. O processo de arteriosclerose já se encontra em franca progressão, ainda na infância, quando a criança está obesa. A diabetes é uma epidemia que caminha de mãos dadas com a obesidade. Muita gente tem usado o termo "diabesidade" para deixar bem clara a relação íntima que existe entre a obesidade e o chamado diabetes tipo 2. Aqui vemos dados alarmantes da região da América Latina e do Caribe mostrando que o diabetes responde por mais de 300 mil mortes anuais no nosso continente, com um gasto para os cofres públicos de US$65.000.000.000,00, sendo US$10.000.000.000,00 de custos diretos e R$55.000.000.000,00 de custos indiretos. Este gráfico mostra claramente que o brasileiro ou qualquer habitante de país em desenvolvimento, embora a desnutrição deva ser erradicada, sofre de doenças relacionadas a excessos alimentares. Aqui vemos, em vermelho, vários tipos de câncer; em verde, doenças isquêmicas do coração, doenças cardiovasculares. São as doenças que mais matam nos países em desenvolvimento, inclusive no Brasil. Ao verificar o que causa essa epidemia e qual o impacto da genética e do meio ambiente, temos fortes evidências nos dois lados: tanto genes como o ambiente conspiram para o crescimento da epidemia. Obviamente, a genética explica vários casos de obesidade, mas não explica a epidemia, pois, nas últimas décadas, nosso patrimônio genético, logicamente, não mudou. Há evidências importantes tanto do lado da genética como do ambiental. Foi publicado um estudo demonstrando que cachorros e gatos de donos obesos são mais obesos que os de donos magros, mostrando claramente que o convívio ambiental e os fatores culturais representam um papel importante. A questão da genética é muito importante. Nossos genes, muitas vezes, enviam sinais que seriam vantajosos, há milhares de anos, e que hoje, na sociedade em que vivemos, tornaram-se extremamente desvantajosos. É a chamada hipótese do gene poupador, ou seja, esse homem das cavernas, caso tivesse um gene que o fizesse poupar energia, teria muito maior chance de sobreviver e deixar descendentes. Esses genes, hoje, transformaram-se em genes que predispõem a pessoa à obesidade. Genes que participam da produção e da regulação de várias dessas moléculas. Temos aqui, do lado esquerdo dessa balança, pelo menos umas oito ou nove moléculas que sabidamente aumentam o apetite. Nessa aqui, temos umas 15 ou 20 que diminuem o apetite. Qualquer alteração nos genes que regulam qualquer dessas moléculas pode predispor o indivíduo à obesidade. Mas é claro que não é disso que falamos hoje. Falamos de uma epidemia que tem suas causas claramente em fatores ambientais. Esse é o desafio que se impõe: de que maneira podemos controlar e interferir nesses fatores ambientais que criam o que alguns atualmente têm chamado de ambiente tóxico ou ambiente obesogênico. Sabemos que as duas grandes causas do problema são a alimentação e a inatividade física. Existem causas acessórias, e aqui poderíamos listar mais umas 10, que não têm tanta relevância. O principal está aqui: alimentação e atividade física, apesar de que a televisão merecerá uma consideração mais detalhada. Outro fator: cada vez mais se come fora. Trazemos um dado do exterior porque não encontramos dados brasileiros sobre o assunto. Num intervalo de 30 anos, vejam como aumentou o percentual do que é gasto em alimentação, nos Estados Unidos, fora de casa. De 34%, passou-se a 47%. E, quando se vai comer fora, encontramos porções de alimentos cada vez maiores. Vejam os senhores como aumentou, de forma dramática, o tamanho médio de cada porção dos alimentos aqui citados. Uma cadeia de "fast food" que, no começo da década de 80, tinha como típico um lanche com 627 calorias, hoje tem seu lanche típico com 1.805 calorias, tendo a gordura sido aumentada de 19g para 84g em média. Aqui vemos o que as crianças bebem e como isso variou, nos Estados