VICTOR HUGO MOREIRA DE RESENDE, Presidente da Associação dos Delegados de Carreira da Polícia Civil de Minas Gerais.
Discurso
Comenta o tema: "A Ação Policial no Estado Democrático".
Reunião
94ª reunião ESPECIAL
Legislatura 14ª legislatura, 2ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 29/07/2000
Página 29, Coluna 1
Evento Teleconferência Segurança Pública: "O Papel do Estado e da Sociedade Civil".
Assunto SEGURANÇA PÚBLICA.
Legislatura 14ª legislatura, 2ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 29/07/2000
Página 29, Coluna 1
Evento Teleconferência Segurança Pública: "O Papel do Estado e da Sociedade Civil".
Assunto SEGURANÇA PÚBLICA.
94ª REUNIÃO ESPECIAL DA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 14ª
LEGISLATURA, EM 6/7/2000
Palavras do Sr. Victor Hugo Moreira de Resende
Exmº Deputado Sargento Rodrigues, que preside neste momento os
trabalhos da Mesa; Exmº Gen. Alberto Mendez Cardoso, DD. Chefe do
Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República;
Exmª Deputada Zulaiê Cobra, DD. Deputada Federal e membro da
Comissão de Constituição e Justiça e de Redação da Câmara dos
Deputados, além de relatora da reforma do Poder Judiciário; Exmº
Cel. José Vicente da Silva Filho; Exmº Sr. Wladimir Sérgio Reale,
eminente Presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Rio
de Janeiro e nosso prezado amigo; Exmo. Sr. Major Domingos Sávio
de Mendonça, Presidente da Associação dos Oficiais da Polícia
Militar e do Corpo de Bombeiros, saúdo a todos os Deputados
presentes na figura da Exma. Deputada Elaine Matozinhos, Delegada-
Geral de Polícia, aos meus companheiros da Polícia Civil e a todos
os presentes.
Pedimos vênia para iniciar a nossa participação lendo o prefácio
da nossa Carta Magna de 1988, que, infelizmente, constou apenas na
primeira edição, sendo suprimido das demais. (- Lê:)
“O homem é o problema da sociedade brasileira: sem salário,
analfabeto, sem saúde, sem casa, portanto sem cidadania. A
Constituição luta contra os bolsões de miséria que envergonham o
País. Diferente das sete Constituições anteriores, começa com o
homem. Graficamente testemunha a primazia do homem, que foi
escrita para o homem. Que o homem é seu fim e sua esperança. É a
Constituição cidadã. Cidadão é o que ganha, come, sabe, mora, pode
se curar. A Constituição nasce do parto de profunda crise que
abala as instituições e convulsiona a sociedade. Por isso,
mobiliza, entre outras, novas forças para o exercício do governo e
a administração dos impasses. O governo será praticado pelo
Executivo e o Legislativo. Eis a inovação da Constituição de 1988:
divide competências para vencer dificuldades: contra
ingovernabilidade concentrada em um, possibilita a governabilidade
de muitos. É a Constituição - coragem. Andou, imaginou, inovou,
ousou, ouviu, viu, destroçou tabus, tomou partido dos que só se
salvam pela lei. A Constituição durará com a democracia e só com a
democracia sobrevivem para o povo a dignidade, a liberdade e a
justiça”.
Esse prefácio é da lavra do nosso Presidente da Constituinte, o
saudoso Ulisses Guimarães. Hoje, após mais de uma década de a
Constituição ter sido elaborada, os problemas de ordem geral se
avolumaram, os problemas de segurança pública estão aí presentes.
O Brasil contemporâneo passa por uma grave crise social e moral.
Na atualidade, consoante esclarece jurista pátrio, “a bondade dos
homens não se tira da razão de serem bons, mas da razão de não
serem maus; o nome da virtude não vem da virtude presente, mas do
vício ausente; o merecimento das coisas não se toma pelo que são,
nem pela forma que têm, mas pelo que não são e pela forma
contrária que não têm”.
Rompeu-se a camada de verniz que recebia os instintos egoístas e
violentos, e estes predominam na orientação da conduta humana.
Desintegra-se cada vez mais o espírito de cooperação, de ordem e
paz. A fé religiosa foi banida dos corações. Não há escolha dos
meios para obtenção dos êxitos. As sanções religiosas e morais
fizeram-se espantalhos ridículos. Mais que nunca o mundo passou a
ser aquinhoado com os audazes, os brutais, os imprudentes.
