SRA. RAQUEL MUNIZ (PSC), Deputada Federal
Discurso
Legislatura 18ª legislatura, 1ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 03/10/2015
Página 67, Coluna 1
Evento Ciclo de Debates: Judicialização da Saúde.
Assunto SAÚDE PÚBLICA.
29ª REUNIÃO ESPECIAL DA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 18ª LEGISLATURA, EM 15/9/2015
Palavras da Sra. Raquel Muniz
A Sra. Raquel Muniz - Bom dia a todos. Cumprimento o deputado Arlen Santiago, presidente da Comissão de Saúde, meu conterrâneo do Norte de Minas, colega do Hospital São Lucas, hoje Hospital Dilson Godinho, professor também, que nos ensina todos os dias. Muito obrigada, Arlen, pelo convite. Na pessoa do nosso secretário Fausto e da secretária municipal de Saúde de Montes Claros, enfermeira Ana Paula, cumprimento todos os secretários; cumprimento todas as autoridades, do Judiciário, do Ministério Público, na pessoa do Dr. João Paulo, tão citado aqui no dia de ontem assim como hoje. Ontem, especialmente na grande palestra do Dr. Gilmar, que mostrou que Montes Claros dá exemplo ao País, e não só a Minas Gerais. Vamos levar também essa experiência para o Congresso Nacional, para as pessoas saberem que Montes Claros, por meio do diálogo entre prefeitura, por intermédio da nossa secretária Ana Paula e do Dr. João Paulo, e Ministério Público conseguiu, efetivamente, diminuir a judicialização da saúde, motivo da nossa discussão de hoje.
Meus amigos, por que estou aqui, hoje? O Arlen já falou. Primeiro, porque meu colega superexperiente, deputado há vários mandatos, Dr. Odorico, está em uma missão oficial. Ontem, estive aqui o dia todo com vocês participando, e o prefeito Ruy, de Montes Claros, também esteve aqui comigo. Hoje, nossa secretária está aqui presente. E fui convidada ontem pela assessoria da Assembleia para que pudesse falar a vocês hoje.
Sou deputada de primeiro mandato, represento o Norte de Minas. Sou uma das poucas mulheres do País a ocupar espaço de poder na política e, de Minas Gerais, somos quatro deputadas federais. Vocês viram que ontem, nesta Mesa de honra, ainda tive a companhia da desembargadora Vanessa; hoje estou aqui sozinha. Fui escolhida para substituir o nosso deputado Odorico. Fui membro da Comissão Parlamentar de Inquérito da Máfia de Órtese e Prótese, pois nossa comissão na Câmara Federal já se encerrou; ela tinha prazo para se iniciar e já teve seus trabalhos encerrados. Mas lembro a vocês que o Senado também abriga uma Comissão Parlamentar de Inquérito da Máfia de Órtese e Prótese. Se vocês tiverem alguma denúncia ou se quiserem ter algum esclarecimento também é possível encaminhá-los ao Senado. Podemos fazer isso, porque temos levado o questionamento de vocês e participado efetivamente das reuniões dessa importante comissão no Senado Federal.
Por que foi criada essa CPI? Assim como toda comissão, ela é motivada por algum problema que está acontecendo. Quando cheguei à Câmara Federal, poderia participar de várias CPIs. Fui tentada por meus assessores a participar da CPI da Petrobras, mas recusei porque acho que poderia contribuir naquilo que conheço.
Sou médica geriatra. Ajudei a implantar o SUS na minha cidade. E o primeiro atendimento foi de geriatria, por meio de uma equipe multidisciplinar. Quando minha cidade resolveu fazer saúde plena, buscamos, junto ao secretário daquela época, Dr. Eduardo Avelino, todos os profissionais necessários e não tínhamos oftalmologistas. Fomos à Fundação Hilton Rocha, de cuja direção tenho orgulho de falar que faço parte hoje, e diminuímos a fila de Belo Horizonte e do seu entorno na área de oftalmologia, levando, assim, oftalmologistas para Montes Claros.
Fui médica intensivista do hospital São Lucas durante muitos anos; sou médica do trânsito – é uma das bandeiras que também levo para o Congresso Nacional; criei a Frente Parlamentar da BR-251 porque acredito que não precisamos atuar somente no Ministério da Saúde, mas podemos fazê-lo em outros ministérios, a fim de melhorar as nossas estradas e, consequentemente, diminuir o número de pacientes hospitalizados em decorrência do trânsito. Mais que isso, poderemos salvar vidas.