Unidos, de 1965 a 1996. Cresceu o consumo de refrigerantes, embora não sejam os grandes consumidores. O maior consumo "per capita" de refrigerante, no mundo, dá-se no México. Isso quer dizer que eles investem maciçamente para que, nos países em desenvolvimento, consigam um incremento de vendas a fim de compensar a perda de vendas nos países desenvolvidos. O consumo de sucos praticamente se mantém, e o de leite está caindo nitidamente ao longo desse período. Gosto muito desse cartum, que demonstra a interação entre a genética e o meio ambiente, ou seja, é uma interação muito forte e clara, em que o pai, além de já ter provavelmente transmitido ao seu filho algum genes que podem predispô-lo à obesidade, ainda, por meio de maus hábitos, de uma cultura equivocada, acaba, de certa forma, condicionando-o a herdar também seu problema de obesidade. Há uma frase de Pitágoras muito adequada ao desafio da prevenção da obesidade infantil, que diz que temos de educar as crianças hoje para que elas não sejam punidas na vida adulta, como veremos mais adiante. Por meio dos maus exemplos, serão geradas nessas crianças atitudes negativas. Nossos jovens tenderão a ter os péssimos hábitos que seus pais já lhes transmitiram. Além disso, há o bombardeio do "marketing" da economia globalizada, para que a criança consuma, com exagero, esse tipo de alimento. Já foram feitos estudos comparativos entre a média de calorias anunciadas no horário infantil pela televisão e a média de calorias anunciadas no horário adulto. No horário infantil, é anunciado o dobro ou o triplo das calorias. Assim, as crianças estão sendo, quando diante de seus televisores, bombardeadas por uma propaganda que praticamente as condiciona ao consumo daquelas novidades e guloseimas. Elas são condicionadas a consumir mais calorias, quando saem da frente da televisão e, muitas vezes, quando ainda estão à frente da tevê. Moro numa cidade que tem fama, até internacional, de ser muito saudável. Já ouvi, em alguns congressos internacionais, as pessoas falarem como seria bom se todos fossem como os cariocas, que se exercitam o tempo todo. Sempre que passamos pelas Praias de Ipanema e Copacabana, vemos pessoas pedalarem e correrem. Isso é um mito, pois o Rio de Janeiro, como a grande maioria das cidades brasileiras, é uma cidade sedentária. Os números do sedentarismo são alarmantes. Em mulheres, chega a quase 80%. Em todas as cidades, há dificuldades enormes de se promover atividade física. É claro que o problema da segurança acaba agravando a questão ambiental da obesidade. É muito difícil convencer uma criança obesa a se exercitar mais quando ela não encontra segurança nem para descer à rua. Ela praticamente fica presa na frente da televisão por praticamente 4, 5 horas por dia. O sedentarismo, na verdade, é a regra no Brasil e na maioria dos países. Algo aconteceu aqui, e vários "slides" ficaram para trás. Fomos diretamente para o final da apresentação. Só mais um comentário sobre a televisão. Foi feito um grande estudo longitudinal na Nova Zelândia, que conseguiu fazer demonstrações com muita elegância. Eles compararam o que chamam de tamanho do efeito, ou seja, compararam o tamanho do efeito das duas grandes causas da obesidade, a má alimentação e a inatividade física, com o tamanho do efeito das horas de televisão a que as crianças assistem. Constataram, assim, que o maior efeito é o das horas de televisão, que apresentou maior impacto na incidência de novos casos de obesidade que a má alimentação ou a inatividade física. Claro que podemos dizer que o hábito de ver televisão é mediado pela inatividade física e pela má alimentação, vindo a desencadear a obesidade; todavia, precisamos fazer esse alerta, que é muito importante. Encontrei uma frase do Pe. Antônio Vieira, que dizia "que é nosso artifício afear a dificuldade para fazer mais formosa a solução". Já que