E como não poderia deixar de ser, a criminalidade tornou-se um
meio de luta pela vida como qualquer outro. Conseqüentemente, o
que se vê hoje é uma onda sempre crescente e assustadora de
crimes, daí a luta da polícia contra a criminalidade ter-se
transformado num verdadeiro “suplício de Sísifo”.
Sísifo, segundo Homero, na “Ilíada”, era o mais sábio e prudente
dos mortais e, por isso, foi condenado a empurrar até o cume de
uma grande montanha um rochedo que sempre voltava ao sopé, por
força do próprio peso.
O trabalho policial, apesar da luta que move contra os inimigos
da sociedade, não tem encontrado meios eficientes para colocar
remoras definitivas ao sempre crescente índice criminal.
Premidos pela opinião pública e pela forte pressão da mídia, as
autoridades movimentam-se para solucionar o problema e
invariavelmente imaginam encontrar na reestruturação do aparelho
policial o remédio eficaz para curar a síndrome de insegurança de
que são acometidos, hoje, os brasileiros. É evidente que a
reestruturação é imprescindível, mas não podemos olvidar que, por
si só, jamais debelará a grave questão da violência do País. Com a
reestruturação do aparelho policial hão de vir também profundas
reformas no Poder Judiciário, no Ministério Público e,
principalmente, no complexo penitenciário, que nem de longe cumpre
sua primordial finalidade de reeducar o apenado. Ao reverso,
avilta-o, violenta-o e o dilacera, afastando-o dos mínimos sinais
da presença de Deus, e o instrui, dia a dia, na mais perversa e
eficiente universidade do crime.
A violência atual é reflexo do descaso dos nossos dirigentes
públicos com as questões sociais relevantes, ou seja, educação,
trabalho, moradia e saúde. Pagamos, hoje, o preço da negligência e
da incompetência das políticas sociais do passado. A incúria
social contemporânea deve ser combatida prioritariamente.
A sociedade civil, por sua vez, não suporta mais conviver com
tanta criminalidade e insegurança nem com a ineficiência da
justiça e das polícias. Da mesma forma, já não suporta também a
hipocrisia com que o problema sempre foi tratado.
Simultaneamente, um grande número de políticos limita-se a
apontar os erros e as mazelas das instituições policiais, quando
não as usam para fins eleitoreiros, contribuindo, como sempre
fizeram nos bastidores de seus gabinetes, para a manutenção do
enfraquecimento dessas instituições.
Em razão dessas manifestações políticas, os legítimos
representantes da sociedade ficam inibidos e não apresentam
projetos sérios, destinados à reformulação do sistema de segurança
pública; em contrapartida, projetos corporativistas ou fantasiosos
não faltam, como a proposta de novo modelo de polícia apresentada
pelos Ouvidores de Polícia no Fórum Nacional de Ouvidores de
Polícia do Brasil.
Podemos afirmar que, de todos os projetos de emenda à
Constituição a respeito de segurança pública que tramitam na
Comissão Especial de Segurança Pública, a Proposta de Emenda à
Constituição nº 613, da Deputada Zulaiê Cobra, aqui presente, é
insofismavelmente a melhor. Entretanto, ações corporativistas
podem propiciar mudanças lesivas à segurança pública.
A problemática da segurança pública, notadamente no que respeita
à questão das polícias, deve ser discutida com desprendimento. A
gravidade do momento não comporta corporativismo egoísta e
mesquinho. É imprescindível que haja interesse e ousadia do
Governo Federal para realizar mudanças efetivas no sistema
policial, criando-se uma nova polícia, única e civil.
Somos pela criação de uma nova polícia, e não pela unificação das
atuais, por entendermos que tal idéia agrada apenas aos ouvidos
dos que não buscam modificações profundas, pois qualquer projeto
nesse sentido não se pode afastar do realismo técnico que já falta
à atual segurança pública.
Unificar duas polícias falidas é, na melhor das hipóteses,
agigantar uma estrutura viciada e impraticável, mantendo-se os
mesmos problemas atuais e ampliando-os, sem nada resolver.
Em razão do exíguo tempo, terminamos aqui. Por ocasião do debate,
se tivermos oportunidade, faremos mais esclarecimentos.