Hoje vou falar um pouquinho para vocês de minha experiência nessa comissão parlamentar de inquérito. O mercado brasileiro de dispositivos médicos implantáveis – DMI – é composto por empresas multinacionais e por pequenas e médias empresas nacionais. Hoje, na Anvisa, existem aproximadamente 3.600 empresas que compõem esse mercado, entre importadores, fabricantes e distribuidores. Em 2014, o mercado brasileiro movimentou aproximadamente R$4.000.000.000,00 em dispositivos médicos implantáveis. Estima-se, na Anvisa, que atualmente existam 10 mil dispositivos médicos implantáveis com registros.
O que nos motivou a criar essa CPI foi a falta de regulação no mercado, que causou sérios problemas ao setor de DMI. Esse envolvimento ocorreu com distribuidores, fabricantes, hospitais e profissionais, como dirigentes de hospitais e advogados. Foi para combater essa associação criminosa que, na Câmara Federal, criou-se uma comissão parlamentar de inquérito para investigar a cartelização na fixação de preços e distribuição de dispositivos médicos implantáveis.
Para criarmos uma CPI é necessário que façamos, junto com mais da metade dos deputados, uma solicitação à Mesa da Câmara. Isso foi feito, e foi criada essa importante CPI.
Práticas irregulares que levaram à criação da CPI: comissão paga a médicos, na ordem de até 30% do valor da nota fiscal, o que se verificou por meio de depoimentos, documentos, todos eles apensados ao relatório final da CPI; comissão paga aos hospitais, na ordem de até 20% do valor das notas fiscais, o que muitos achavam ser uma prática normal; esquema formado entre médicos e advogados visando à judicialização de processos.
Vários processos chegam à Justiça, com urgência: tem-se de colocar um stent farmacológico. E ontem vimos aqui que tanto o stent farmacológico como o não farmacológico têm a mesma função. Quem falou isso foram professores e pesquisadores desse assunto. E, pasmem, muitas vezes pacientes relataram, em nossa CPI, que venderam tudo para colocar o stent farmacológico – esse foi o grande trabalho dessa CPI na área de cardiologia, apesar de saber que o esquema da máfia de órteses e próteses perpassa também por outras áreas, como ortopedia e oncologia.
Quanto aos resultados dessa CPI, muitos ainda estão por vir, e peço a ajuda de vocês, junto aos parlamentares que ajudaram a eleger, para que possamos aprovar projetos de lei, mas aqui apresentaremos alguns resultados. Portaria Interministerial nº 38, de 8/1/2015, dos Ministérios da Saúde, da Fazenda e da Justiça, que criou um grupo de trabalho para regulamentar as questões dos dispositivos médicos. Portaria SAS nº 403, de 7/3/2015, que disciplina a aquisição, o recebimento, a utilização e o controle dos dispositivos médicos.
Projeto de lei que criminaliza a corrupção privada: o seu objetivo é coibir e diminuir esses abusos. Projeto de lei que altera as competências da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, para incluir os dispositivos médicos implantáveis: esse ainda não tem número, porque está em andamento, para ser aprovado.
Projeto de lei que cria o sistema de educação permanente em novas tecnologias e dispositivos médicos implantáveis no SUS: defendi-o com grande vigor, porque minha grande bandeira é a educação; o trabalho tem de ser feito com aquelas crianças que estiveram aqui. Montes Claros dá exemplo ao criar também uma cartilha anticorrupção, que está sendo trabalhada nas escolas. Aliás, o Estado de Minas, esse grande jornal, deu uma aula de cidadania no dia 7 de setembro, ao publicar matéria sobre essa cartilha criada pelo ex-delegado federal na nossa cidade.
Projeto de lei que disciplina a concessão de tutela de urgência em demandas judiciais que envolvam dispositivos médicos implantáveis: como eu disse, muitos resultados ainda estão por vir, e os senhores poderão nos ajudar também.
Ética Saúde, Acordo setorial: foi um documento elaborado em agosto de 2014 e lançado em junho de 2015 pela Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Implantes – Abraidi -, por empresas e pelo Instituto Ethos, que estabelece critérios e padrões no relacionamento entre empresas e profissionais de saúde. Durante a investigação da nossa CPI, percebemos - e ontem foi falado aqui – que as pessoas que procuram os consultórios médicos para apresentar medicamentos estão cada vez mais bonitas e bonitos. Os profissionais de saúde são muito tentados por essas empresas desde a implantação dos serviços. Recebem aparelhos, têm todo um treinamento, realizam viagens, participam de congressos, todo esse financiamento visando a que estejam implantando mais e mais dispositivos médicos.