tentamos pintar esse quadro sombrio da epidemia da obesidade, podemos discutir agora algumas soluções que se impõem. Em primeiro lugar, acho que é muito importante termos em mente... Não vamos analisar em detalhes estes "slides", mas são "slides" da IOTF, em que vários níveis de intervenção têm que ser analisados, para que cheguemos a um bom resultado. Não se pode atuar simplesmente em nível local, comunitário e esquecer o nível nacional e o impacto dos fatores internacionais, como a própria globalização de mercado. Tudo isso tem que ser gerenciado em conjunto. Exemplos de idéias criativas que funcionaram: na Universidade de Minnesotta, simplesmente oferecendo um desconto de 50% no preço, conseguiram aumentar em até 300% o consumo de cenouras e frutas. Quer dizer, algo muito simples deu resultado. Na Universidade de Stanford, o Dr. Robson acompanhou 195 crianças obesas durante nove meses, e a única intervenção que propôs foi limitar a televisão a 1 hora diária, e elas emagreceram. Sem fazer mais nada, apenas limitando o tempo que assistiam à televisão, as crianças emagreceram. Há outros exemplos mais radicais e que dificilmente seriam aplicados num país como o Brasil. Em Cingapura, preocupados com o aumento da obesidade infantil, lançaram um grande programa escolar pelo qual a criança obesa que não conseguia emagrecer repetia o ano. É algo que logicamente só pode funcionar num Estado pequeno, cujo regime de governo é totalitário. Algumas iniciativas brasileiras são muito louváveis, e devemos tentar apoiá-las, fazê-las surgir em outras partes e para elas contribuir. Por exemplo, ações legislativas que funcionaram: proibição de guloseimas em cantinas escolares - isso foi válido pelo menos em Florianópolis e no Rio de Janeiro, no Rio está funcionando mais na rede pública -; rotulagem nutricional obrigatória. Isso será abordado depois pela Dra. Ana Beatriz, mas posso dizer que o Brasil teve um grande avanço, foi o primeiro país em desenvolvimento a ter uma lei de rotulagem nutricional obrigatória. Agora fica o desafio: "como transformar isso em uma medida mais compreensível pela população?". Intervenções em escolas do Rio de Janeiro e de Recife; ações educativas que o Ministério realizou há cinco ou seis anos - não sei se ainda estão em andamento, mas, por meio do programa TV Escola, foram divulgados vídeos educativos para escolas de diversas partes do País. Enfim, são medidas importantes que precisam também do respaldo da sociedade e do ambiente acadêmico. As sociedades médica e de nutrição, neste ano, estão dando um passo importante para que consigamos avançar nessa questão. Por sugestão da Globo On-Line, para a prevenção de doenças crônicas, diversas sociedades brasileiras que estão aqui representadas pelas suas logomarcas - de endocrinologia, obesidade, diabetes, nutrição, alimentação e nutrição, pediatria, hipertensão e cardiologia - juntaram-se e criaram a Aliança Brasileira para Prevenção da Obesidade e das Doenças Associadas. Essa Aliança pretende propor ações e estratégias, para que se consiga avançar nessa questão, principalmente na prevenção da obesidade infanto-juvenil. Quando se trata de proteger o consumidor, a minha visão pessoal é a de que há passos que precisam ser dados, mesmo difíceis, não só quanto ao controle da propaganda, mas também quanto à rotulagem nutricional. Já sabemos que a população não compreende bem o que está exposto nos rótulos. Então, o que podemos fazer para transformar isso em algo mais prescritivo, que diga claramente que aquele alimento é perigoso ou saudável? Queremos estimular o consumo do alimento? Vamos estampar um rótulo verde, como se fez na Suécia, ou um rótulo vermelho ou uma advertência nos perigosos? Quer dizer, são decisões politicamente difíceis, mas que precisamos ter em mente e guardar como ferramentas importantes no arsenal de intervenção. Diante de uma epidemia que se considera grave, talvez as soluções tenham de ser bem rigorosas. Iniciativas de alimentação saudável em escolas: no Rio de Janeiro, existe uma iniciativa municipal que já atendeu a mais de 1.050 escolas e continua funcionando também com ações educativas. As merendeiras que preparam os alimentos recebem treinamento para uma alimentação saudável. Enfim, existem diversas iniciativas que são louváveis e merecem ser expandidas e copiadas. Estamos vendo hoje avanços legislativos no Estado de Minas Gerais sobre segurança nutricional. Precisamos talvez pensar em como transformar a saúde em algo contagioso e fazer com que essas ações sejam reproduzidas em outros Estados brasileiros e difundidas por todo o País. Aproveito os últimos seis ou sete minutos que me restam para abordar um tema. Acabo de ver a chegada de um grande amigo, Dr. Saulo Cavalcanti, de Minas Gerais, que está nesta luta conosco há alguns anos, junto à Sociedade de Diabetes e Endocrinologia. Hoje, estamos tratando da obesidade como uma questão de saúde pública. Acho que os tratamentos da obesidade hoje são um escândalo sanitário, são um problema gravíssimo, do ponto de vista sanitário, não somente do ponto de vista clínico. Acabaram de ser divulgados pela ONU dados que dão conta de que o Brasil acaba de assumir a liderança mundial em consumo de inibidores de apetite. Provavelmente, nós, que vamos começar a ouvir certos deboches sobre futebol quando sairmos do Brasil, ouviremos também sobre a questão da obesidade. Tive notícia de que um psiquiatra brasileiro muito famoso sofreu um tipo de deboche em uma reunião promovida pela ONU para falar sobre controle de anorexia. Um estrangeiro lhe disse: "Agora entendo o problema da fome zero no Brasil, por que isso vai funcionar tão bem: é porque, com o que vocês consomem de inibidores de apetite, não vai existir mais fome no País". Quer dizer, internacionalmente, essa situação de descalabro nos tratamentos da obesidade atingiu uma proporção que está preocupando as Nações Unidas. Aqui no Brasil estamos muito preocupados em controlar, de alguma maneira. Nestes cinco minutos, gostaria de falar um pouquinho sobre essa questão e propor algumas soluções que são viáveis para tentar controlar isso. Em grande parte, esse é nosso desafio. A imagem que a pessoa com excesso de peso tem, quando procura qualquer tratamento para emagrecer, é de um resultado milagroso, mais ou menos como isto, que só se consiga por meio de recursos gráficos e de programas de computador. Diante do resultado prático, que é o que preconizamos que a pessoa consiga atingir, geralmente os pacientes se desesperam. Preconizamos uma perda de 2kg a 4kg por mês. Todo mundo quer perder de 7kg a 10kg. Nessa busca da perda de 7kg a 10kg por mês, essas pessoas procuram soluções mágicas, soluções rápidas, por meio de dietas da moda. Trouxe a primeira dieta de que se tem registro, proposta por Hipócrates, o grande gênio da medicina. Ele dizia que quem precisa emagrecer deveria fazer suas refeições enquanto estivesse ainda ofegante, em suas atividades físicas, e dormir, toda noite, em cama bem dura. Não sei como a cama dura entra nesse processo de emagrecimento, mas ele propôs isso. Daí a coisa evoluiu para propostas cada vez mais sem sentido. Listamos algumas aqui, como a dieta do tipo sangüíneo, que agora começa a dar até metástase. Está sendo lançado um livro para cada tipo sangüíneo. Nada disso tem o menor fundamento. Não vou nem discutir mais essas dietas, mas é um problema que atrapalha muito a promoção da alimentação saudável, a estratégia de tentar induzir essas pessoas a ter um hábito alimentar mais saudável. Em 1999, a Abeso lançou uma campanha nacional chamada Dieta Não, propondo como alternativa à dieta o plano alimentar equilibrado, orientado por profissionais de saúde. Na época, essa campanha foi coordenada por uma nutricionista