Ao encerrar o relatório da CPI, foram feitas algumas recomendações, que citaremos a seguir: treinamento dos profissionais da saúde pelo SUS no âmbito dos hospitais universitários e dentro da política nacional de educação permanente de saúde – tudo isso foi disponibilizado em uma audiência na nossa comissão, ao encerrar os trabalhos, e foi entregue ao ministro; indicação, ao Conselho Federal de Medicina, para ampliação da atuação das comissões de ética médica –aproveito para saudar o Lincoln, que já me disse que vai entregar ao secretário Fausto, através da Comissão de Saúde da Assembleia, toda essa parametrização tão cobrada pela secretaria; padronização da nomenclatura dos dispositivos médicos implantáveis: como não há uma padronização, existe um mercado vasto nessa área e, com isso, os preços desses produtos tornam-se abusivos; aperfeiçoamento no controle de fluxo de dispositivos médicos no SUS; criação de comissão especial para estudar o processo de inovação e incorporação tecnológica no complexo produtivo da saúde – ontem debatemos muito esse tema, porque existe uma evolução tecnológica, mas, às vezes, não acompanhamos esse processo, e daí os abusos; realização de audiências públicas semestrais dentro da Comissão de Seguridade Social e Saúde, para acompanhar o andamento das medidas propostas pela CPI da Máfia das Órteses e Próteses do Brasil.
A nossa CPI não encerrou os trabalhos, haja vista que é um braço da nossa Comissão de Seguridade, Saúde e Família na Câmara federal. A CPI recomendou que, semestralmente, realizássemos essas audiências públicas, até para acompanhar o relatório entregue ao Ministério da Saúde, à Polícia Federal e à Justiça, para saber se os passos estão sendo cumpridos e também para receber novas denúncias – a comissão está lá também para isso.
Realização de auditoria pelo Denasus no Município de Montes Claros: faço uma pausa neste ponto para falar de Montes Claros. Quando ingressei nesta CPI, muitos de vocês viram pela televisão que vários estados estavam envolvidos nessa corrupção, como Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.
Fomos surpreendidos pela nossa comissão. O delegado federal em Montes Claros, bem como o Ministério Público Federal, fizeram um trabalho brilhante: uma operação em Montes Claros e identificaram irregularidades e abusos ocorridos nos hospitais e encaminharam à nossa CPI, o que motivou a ida da CPI a Montes Claros. Não foi motivo de alegria participar disso, não foi motivo de alegria estar ao lado de colegas que conheci quando começaram o trabalho em Montes Claros e acredito que, influenciados por essa máfia, perderam a noção do juramento que fazemos quando terminamos o curso médico e se juntaram a essa máfia praticando irregularidades. Não fui eu que levei a CPI a Montes Claros, como noticiou uma parte da imprensa. Não tenho essa capacidade, sou deputada de primeiro mandato, sou aprendiz. A CPI foi motivada por uma ação de Montes Claros, que sempre sai na frente. Quem conhece a história do SUS sabe que lá nasceu o SUS. Somos aguerridos e tivemos a oportunidade de receber essas denúncias. Mais do que isso, quando a CPI estava se encerrando, nossos deputados bradaram ao presidente Eduardo Cunha que desse mais prazo para avaliarmos outros estados, já que Montes Claros havia mostrado que possuía profissionais que poderiam ajudar a fazer esse levantamento no Brasil, por meio da Polícia Federal. Mas havia prazo para encerrar e não conseguimos fazer o que desejávamos. Porém, Montes Claros deu o exemplo. Eu ainda insisti, no dia da entrega do relatório ao ministro, que isso fosse feito rapidamente na nossa cidade para mostrarmos que fomos capazes de fazer nascer o SUS e que também somos capazes de identificar essa corrupção e coibi-la. Há um requerimento meu, protocolado em agosto, e ainda não recebemos a visita do Denasus.
Encerro minhas palavras agradecendo a participação de cada um de vocês, especialmente do meu município, por intermédio da nossa secretária Ana Paula, do Ministério Público, na pessoa do Dr. João Paulo, da câmara de vereadores, na pessoa do vereador Fernandão, que é da Comissão de Saúde. O Norte de Minas em peso está presente. Vejo o prefeito Tiãozinho, de Maria da Cruz, o Ramon. Vamos passar ao debate. Encerro pedindo a vocês uma salva de palmas para aqueles que resolvem o problema. O Brasil tem jeito e quem dá o jeito é cada um de nós que está na ponta. Eu não saí da ponta, continuo médica na minha cidade, continuo fiscalizando. Temos de diminuir a judicialização, mas, quando ela for necessária, temos de usá-la. Posso dizer que Montes Claros vai dar o exemplo para o Brasil. Ana Paula, fique de cabeça erguida porque estamos fazendo o correto. Montes Claros é uma das poucas cidades que está judicializando, a prefeitura junto com a Secretaria de Saúde e com o Estado. Tiraram a nossa saúde plena, mas vamos lutar muito para que, por meio do diálogo e não da judicialização, possamos retornar e atender muito bem não só o Norte de Minas, como já fazemos, mas até o Sul da Bahia.
– No decorrer de seu pronunciamento, procede-se à exibição de slides.
O presidente – Obrigado, deputada Raquel.