de Minas, da Universidade Federal de Viçosa, Dra. Josefina Bressan Monteiro. Do ponto de vista clínico, hoje fala-se mais sobre o plano alimentar, sobre algo definitivo do que sobre dietas propondo soluções fáceis. Isto aqui é o que gera essa situação de descalabro do tratamento da obesidade. Grande parte da chamada indústria do emagrecimento, no Brasil, está girando em torno disso. São as chamadas fórmulas mágicas de emagrecimento, que muita gente chama de bombas para emagrecer. Mostrarei exemplos de dois lados nefastos desse tratamento medicamentoso. Um lado é este. Aqui há mais de 40 produtos listados. Isso foi prescrito para um mesmo paciente, a um custo mensal de R$1.200,00. Podem analisar que não há aqui nenhum agente que tenha evidência científica de eficácia no tratamento da obesidade. Esse paciente procurou o médico com o único objetivo de emagrecer. É o uso de substâncias sem respaldo científico de eficácia. Essa é a bomba que faz perder de 7kg a 10kg por mês, que provoca o milagre, sempre contendo hormônios de tireóide em doses excessivas. Quando se fala em controlar o anorexismo, tem-se que tirar esses hormônios de tireóide das fórmulas. Diversos óbitos já foram registrados e também complicações gravíssimas. E essas pessoas que perdem de 7kg a 10kg por mês, quando param de tomar o produto, engordam mais do que emagreceram. Isso se tornou um problema de saúde pública no Brasil. Temos um estudo feito no Rio de Janeiro, por amostragem domiciliar, mostrando que, em mulheres adultas, o consumo de hormônios tireoidianos para emagrecer, em fórmulas, chega a 20%. É uma coisa calamitosa. Temos vários consensos e diretrizes respaldando o que realmente deve ser feito em termos de tratamento medicamentoso. Não vamos deter-nos nisso, mas existem sete medicamentos que têm eficácia comprovada cientificamente e que podem ser usados. Fizemos um levantamento e descobrimos que são usados aproximadamente 200 produtos no tratamento da obesidade. Uma imagem fala mais que mil palavras. Este "slide" mostra que é a mudança de hábito que leva aos melhores resultados, e não a solução mágica. Não são os remédios que fazem emagrecer, eles ajudam no programa de emagrecimento, mas nenhum deles faz milagre em resolver um problema que é resultado da interação da genética com o meio ambiente obesogênico, como estamos enfrentando hoje. Concluindo, queria chamar a atenção para essa questão da obesidade como um problema grave de saúde pública. E, como tal, é um problema que requer medidas urgentes não somente de prevenção, mas também de tratamento. Apesar de conhecermos cada vez mais o importante papel que tem o gene na obesidade, certamente esses fatores ambientais é que fazem crescer a epidemia da obesidade. O meio ambiente é o que precisa ser atingido de forma mais direta. Os maus hábitos alimentares só podem ser combatidos por meio de mudanças ambientais na escola, no lar, no trabalho e na comunidade. Essas mudanças só podem ser alcançadas por um esforço coordenado de toda a sociedade. É muito importante que os profissionais de saúde estejam conscientes disso e engajados nessa luta, porque o ambiente está conspirando para que a obesidade continue crescendo. Precisamos do engajamento de toda a sociedade, do nosso Poder Legislativo, para nos ajudarem a vencer as dificuldades de enfrentamento desse problema. Infelizmente, essas intervenções se mostram insuficientes para mudar o estilo de vida no caso de crianças e adultos que já têm excesso de peso e obesidade. Torna-se necessário o uso de medicamentos e, em casos extremos, da cirurgia bariátrica. E esse extremo também é preocupante, mas fico feliz em ver que ele será debatido neste fórum, que debaterá como tornar disponível para a população de baixa renda a cirurgia bariátrica. Muito obrigado pela atenção. - No decorrer do pronunciamento, procede-se à apresentação de "slides".